domingo, 31 de julho de 2011

Maré baixa no mercado financeiro mundial

Semana de 18 a 24 de julho de 2011

Tatiana Losano de Abreu [i]

Apesar da sociedade continuar a recorrer aos protestos de rua para reivindicar seus direitos - como os estudantes chilenos que marcharam levantando a bandeira por mudanças no sistema educacional e os milhares de “indignados”, como se auto-denominam, que foram às ruas de Madri manifestando-se contra o desemprego - , as notícias da semana giraram em torno dos problemas da elite do mercado financeiro, inconformada com o cenário pouco promissor para o “lucro especulativo”.

A certeza de que as ações seriam vendidas por preços sempre mais elevados, pelo menos por enquanto, não condiz mais com a realidade e os especuladores trataram de refazer seus planos de “investimentos”. Como consequência, as empresas começaram a desistir de lançar suas ações no mercado, acompanhando quase a metade das empresas européias que, no início do ano, haviam anunciado tais lançamentos.

Os especuladores, na busca de um bode expiatório, culpam a ganância dos bancos que cobram comissões altíssimas e usam pouca transparência nas operações. Já os banqueiros acusam os especuladores de dificultarem uma remuneração honesta aos agentes da intermediação financeira e, por isso, propõem uma correção no sistema que integra as empresas na bolsa. Das discussões surge, porém um consenso: a turbulência dos mercados é a principal causa do desempenho decepcionante das empresas. No entanto, ninguém questiona as causas dessa turbulência.

Momentos de preocupação viveram também os dirigentes dos países membros da União Européia. Eles sofreram dias de insônia examinando (novamente) formas de proteger o mercado financeiro internacional das conseqüências de um possível default grego. Para aumentar as pressões por alguma solução, José Manuel Barroso, presidente da Comissão Européia, advertiu: “se não houver um acordo para o segundo socorro à Grécia em 24 horas, isso deflagrará uma onda de choques na economia mundial”. Ele alertou que estes choques poderiam afetar os Bancos Centrais dos 17 países membros da União Européia e os bancos privados credores dos governos soberanos, além de contagiar o sistema financeiro de outras economias fora da zona do Euro, como a Turquia, o Reino Unido, o Brasil e a Rússia.

No fim, as pressões funcionaram, e foi aprovado um novo pacote de socorro, equivalendo a 159 bilhões de euros, e outras medidas, que oneraram os detentores privados de bônus gregos. Os bancos da zona do euro foram taxados para custear o pacote de socorro. Com isto, finalmente, conseguiu-se reduzir a dívida que a Grécia nunca teria condições de pagar.

No Brasil, apesar da situação mais favorável, a maré está baixa para os bancos de médio porte, já que as ações das instituições que abriram capital nos últimos quatro anos estão valendo menos que na época da oferta pública inicial. O valor de mercado, em alguns casos, chega a ser inferior ao seu patrimônio líquido. Mas, por cá, os bancos não têm muito que reclamar. A última reunião do Copom confirmou nossa constatação (mencionada em nossa última análise) do aumento da taxa básica de juros (Selic) para 12,5%, beneficiando a classe remunerada pelos juros: os banqueiros. A justificativa divulgada pelo Copom continua a ser a necessidade de desaquecimento da economia para o controle da inflação, já que, segundo eles, é preciso reduzir a demanda e não aumentar a oferta, mesmo que seja à custa de uma dívida pública maior. Segundo relatório divulgado nos últimos dias, o estoque da Dívida Pública Mobiliária Federal Interna (DPMFI) cresceu 3,86% em junho, alcançando a cifra de R$ 1,729 trilhões. A parcela referenciada pela taxa Selic, e que será afetada diretamente pela sua elevação, representa 33,12% desse total. O mais impressionante é que, apesar de constatada a forte influência dos preços administrados para a inflação, responsáveis por 31% da variação do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), entre janeiro e julho deste ano, a possibilidade de redução da tarifa de ônibus, da energia elétrica e dos preços dos combustíveis nem é cogitado pelo governo.

Não seria mais coerente cortar o mau pela raiz?

