segunda-feira, 26 de julho de 2010

É só aumentar os juros

Semana de 12 a 18 de julho de 2010





O que dizer da situação econômica do Brasil no presente momento? É difícil diagnosticar com precisão clínica o estado do paciente. Há muitas informações contraditórias nos resultados dos exames. Poderíamos dizer até que alguns dados sugerem a necessidade de um eletrocardiograma e talvez uma intervenção cirúrgica.

Para os economistas "oficiais", o Brasil viaja de vento em popa. Tão bem, que já está passando do ponto. Isto aconteceu no 1° trimestre de 2010, quando o país cresceu mais de 9% em relação ao mesmo período do ano passado. Mas, o país não pode agüentar este ritmo, dizem eles. Segundo o Banco Central (BC), podemos crescer no máximo 5%. Por que não pode?! Porque este é o crescimento delimitado pelo PIB potencial. E o que é o PIB potencial?! É uma estimativa não observável do que a economia pode produzir. E o que isso quer dizer?! Quer dizer que a variável não pode ser calculada por meio de pesquisas (como o índice de preços e o desemprego). E como é que o BC calcula?! Em essência, o conceito baseia-se no que a utilização das máquinas, equipamentos, edificações, matérias primas, etc. (que alguns economistas chamam, de forma imprecisa, de capital) e da força de trabalho disponíveis, ou seja, no que o potencial das forças produtivas em ação pode gerar como produto, sem que haja pressão inflacionária advinda da demanda. No entanto, com base nos avanços dos métodos estatísticos, esta variável passou a ser calculada a partir de uma análise da produção passada. Então, o PIB potencial é uma projeção para o crescimento, calculada através de uma média móvel ponderada de três séries: taxa de emprego, taxa de utilização da capacidade da indústria e taxa de crescimento do PIB. A diferença entre o PIB alcançado efetivamente pelo país e o PIB potencial é chamada de "hiato do produto". Isto quer dizer que, dado o valor do PIB potencial, quanto maior for o valor do PIB efetivo, maior será a pressão sobre os preços.

Assim, os gestores da política econômica, baseada no tripé metas de inflação, superávit primário e câmbio flutuante, travarão uma luta feroz para cumprir seu receituário. Na última reunião do Copom, o BC aumentou, em 0,75%, a taxa Selic, como forma de controlar o possível hiato do produto, e ainda há sinais de nova elevação da Selic, embora mais amena. Com isto, o governo opta por travar o crescimento da demanda ao invés de expandir a capacidade da oferta, conforme mostram os números que seguem.

Neste ano, comparando mês a mês, a produção industrial, após elevar-se 1,2%, 1,4% e 3,4% em janeiro, fevereiro e março, respectivamente, apresentou um decrescimento de 0,8% em abril e nenhum crescimento em maio. A produção de veículos, por exemplo, subiu 2,1% em maio e caiu 2,9% em junho desse ano, tendo suas vendas caído 10,2% e 2,4% nos respectivos meses. Já o consumo de energia elétrica decresceu 2,1% em maio. Além disso, as vendas no varejo diminuíram 3,2% em abril e cresceram, graças a Copa do Mundo, 1,4% e apenas 0,1% em maio e junho, respectivamente. A venda de papelão ondulado, outro forte indicador de conjuntura, pois é um dos materiais mais utilizados como embalagem pela indústria, apresentou grande oscilação no 1° semestre deste ano. Mês a mês, os números de janeiro a junho foram respectivamente: -1,9%, 1,4%, 2,8%, -2,7%, 5,5% e -2,1%. Por sua vez, a venda de aço, no segundo trimestre de 2010, não se alterou, quando comparado com o primeiro trimestre do ano. Na criação de empregos com carteira assinada, o país bateu o recorde semestral, que era de 2008, quando atingiu o número de 1,47 milhões de vagas criadas. Mas os números mensais também merecem destaque. Durante os cinco primeiros meses do ano, o país bateu os respectivos recordes mensais de geração de emprego, mesmo com a tendência constante de desaceleração a partir de abril (305 mil vagas). Em maio, foram criados 298,04 mil vagas e junho, que não bateu o recorde do mesmo mês de 2008 (309,44 mil), ficou com 212,9 mil.

Tudo isso embasa a tese de que a economia está se "acomodando". O índice da atividade econômica do BC registrou um crescimento de 11,11% em março, 10,83% em abril e 9,39% em maio, na comparação com os mesmos meses de 2009.

