domingo, 28 de março de 2010

Por quem os sinos dobram?

Semana de 01 a 07 de março de 2010

No cenário internacional, alguns acontecimentos deram a tônica das principais preocupações da semana. Um deles foi o risco de superaquecimento na China. As previsões, num cenário otimista, eram para um crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) do país de 8,4%. Diante do desempenho da economia chinesa em 2009, alteraram-se as expectativas. Em 2010, num cenário mais pessimista, o PIB daquele país cresceria 9,6% e num cenário otimista, 11,5%.
Este crescimento para além do previsto tem sido atribuído, em grande parte, aos estímulos sem precedentes, como o de 4 trilhões de renmimbis em programas de investimentos (US$ 600 bilhões, ou 12% do PIB), 950 bilhões de renmimbis (US$ 140 bilhões, ou 35% do PIB) de déficits orçamentários e 10,5 trilhões de renmimbis (US$ 1,5 trilhões, ou 31% do PIB) em novos empréstimo. O investimento, que tem sido a chave do crescimento do PIB, subiu 30% em ativos fixos em 2009, 4,6% a mais do que em 2008. A proporção investimento/PIB, estimada em 55% um ano atrás, agora passou para 67%.
Nos Estados Unidos, os fundos de hedge, que são remunerados utilizando a estratégia de fazer operações para garantir outras operações contratadas, lançaram uma forte investida contra o euro, que teve sua cotação reduzida, de US$ 1,51, para US$ 1,35, o que, na perspectiva do mega especulador Geoge Soros, só não levará o euro a bancarrota se a União Européia alterar a sua política monetária e financeira. Poucos são, no entanto, os operadores que acreditam que o valor do euro desmoronará totalmente, como ocorreu com a desvalorização da libra esterlina em 1992, na esteira de uma grande aposta, do mesmo especulador, que naquela ocasião teve um ganho equivalente a US$ 1 bilhão.
Por seu lado, o Banco Central Europeu (BCE) anunciou que retomará o seu formato padrão de agir, retirando gradualmente as medidas extraordinárias de ajuda à economia da zona do euro. Mas, o pesidente do BCE, Jean-Claude Trichet, afirmou que continuará a sua linha de empréstimos e manterá o nível baixo da taxa de juro, 1%. O BCE, além disso, manterá estáveis as previsões para o crescimento e para a inflação da zona do euro neste ano, reduzindo as previsões para o ano que vem. No interior do bloco, o governo da Grécia continuou a agir drasticamente no sentido de eliminar seu déficit de €$ 4,8 bilhões, através de medidas que impõem cortes orçamentários, como o congelamento, por um ano, das pensões dos servidores públicos e a redução de 30% dos abonos salariais além de aumentos gerais de impostos, que devem crescer em 2% sobre o valor agregado, particularmente sobre cigarros e gasolina.
No hemisfério Sul, em conseqüência do tremor de terra, agravou-se a situação econômica do Chile, com seus reflexos nos países com os quais mantém relações comerciais, principalmente os importadores do cobre chileno, que verão afetados os preços dessa matéria-prima. Outros acontecimentos de realce nessa parte do globo foram as assinaturas de um tratado de livre comércio entre o Peru e a China, que já entrou em vigor, e entre Peru e Colômbia, com a União Européia. Nesse último, o principal interesse da Europa parece ser o de exportar automóveis, máquinas, serviços, vinho e produtos lácteos. Estes tratados trarão, sem dúvidas, conseqüências para o Brasil, como por exemplo, a possibilidade de importação de produtos chineses com tarifa zero, através do Peru.
E já que falamos de Brasil, o Banco Central do país prepara uma revisão das normas para operações de câmbio. Henrique Meireles, seu presidente, afirma querer uma limpeza das regras ainda esse ano. O objetivo é o de conter a acumulação de créditos tributários criados no recolhimento dos impostos nas etapas de produção das mercadorias para exportação. Com as medidas se pretende facilitar as exportações brasileiras e aumentar a competitividade do país. Para Meireles, é preciso fazer uma limpeza das normas, eliminando regras anacrônicas e simplificando procedimentos necessários para ingressos e  remessas de moedas estrangeiras.
Enquanto no exterior, se discute o tamanho dos bancos no pós crise, no Brasil, a concentração bancária não para de avançar. Os oito maiores bancos brasileiros concentram, nesse momento, 88,6% do total do sistema financeiro, onde se destaca o Banco do Brasil, que concentra 20,1% de todos os recursos concedidos por meio de empréstimo bancário. A Caixa Econômica Federal responde por 8,8% dos empréstimos. Somando-se os bancos públicos menores e o BNDES, a participação estatal no sistema financeiro supera os 41% do total.
Comenta-se que, antes mesmo do início do ciclo de alta do juro básico pelo Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central, a taxa real de juro projetada para 12 meses está em 6%. Mesmo sem a elevação da Selic, congelada desde julho do ano passado, em 8,75%, esta taxa básica já é a maior taxa de juro real do mundo e, de acordo com o ranking organizado pela consultoria UP Trend, vem seguida pela Indonésia, com 3,6%, e pela China, com 3,3%.
Com semelhante taxa de juro aliada à desconfiança crescente no Euro e a pouca confiabilidade na economia americana, os investidores estrangeiros carreiam os seus recursos para aquisição de ativos denominados em reais. A primeira vista, isso pode parecer que a credibilidade da economia brasileira está em alta. No entanto, esta aparência não corresponde à realidade. É bastante observar a economia para constatar que o risco de inflação é uma realidade admitida por todos. A inflação medida pelo Índice de Preços do Consumidor Amplo (IPCA) fechou o ano passado em 4,3%, pouco abaixo da meta de 4,5% pretendida pelo Banco Central. Em janeiro deste ano, houve, no entanto, uma aceleração do índice, que registrou 0,75% de aumento, a maior alta mensal desde maio de 2008. Pode-se observar também que apesar do recorde de exportação, o saldo da balança comercial, em fevereiro, é o menor desde 2000 e que não houve nenhuma inovação substancial para melhorar o desempenho da economia. Esse é um país tão precário que até as multas de trânsito, que supostamente deveriam ser usadas como fundo para salvar vítimas, estão sendo desviadas e usadas para pagamento dos juros da dívida pública.
Afinal, é caso de se perguntar: “Por quem os sinos dobram?”