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terça-feira, 26 de julho de 2011

PIGS OU PIIGS?

Semana de 11 a 17 de julho de 2011

Nelson Rosas Ribeiro[i]

Depois dos dois anos de grande destruição, causada pela crise econômica que abalou o planeta, a esperada e inevitável recuperação começou. As taxas de crescimento dos Produtos Internos Brutos (PIB) dos países capitalistas mais avançados passaram do negativo para o positivo. A novidade é que este processo, que deveria continuar normalmente, entalou. Durante a crise foram à falência empresas e bancos. Passado o sufoco e feita a limpeza, em vez das empresas, começaram a entrar em falência os países e seus governos. Foi criada então a sigla PIG (porco em inglês) formada com as iniciais dos países considerados caloteiros: Portugal, Irlanda e Grécia. Em breve tempo a eles veio juntar-se a Espanha (Spain, em inglês), transformando a sigla em PIGS. Alguém mais atrevido chegou a acrescentar o segundo I, criando o PIIGS, onde estava incluído um novo porco, a Itália.

Durante a semana anterior, a Grécia esteve nas manchetes. Não causou surpresa a ninguém, pois ela já era um pig. Nesta semana chegou a vez da Itália. O introdutor do segundo I estava com a razão e agora a sigla PIIGS passou a ter sentido. A vara foi aumentada com um novo porco. O problema é que este novo pig é grande e gordo demais. É simplesmente a terceira maior economia da zona do Euro. Espalha-se o pânico e fala-se em contágio, a União Européia ameaça rachar-se e há quem afirme que a moeda única entrou em processo de desintegração. O Banco Central Europeu (BCE) é chamado a intervir.

O governo italiano, através do seu primeiro ministro, Silvio Berlusconi, preparou um pacote de austeridade para economizar 45 bilhões de euros que foi rapidamente aprovado pelo senado, em nome da honra nacional. Foi uma tentativa de acalmar “os mercados” e os “investidores”, para que continuem a comprar os títulos podres ofertados pelo governo, com a finalidade de financiar seu gigantesco rombo que atinge valores próximos a um trilhão e oitocentos bilhões de euros. Se a UE estava preocupada com a dívida da Grécia, que se arrasta até hoje sem solução, a da Itália é simplesmente maior que o somatório das dívidas da Grécia, Espanha, Portugal e Irlanda. As tentativas de redução de gastos que atingem e agravam a vida dos trabalhadores, com cortes de subsídios, de salários, demissões, etc., tem levado a imprensa a investigar as mordomias, as despesas dos deputados e senadores considerados dos mais bem pagos do mundo. O próprio Berlusconi já foi flagrado tentando incluir, em uma das suas propostas de austeridade, um dispositivo que permitiria a uma de suas empresas adiar o pagamento de uma multa de 560 milhões de euros. Pelo que vemos, a depender da União Européia, a situação da economia mundial continuará se agravando.

A esperança volta-se então para os EUA. Para nossa tristeza, deste lado as coisas também não vão bem. O governo Obama é obrigado a pedir ao parlamento a elevação do teto para o endividamento do país, atualmente em US$ 14,3 trilhões, para que possa honrar os compromissos internacionais. Os gastos para estimular a economia fizeram com que o déficit público passasse de 2,7% do PIB, em 2007, para 12,7% em 2010 e a dívida pública saltasse de 62,2% do PIB para quase 100%, no mesmo período. O Federal Reserve (Fed), banco central americano, tem recorrido à emissão de dólares para saldar os compromissos do país, operação que é chamada eufemisticamente de “afrouxamento quantitativo” ou “aumento da liquidez” e cujo resultado é inundar o mundo com dólares, provocando sua desvalorização. O Fed anda às cabeçadas e não sabe que medidas adotar. O próprio presidente Ben Bernanke afirmou desalentado: “Não sabemos para onde ir”. E enquanto não descobre uma saída, o Fed vai mantendo os juros básicos do país em níveis inferiores a 0,25% o que se tem mostrado insuficiente para estimular a retomada. O Federal Open Market Commitee (Fomc), equivalente ao Copom brasileiro, já reduziu a estimativa de crescimento do PIB do país, do intervalo de 3,1% a 3,3%, para 2,7% a 2,9%. De qualquer modo, se o congresso não permitir a alteração do teto do endividamento, assistiremos o espetáculo do calote dado pelo país mais poderoso do mundo.