Mas quem estiver preocupado com o futuro do país, nada tem a temer. Os prováveis partidos vencedores das eleições de 2010 (PT ou PSDB) e até o improvável (PV) já manifestaram seu apoio, em maior ou menos escala, ao atual tripé: metas de inflação, superávit primário e câmbio flutuante. Contudo, como viver com uma política econômica que, ao ver o amanhã melhor do que o ontem, impede o hoje de acontecer? Se o amanhã deve ser igual à ontem, não façamos nada hoje. É só aumentar os juros...



Texto escrito por:


Lucas Milanez de Lima Almeida: Professor Substituto do Departamento de Economia da UFPB, Mestrando em Economia pelo CME-UFPB e membro do Progeb. (Email: progeb@ccsa.ufpb.br)





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domingo, 18 de julho de 2010

Se a canoa não virar...

Semana de 5 a 11 de julho de 2010





As empresas líderes dos Estados Unidos estão cada vez mais temerosas de que o país sofra um “duplo-mergulho”, devido aos cortes do governo nas despesas públicas, à crise da dívida na União Européia e à desaceleração da economia chinesa. O leitor pode indagar: mas o que seria esse “duplo mergulho”? De acordo com Robert Hall, presidente do Birô Nacional de Pesquisa Econômica, comissão encarregada de declarar oficialmente o início e o fim das recessões, um duplo mergulho consistiria em uma recessão contínua pontuada por um período de crescimento, seguido de um desaquecimento ainda maior da economia.

Os sinais emitidos pela economia dos Estados Unidos parecem corroborar com a ideia de que a crise econômica, iniciada em 2008 com a quebra do banco Lehman Brothers, está longe de ter acabado. A lenta recuperação da economia americana parece ser apenas um surto temporário. O consumo privado e as exportações têm sido fracas, e nenhum deles está ganhando força. Segundo David Semmens, economista do Standard Chartered Bank, “os gastos dos consumidores continuarão contraídos por causa da lenta recuperação do mercado de trabalho e a reduzida oferta de crédito”. Além disso, a queda nos preços do aço, ocasionada por fraca demanda doméstica e internacional, fez com que as siderúrgicas cortassem a produção. Tanto a européia ArcelorMittal, maior siderúrgica do mundo, já adotou tal medida nas usinas do estado de Indiana, quanto a siderúrgica russa Severstal, que possui várias usinas nos Estados Unidos, pretende fazê-lo na sua unidade no estado de Maryland.

Em seu informe mensal, a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico, OCDE, apontou que o crescimento das economias desenvolvidas caiu pelo décimo mês consecutivo. Segundo ela, a expansão atingiu o seu ponto máximo na Índia, China, Itália e França. A instituição ainda afirmou que também há sinais de que a expansão chegou ao ponto máximo no Brasil, Inglaterra e Canadá. "Picos no ciclo de crescimento emergiram na França, Itália, China e Índia e sinais de picos estão emergindo no Canadá, Reino Unido e Brasil", afirmou a OCDE em seu relatório mensal.

Na China, a adoção de uma política monetária mais rigorosa, aliada à fraca recuperação mundial, começa a ser sentida na economia. O índice dos gerentes de compras do HSBC para o país revela que a produção em geral estancou, tendo a produção industrial começando a cair. Como reflexo destes fatos, o banco de investimento Goldman Sachs reduziu sua projeção para o crescimento da economia chinesa neste ano, de 11,4%, para 10,1%, acompanhando, assim, o BNP Paribas, a Marcquaire Securities e o China International Capital que também já o fizeram. “O crescimento da China tem desacelerado significativamente, e as medidas de aperto que vimos em abril sobre o mercado de imóveis foram bastante agressivas”, disse Isaac Meng, economista do BNP Paribas em Pequim.

A lenta recuperação da economia mundial pode sofrer novos impactos negativos advindos dos ajustes fiscais implementados nos países ricos. O Instituto Internacional de Finanças (IIF), entidade que representa os maiores bancos do mundo, aponta que os ajustes fiscais nos países ricos devem reduzir em 1,25 pontos percentuais o crescimento econômico mundial em 2011. A entidade teme que o aperto fiscal provoque uma nova recessão global, e mostre que a recente recuperação econômica é muito mais uma aparência do que uma recuperação real das economias ricas. Na Zona do Euro, estas medidas devem exacerbar o já forte desemprego, o que ocasionaria o aumento das tensões sociais. Além disso, a IIF aponta que a fase de aceleração de crescimento nas economias emergentes, incluindo o Brasil, é dada como terminada. Esta avaliação aponta na mesma direção da análise feita pela OCDE, a qual nos referimos anteriormente.

