segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Uma China incomoda muita gente... Com guerra cambial incomoda muito mais...

Semana de 17 a 23 de janeiro de 2011

Em sua primeira reunião do ano e sob nova gestão, o Copom, como já era esperado, puniu o consumidor aumentando a taxa de juros Selic em 0,5%. Com uma taxa de 11,25%, fica cada vez mais claro o esforço que o novo governo está exercendo para desacelerar a economia. A inflação é de demanda, dizem eles. É necessário aumentar os juros! O que fazer, então, com a pressão inflacionária, que começa a ser observada pelo aumento dos preços das commodities, ou seja, por um choque de oferta? Não é necessário usar sua bola de cristal, caro leitor. Afinal, o mesmo remédio curará todos os males. Maravilhoso para os bancos, ruim para o povo, ruim para o setor produtivo, ruim para o governo. Os bancos recebem remunerações maiores (já planejam aumentar o spread), o povo paga mais pelo crédito, o setor produtivo cresce menos (a expansão da indústria de transformação cairá de 10,2% em 2010 para 5,4%, este ano) e o governo remunera a uma taxa maior que a Selic grande parte dos seus títulos, que atraem dólares para o país, que valoriza o real, que obriga o governo a comprar dólares, que aumenta a quantidade de moeda doméstica em circulação, que gera inflação, que é combatida com o aumento dos juros... Onde vamos parar?

Segundo alguns economistas, o Banco Central deveria ser mais “comedido” no seu ciclo de alta dos juros, pois, além da inflação, existe a questão cambial. Um estudo realizado para os emergentes, Brasil, China, Índia, México, Turquia, Coréia do Sul e África do Sul, constatou que o maior perdedor da guerra cambial foi o Brasil que apresentou a maior inflação, o maior juro e a maior apreciação cambial. Aliás, tanto interna quanto externamente, este assunto nunca foi tão discutido. A guerra do câmbio voltou à tona com a visita do presidente chinês aos Estados Unidos esta semana.

Nesse encontro, para aliviar a tensão entre os dois países, a China prometeu importar US$ 45 bilhões em produtos americanos. Segundo os EUA, os acordos com os chineses deverão criar internamente 235 mil empregos. Mas, em relação à questão cambial, não houve avanços. O governo chinês se mostrou pouco preocupado com a pressão norte-americana em relação à valorização do yuan. O presidente, Hu Jintao, declarou que um sistema monetário baseado no dólar é “produto do passado”. Nada o convence a valorizar sua moeda, nem mesmo o assombroso monstro da inflação, levantado pelos Estados Unidos.

A participação da China na economia norte-americana tem aumentado bastante nos últimos anos. Em 2010, as empresas chinesas gastaram, em projetos e aquisições, US$ 4,9 bilhões nos EUA, frente a US$ 2,2 bilhões em 2009. Além disso, o país é o maior detentor de títulos do Tesouro americano. Investindo também na agricultura desde 2002, os chineses entraram no cultivo de cítricos através do aumento da área cultivada e vêm incomodando os agricultores norte-americanos. A Flórida, principal estado produtor de laranjas do país, encomendou uma investigação de como os chineses planejam se tornar uma potência neste setor que é dominado atualmente pelo Brasil, com 55% do mercado, e pela Flórida, com 30%.

Mas, os sucessos da economia chinesa não a libertam dos problemas internos. O país elevou o depósito compulsório pela quarta vez consecutiva em apenas dois meses, para conter o aumento de novos empréstimos, e as reservas cambiais já somam US$ 2,85 trilhões. O governo já prometeu usar as reservas “politicamente”, comprando quantias indeterminadas de títulos europeus, mas, na verdade, o país não sabe o que fazer com este rio de dinheiro e já permitiu que parte da moeda estrangeira recebida pelos exportadores fique no exterior.

Apesar dos problemas internos, a economia chinesa está conseguindo superar a herança maldita de exportadora de produtos de baixo valor agregado e se transformando numa produtora e exportadora de produtos de alta tecnologia e, dependendo da metodologia adotada para o cálculo do PIB, já se pode dizer que a China alcançou o posto de maior potência mundial.

A agressividade chinesa, então, não se limita apenas a um país. A guerra cambial declarada acabou se tornando uma guerra comercial mundial. O nosso ministro da Fazenda, Guido Mantega, pretende propor à OMC que o problema do câmbio chinês seja tratado como um subsídio à exportação, tese que passa a ser defendida por alguns países.

Arraigada por tantas contradições, não se sabe qual o rumo que a economia chinesa tomará. O fato é que se a China incomoda muita gente, atrelada a uma política cambial perversa, incomoda, incomoda muito mais.


