quinta-feira, 24 de maio de 2012

Entre verdades e cachoeiras, a crise continua


Semana de 14 a 20 de maio de 2012


Nelson Rosas Ribeiro[i]




            Duas notícias no campo político ocuparam completamente todas as manchetes da semana: a instalação da Comissão da Verdade e a CPI do Carlinhos Cachoeira.
            A Comissão da Verdade assanhou o vespeiro dos velhos torturadores entocados nos clubes do exército, marinha e aeronáutica. Em tom de ameaça, com saudade dos velhos tempos, vociferaram contra a Comissão e pretendem instalar outras comissões para “fiscalizar” as apurações que serão feitas. Sem postos de comando, procuram matreiramente envolver os novos oficiais e comprometê-los com a defesa dos crimes que cometeram, invocando uma solidariedade corporativa. Por outro lado, várias forças sociais manifestaram-se em apoio às investigações, na busca do restabelecimento da verdade histórica, que aponte as responsabilidades, para o conhecimento da sociedade. Entre estas forças destacou-se o “Levante popular da juventude”, organização de jovens surgida no Rio Grande do Sul que vem promovendo o que chamam de “esculacho”, manifestações em frente às residências de torturadores, que são localizados e têm seus endereços divulgados pela internet.
            A CPI do Cachoeira tem promovido a divulgação do tamanho da corrupção nos meios políticos e na administração pública. Pelo andar da carruagem, não escapará nenhum dos poderes da nação e nenhum dos partidos políticos. Os escândalos, que aparecem a cada dia, envolvem empresas, licitações, contratos em andamento com os governos estaduais, etc. O pânico está mobilizando as lideranças políticas do país para uma gigantesca operação abafa. É de se temer uma solução do tipo PC Farias (nos tempos de Collor), com a queima de arquivo, ou uma monumental pizza.
            Com todas estas novidades, quase não sobrou espaço para as notícias econômicas. Aliás, pouco se tem a dizer senão acrescentar fatos negativos à frágil situação mundial e nacional, que vão como a cantiga da perua: pió, pió, pió, pió.
            A economia americana andando de lado, nem ata nem desata, e a dívida pública do país ameaça novamente bater no teto máximo permitido, até o final de 2012, deixando o presidente Obama refém do congresso. A economia da China surpreende pela negativa. A desaceleração está sendo maior do que se esperava, com fortes repercussões no preço das commodities, que apresentam uma tendência para a queda, provocando a fuga dos fundos especulativos das aplicações em papeis ligados a estes bens. Receando a queda dos preços, procuram aumentar as posições vendidas.
            A situação da economia europeia é cada vez mais complicada. Se não fosse a Alemanha, com seus 0,5% de crescimento, o PIB da zona do euro teria sido negativo no primeiro trimestre, e, como já o foi (-0,3%) no último trimestre de 2011, a zona estaria tecnicamente em recessão. A situação torna-se mais delicada com a eleição do socialista Hollande, na França, segunda economia da zona.  Aguarda-se com ansiedade o resultado do encontro que o novo dirigente terá com a toda poderosa Angela Merkel, da Alemanha, com seu prestígio abalado pela última derrota eleitoral.  A situação da Grécia é cada vez mais caótica, e o que se discute é se o calote será ordenado ou desordenado. A hipótese da saída da zona do euro torna-se cada vez mais considerada e já é admitida pelo Banco Central Europeu (BCE).  Teme-se a corrida aos bancos e o processo de contágio para o resto da Europa. A situação do sistema bancário mundial já é delicada, e estima-se que os 29 maiores bancos do mundo necessitariam de uma ajuda imediata de US$ 566 bilhões para se adequarem às resoluções de Basiléia 3.  
            Neste ambiente, no Brasil, apesar das medidas tomadas pelo governo para salvar a indústria nacional, que já provocaram a desvalorização do real frente ao dólar; apesar da queda dos juros e do aumento da oferta de crédito; apesar da redução dos impostos, a situação continua a se agravar, e não há sinais de recuperação da economia. As medidas tomadas contra o capital financeiro espantaram os parasitas da especulação internacional, e a enxurrada de dólares parece ter sido contida. No entanto, subestimando a integração do Brasil na economia mundial, a presidente Dilma e o ministro Mantega continuam confiantes no arsenal de que dispõem para a recuperação. A presidente Dilma afirma que estamos 100%, 200%, 300% preparados, e o belicoso ministro Mantega orgulha-se de ter “bala na agulha” para o combate.
            Coitados dos economistas! Pensam que mandam na economia e enganam os capitalistas!
            Esquecem que estamos vivendo a dura realidade da globalização do mundo capitalista em crise. E dela ninguém vai escapar.