As dificuldades atingem todos os países desenvolvidos onde a dívida pública aumentou 25% em três anos, passando de 77% do PIB em 2007, para 104% em 2010.

Vemos assim que o ambiente internacional é bastante adverso. Da mesma maneira como já o fizemos antes da crise, voltamos agora a alertar os leitores que a aparente calmaria nacional não se poderá sustentar baseada apenas no mercado interno, neste mundo globalizado. O BC, em sua ação, continua utilizando o único instrumento que sua tosca teoria econômica consegue propor para gerir o terrível dilema câmbio-inflação: os juros. E quanto mais eleva os juros, mais esmaga o consumo desestimulando os investimentos e promovendo o capital especulativo. Não é por outra razão que se fala na enxurrada de dólares que atinge o país. Outra consequência é a desvalorização do dólar e a valorização do real que facilita as importações e dificulta as exportações, com as consequências desastrosas para a indústria do país, fato que vem provocando os movimentos de protesto que temos comentado em nossas Análises.

E apesar de tudo isto a insensatez continua. Na quarta feira desta semana, o Copom comunicará a sua nova decisão sobre a taxa de juros básica, a Selic. Todos já sabem que haverá um novo aumento de 0,25% o que elevará esta taxa, que já é a maior do mundo, para 12,5%.

Preparemo-nos então para o novo golpe.



[i] Professor do departamento de Economia, Coordenador do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira progeb@ccsa.ufpb.br); (www.progeb.blogspot.com).

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quarta-feira, 13 de julho de 2011

O câmbio e a desindustrialização

Semana de 04 a 10 de julho de 2011

Rosângela Palhano Ramalho [i]

Já é de conhecimento do leitor que a economia mundial vai muito mal, principalmente nos EUA e Europa. O leitor também sabe que a situação no Brasil não é a das melhores. Embora a produção industrial, segundo o IBGE, tenha subido 1,3%, em maio, frente a abril, é possível detectar que a desaceleração, anunciada no mês passado, não é generalizada. O setor de bens duráveis cresceu 2,7% e o de bens de capital 1,7%, mas o crescimento ainda é considerado moderado. Setores como o siderúrgico, o elétrico, o eletrônico e o têxtil perderam fôlego no segundo trimestre, mas o setor calçadista e os fabricantes de eletrodomésticos vão muito bem, obrigado. A Confederação Nacional da Indústria (CNI) chegou à mesma conclusão: houve dubiedade nos dados da pesquisa de maio, o que indica uma moderação da atividade econômica. Das 19 atividades industriais pesquisadas, algumas apresentaram alta expansão e outras, queda. Tal fato, não preocupa o governo. Afinal, este desaquecimento foi desejado desde o início do ano.

Por outro lado, o ministro da Fazenda, Guido Mantega declarou em Paris que vem perdendo o sono por causa de outro problema: a valorização cambial. O governo, preocupado, ainda não decidiu que medidas tomar e declarou ter ciência “de que não há, no instrumental da área econômica, uma providência capaz de mudar o curso da taxa de câmbio.” Segundo a Fazenda, “...é uma briga sem fim. Os mercados são muito criativos, fechamos a porta, eles entram por outra...” O fluxo excessivo de capitais foi combatido com o aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) mas o capital continua a entrar no Brasil de forma camuflada. As intervenções no mercado de câmbio através dos leilões cambiais também não têm dado bons resultados.

Para piorar a situação, segundo a presidência, os últimos movimentos do câmbio não decorreram apenas do ingresso de capitais, mas também da especulação do mercado. Para se ter uma idéia, só na segunda quinzena do mês de junho, os “investidores” de moeda estrangeira ganharam 3,1% com a variação cambial do período, pois o dólar caiu de R$ 1,61, para R$ 1,56. Entre 17 e 30 de junho, esta queda do câmbio garantiu aos especuladores um ganho maior que o investimento em um título do Tesouro americano. Um título norte-americano, com prazo de 10 anos, demoraria quase 2 anos para ter este rendimento e se igualar ao ganho cambial no Brasil.