Texto escrito por:

Rosângela Palhano Ramalho: Professora do Departamento de Economia da UFPB e pesquisadora do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com)

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terça-feira, 25 de janeiro de 2011

A herança maldita

Semana de 10 a 16 de janeiro de 2010

É difícil a situação de quem se reelege. A desculpa da “herança maldita” recebida do governo anterior não pode ser usada. Embora o atual caso presidencial não seja de reeleição, a sombra do Presidente Lula tem que defender seu criador a qualquer custo. Como agravante, temos a situação internacional, neste começo de mandato. A recuperação mundial tão esperada e desejada arrasta-se. Continua o impasse na economia americana apesar da tentativa do Federal Reserve (Fed), Banco Central dos EUA, e do presidente Obama de provocar a retomada da produção industrial interna mesmo tendo de recorrer às medidas protecionistas ou à desvalorização do dólar.

Na União Europeia (UE), o problema da dívida pública continua sem solução. Países como Portugal, Irlanda, Itália, Grécia, Espanha e Bélgica tentam desesperadamente lançar títulos no mercado para financiar o rolamento de seus rombos orçamentários.

Índia, China e Japão impedem a valorização de suas moedas neutralizando as manobras do Fed. A guerra cambial transforma-se em uma guerra comercial. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, em entrevista ao “Financial Times”, definiu assim o problema e ameaçou tomar medidas drásticas para evitar a valorização do real. Pretende ainda fazer uma denúncia na Organização Mundial do Comércio (OMC) e um pedido para que a manipulação cambial seja considerada subsídio à exportação.

Nesses mares revoltos deverá navegar a presidente Dilma de posse da seguinte herança.

O processo de desindustrialização continua em curso. Em 2010, 43,4% do valor total das exportações, ou seja, quase a metade, corresponderam às vendas de cinco commodities (produtos primários): ferro, petróleo, soja, açúcar e carnes. Estes produtos, em 2004, correspondiam a 27% do total. Só os minérios de ferro passaram de 5%, para 14%, neste período. Outro indicador do problema são os produtos industriais. A participação de produtos industriais importados no consumo doméstico passou de 12,6%, no quarto trimestre de 2005, para 21,4%, na média de setembro, outubro e novembro de 2010. Para o mesmo período, no setor têxtil, o salto foi, de 8,2%, para 21,5% e no setor de máquinas e equipamentos foi, de 22,1%, para 36,1%. De janeiro a novembro de 2010, a importação de material eletrônico e de comunicação aumentou 43% em comparação com o mesmo período de 2009, e a produção local cresceu 5,1%. O aumento do consumo das famílias tem sido atendido pela importação de produtos. Deste modo, a política de distribuição e crescimento de renda exporta seus efeitos aceleradores para o exterior. Entre dezembro de 2009 e novembro de 2010, as vendas no comércio cresceram 14,5%, o volume dos bens importados cresceu 28,2% e a indústria nacional apenas 4,1%.

Esta herança maldita, que já vem do governo FHC, foi agravada no governo Lula e é decorrente da política econômica implementada pelo primeiro e continuada pelo segundo. Tal política, a pretexto de conter a inflação, tem recorrido unicamente à elevação das taxas de juros, o que colocou o Brasil como campeão do mundo neste quesito. O anunciado “tripé macro econômico” foi assim reduzido a uma só perna, que nós temos apelidado de “saci macro econômico”. A elevação das taxas de juros tem sido o fator mais importante para provocar a enxurrada de dólares especulativos que tem invadido o país. E os atuais policymakers do governo continuam a bater na mesma tecla por não terem alternativa, já que a teoria keynesiana não tem nenhuma receita para a inflação. Ao lerem estas linhas, provavelmente, a taxa Selic já terá sido aumentada na reunião do Copom, em 0,5%, passando para 11,25%, atraindo mais dólares e agravando a dívida pública. Veremos novamente a ação desesperada do Banco Central (BC) para retirar os dólares de circulação e evitar a valorização. As outras medidas como o swap cambial reverso, o recolhimento compulsório sobre venda de dólares, etc., têm se mostrado meros paliativos para enxugar o derrame de reais. Eis outro aspecto da herança maldita que o governo Dilma, seguindo a mesma cartilha, tem que amargar.


Texto escrito por:

Nelson Rosas Ribeiro: Professor do departamento de Economia, Coordenador do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira progeb@ccsa.ufpb.br); (www.progeb.blogspot.com).

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sábado, 15 de janeiro de 2011

O que esperar de 2011?!