[i] Professor do departamento de Economia, Coordenador do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira progeb@ccsa.ufpb.br); (www.progeb.blogspot.com).
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quarta-feira, 16 de maio de 2012

Indústria empurra atividade econômica ladeira abaixo


Semana de 7 a 13 de maio de 2012


Rosângela Palhano Ramalho[i]




            Há algum tempo, caro leitor, esta coluna relata as incertezas quanto à prometida retomada do crescimento brasileiro. Os resultados para o terceiro trimestre não são dos melhores. Embora a Confederação Nacional da Indústria (CNI) tenha divulgado um aumento do faturamento real na indústria de transformação de 0,9% entre fevereiro e março, elevação de 0,4% nas horas trabalhadas na produção e de 0,3% no nível de emprego, as perspectivas para a indústria este ano são muito ruins. O Boletim Focus, relatório de mercado do Banco Central, por exemplo, já revela uma queda da projeção de crescimento da indústria, de 2%, para 1,92%, em 2012. A Quest Investimentos já é mais pessimista: reduziu a sua expectativa, de 1,5%, para 1%. Tal pessimismo é motivado pelos últimos números da indústria apresentados pelo IBGE. O levantamento da Pesquisa Industrial Mensal (PIM) revelou, em março, queda da produção industrial em 18 das 27 atividades pesquisadas. No acumulado do ano, a retração chega a 3%. O emprego na indústria também caiu. O índice recuou 0,3% em janeiro, em fevereiro, cresceu apenas 0,1% e caiu 0,4% em março, número que contrasta com o da CNI.
Para a indústria do Sudeste, que representa 60% da produção nacional, o IBGE registrou, no primeiro trimestre do ano, queda de 6,2%, em São Paulo, 6,8%, no Rio de Janeiro, 2,4%, no Espírito Santo e 1,4%, em Minas Gerais. Observando os dados por setores industriais, confirma-se que, na região, a indústria automobilística deu a maior contribuição para esta queda, seguida pela indústria extrativa e pela siderurgia.
            É fato que, desde o segundo semestre do ano passado, a indústria automobilística passa por dificuldades. A produção de veículos caiu 15,5% em abril. Segundo a Anfavea, o giro dos veículos no pátio das montadoras e concessionárias é de 43 dias. No quadrimestre, as vendas caíram 3,4%, principalmente, segundo os fabricantes, em virtude do aumento da inadimplência. A taxa de inadimplência acima de 90 dias, pelos dados do Banco Central, está em 5,7%, a maior da série produzida pela instituição. O mau pagador, então, é apontado como o inibidor da concessão de crédito neste setor.
Finalizados os balanços trimestrais, especula-se sobre os resultados a serem apresentados. Cogita-se que a Petrobras, neste período, apresente queda de 27% no lucro líquido. Já a CSN (Companhia Siderúrgica Nacional) divulgou uma queda do lucro líquido de 82,1% no primeiro trimestre, devido à fraca demanda interna e aos baixos preços do minério de ferro.
Diante desta realidade, não restou alternativa ao Ministério do Desenvolvimento, Comércio e Indústria senão lamentar. O secretário executivo do órgão, Alessandro Teixeira, declarou que o primeiro semestre deste ano será, para a indústria, um dos piores da história.
O setor industrial, embora venha perdendo peso na determinação do PIB, é o setor mais dinâmico da economia, por produzir um efeito de arrastamento muito grande nos serviços e na agropecuária. Em meio à desaceleração, a indústria clama por soluções e chama de paliativas as medidas tomadas pelo governo em relação ao câmbio e ao Programa Brasil Maior.
Por outro lado, analistas concordam que a política industrial está equivocada, pois não ataca o problema principal do setor, que é a perda de competitividade. Ou seja, segundo eles, a questão é estrutural, típica de uma sociedade que escolheu consumir a poupar!
Divergências à parte, o fato é que as previsões de crescimento do PIB vêm sendo revisadas. O Credit Suisse aposta em um crescimento de 2,5%. O governo, através do Ministério da Fazenda, que estimava uma taxa de 4,5%, e do Banco Central, que projetava uma taxa de 3,5%, vem reduzindo as previsões para abaixo de 3%. Provavelmente os 2,7% do ano passado se repetirão.
Os últimos números do IPCA, indicador da inflação, mostraram, entre março e abril, um aumento de 0,21% para 0,64%. Seis dos nove grupos levantados pelo IBGE apresentaram alta. Com isto, volta-se a especular a respeito da próxima decisão do Copom. A presidente agora terá que lidar com dois incômodos: o provável resultado pífio do PIB este ano e o retorno das discussões acerca da autonomia do Banco Central, em virtude da divulgação dos últimos números da inflação.