Texto escrito por:
Elivan Rosas Ribeiro: Professora do Departamento de Economia da UFPB e Pesquisadora do PROGEB – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira.
Email: progeb@ccsa.ufpb.br

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quinta-feira, 25 de março de 2010

Se correr, ou se ficar, o bicho pega e come

Semana de 22 a 28 de fevereiro de 2010

Temos destacado em nossas análises o caráter contraditório da atual fase do ciclo econômico, a recuperação. São exemplos: a quebra de mais quatro bancos nos Estados Unidos e a ameaça de insolvência de diversos países europeus (Portugal, Irlanda, Itália, Grécia e Espanha). No entanto, mesmo diante da fragilidade verificada no setor financeiro, os governos dos Estados Unidos e de países da Europa como Alemanha, França e Inglaterra, começaram a retirar as medidas emergenciais.
Os diversos governos têm sido convocados a adotarem políticas de austeridade econômica, o que significa a aplicação de medidas restritivas.
Na União Européia, fala-se em congelar salários e aumentar a idade de aposentadoria, com o objetivo de reduzir os déficits orçamentários. A retirada das medidas emergenciais somada ao ajuste fiscal provocou uma onda de greves na Zona do Euro. Na Grécia, foi convocada uma greve geral de 24 horas; em Portugal, os trabalhadores anunciaram uma greve nacional para o dia 4 de março; e na Espanha, os sindicatos iniciaram uma marcha de protestos no dia 23 de fevereiro. A Confederação Européia dos Sindicatos (CES) afirmou que os protestos “vão se multiplicar diante da insatisfação real, da inquietação forte em meio a riscos de regressão social”. Joel Decaillon, “número dois” da CES, afirmou que a Europa perdeu 5 milhões de empregos em 2009 e pode perder outros 7 milhões em 2010.
Em períodos de crise, as condições de trabalho se deterioram, com o aumento de trabalhadores temporários mal pagos e a intensificação da jornada de trabalho. Nesse sentido, Decaillon expressa o seu descontetamento com a atual situação dos trabalhadores, ao dizer que “a taxa de desemprego é muito alta, o trabalho precário avança velozmente.”
Mesmo no país mais poderoso da Zona do Euro, a Alemanha, a situação não é das mais confortáveis. O déficit fiscal ultrapassou 3,3% do PIB, sendo esta a primeira vez, desde 2005, que o país não conseguiu manter o limite máximo de 3%, apesar de todo o empenho e rigor da premiê Ângela Merkel, intransigente defensora do respeito ao limite dos 3%. Além do mais, o Produto Interno Bruto (PIB) só não registrou retração no quarto trimestre de 2009, porque a indústria aumentou suas exportações para as economias mais “sadias”.
Ora, a dívida pública apresenta uma dupla face. De um lado, ela cria uma classe de parasitas financeiros, os rentiers, que enriquecem negociando os títulos de dívida na bolsa de valores. A aquisição dos títulos da dívida, por parte de industriais, comerciantes, sociedades anônimas, bancos e especuladores, faz prosperar o jogo na bolsa, o que Marx denominou de “bancocracia”. Mas, por outro lado, o pagamento da dívida requer o aumento dos impostos e esses recaem, de modo geral, sobre os meios de subsistência de primeira necessidade, ou seja, aqueles destinados à reprodução da força de trabalho. Desse modo, confirma-se a afirmação de Marx de que “a única parte da chamada riqueza nacional que é realmente objeto da posse coletiva dos povos modernos é (...) a dívida pública.”
Nos Estados Unidos, o presidente Barack Obama criou uma comissão interpartidária para analisar o problema do déficit fiscal, que deve chegar a 10,5% neste ano. Para reduzir este déficit, as propostas não são nada animadoras para os trabalhadores: aumento dos impostos, adiamento de aposentadorias e corte nos serviços médicos cobertos pelo governo. Em 2007, antes do estouro da crise, a dívida do governo federal era de 37% do PIB, mas, em 2009, ultrapassou 53%. O Federal Deposit Insurance Corp. (FDIC), agência do governo dos EUA, informou que 702 bancos eram considerados problemáticos no fim de 2009. A FDIC disse que o aperto final ainda está por vir, pois outros 140 bancos podem ficar sob sua supervisão. O total de ativos problemáticos chegou ao patamar de US$ 402,8 bilhões no fim do quarto trimestre de 2009. A venda de casas nos EUA apresentou queda recorde, com retração de 11,2%, em janeiro. Jennifer Lee, economista do BMO Capital, disse que, apesar da ajuda do governo, “o setor deu outro grande passo para trás”.
A atual situação da economia dos EUA é de um verdadeiro impasse. Os consumidores não compram, os bancos temem emprestar, as empresas não contratam e o Estado retira os estímulos. O economista-chefe do Fundo Monetário Internacional, Olivier Blanchard, disse que a economia dos EUA estaria crescendo por uma combinação de insulina (estímulos fiscal e monetário) e açúcar (a ansiedade dos empresários de preencher estoques vazios). Blanchard destaca que “a contração foi muito sincronizada. Mas a recuperação? Cada vez menos.” O impasse da economia também repercute no nível de emprego. A situação dos trabalhadores é preocupante. Ben Bernanke, presidente do Federal Reserve (banco central dos Estados Unidos), disse que “as aberturas de empregos (nos EUA) são escassas”, com o aumento na demanda por mão de obra temporária.
No resto do mundo, alguns países apresentam certa recuperação. Argumenta-se que esta depende dos mercados globais que são estimulados pela “incansável” economia chinesa. Entretanto, Kenneth Rogoff, professor da Universidade de Harvard, disse que a China pode sofrer um baque nos próximos anos. Rogoff afirmou que “a reação chinesa à recente crise financeira aumentou claramente os riscos de que a China tenha uma bolha na economia alimentada por dívidas.” Ele completou que os valores dos imóveis se descolaram da realidade, sendo o mercado imobiliário o setor mais provável de eclosão de bolhas.
Com esse quadro da economia mundial, não surpreende o fato de que sobrem recursos para o comércio global. De acordo com Raed Safadi, diretor adjunto do departamento de comércio e agricultura da Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), dos US$ 250 bilhões que o G-20 (grupo dos 20 países mais ricos do mundo) arrecadou em 2009, apenas 67% foram utilizados, restando US$ 80 bilhões ociosos. Isto é indicativo de que, mesmo com as taxas de juros mundiais em níveis muito baixos, os capitalistas não se arriscam a investir, o que acaba por travar a recuperação da economia mundial.
Então, os governos se vêem pressionados a continuarem com as políticas emergenciais, dadas as pressões sociais e, ao mesmo tempo, são forçados a adotarem medidas restritivas, tendo em vista a debilidade de seus orçamentos, o que aumentará ainda mais a insatisfação social.
Temos, portanto, o ressurgimento, noutro plano e noutra escala, de um antigo paradoxo: se o governo correr ou ficar o bicho pega e come.