Há quem chegue a dizer que estamos vivenciando um processo de desindustrialização, disse Mantega, e isto, para ele, não é verdade. Questionado sobre o processo, o ministro afirmou que os investimentos estão em um patamar “considerável".

O que seria um patamar “considerável”?

Sérgio Lamucci, colunista do Jornal Valor Econômico, frisa que, além das questões estruturais já conhecidas, como a elevada carga tributária, falta de infraestrutura e altos custos de produção, a indústria enfrenta o câmbio elevado. Segundo ele, o índice câmbio efetivo/salário recuou 50%, entre 2000 e 2010, o que denota a dificuldade da indústria, porque quanto mais baixo for este indicador, maior será a dificuldade de competição.

Já presenciamos a união entre burgueses e proletários com a intenção de salvar a indústria. Esta semana, funcionários de montadoras do ABC paulista (Volkswagen, Mercedes Benz, Toyota, Scania e Ford), de outras fábricas da região e os metalúrgicos da cidade de São Paulo cruzaram os braços, não para reinvidicar aumentos salariais, mas para protestar contra o aumento da presença de veículos e de outros produtos importados no mercado interno. Segundo os trabalhadores, a marcha pela Via Anchieta busca alertar o governo para a perda de competitividade da indústria em virtude da valorização do real e dos altos impostos.

Embora o setor produtivo proteste, o governo faz vista grossa às manifestações, anunciando uma política industrial indefinida. O ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Fernando Pimentel, disse que a nova política industrial terá subsídios e desonerações tributárias e de insumos muito fortes, para que se viabilize o investimento em pesquisa e desenvolvimento. Mantega divergiu de Pimentel e disse não saber se a política estará pronta, até o fim do mês, e ainda disse que poderia haver alguma desoneração para investimentos, mas que ainda depende de estudos e descartou a desoneração dos insumos. A contradição entre os ministros mostra o quão preocupado o governo está com a questão.

E, segundo assessores, a presidente está mais preocupada com a inflação do que com a valorização da taxa de câmbio, que provoca a desindustrialização. Nesse sentido, Mantega comanda o coro do governo: “Vamos deixar de subir os juros por causa do câmbio? Não, não vamos deixar. (...) Se necessário for, o juro subirá quando o BC achar necessário. (...)” Vencido, o ministro conclui: “a indústria brasileira terá que conviver com o real forte.”

O pretexto do combate prioritário à inflação alimenta a fome insaciável do capital financeiro. Com isso, o governo alimenta o vampiro dos juros e está matando a indústria brasileira!



[i] Professora do Departamento de Economia da UFPB e pesquisadora do Progeb – Projeto Globalização e crise na economia brasileira. (www.progeb.blogspot.com)

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segunda-feira, 11 de julho de 2011

XVI ENCONTRO NACIONAL DE ECONOMIA POLÍTICA

O XVI Encontro Nacional de Economia Política (ENEP), promovido pela Sociedade Brasileira de Economia Política – SEP, realizou-se entre os dias 21 e 24 de junho de 2011 na Universidade Federal de Uberlândia, situada na cidade de Uberlândia-MG. O PROGEB – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira, esteve representado no Encontro pelos professores Nelson Rosas Ribeiro, coordenador do projeto, e Lucas
Milanez de Lima Almeida. Os professores apresentaram em uma das sessões ordinárias o trabalho intitulado “Valor, valor de troca e mercado: o falso problema da transformação”.
Dos 299 trabalhos inscritos no ENEP, 99 foram aceitos para apresentação nas sessões ordinárias e 29 nas comunicações. Estima-se que o número total de participantes foi de 400 pessoas, incluindo os apresentadores de trabalhos, ouvintes, estudantes e convidados.

Após o ENEP, realizou-se a Assembléia Geral da SEP, a qual aprovou a Carta de Uberlândia, onde a entidade expõe sua opinião sobre a atual situação econômica do país.