O bater de asas de uma borboleta em Tóquio pode provocar um furacão em Nova Iorque: esta é uma das ideias centrais da Teoria do Caos. Em um mundo globalizado e permeado por forte incerteza, há algo parecido: qualquer pequeno distúrbio em uma das economias desenvolvidas pode ter sérias conseqüências para a deflagração de uma nova recessão mundial.



Texto escrito por:

Kaio Glauber Vital da Costa: Economista, pesquisador do Progeb-Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira.


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sexta-feira, 9 de julho de 2010

Os Paradoxos da Recuperação

Semana de 28 de junho a 04 de julho de 2010





As notícias sobre o nível de atividade econômica mundial continuam tomando conta da maioria dos jornais. O assunto, de tanto ser repetido, já se tornou comum e muitas vezes cansativo para os leitores. Infelizmente, abordá-lo-emos mais uma vez neste artigo, por se tratar de um processo lento e conturbado, que se encontra em plena evolução seguindo direções incertas e caminhos tortuosos. Com efeito, alguns fatos parecem apontar para a reanimação da economia mundial, criando entusiasmo nos mais otimistas. Outros continuam a indicar o aprofundamento, ou pelo menos o prolongamento da crise econômica. Em mais uma semana, as notícias mostraram exatamente isto, com as montadoras de automóveis dos Estados Unidos aumentando a produção, mas, no México. Durante a crise, o governo Obama gastou mais de US$ 80 bilhões para sustentar e salvar a GM e a Chrysler. Uma vez estabilizadas, elas projetam um aumento da produção de carros, no entanto, alegando a necessidade de redução dos custos de produção, estes recursos foram transferidos para investimentos no país vizinho.

Os números da economia dos Estados Unidos, por outro lado, também sugerem uma perda de fôlego na recuperação. Os pedidos de seguro desemprego aumentaram em 13 mil, contrariando as expectativas que eram de queda desse indicador. A geração de postos de trabalho no país também frustrou as expectativas. Em junho, foram criados apenas 13 mil empregos, número muito abaixo do esperado, que era de 60 mil.

A Europa continua passando por um período de elevada instabilidade. Na Grécia, está sendo estudado um congelamento nos salários do setor privado por três anos. Com isso, o clima de insatisfação e descontentamento continua se refletindo em grandes protestos e manifestações de trabalhadores.

Na Alemanha, a taxa de desemprego caiu de 7,7% em maio, para 7,5% em junho, refletindo um moderado crescimento de sua economia. Já a Irlanda, por sua vez, anunciou “oficialmente” a saída da recessão no primeiro trimestre de 2010, quando a economia do país cresceu 2,7% em relação ao trimestre anterior. Esta foi a primeira vez que a economia do país apresentou crescimento, depois de dois anos de contração. A evolução destes dados, entretanto, não é suficiente para permitir a retomada da economia desses países, indicando apenas um intervalo no período de instabilidade, que ainda não terminou.

Até mesmo a China apresentou uma desaceleração em sua atividade industrial, puxando para baixo o mercado asiático. O índice de gerentes de compra da indústria chinesa caiu de 52,7 pontos em maio, para 50,4 em junho. Os analistas de mercado estão preocupados ainda com um possível estouro da bolha imobiliária chinesa, o que poderia desencadear fortes efeitos negativos sobre toda a economia. A agência nacional de estatísticas da China informou que a desaceleração do índice oficial reflete a política monetária mais dura do governo

No Brasil, o aquecimento do mercado vem levando algumas empresas a contratação de novos trabalhadores. A fábrica da Ford, em São Bernardo do Campo, anunciou a instalação de uma nova linha de motores, dobrou a capacidade de produção e, além disso, contratou 200 trabalhadores horistas, cuja jornada de trabalho varia de acordo com a produção.

O desenrolar do processo de recuperação, portanto, continua marcado pela instabilidade e pela incerteza, e a sucessão dos fatos apresenta um histórico recente de paradoxos grandes o suficiente para levar os mais otimistas a projetarem um breve retorno do crescimento da economia mundial, enquanto, do outro lado, os mais pessimistas formulam previsões de um cenário de aprofundamento da recessão, com a turbulência nos países europeus.

O fato é que esse episódio do ciclo econômico atual ainda está longe de acabar, prometendo revelar novos fatos paradoxais.



Texto escrito por:



Diego Mendes Lyra: Mestrando em economia, Professor Substituto do Departamento de Economia da UFPB e pesquisador do Progeb – Projeto globalização e crise na economia brasileira.