Texto escrito por:
Kaio Glauber Vital da Costa: Economista, pesquisador do Progeb-Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira.

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Alta tensão na zona do Euro

Semana de 15 a 21 de fevereiro de 2010

O sistema financeiro mundial continua fortemente instável, e os mercados mundiais se encontram em alerta diante do perigo de eclosão de uma nova crise econômica e financeira, antes mesmo das consequências da última crise terem cessado.
No dia 19 passado, as autoridades americanas anunciaram a falência de mais quatro bancos nos Estados Unidos, aumentando para 20 o total de instituições que faliram somente este ano.
No início do mês, aumentou também a preocupação dos investidores com a enxurrada de notícias sobre o forte endividamento dos países europeus. Portugal, Irlanda, Itália, Grécia e Espanha estão entre os que possuem as maiores dívidas. No caso da Itália, a dívida já representa mais de 100% do seu Produto Interno Bruto (PIB).
A situação na Europa ficou ainda mais complicada com as denúncias de que alguns países, como a Grécia, para aderir à zona do euro, ocultaram bilhões de dólares em dívidas com a ajuda de grandes bancos internacionais, o que já está sendo chamado de “subprime europeu”. Uma estratégia parecida com aquela que impulsionou o crescimento das hipotecas de alto risco nos Estados Unidos.
Instituições financeiras como o JPMorgan Chase e o Goldman Sachs desenvolveram instrumentos que possibilitaram aos governos da Grécia e da Itália mascararem empréstimos, forjando suas contas para criar a aparência de uma boa administração. A proposta apresentada pelo Goldman Sachs à Grécia esteve baseada num instrumento financeiro que prolongou sua dívida, empurrando-a para o futuro. Foi uma manobra semelhante à de uma pessoa que faz uma segunda hipoteca para pagar suas dívidas da hipoteca anterior. Em vários acordos dessa natureza, bancos adiantaram dinheiro a países europeus em troca de pagamentos futuros que não eram registrados como empréstimos contraídos, o que acabou por encobrir a real dívida dessas nações. Novamente, a Grécia serve de exemplo. Ela concedeu direitos sobre tarifas aeroportuárias e proventos de loterias como formas de pagamento.
Com as denúncias de fraudes nas contas públicas desses países, aumentou a tensão na zona do euro. A dívida de importantes economias européias, portanto, é bem maior do que aquilo que se pensava, e o grande problema debatido no velho continente agora é como a falência de países como a Grécia, cujo déficit orçamentário, em 2009, alcançou a marca de 12,7% do PIB, pode repercutir de maneira desastrosa na economia global. Alguns temem que esta falência traga consequências ainda piores, para o sistema bancário, que a quebra do Lehman Brothers, ocorrida em setembro de 2008. Já o colapso da Espanha colocaria em risco também a Alemanha, uma vez que os bancos alemães são detentores de grande parte dos títulos da dívida espanhola.
Os efeitos negativos dessa forte integração econômica e da livre mobilidade de capitais levaram economistas do Fundo Monetário Internacional (FMI) a modificarem a visão da entidade sobre o controle destes capitais. O FMI passou a sugerir que os países devem usar impostos e regulamentação para moderar a euforia dos capitais, responsáveis pelo surgimento das bolhas especulativas. Dessa maneira, o FMI altera o velho dogma sagrado do livre mercado, que sempre defendeu, chamando a atenção para o risco de formação de novas bolhas especulativas em países emergentes, como a China, onde os temores com a especulação imobiliária e a aceleração da inflação não param de crescer.