XVI ENCONTRO NACIONAL DE ECONOMIA POLÍTICA

Carta de Uberlândia

O segundo mandato do governo Lula encerrou-se sem que os principais problemas econômicos e sociais do país tenham sido enfrentados. Apesar disso, naquele momento, o índice de aceitação do presidente atingiu 86%, para o qual contribuíram fortemente, o crescimento do PIB em 2010, a recuperação parcial, mas expressiva, do valor do salário mínimo e os programas sociais assistenciais, principalmente o Programa Bolsa Família. Boa parte dos brasileiros que votou em Dilma Roussef para presidente o fez para garantir essa continuidade.

Iniciado o governo Dilma, o que estamos assistindo? De um lado, a repetição da manutenção quase exclusiva da prioridade do regime de metas para a inflação, o que supostamente provocou a elevação da taxa de juros básica, cortes e contingenciamento do orçamento da União, a restrição ao crédito e o recrudescimento do processo de apreciação cambial. De outro, o retorno da política de privatizações e das parcerias público-privadas, conforme eufemismo governamental, e a manutenção de vultosos superávits primários.

Em suma, no plano econômico, continuamos com uma das taxas de juros mais elevadas do mundo, o que torna o país presa fácil dos especuladores, nacionais e internacionais, fragilizando sua situação na conta de transações correntes. Por sua vez a valorização do real, que em alguns momentos atingiu níveis antes impensáveis, começa a colocar em risco a viabilidade econômica de vários setores industriais, o que não pode ser contrabalançado indefinidamente com reduções tributárias e expõe o país à possibilidade de uma crise de balanço de pagamentos em um futuro próximo.

E tudo isso em meio a uma crise econômica internacional que está longe de ter terminado, vide a situação da maioria dos países do continente europeu, onde segmentos crescentes de sua população têm ido às ruas se manifestar contra as “políticas de ajuste” impostas pelo FMI, com aumento de desemprego e reduções de salários e pensões dos aposentados. A Europa, à deriva, mostra quão frágil é a situação da economia brasileira, sujeita aos humores do capital especulativo e fortemente dependente da valorização das commodities.

Tomado em conjunto, o atual momento expressa à perfeição quão estreitos são os limites colocados pelas escolhas feitas pelos últimos governos, que procuraram fazer a economia crescer e a distribuição de renda melhorar sem resolver seus problemas estruturais e sem alterar a distribuição da propriedade e a relação entre salários e lucros, ou, em poucas palavras, acreditando que era possível servir simultaneamente a dois senhores.

É preciso começar a construir uma política econômica que supere esse quadro. Mas, no plano econômico, isso somente poderá ser feito com o abandono da camisa de força em que se constitui o regime de metas para a inflação e com o enfrentamento dos interesses daqueles que se beneficiam dos juros elevados e da insensata valorização de nossa moeda. Ademais, o tripé metas para a inflação, metas de superávit fiscal e câmbio flexível, com livre mobilidade de capital, com o crescente predomínio da produção agroindustrial e da exportação de commodities, não permite um desenvolvimento econômico pujante e sustentável econômica e ambientalmente. Muito pelo contrário, nos últimos anos a economia brasileira cresceu a taxas insuficientes para superar nossas carências econômicas e sociais históricas, e perseguir os desafios de uma sociedade avançada do século XXI. No plano geral e social, é preciso enfrentar os determinantes da pobreza absoluta e relativa, que não podem ser eliminados tão somente com políticas de transferência de renda, muito embora estas minimizem as agruras sofridas pelas famílias em pior situação.

Para que o Brasil caminhe na direção de um projeto de desenvolvimento nacional, autodeterminado politicamente e fraterno socialmente, é fundamental o aprofundamento radical da democracia política e econômica, com redistribuição do poder político, da renda e da riqueza, especialmente da propriedade da terra. Para isso é necessária a alteração das políticas econômicas neoliberais predominantes nos últimos governos, como bem demonstraram as discussões e os trabalhos apresentados neste XVI Encontro da Sociedade Brasileira de Economia Política.