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terça-feira, 6 de julho de 2010

As Formas de Manifestação das Contradições Internas do Capitalismo

Semana de 21 a 27 de junho de 2010


Os agentes econômicos continuam preocupados com a trajetória da economia mundial, visto que a situação na Europa permanece tensa. Uma compilação feita pelo Royal Bank of Scotland aponta que os empréstimos fornecidos pelo Banco Central Europeu cresceram € 332 bilhões desde junho de 2008. O que chama atenção é que 68% deste aumento, ou seja, € 225 bilhões, consiste em empréstimos a bancos da Grécia, Portugal, Irlanda e Espanha. Diante deste cenário, a preocupação com a austeridade fiscal fez o rendimento dos títulos gregos com prazo de 10 anos subir mais de um ponto percentual nesta semana, atingindo 10,42%. Os rendimentos dos títulos de Portugal e Espanha, por sua vez, subiram para 5,70% e 4,5% respectivamente, estando, este último, meio ponto percentual acima do patamar alcançado durante a turbulência financeira ocorrida em 10 de maio passado.
Nos Estados Unidos, a venda de imóveis usados, também em maio, caiu 2,2% em relação a abril, mesmo com os analistas esperando um aumento de 6%. Desempenho consideravelmente pior foi constatado nas vendas de imóveis novos, que caíram 33% no mesmo período, quando os analistas esperavam uma queda de 20%. Sabendo que os incentivos estatais para compra de imóveis duraram até abril, a magnitude da queda nas vendas aponta para o fato de que a destruição de capitais neste setor apenas foi adiada pelo governo norte-americano.
Um problema que passa despercebido, entretanto, é que esta situação da economia mundial serve de justificativa ao aumento da exploração da força de trabalho. Um indicador econômico que se presta muito bem à mistificação deste fenômeno é a produtividade do trabalho, visto que é comumente calculado apenas dividindo o que foi produzido pelo número de trabalhadores ativos. Mas, os entusiastas deste indicador, maliciosamente, nunca consideram o ritmo de trabalho ou a quantidade de horas trabalhadas por cada trabalhador, o que permitiria diferenciar aumento de produtividade e aumento de intensidade do trabalho.
Na economia brasileira, por exemplo, nos 12 meses encerrados em abril deste ano, a indústria teve um aumento de 4,2% no que se chama de produtividade. A credibilidade desta estatística, todavia, é colocada em xeque quando se analisa a evolução dos índices de horas trabalhadas e pessoal ocupado na indústria durante o mesmo período. Segundo pesquisas do IBGE e da CNI, enquanto o primeiro evoluiu, de 97,5, para 105,6 (com um pico que atinge 109,8 em março), o segundo (tendo o último valor como pico) passou de 99,46 para apenas 102,78. Claramente se observa, portanto, que o chamado aumento de produtividade, na verdade, esconde uma jornada de trabalho cada vez mais árdua para os trabalhadores. Para piorar a situação, a resposta dos trabalhadores via organização sindical conseguiu aumentos reais de salário de apenas 1,9% neste período. Se tal cenário se desenha em um dos países em melhor situação frente à crise, imagina-se como deve estar a situação do resto do mundo.
Na China, o aumento da dominação das relações capitalistas na economia, que têm como efeito colateral o aumento da organização da classe operária, tem gerado uma série de greves. A maior operação da Toyota, depois de três dias de paralisação, só foi reaberta na segunda-feira, dia 21, após acordo com trabalhadores de uma fabricante de autopeças. Entretanto, no dia seguinte, a companhia foi novamente forçada a fechar duas linhas de montagem em virtude de novas greves nos seus fornecedores. Já a Honda, devido às greves dos seus trabalhadores, foi obrigada a aumentar os salários em até 24%. Após este reajuste, o salário anual do trabalhador chinês passou à faixa que varia entre US$ 4.500 e US$ 5.500, quase o dobro do salário médio de um operário indiano e 33% maior que o de um operário tailandês. Assim, os mesmos fatores que levaram várias companhias a migrarem para a China farão com que estas migrem para outros países. Resta-nos saber o que acontecerá quando não houverem mais trabalhadores desorganizados em países de terceiro mundo que se submetam aos altos níveis de exploração que têm sido praticados.
Vemos, portanto, que a ocorrência no cenário da economia mundial, de acontecimentos como tensão nos mercados financeiros, destruição de capitais e conflitos de classe, permite claramente a observação das formas de manifestação das contradições internas do Modo de Produção Capitalista na atualidade.


Texto escrito por:

Antonio Carneiro de Almeida Júnior: Economista, Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Econômico da UFPR, PPGDE/UFPR, e pesquisador do PROGEB - Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira.
Email: progeb@ccsa.ufpb.br
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