Se ao nível financeiro as tensões aumentam, no mundo do trabalho, as relações entre empregadores e empregados continuam muito instáveis. Em janeiro, trabalhadores da AB InBev, maior companhia de cerveja do mundo, bloquearam as entradas de fábricas da empresa na Bélgica durante duas semanas, exigindo o abandono do plano de eliminar 10% dos seus atuais 8 mil empregados na Europa Ocidental. A companhia, que detém 25% do volume mundial de vendas de cerveja, chegou a acorrentar os portões da fábrica na cidade de Leuven, para não permitir a entrada dos trabalhadores e forçar a demissão coletiva de 300 deles. Os custos das demissões e a pressão política das autoridades do Governo Belga, que avisaram que não arcariam com o seguro-desemprego, levaram a cervejaria a abandonar temporariamente o plano de demissões.
Nos Estados Unidos, as demissões em massa tornaram-se frequentes durante a crise, assim como as falências, os planos de reestruturação e corte de custos. Este fato, segundo o jornalista C. Sardenberg, vem proporcionando uma recuperação mais rápida em relação às demais economias que operam com amplas redes de proteção social, como a Alemanha, onde o governo pagou para que as empresas não demitissem, estimulando-as a contratarem em tempo parcial, pagando aos trabalhadores as horas não trabalhadas. Nos Estados Unidos, as empresas simplesmente demitem, fecham as fábricas e cortam custos, de tal maneira que o ajuste econômico é mais rápido, embora o custo social seja bem mais elevado. Mas a destruição e a violência das leis econômicas fazem mesmo parte do capitalismo, e a ação do Estado para reduzir tais efeitos constitui apenas uma tentativa de intervir na dinâmica de funcionamento desse sistema.
Enquanto isto, no Brasil, em ano de eleições, o afrouxamento fiscal que envolve a elevação de gastos da máquina administrativa preocupa os mais ortodoxos, entre os quais se encontram os principais quadros do Banco Central. Por isso, a expectativa é de elevação da taxa básica de juros, a Selic. De acordo com o Instituto Internacional de Finanças (IIF), órgão que representa as maiores instituições financeiras do mundo, a Selic deve saltar, dos atuais 8,75%, para 12,25% até o final de 2010. Caso isto ocorra, o Brasil encerrará o ano bem mais perto da posição que ocupava até pouco tempo, de país com a maior taxa de juros do planeta. Algo bastante coerente com a política econômica brasileira dos últimos anos, que, apesar dos programas de assistência social de caráter paliativo, sempre obedeceu à risca os mandamentos da cartilha econômica canônica do FMI. Como lembra Delfim Netto, ela esteve baseada na perseguição incansável pelas metas de inflação, na formação de superávits primários para o pagamento da dívida e na flutuação cambial acompanhada de grande mobilidade de capitais, mobilidade que se pretende ampliar.
Com efeito, se discute um projeto que pretende transformar São Paulo em centro financeiro da América Latina, através de medidas que visam ampliar a liberdade de entrada e saída de capitais, como a eliminação do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), cobrado dos investidores (especuladores) externos. O projeto começou a ser pensado, acerca de um ano, pela iniciativa privada e tem a participação do governo. Ou seja, mais uma vez o Brasil chega atrasado à festa, no momento em que a farra financeira está demonstrando sinais de extrema fragilidade e que os demais países tentam criar mecanismos adicionais de controle de capitais.
Parece que, novamente, o Brasil se encontra na contramão da economia mundial.

Texto escrito por:
Diego Mendes Lyra: Mestrando em economia, Professor Substituto do Departamento de Economia da UFPB e pesquisador do Progeb – Projeto globalização e crise na economia brasileira

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quinta-feira, 18 de março de 2010