Uberlândia, 24 de junho de 2011
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quinta-feira, 7 de julho de 2011

Seminário Permanente

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quarta-feira, 6 de julho de 2011

A sagrada remuneração

Semana de 27 de junho a 03 de julho

Lucas Milanez de Lima Almeida [i]

É, meus amigos, como prevíamos, o pau quebrou. Nos últimos dias de junho milhares de manifestantes foram às ruas da Grécia protestar, em vão, contra o plano de austeridade proposto pelo governo. Aprovado por 155, dos 296 parlamentares gregos, a expectativa é de que, nos próximos quatro anos, o país consiga economizar € 28,4 bilhões e obter outros € 50 bilhões com a venda de praias (da famosa costa grega), cassinos, campos de golfe, fábrica de sal, casas lotéricas, aeroportos, bancos, estradas, dentre outros "ativos" estatais. Tudo isso, é para garantir aos salvadores de emergência, leia-se FMI e Banco Central Europeu, o pagamento de uma ajuda futura, que virá por meio de empréstimo. Alguns analistas acreditam que uma possível moratória grega cause, para os bancos de todo o mundo, consequências piores do que as causadas pela quebra do Lehman Brothers.

Mas, não foram apenas os gregos que resolveram garantir o pagamento do dízimo à "instituição sagrada" chamada capital financeiro. O novo primeiro-ministro de Portugal também anunciou um agressivo plano de austeridade baseado em contenção de gastos e em privatizações. Para garantir seu compromisso com o FMI e com a União Européia, que concederam um montante de € 78 bilhões como empréstimo, a proposta é vender participações em diversas empresas estatais de vários setores, tais como o energético, o de aviação e o de telecomunicações. Além disso, um projeto será engavetado: a construção do trem bala que ligaria Portugal à Espanha. E, como não poderia deixar de ser, o povo também pagará sua parcela: serão reduzidos os benefícios de bem-estar social, aumentados os impostos sobre os salários e sobre a venda de algumas mercadorias e haverá, ainda, a "reestruturação" das políticas e leis de contratação de mão de obra.

Para não ter a necessidade de tomar empréstimos internacionais, como a Grécia, Portugal e Irlanda, a Espanha também propôs, como medida preventiva, novas regras de contenção dos gastos e redução do déficit orçamentário, tais como a redução dos salários do setor público e o aumento da idade mínima para a aposentadoria. Medidas semelhantes também estão sendo ou já foram tomadas na Inglaterra, que no dia 30 de junho colocou mais de 30 mil manifestantes nas ruas contra os tais planos de austeridade.

E, para piorar, as expectativas futuras também não são nada animadoras para o resto do mundo. O FMI prevê, que nos próximos cinco anos, a economia estadunidense continuará sofrendo com a crise do mercado imobiliário, com o desemprego elevado e com os déficits orçamentários (estima-se que só com gastos de guerra, incluindo indenizações e assistências, os EUA vão gastar um total entre US$ 3,7 e US$ 4,4 trilhões). Soma-se a isso o fato de que a confiança dos consumidores norte-americanos diminuiu mais do que esperavam os analistas. O resultado será o lento crescimento econômico. Já a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) registrou um aumento na concentração de renda em 17 das 22 economias dos países avançados. Enquanto isso, estudos mostram que, há mais de uma década. os salários reais dos trabalhadores de economias avançadas estagnaram. O que houve foi apenas um aparente aumento na capacidade de consumo causada pela grande oferta de crédito. Agora, que o crédito arrefeceu, é possível se ter uma idéia da real situação, que tende a piorar, pelos motivos acima apresentados.

Aterrissando aqui no Brasil, é de se destacar dois fatos: a expansão do setor de aviação de 21,74% de janeiro a maio de 2011 e o aumento da massa salarial, que, nos últimos 12 meses, cresceu mais do que o crescimento da taxa de ocupação em seis regiões metropolitanas. Segundo o Relatório de Inflação do Banco Central do Brasil, isto é motivo de preocupação, pois poderá causar pressões inflacionárias. Para o diretor Carlos Hamilton Araújo "o mercado de trabalho e o comércio ainda estão muito fortes", o que deve gerar pressão sobre os preços.