[i] Professora do Departamento de Economia da UFPB e pesquisadora do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com)
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quarta-feira, 9 de maio de 2012

Economia, governo e política econômica


Semana de 30 de abril a 06 de maio de 2012


Lucas Milanez de Lima Almeida[i]




            A economia política nos ensina que a formação social, e seu conjunto de leis e instituições, inclusive o Estado, é um reflexo do modo como uma sociedade espontaneamente se organiza para produzir e distribuir a riqueza. Por isso, ela deve corresponder às características e necessidades desta base econômica. Com alguma ressalva e considerando que os maiores países vivem numa democracia, podemos utilizar o governo como o ícone da sociedade, sendo os representantes dos interesses econômicos, as próprias empresas.
            Não é difícil perceber que a estrutura social é dominada por aqueles que, sendo proprietários dos meios de produção, ficam com a maior parte da riqueza, o que não quer dizer que os menos abastados não tenham poder algum. Enquanto a dominação econômica de uns sobre os outros se mantiver em determinado nível, o que depende da realidade de cada país, haverá certa estabilidade na relação entre as classes. Por outro lado, se uma parte da sociedade quer aumentar seu poder econômico, ou compensar o poder perdido, em detrimento da outra, o conflito entre as classes pode desencadear grandes alterações sociais.
            Na história, temos vários exemplos de alterações políticas causadas por mudanças econômicas, mas o que vemos hoje não é a história sendo contada, mas acontecendo diante dos nossos olhos. O pós-crise nos mostra a reação ante a situação econômica.
            Em Portugal, o Partido Socialista, que ganhou as eleições de 2005 e 2009, sucumbiu diante do Partido Social Democrata em 2011. Na Bélgica, após a queda dos Liberais Democratas em 2010, houve uma eleição geral na qual a Nova Aliança Flamenca saiu vitoriosa, com uma cadeira a mais do que o Partido Socialista Francófono. No Reino Unido, o Partido Conservador, do primeiro ministro David Cameron, ganhou, sem maioria absoluta, do Partido Trabalhista do então primeiro ministro Gordon Brown, as eleições de 2010. Nos Países Baixos, o governo do partido Apelo Cristão-Democrático foi dissolvido e, com as eleições gerais de 2010, o Partido Popular para a Liberdade e Democracia e o Partido Trabalhista conquistaram a maior parte dos votos, obtendo, respectivamente, 31 e 30, dos 150 assentos disponíveis no parlamento. Outro que também não aguentou a pressão foi o carcamano Silvio Berlusconi, que em 2011 perdeu o cargo de primeiro ministro da Itália para o tecnocrata Mario Monti.
            Neste último fim de semana, vimos os fatos se repetirem: o conservador Nicolas Sarkozy perdeu, em segundo turno, as eleições presidenciais para o “socialista” François Hollande, que prometeu ouvir os clamores pela mudança. O partido de coalizão da Alemanha, que já sofreu com a queda do presidente Horst Köhler em 2010 e com a perda do seu maior aliado internacional, tem agora ameaçada a sua hegemonia interna, pois, nas últimas eleições regionais (06/05/2012), eles perderam espaço, no norte do país, para a oposição de centro-esquerda. E, na Grécia, o parlamento, que tem cadeiras ocupadas por partidos que vão da ultraesquerda (que defendem o calote) ao neonazismo (que defendem a colocação de minas terrestres nas fronteiras para impedir a entrada de estrangeiros), criou um impasse para a formação de um governo majoritário.
            Note, caro leitor, o caos em que se encontra a Europa. O povo, insatisfeito com a crise e a reação dos governos diante dela, que favorece o capital financeiro, mediante empréstimos, arrocho fiscal e pagamento de dívidas, se lança às ruas para tentar impedir a compressão da sua precária condição econômica. Mas, não é sozinho que ele vai à luta, alguns capitalistas também vão. O atual modelo de política econômica europeu foi posto em xeque, pois, como uma política de redução de gastos e concentração de riquezas nas mãos dos credores internacionais poderia estimular o consumo e, consequentemente, a produção? Entra em cena o capitalista industrial, com seu discurso de que sem produção não há emprego, renda e nem sequer o que consumir.
            Curiosamente, diante do domínio que os bancos sempre tiveram, o Brasil resolveu seguir o receituário de políticas de proteção do capital industrial e agora quer levantar a bandeira de defesa da produção e baixar a bandeira dos juros altos. Será?!
            Em todo o mundo cresce o coro para, por meio do governo e da política econômica, se mudar a economia. Resta-nos esperar para ver. O problema é que isto não cabe ao governo, apenas a nós, que transferimos às empresas a decisão do que produzir e de como distribuir.
            Quem sabe, um dia, não possamos revogar esta decisão e governar a economia...