A Globalização e a Recuperação da Economia Brasileira

Semana de 08 a 14 de fevereiro de 2010

A globalização vem se desenvolvendo ao longo dos tempos através das várias expansões do comércio internacional e de suas seguidas transformações. Grosseiramente, poderíamos defini-la como uma progressiva integração das esferas de produção, distribuição e consumo dos países do globo. O que preocupa em momentos de crise, entretanto, é que esta união, assim como o matrimônio, é válida na alegria e na tristeza, na saúde e na doença, e todos sabem disto.
Não foi sem razão que o “espectro do nervosismo” rondou a Europa esta semana e espalhou-se pelo resto do mundo, refletindo-se nas bolsas de valores. A ansiedade dos especuladores, que tinha como fonte a situação da dívida pública grega, só diminuiu após o anúncio, nesta quinta-feira, de que, caso o país precisasse, seria socorrido pelos seus parceiros de bloco econômico. Embora tais especuladores não saibam ao certo o porquê, sua preocupação realmente tem fundamento.
A função do dinheiro como Meio de Pagamento consiste em viabilizar o ciclo das mercadorias apenas por intermédio de dinheiro ideal, ou seja, sem a presença física do dinheiro. Durante a crise, esta função do dinheiro foi demasiadamente utilizada na tentativa de minimizar a destruição de capitais e trazer rapidamente de volta o crescimento econômico mundial. O fato que não é do conhecimento da maioria dos “policy-makers” (elaboradores de políticas econômicas) é que a recuperação econômica não depende de suas vontades, mas sim das “vontades” do Modo de Produção Capitalista.
Assim como esta função do dinheiro pode servir para “driblar” momentos ruins, ela também é uma das formas de manifestação das crises. Diante disto, se a destruição de capitais não se completou devido a sua utilização, em virtude dela, a crise voltará. E, ao que tudo indica, é o que está para acontecer.
Não só a Grécia, mas também Portugal, Irlanda e Espanha estão com as contas públicas em situação de risco. A semelhança da situação de tais países foi reconhecida pelos agentes econômicos através da criação da sigla Pigs para fazer referência a eles. Juntos, os Pigs têm uma dívida com bancos europeus que atinge a cifra de US$2 trilhões. Só a Grécia possui US$330 bilhões desta dívida. Assim, caso o país decretasse moratória, deixando de honrar com seus compromissos, esta situação crítica facilmente espalhar-se-ia pelo bloco europeu via sistema financeiro.
A tão glorificada economia chinesa não deixa por menos. Segundo o advogado especialista em falências Niel McDonald, já há “trilhões e trilhões de yuans em empréstimos de difícil recuperação na China, e ninguém está fazendo nada a esse respeito”. Em virtude deste acúmulo de “créditos podres” no país, o advogado não hesitou em afirmar: “Em algum momento deverá haver algum ajuste de contas para isso”.
Mas, isto não é tudo. A situação pode ainda tomar proporções maiores do que se imagina. Isto porque, segundo a consultoria McKinsey, a dívida das dez economias mais desenvolvidas do mundo aumentou 60% desde 2000 e hoje alcança a casa dos 40 trilhões. O fato é que este montante representa 330% do PIB destes países, ou seja, é cerca de três vezes maior do que a riqueza que eles produzem.
Neste caso, portanto, não só é possível, como também é bastante provável que as barreiras que impedem o consumo, conteúdo das Crises Cíclicas de Superprodução, se manifestem através de outra forma e tragam de volta o cenário de crise econômica. Resta-nos saber, contudo, se veremos apenas o desenrolar de uma crise complementar ou de uma catástrofe.
No Brasil, a situação é bem diferente da européia. Em janeiro deste ano, na comparação com janeiro de 2009, a inadimplência da economia caiu 3,14% e houve um aumento de 3,12% nos pedidos de cancelamento de registros no Serviço de Proteção ao Crédito (SPC). Em virtude disto, constatou-se, no mesmo período, um aumento de 7,11% nas vendas a prazo no varejo. Devido a estes e outros estímulos, ocorreu um aumento de 0,54% no emprego na comparação do mês passado a dezembro de 2009. Este aumento representa uma criação de 12 mil postos de trabalho. Por sua vez, o Nível de Utilização da Capacidade Instalada do mês de dezembro, que subiu, de 81,3% em novembro, para 81,7%, já apontava nesta direção.
Todavia, embora se verifique claramente o surgimento das condições para a retomada do crescimento na economia brasileira, esta situação pode ser revertida. Por melhor que esteja a situação da nossa economia frente ao resto do mundo, caso um novo mergulho seja deflagrado pela Grécia, a situação de crise espalhar-se-á não só pela União Européia. Em um segundo momento, ela irá espalhar-se por todo o mundo. A globalização não só é válida para países que integram um mesmo bloco econômico, mas também para as demais economias do globo, pois todas elas estão, de algum modo, ligadas economicamente.
Portanto, em virtude das contradições geradas pelo fenômeno globalização, somos obrigados a anunciar que a recuperação da economia brasileira, se não for revertida, será, pelo menos, deformada pela presença de taxas de crescimento menores que o esperado. E isto ocorrerá com qualquer economia que esteja integrada ao movimento cíclico mundial do capitalismo, pois é assim que são as tão faladas Crises Cíclicas de Superprodução.

Texto escrito por:
Antonio Carneiro de Almeida Júnior: Economista, Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Econômico da UFPR, PPGDE/UFPR, e pesquisador do PROGEB - Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira.

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Varre, varre vassourinha... As conseqüências da crise