Destacam-se também as contas na área fiscal. Com a elevação na inflação, foi "necessário" ao Banco Central elevar a taxa de juros para "conter a demanda" (e também o excesso de gente empregada e os salários muito altos). Mas isto trouxe outros problemas para as expectativas fiscais de 2011: elevação da relação dívida líquida/PIB, que subiu de 38% para 39%; aumento na relação entre os juros nominais e o PIB, que passou de 4,8% para 5,4%; e, consequentemente, aumento no déficit nominal (receita menos todos os gastos do governo, inclusive com os juros da dívida), que, se espera, passará de 1,9% para 2,5% do PIB. Mas, parece que isto não será problema para o governo, pois este ano, já foram economizados 55% do necessário para o superávit primário (o dinheiro que poderia ser investido, mas é pago como juros), uma quantia total de R$ 64,8 bilhões.

Com esse aumento na remuneração, qual capitalista financeiro não tem interesse de "investir" aqui no Brasil? Em maio de 2011, o chamado Investimento Estrangeiro Direto (que hoje tem muito pouco de investimento) foi de US$ 64,1 bi, enquanto que, no mesmo mês de 2010, foi de US$ 26 bi. O problema é que a entrada de dinheiro estrangeiro supervaloriza a moeda local, que, por sua vez, cria uma concorrência desleal entre produtos importados e os nacionais, além de desestimular as exportações e o investimento industrial.

No que se refere às exportações, por incrível que pareça, elas vão de vento em popa (mas apenas as de commodities, é claro).

O superávit comercial em maio foi de US$ 3,527 bi, 2,3% maior que no mesmo mês de 2010. Decompondo a cifra de US$ 94,61 bi de produtos exportados, entre janeiro e maio de 2011, a Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB) identificou que US$ 67,36 bi são de commodities básicas, semimanufaturadas e manufaturadas (tais como álcool, gasolina, suco de laranja, barras de aço e ferro, açúcar refinado, etc.). Isto representa um total de 71% das exportações brasileiras, constituídas de produtos que tem seu preço determinado pelas bolsas do mundo inteiro, não tendo o país controle algum sobre eles.

É, mas garantir a remuneração do capital financeiro, acima de tudo, tem sido a opção, e não só do Brasil. Todos acreditam, com fé, que o salvador é este tipo de capital, e procuram satisfazer as suas necessidades a qualquer custo. Em todo o mundo é preferível pagar os juros da dívida e garantir a "sagrada remuneração", como se, com isso, fôssemos todos para o paraíso, doa no bolso de quem doer.

E sempre quem paga a conta são os trabalhadores.

Até quando?



[i] Mestre em Economia, professor Substituto do Departamento de Economia da UFPB e pesquisador do Progeb. (www.progeb.blogspot.com.).

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sábado, 2 de julho de 2011

O pau vai quebrar!

Semana de 20 a 26 de junho de 2011

Nelson Rosas Ribeiro[i]

No começo de junho, afirmamos em nossa Análise que estávamos entrando em um beco sem saída. A situação continua a piorar e agora, estamos afundando num buraco sem saída. A economia mundial não consegue passar à fase da recuperação. A violenta crise não foi suficiente para cumprir o seu papel saneador dos excessos do capitalismo. É preciso mais destruição. E, na queda de braço, o capital financeiro continua a ganhar garantindo seus rendimentos enquanto o povo deve pagar a conta.

Mas, parece que o povo está ficando irritado por todo o mundo. A situação da Grécia continua a agravar-se. O FMI só libera a nova parcela de 12 bilhões de euros mediante garantias mais fortes do governo. A União Européia (UE) promete mais 120 bilhões de euros, mas também exige medidas de austeridade. O parlamento reúne-se para aprovar o pacote proposto pelo governo enquanto o povo grita e se manifesta nas ruas. Quem vai ganhar?

