sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Como as macroprudenciais definiram o W

Semana de 20 a 26 de dezembro

O ano velho chega ao fim e o nascimento da criança 2011 se aproxima. Vivemos o repetitivo e alegre ritual e, aderindo a ele, não podemos deixar de desejar aos nossos leitores as maiores felicidades.

No entanto, a frieza do rigor científico com que fazemos nossas Análises de Conjuntura Econômica nos obriga a, desde já, avisar que esta criança que nasce não será tão pródiga quanto o velho que se finda. Mas, a passagem dos anos é um movimento cíclico, o que nos faz relembrar a questão alfabética que envolve os debates sobre o ciclo econômico. Agora podemos garantir que a saída da crise no Brasil já se configura como a conhecida saída em W, como vinhamos prevendo.

Tomando como indicador das diferentes fases do ciclo econômico o gráfico traçado com as taxas de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), a primeira perna descendente do W ocorreu durante o ano de 2009, quando esta taxa foi de -0,5%, ou seja, foi uma taxa de decrescimento que o cinismo dos economistas esconde sob o nome de “crescimento negativo”. Para o bom ano de 2010, o BC e o mercado estimam uma taxa em torno de 7,3%, ou seja, estamos na primeira perna ascendente do W. Neste momento, o próprio governo, com todo o seu otimismo, estima, para 2011, uma taxa de 4,5%. Desse modo vivemos um processo de desaceleração na economia, ou seja, estamos escorregando para baixo no escorrega da segunda perna descendente do W (mesmo tomando como base as otimistas estimativas do Ministro Mantega).

Identificado o fenômeno, a tarefa é entender as razões para esta configuração de ciclo econômico. Consideramos que a responsabilidade pela recuperação rápida da economia brasileira é da política anticíclica do governo. No entanto, o caráter eleitoreiro das medidas adotadas cobrará agora o seu preço e pagaremos o presente de Natal de 2010 com a desaceleração de 2011. O pior é que o fantasma meirelliano continua a rondar o BC brasileiro e, como se não bastasse o “porrete” macro prudencial do BC, nada fantasmagórico, no lombo do tão sofrido povo brasileiro, prepara-se, no mesmo BC, o aríete da elevação dos juros, programado para a próxima reunião do Copom em janeiro. Tudo com o pretexto de que a população está consumindo muito e a pressão da demanda, segundo a perversa lei da oferta e da procura, está provocando a inflação. Vejam bem o paradoxo que estamos vivendo. O governo Lula, para ganhar as eleições, distribuiu renda e elevou os salários e se vangloria de ter aumentado a capacidade de consumo dos pobres, reduzido a pobreza e aumentando os participantes das classes C e D. O forte do seu governo foi a política social. Agora, este ingrato povo, atacado por uma fúria compradora, vinga-se explodindo a demanda e provocando a inflação.

E tome BC neles! Declaradamente, todas as medidas adotadas, e por adotar, pretendem comprimir o consumo, em um ano em que já se esperava uma desaceleração da economia. O arrocho chegou como havíamos anunciado.

A perversa missão compete ao novo governo. Mas, como as eleições estão longe, de acordo com a teoria dos ciclos políticos, o povo tem memória curta e, começo de governo é hora de apertar. Quando as eleições se aproximarem, as medidas simpáticas retornarão. O problema é a permanência no poder. Os interesses da nação não são levados em conta. E para isto compram-se as pessoas e as consciências.

E cá estamos nós a bater no governo que ainda não tomou posse. Até parecemos anarquistas espanhóis. O problema é que não temos nenhum compromisso com qualquer partido político ou governo. Só temos compromisso com o país e com o povo.

Vejam, por exemplo, um derrotado ex-senador, agraciado com o prêmio de um ministério no novo governo. Na sua tese de doutorado defendida na Unicamp, mostrou que, durante os governos Lula, foi criado um “novo desenvolvimentismo”. Não conseguiu, porém, explicar o processo de desindustrialização em curso por não “acreditar” que ele exista. Mercadante, que subordina a sua pena de cientista aos interesses partidários, se escondeu atrás da ignorância como se as “questões da ciência” fossem questões de “crença”. Eis um caso explicável, mas... condenável.

Texto escrito por:

Nelson Rosas Ribeiro: Professor do departamento de Economia, Coordenador do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira progeb@ccsa.ufpb.br); (www.progeb.blogspot.com).