Semana de 01 a 07 de fevereiro de 2010

Caro leitor, o carnaval passou. As festividades desta época contagiam todos os foliões em todas as partes do Brasil. Marchinhas de frevo e samba são entoadas pelos quatro cantos. Trios elétricos arrastam multidões embriagadas de felicidade. Todos os anos surgem hits que fazem o maior sucesso nos blocos carnavalescos. Por que este ano seria diferente?
No ano passado as rodas de choro cantavam tsunamis e marolas. Hoje se exalta o swing e o balacobaco brasileiro. Isto porque, segundo a notícia reportada em 01/02/10 no jornal Valor Econômico, "o país transformou-se em exemplo de sucesso, não só no desempenho econômico, como na regulação bancária, no uso de combustíveis renováveis, na conciliação de crescimento com distribuição de renda e até na aplicação de regras de proteção à saúde e ao ambiente dentro da OMC". Este reconhecimento foi feito no Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça.
Porém este canto pode desafinar e destoar das inspirações reais.
Em análises passadas já vimos que alguns números soam tão bem aos ouvidos que são declamados o tempo todo como se fossem um refrão. Tanto que, diante da expectativa de crescimento para 2010, o Comitê de Política Monetária do Banco Central sinalizou, na última ata, que começará um ciclo de arrocho monetário, o qual pode ter início com um aumento da Selic, já na próxima reunião do dia 17 de março. No entendimento do Copom há uma pressão da demanda doméstica sobre o mercado de fatores, o que aumentaria a pressão inflacionária.
Mas nem todas as estrofes de uma música são refrãos. Existem aquelas que são apenas balbuciadas, como se os cantores não soubessem da letra. Mas quem cantaria sobre a expectativa de esfriamento da economia, após o fim da redução do IPI? Os versos se tornariam lamúrias, já que as indústrias de bens de consumo duráveis e da construção civil são diretamente beneficiadas pela política fiscal. Elas estimulam outros setores, como, por exemplo, o do aço, o têxtil e o calçadista, os quais prevêem uma aceleração, no começo de 2010, estimulada pela demanda interna. Outro reflexo do estímulo fiscal é visto na elevação de 18%, do consumo interno de máquinas (somatório das vendas das máquinas nacionais e importadas), do 3°, para o 4° trimestre de 2009. A incidência dos benefícios governamentais (redução do IPI, PAC, bolsa celular, etc.) é, justamente, sobre os setores mais afetados pela crise, em termos de fechamento de postos de trabalho. Só no setor de materiais elétricos e de equipamentos de comunicação foram fechados 11,7 mil postos.
Como numa apuração do desfile das escolas de samba, a economia apresenta números referentes ao desempenho de cada ala. Para o crescimento da produção industrial brasileira, em 2009 (comparado com 2008), temos as seguintes cifras: bens de capital -17,4%; bens intermediários -8,8%; bens de consumo - 2,7%; bens de consumo duráveis -6,4%; semi e não-duráveis -1,6%; insumos para a construção civil - 6,7%; indústria extrativa -8,8%; e indústria de transformação -7,3%. Tudo isso gera um saldo de redução
da produção industrial total de 7,4%.
Indicadores da produção industrial por categorias de uso - Brasil - dez. 09(*)

(*) Para melhor visualização do gráfico clique sobre a imagem

Indicadores da produção industrial por categorias de uso
Índice trimestral (Base: igual trimestre do ano anterior)(*)
(*) Para melhor visualização do gráfico clique sobre a imagem

No mundo, outros temas poderiam se tornar versos tristes, como a cifra de 4,6 milhões de pessoas que estão recebendo o seguro-desemprego, nos Estados Unidos. Ou os 4,048 milhões de trabalhadores da ativa que estão desempregados na Espanha, perfazendo um total de 18,83% da população economicamente ativa. E o que dizer da Rússia, que teve uma retração de 7,9% do PIB, diante da retração de 8,1%, no consumo e 18,2%, nos investimentos?
Existem ainda aquelas canções que são tão repetitivas que se tornam ladainhas (típicas do compositor Meirelles), como é o caso das fusões, formação de trustes e cartéis e a oligopolização da economia, ao longo do desenvolvimento do capitalismo. Isto se dá de forma mais intensa nos períodos em que o ciclo econômico atinge as fases de crise e depressão (fundo do poço). Nestes períodos, as empresas estão mais fragilizadas e vulneráveis à falência. Por este meio os capitais individuais mais poderosos se fortalecem. No início da reanimação este fenômeno também ocorre como forma de reestruturação do capital nos diversos setores da economia.
É o atual caso do Brasil, por exemplo. Assistimos a Companhia Siderúrgica Nacional pretendendo tornar-se sócia majoritária da CIMPOR (cimenteira portuguesa), numa transação que pode chegar a € 3,86 bilhões. A WEG, em processo de expansão, por sua vez, irá contratar até 600 dos 1.138 funcionários despedidos pelo plano de demissão voluntária (PDV) da empresa de ônibus Busscar. A união da Shell e da Cosan vai criar uma empresa com 29,2% do mercado brasileiro de distribuição de etanol. Sem falar no caso da Brasken, que iniciou um processo de internacionalização, apoiado pelo governo (através da Petrobrás e do BNDES).
Enquanto isso, as empresas mais fracas caminham para a falência. Entre 2008 e 2009, o Serasa registrou um crescimento de 18,8% na inadimplência das empresas.
Na Europa, a Unilever, a segunda maior empresa de bens de consumo do planeta, é investigada por órgãos antitruste, na Bélgica, República Tcheca, Alemanha, Holanda, França, e Itália. No ano de 2008, ela já foi multada em € 37 milhões, na Alemanha, por fixação conjunta de preços de alguns produtos. Outra gigante que chama a atenção no momento é a Wal-Mart, que demonstra interesse em adquirir operações do Carrefour, aqui no Brasil.
Mas, como o carnaval só dura alguns dias, deixemos esta cantiga de lado. Continuemos nossa tarefa de prosear sobre as diversas faces e fases do modo de produção capitalista, expondo aquilo que por algum motivo se quer esconder e fazer calar.

Texto escrito por:
Lucas Milanez de Lima Almeida: Professor Substituto do Departamento de Economia da UFPB, Mestrando em Economia pelo CME-UFPB e membro do Progeb.