Mas não é só a Grécia. As medidas restritivas espalham-se por toda a Europa. Os funcionários públicos estão sendo os alvos preferidos. Seus salários foram reduzidos em muitos países: 2,5% na Alemanha, 5% na Espanha, 10% em Portugal, 13% na Irlanda, 25% na Romênia, 50% na Letônia, etc. Além disso, os salários nominais foram congelados, por um a três anos, na França, Itália, Portugal, Espanha, Bulgária, Polônia, Romênia e Eslovênia. Em um ambiente inflacionário, isto significa efetiva redução de salários reais.

Há mais medidas restritivas como a redução do número de funcionários. O Reino Unido promete demitir 490 mil trabalhadores, Polônia e Bulgária já cortaram 10% dos seus funcionários públicos, a Romênia demitirá 250 mil, a França suspendeu as contratações e a Grécia, para cada cinco aposentados, contratará apenas um. Além dos cinco milhões de empregos perdidos, durante a crise passada, a UE espera perder agora mais 1,5 a 2 milhões. Implacáveis, os governos em vários países como Dinamarca, Suécia, Alemanha, Suíça, Estônia, República Tcheca e Espanha, reduziram os subsídios desemprego. Este é o combustível que vai tornando cada vez mais explosiva a situação social dos países da UE. Grandes movimentos de massa são esperados para os próximos tempos inclusive no Reino Unido onde o maior sindicado de funcionários públicos prepara uma greve geral que poderá paralisar o país e derrubar a frágil aliança que permite manter o atual governo. A primeira batalha está marcada para o dia 30 de junho com a realização da já anunciada greve dos professores.

Nos EUA, a situação mostra-se ainda pior que na semana passada. O crescimento no primeiro trimestre, em taxas anualizadas, não ultrapassou 1,9%. O secretário do tesouro dos EUA, Timothy Geithner, estima que, no final do ano, o crescimento dificilmente ultrapassará os 2%, muito abaixo dos 3 a 4% esperados pelos analistas. Diante deste quadro, as exportações dos países asiáticos começam a desacelerar e já se fala em queda no ritmo da expansão dos preços das commodities. Na reunião do G-20 agrícola, o Brasil chocou-se com russos e chineses que se opõem à produção de etanol a partir de produtos alimentícios (cana e milho), por causa dos preços. Dizem eles que a produção de etanol, a partir destes produtos desloca as culturas, provoca o desabastecimento e o conseqüente aumento de preços que vem ocorrendo no mercado.

Nessa conjuntura o Brasil passa a correr vários riscos.

Em primeiro lugar, os déficits na conta corrente, que atualmente são financiados pelos saldos do comércio exterior (graças aos preços das commodities que exportamos) e pela entrada de capitais, pode tornar-se perigoso.

Em segundo lugar, os ritmos da produção industrial, no país, continuam a cair e o processo de desindustrialização avança.

Em terceiro lugar, a inadimplência das pessoas físicas, que vinha aumentando, já no primeiro trimestre, acelerou-se, em abril e maio, preocupando as empresas que vendem à crédito.

Em quarto lugar, a inflação reduz o ganho real dos trabalhadores o que começa a provocar movimentos de protesto como a greve anunciada pelos metalúrgicos de Porto Alegre. Lembremos que a maior parte dos novos empregos criados este ano situa-se na faixa de até dois salários mínimos.

Finalmente, enquanto cresce a dívida pública na mão dos estrangeiros, passando de 11,29% para 11,45%, o tesouro enfrentará, no dia primeiro de julho, o maior vencimento de títulos deste ano, no montante de R$ 119 bilhões. É claro que o país não conseguirá pagá-los e pretende, mais uma vez, “rolá-los” com o lançamento de novos títulos, pelo tesouro nacional, o que, certamente, aumentará a dívida pública.

Para completar o quadro, a tensão no Pará, com os assassinatos de lideranças no campo, fez o MST romper a trégua com o governo, em protesto contra o não cumprimento das promessas feitas.

Como se vê, a conjuntura não está nada favorável. Até quando os trabalhadores de todo o planeta suportarão pagar a os tributos impostos pela ganância do capital financeiro internacional?

Os próximos tempos prometem muita violência e instabilidade.



[i] Professor do departamento de Economia, Coordenador do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira progeb@ccsa.ufpb.br); (www.progeb.blogspot.com).

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