Semana de 03 a 09 de janeiro de 2011

O último mandato do agora ex-presidente Lula foi marcado por altos e baixos. Segundo o Fundo Monetário Internacional, em 2007, o PIB brasileiro cresceu 6,1%. Já no ano de 2008, quando o Brasil foi atingido pela “marolinha”, o crescimento ficou em 5,1% e em 2009, diante do tsunami, o PIB decresceu 0,2%. Segundo estimativas, em 2010, a taxa de crescimento do PIB deverá ser em torno de 7,5%. Mas, o que esperar no primeiro ano de mandato da primeira mulher presidenta do país, Dilma Rousseff?

Para começar, no primeiro dia útil do ano (03/01), a presidenta teve que desembolsar R$ 110,4 bilhões para pagar o maior lote da dívida pública em papéis federais de 2011. Pago este valor, restarão apenas R$ 253 bilhões a pagar entre fevereiro e novembro. Calcula-se que esta dívida está em torno de R$ 1,6 trilhões. Mas não é só Brasil que está devendo. Bancos e governos (federais, estaduais e municipais) europeus e estadunidenses somam um total de US$ 7 trilhões necessários para o financiamento das contas públicas e dos ativos podres. No Japão, a necessidade de refinanciamento chega a 50% do seu PIB. A expectativa é de que em 2011 a dívida pública japonesa chegue ao dobro do PIB e, em 2012, atinja 210% do PIB.

Diante deste gigantismo, no Brasil, o primeiro escalão do novo governo já garantiu que, passadas as eleições, a regra é reduzir os gastos e cumprir a meta fiscal sem recorrer a truques contábeis (como a capitalização da Petrobras em 2010). Para isso, economistas, como Mansueto Almeida, do IPEA, defendem um corte no crescimento do investimento e nos gastos públicos. A ministra do Planejamento, Miriam Belchior, assinalou como prioridade a votação de um projeto de lei complementar que limite a expansão dos gastos do Estado com pessoal. Enquanto isso, Guido Mantega, que continuou no Ministério da Fazenda, anunciou a decisão de reduzir o caixa para empréstimos do BNDES. Agora ele admite que o custo do subsídio é muito elevado, na medida em que, nos seus empréstimos, o banco é remunerado pela Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP), atualmente em 6% ao ano, mas se capitaliza com os recursos do Tesouro, que paga a Taxa Selic de 10,75% ao ano. No momento, o BNDES financia até 70% dos projetos que apóia. O objetivo é reduzir este número, obrigando os investidores a recorrerem aos bancos privados.

Por sua vez, o novo presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, garantiu um anabolizante para o Saci Macroeconômico ao defender, em seu discurso de posse, uma meta de inflação menor. Para ele, é necessária uma luta "incansável e intransigente da missão institucional de assegurar a estabilidade e o poder de compra da moeda", idéia que é referendada por Dilma Rousseff. E, como sabemos, contra a inflação, o aumento da taxa de juros é a solução. É exatamente o que o mercado espera da primeira reunião do Copom, nos dias 18 e 19 desse mês: um aumento de 0,5% na Selic.

Deixando de lado as políticas econômicas, vejamos a atividade econômica.

Um dos principais contribuintes para o crescimento do PIB em 2010 foi a Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF), indicador que representa o investimento em máquinas e equipamentos e na construção civil. O crescimento da FBCF foi superior a 20% em 2010, porém, três elementos modificarão esta situação em 2011: 1) o fim do Plano de Sustentação do Investimento do BNDES em março; 2) a exposição à desleal concorrência externa causada pela supervalorização do real; e 3) o provável aumento dos juros. Esses três fatores contribuirão para a redução do crescimento da FBCF. A expectativa do economista-chefe do J. P. Morgan, Fábio Akira, é de que o crescimento desse investimento será de 11% no presente ano. Já para Mônica Baumgarten de Bolle, economista da Galanto Consultoria, "se o governo reduzir os estímulos fiscais, monetários e de crédito em 2011, para trazer a inflação para nível mais compatível com o centro da meta perseguida pelo BC, de 4,5%, a FBCF não crescerá na casa de dois dígitos".

Não na mesma magnitude, muitos países do resto mundo também ensaiaram uma recuperação no ano passado. Mas, como no caso do Brasil, é de se esperar uma desaceleração desta retomada. Há quem admita, além do presente redator, que a economia mundial seguirá, a partir de 2011, a rota do "double dip", ou duplo mergulho.

Os estímulos foram dados, os indicadores melhoraram e os países se endividaram. Agora, em 2011, chegou o momento de acertar as contas e soltar a mão do sistema.

Texto escrito por:
Lucas Milanez de Lima Almeida: Mestre em Economia, professor substituto do Departamento de Economia da UFPB e pesquisador do PROGEB. (www.progeb.blogspot.com)
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