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quinta-feira, 11 de março de 2010

Economia planetária na rampa de lançamento

Semana de 25 a 31 de Janeiro de 2010

O acontecimento mais marcante da semana em análise foi o Fórum de Davos, que, ao completar 40 anos, procurou disfarçar a sua postura liberal ortodoxa. A nova postura de Davos é decorrência da preocupação com a necessidade de fortalecer a “governança global”, criando um modelo de gestão dos riscos sistêmicos de efeitos generalizados sobre todos os países. O fórum tenta apontar ao mundo as saídas para a crise, que, segundo os dados e a opinião dos especialistas, se encontra numa fase ainda preocupante e muito distante da estabilidade.
Com uma unanimidade nunca vista desde a Conferência de Bretton Woods (1944), duas grandes novidades se destacaram lá: a identificação do sistema financeiro mundial como o vilão da “odisséia” econômica contemporânea e o reconhecimento inequívoco de que os países emergentes passaram, de Estados susceptíveis a colapsos, a países que poderão salvar o mundo.
Com relação à primeira, as lideranças do mundo concluíram em conjunto que é necessário reforçar o sistema financeiro global. Quanto à segunda, serve de exemplo a declaração do presidente do Deutsche Bank, Joseph Ackermann: "Não subestimem os emergentes! Pois lá vivenciaremos um intenso desenvolvimento, que muito ajudará aos países industrializados".
As mesmas preocupações manifestaram-se nos pronunciamentos das instituições financeiras internacionais.
O Fundo Monetário Internacional (FMI), por exemplo, acredita que serão os países emergentes que tirarão o mundo da crise. Com efeito, o FMI prevê que, em 2010, a China crescerá 10%, a Índia, 8%,  quanto a Alemanha ficará abaixo dos 2%. É de salientar que se espera um crescimento de até dois terços do fluxo de capital privado para os mercados emergentes, principalmente para o Brasil e a  China. Segundo informação do Instituto Internacional de Finanças (IIF), associação que reúne os maiores bancos do mundo, estes dois países se encontram na dianteira da recuperação global. A perspectiva do IIF é de que, nesse ano, a entrada de capitais estrangeiros nos mercados emergentes atinja US$ 722 bilhões, valor muito superior, conforme dito anteriormente, aos US$ 435 bilhões estimados para o ano de 2009. Na análise do IIF, após um recuo de 2,5% em 2009, a economia global deverá crescer 3,2% em 2010, sendo que as economias maduras devem avançar até 2,4%, enquanto os mercados emergentes crescerão 6,1%.
Peter Sands, um dos principais executivos do banco britânico Standard Chartered Bank, afirmou que “essa crise econômica pôde rapidamente deslocar o poder econômico no mundo (...) do Ocidente para o Oriente". Segundo ele, o poder econômico afasta-se dos que "consomem e se endividam, para se aproximar daqueles que poupam e produzem". Ele se referia diretamente à mudança da liderança, dos endividados EUA, para a Índia e a China.
Outra questão em destaque foi a vantagem que o intervencionismo, momentaneamente, vem obtendo contra o “liberalismo.
Nesta semana, o Presidente do Conselho de Estabilidade Financeira, Mario Draghi, anunciou a existência de reguladores globais que estão trabalhando em favor de propostas para a criação de uma agência central, para gerir as falências de bancos. Ele revelou que as autoridades estão avaliando ideias sobre uma sobretaxação de capital ou de capital especulativo, para instituições consideradas grandes demais para entrarem em colapso. O ministro de Finanças da Grã-Bretanha, Alistair Darling, disse à Reuters: "Primeiramente concordamos que o que quer que façamos precisa ser universal". Já o banco Central da China estabeleceu como meta assegurar que o crescimento de empréstimos não superaqueça a economia, como disse à Reuters o seu vice-presidente, Zhu Min: "Estamos muito cuidadosos ao gerir o crescimento dos empréstimos neste ano para reduzir o ritmo do avanço do crédito e garantir que o investimento esteja num nível equilibrado a ponto de evitar um super aquecimento (...) Guiaremos (não queremos utilizar a palavra controle, porque eles, os bancos, são entidades comerciais) o mercado e gostaríamos de ver um crescimento suave do crédito e da economia".
De uma maneira generalizada, os bancos centrais discordam sobre como agir depois da crise. As principais divergência encontram-se na escolha do momento para aumentar o juro e em quanto elevá-lo. Além disso, os políticos, principalmente europeus, temem que os gastos governamentais, aliados ao dinheiro fácil que os bancos centrais injetaram no sistema bancário, principalmente o de taxas de juros próximas de zero, entre outros, possam criar as condições para uma nova crise.
Enquanto estas questões são debatidas, a perspectiva da maioria das opiniões é de que a recuperação da economia mundial, ainda esse ano, deverá acontecer de forma irregular e multifacetada, a custa do abandono da prática ditada pela ortodoxia liberal e mantendo elevadas a taxa de desemprego e a inflação.
As notícias confirmam estas opiniões.