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sábado, 25 de dezembro de 2010

Entre as medidas macroprudenciais e o processo de desindustrialização

Semana de 13 a 19 de dezembro

Fim de ano, fim de mandado político no executivo. Trata-se de uma época de balanço sobre o que foi feito e o que virá. Notícias sobre diminuição do desemprego, aumento do consumo e do Produto Interno Bruto (PIB) evidenciam que o ano foi bom. Contudo, problemas e gargalos insistem em povoar este cenário de “paraíso”.

Aumentam as já famosas preocupações do governo com escalada da inflação. O Índice de Preços ao Consumidor Amplo, IPCA, no acumulado de onze meses, encontra-se em 5,25%, acima do centro da meta, 4,25%. Para dar resposta ao cenário de cautela, o Comitê de Política Monetária (Copom), em sua última ata, anunciou a adoção “medidas macroprudenciais”, ao invés de utilizar o aumento da taxa básica de juros, a Selic. Tais medidas, abrangidas pelo neologismo adotado, significaram o aumento dos depósitos compulsórios e a contenção da oferta de crédito. Segundo o Ministro da Fazenda, Guido Mantega, elas equivalem a um aumento de um ponto percentual na Selic.

Segundo a ata do Copom, os preços livres, como de alimentos e bebidas, foram os responsáveis por puxar o índice de inflação para cima. Diante deste fato e da teoria que sempre norteia as decisões da entidade, era de se esperar uma ação do gênero. Embora tenha tentado ludibriar a todos com um tipo diferente de política monetária contracionista, as conseqüências das medidas tomadas pela entidade pouco diferem das que são provocadas pelos aumentos da Selic levados a cabo através do gerenciamento diário de liquidez.

Não se sabe se as medidas apelidadas de macroprudenciais também terão macro resultados. A próxima reunião do Copom será entre os dias 18 e 19 de janeiro de 2011. Até lá, talvez saibamos se a expressão veio pra ficar, ou se será apenas mais uma formulação eloquente no repertório inventivo que caracterizou a era Lula.

Como vínhamos informando em análises passadas, é incerto o nível do crescimento da economia brasileira no próximo ano. Agora foi a vez da Confederação Nacional da Indústria (CNI) projetar desaceleração da economia para 2011. Logo, será complicado, para a nova gestão federal, manter, em 2011, o resultado do PIB de 2010, em torno de 7,6%, segundo estimativas do governo. Analistas da CNI estão prevendo que o PIB cresça 4,5% em 2011.

Um fato que deveria estar preocupando o governo e, no entanto, parece estar passando despercebido, é o fenômeno da desindustrialização, ao qual já nos referimos em análises anteriores. A indústria de transformação, por exemplo, vem, desde 2005, diminuindo sua participação no valor adicionado do país, enquanto a de outros segmentos, como o de serviços e de extração mineral, vem aumentando. Segundo dados do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI), na década de 1970, a participação deste setor era de 30%. Atualmente este número caiu para 24%.

Já demonstramos em análises anteriores o que está por trás de tal fenômeno. Isto fica mais visível ainda quando tomamos conhecimento do que ocorre atualmente com a balança comercial da indústria de transformação. Enquanto esta apresentava um superávit de US$30 bilhões, no ano corrente, de janeiro a setembro, o déficit chega a US$25,8 bilhões. Para Nelson Marconi, economista e professor da FGV-SP, “há um aumento muito forte de importação de componentes e de bens finais, o que afeta a produção local desses produtos”.

Desta forma, se o novo governo, assim como o anterior, planeja dar vida longa ao Saci Macroeconômico, apesar dos malefícios que esta política monetária traz ao país, nós brasileiros nos assemelharemos a policiais que perseguem um fugitivo invisível equipados com um carro sem motor! Mas, a despeito das péssimas notícias que trazemos, desejamos a todos um feliz natal e um próspero ano novo!

Texto escrito por:

Maria Carolina Costa Madeira: Analista do Ministério da Pesca e Aquicultura, mestre em economia pela UFPB e pesquisadora do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira.

Nelson Rosas Ribeiro: Professor do departamento de Economia, Coordenador do Progeb. (progeb@ccsa.ufpb.br); (www.progeb.blogspot.com).