Nos Estados Unidos, a atenção volta-se para a política econômica do Governo, com Obama tentando cortar gastos e agradar os eleitores ao mesmo tempo. No dia 28, ele fez um discurso sobre o estado da união perante o Congresso, onde, no Orçamento para 2011, apresentou a diminuição das despesas do governo. Paul Krugman, personagem que aglutina os liberais insatisfeitos com o atual presidente norte-americano, considerou que isso equivalia a uma traição aos objetivos pelos quais os seguidores de Obama estiveram a trabalhar. Os dados, de 2009 da economia estadunidense, por sua vez, não melhoram o quadro geral. O deficit público esse ano deverá atingir 9,2% do PIB, a dívida pública deve subir para 67% do PIB e o pagamento de juros vai disparar para 3,2% do PIB. Obama pretende um congelamento de gastos que afetará todos os gastos discricionários das agências federais, excluindo defesa, assuntos internacionais, segurança interna e veteranos de guerra. Espera-se que, com essa medida, seja gerada uma economia de US$ 250 bilhões nos próximos dez anos. Ao mesmo tempo, o presidente americano anuncia um pacote para ajudar a classe média. No pacote, estão: a duplicação de incentivo fiscal de assistência a crianças de famílias com renda inferior a US$ 85 mil ao ano, um aumento de fundos federais para programas de atendimento infantil, um programa que limita os financiamentos de estudantes em 10% da renda acima da “renda básica de subsistência” e incentivos às famílias que cuidam de parentes idosos e aos trabalhadores que fazem poupanças para aposentadoria autônoma.
Nesse contexto, Ben Bernanke foi reconduzido, com apoio do Senado dos EUA, para o seu segundo mandato a frente do Federal Reserve – FED. A aprovação na votação do senado foi obtida com 70 votos contra 30. O democrata Sheldon Whitehouse comentou: “Se você é juiz do jogo de nossa recuperação, parece que o placar pode ser resumido na frase: Bancos venceram”.
Na Rússia, no quarto trimestre de 2009, dos US$ 42 bilhões de capitais privados previstos pelo Banco Central para entrarem no país, ingressaram apenas US$11,6 bilhões. No entanto, no terceiro trimestre, saíram US$ 33,4 bilhões. Em 2009, o PIB contraiu-se 8,5% em relação ao ano anterior, mas nos últimos dois trimestres consecutivos a economia vem se expandindo e estima-se, para este ano, um crescimento de, pelo menos, 3%. Nos bancos, a carteira de empréstimos considerados irrecuperáveis continua elevada, atingindo 20% para todo o setor. Contudo, o anúncio do governo de um deficit orçamentário de 5,9% foi bem inferior aos 7,7% que estavam projetados. Comenta-se que essa mudança, ou inflexão, deveu-se aos preços do petróleo.
Na China, o principal destaque da semana foi o corte de crédito bancário, que tem sido um dos motores do crescimento acelerado do país. Não se conhece, no entanto, a extensão dessa medida. O presidente da Comissão Reguladora do Setor Bancário disse na semana passada que o órgão espera que a soma dos novos empréstimos situar-se-á em torno de 7,5 trilhões de yuan neste ano. Comparados com os 9,59 trilhões de yuan em 2009, representam uma queda, mas, comparando-se com 2008, é mais do que o dobro.
No Brasil, o otimismo continua a prevalecer, empurrado pelas ações e propaganda do governo. Embora as receitas tenham aumentado em apenas 4,8%, as despesas primárias do governo federal cresceram 15%, em 2009, em valores nominais, a um ritmo mais acelerado do que no ano anterior. Diante do descompasso entre a arrecadação e as despesas, o superavit primário caiu substancialmente, se comparado a 2008, passando de R$ 71,438 bilhões para R$ 39,215 bilhões. Em percentagem do PIB caiu, de 2,38%, para 1,25%.
Tal como o Federal Reserve, FED, o Comitê de Política Monetária do Banco Central do Brasil, BCB, manteve, nesse caso por unanimidade, a taxa básica de juro, Selic, em 8,75% ao ano, pelo menos até 17 de março, quando ocorrerá uma nova reunião. Os especialistas, porém, acreditam que, no final de 2010, ela atingirá os 11,25%.
A dívida bruta do governo brasileiro geral, que inclui os débitos da União, dos Estados e dos municípios, atingiu 64,1% do PIB em novembro de 2009, registrando um aumento acumulado de 7,8%, se comparado ao ano anterior. Considera-se que esse crescimento acentuado foi causado pelo aumento das operações de crédito do Tesouro a bancos estatais. No ano passado, foram concedidos, ao BNDES, R$ 100 bilhões, e já estão comprometidos R$ 80 bilhões para esse ano.
Nessa mesma semana, publicaram-se alguns índices que nos permitem fazer uma avaliação, ainda que superficial, do que os agentes económicos esperam da economia do país. O Índice de Confiança do Empresário Industrial relativo a Janeiro atingiu os 68,7%, o maior resultado em toda a série histórica, que teve início em 1999. Os resultados que se situam acima dos 50% indicam otimismo. Se comparado com o resultado obtido em outubro de 2009, o índice cresceu 2,8% e acumula um crescimento de 21,3% pontos desde janeiro do ano passado. Por sua vez, o Índice de Confiança do Consumidor cresceu 0,6%, entre dezembro e janeiro, passando, de 112,3, para 113 pontos. O Indicador Serasa Experian de Atividade Econômica, diz-nos que a economia do país cresceu 4,5% em novembro do ano passado, se comparado com igual período de 2008. Nesse mesmo tempo, o mercado voltou a projetar uma taxa de inflação acima da meta para 2010, de acordo com o Boletim Focus do Banco Central.
Em síntese: a economia planetária, o Brasil incluído, está na rampa de lançamento, através de medidas intervencionistas tímidas. Afinal, nem tanto ao mar nem tanto a terra. A dúvida que fica é saber se o impulsionador vai funcionar na medida necessária.

Texto escrito por:
Elivan Rosas Ribeiro: Professora do Departamento de Economia da UFPB e Pesquisadora do PROGEB – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira.

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