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sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Trocar seis por meia dúzia

Semana de 06 a 12 de dezembro

O ambiente econômico internacional continua hostil apesar do derramamento de trilhões de dólares feito pelos bancos centrais em todo o mundo. Os dados continuam a surpreender. Em um relatório publicado pelo Banco Central dos EUA, o Federal Reserve Bank (Fed), no dia 1 de dezembro passado, foram listadas 21 mil operações de socorro efetuadas pela entidade, não só a instituições do país, mas a bancos de todo o mundo. Os valores são espantosos e são de uma fonte oficial. O Citigroup obteve US$ 2,2 trilhões em empréstimos. O falido Merrill Lynch, comprado pelo Bank of America, abocanhou US$ 2,1 trilhões. Ao Morgan Stanley coube US$ 2 trilhões, e mesmo o fanfarrão Goldman Sachs levou US$ 615 bilhões. Mas as instituições estrangeiras também foram agraciadas. O Banco Central Europeu (BCE) usou US$ 8 trilhões, o Banco da Inglaterra satisfez-se com US$ 918 bilhões, o UBS suíço levou apenas US$ 161 bilhões, o Barclay’s britânico, US$ 231 bilhões e muitos outros, como o Deutsche Bank, o Royal Bank of Scotland, o Dresdner Kleinwort, etc. também levaram seus presentes.

Apesar desta farra, a situação continua a se arrastar. Nos EUA, o Fed mantem o programa de comprar US$ 600 bilhões em títulos de empresas em dificuldades, e o governo implementa um pacote de mais US$ 900 bilhões de novos gastos e reduções de impostos. Na União Europeia, os ministros das finanças descartaram novos pacotes de intervenção diante da ação do BCE, que mantém a compra dos títulos dos países em dificuldades como Portugal, Espanha, Itália, além dos 85 bilhões de Euros já concedidos à Irlanda. Apesar de tudo isto, a previsão de crescimento na zona do Euro, para 2010, não ultrapassa 1,7%.

Diante deste quadro as empresas multinacionais, prevendo a retração dos mercados com os cortes nos orçamentos e demissões, reduzem suas metas de produção alimentando o pessimismo geral que começa a contagiar as autoridades brasileiras.

Com efeito, a euforia no Brasil começa a dar sinais de esgotamento. Embora as autoridades tentem disfarçar, o terceiro trimestre de 2010 já será de desaceleração, e, neste quadro, as medidas anunciadas pelos novos ministros da área econômica representam mais algumas pás de terra no caixão da recuperação nacional tão cantada e já em processo de putrefação. Como denunciamos em análises anteriores, agora fica claro o caráter eleitoreiro das medidas adotadas pelo governo Lula no presente ano. Já havíamos afirmado que o Brasil sozinho não conseguiria sair da crise e que a recuperação iniciada não seria sustentável. Também elogiamos a competência do Ministro Mantega na condução da política econômica seguindo a cartilha anticíclica keynesiana. Mas a euforia chegou ao fim. Os recursos injetados na economia, em boa parte, estão sendo drenados para o exterior, pois as necessidades do consumo acrescidas pelas medidas de estímulo adotadas estão sendo supridas pelas importações e não pela produção nacional, graças à poderosa ajuda da política monetária que valorizou o real frente ao dólar. Por outro lado, as desonerações fiscais, os subsídios e os juros bonificados e o aumento das despesas públicas ameaçam quebrar o Estado cujo rombo vem sendo escondido por manobras contábeis escusas.

Convencido que a situação é insustentável, e uma vez passadas as eleições, é necessário mostrar a verdadeira cara. E mais ainda porque os que chegam ao poder são os mesmos que lá estavam, ou seja, já têm as mesmas caras. Trocamos seis por meia dúzia. Os partidos são os mesmos e os ministros, são os mesmos ou parecidos. Como as próximas eleições estão distantes, está na hora de comer a banda podre: o arrocho que havíamos anunciado chegou. O pretexto, para variar, continua o mesmo: o fantasma da inflação. E para esta doença, o Ministro Mantega não tem remédio, pois, no receituário keynesiano, há uma abundância de infusões anticíclicas, mas nada para a inflação. Ela não esteve nas preocupações de Keynes que, por isso, deixou os seus seguidores órfãos. Na ausência de conselhos, eles adotam as mesmas soluções neoclássicas que partem da lei da oferta e da procura como causa da doença.

Uma coisa temos que reconhecer: mudaram o tipo de aspirina para atacar o mal. Desta vez não aumentaram os juros (o Copom manteve a Selic nos 10,75%), mas adotaram uma série de medidas para reprimir o consumo, como o aumento do depósito compulsório, as restrições aos financiamentos, a redução dos prazos e a obrigação de pagamento de entrada, etc. Distribuíram a renda, mas agora querem impedir o povo de consumir.

Texto escrito por:

Nelson Rosas Ribeiro: Professor do Departamento de Economia da UFPB e coordenador do Progeb-Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira (progeb@ccsa.ufpb.br); (www.progeb.blogspot.com).

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