[i] Professor do Departamento de Economia da UFPB e pesquisador do Progeb. (www.progeb.blogspot.com.)
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sexta-feira, 4 de maio de 2012

Governo versus bancos


Semana de 23 a 29 de abril de 2012


Nelson Rosas Ribeiro[i]




            Afinal, temos duas novidades sobre a economia mundial. Duas economias da Europa consideraram-se oficialmente em recessão. Todos sabemos que os economistas adoram definições. Muitas são produzidas e modificadas segundo as conveniências. Foi assim que produziram a definição de “recessão” para caracterizar uma economia que, por dois trimestres seguidos, apresenta taxas negativas de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), o que deve ser traduzido como “taxa de decrescimento do PIB”, ou seja, em um dado período, a economia encolhe, produz menos que no período anterior.
            Um dos países que se enquadrou nesta definição foi a Espanha, mas já se sabia que ela andava mal das pernas. Além de ter uma taxa de desemprego de mais de 20%, já havia decrescido 0,4% no último trimestre de 2011 e voltou a decrescer 0,3% no primeiro trimestre de 2012. O outro país surpreende, pois é a Inglaterra, o velho Reino Unido. Sua economia já havia encolhido 0,3% no último trimestre de 2011 e agora, no primeiro trimestre de 2012, encolheu mais 0,2%, respondendo às medidas de austeridade adotadas para reduzir o déficit público.
Por toda parte, na UE, ecoam os protestos e, quando surge a oportunidade, as populações correm seus respectivos dirigentes com “pontapés nos traseiros”. Dez dirigentes já foram derrubados, e agora caiu o governo na Holanda, e o poderoso Sarkozy, na França, perdeu o primeiro turno das eleições, provocando o pânico diante de um apertado segundo turno que se aproxima. Com isto cresce a onda antiausteridade que cada vez mais se confunde com a luta contra a odiosa figura da primeira ministra da Alemanha: Angela Merkel.
            E ninguém encontra nenhuma saída para a situação, nem mesmo uma ajuda externa, já que a economia dos EUA continua a andar de lado e a poderosa China programa o seu “pouso suave” com uma taxa de crescimento do PIB prevista para 7,5% neste ano.
Aqui no Brasil, também temos duas grandes novidades. A primeira delas é a divulgação da ata da reunião do Copom, que deixou os economistas e analistas na maior excitação. Procura-se ler nas entrelinhas, nos adjetivos, na colocação das vírgulas, as intenções do BC em relação à Selic. O famoso item 35 da ata anterior foi derrubado e agora o BC fala em novas reduções da Selic, embora com “parcimônia”. O mercado espera, então, que possa haver novos cortes e que a Selic possa cair a 8,75%, 8,5% ou mesmo 8,0%, segundo as estimativas mais radicais. Comenta-se que para a Selic cair abaixo de 8,5% será preciso alterar as regras de remuneração da caderneta de poupança, coisa que ninguém teve coragem de fazer até hoje.
            A outra guerra que o BC continua a travar é pela desvalorização do real e consequente valorização do dólar, o que tem exigido frequentes intervenções no mercado de forma propositadamente confusa. Parece que o BC quer levar a completa incerteza aos especuladores numa terrível queda de braço com a intenção de criar alguma proteção para a indústria nacional, que continua em desaceleração, segundo a Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp) e a Confederação Nacional da Indústria (CNI).
            A segunda novidade é a guerra da Presidente Dilma contra o sistema bancário. Como nós já tínhamos previsto, a suposta redução dos juros e spreads bancários está dando margem a todo tipo de malandragem. Parece que apenas a Caixa Econômica Federal está levando a sério e a risca as determinações do Planalto. O próprio Banco do Brasil, que não é nem do Brasil, nem do José, nem do Antônio, mas de um grupo privilegiado de acionistas, está mordendo a corda, pois tem de garantir os dividendos das suas ações para manter a cotação delas na bolsa. A bandalheira entre os bancos privados é ainda maior. A irritação do governo parece estar aumentando, o que explicaria o discurso agressivo da presidente Dilma, proferido no rádio e televisão por motivo da comemoração do primeiro de maio.
            Como já havíamos previsto, brasileiros e brasileiras, preparemo-nos! Esta batalha vai ser muito dura.


[i] Professor do departamento de Economia, Coordenador do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira progeb@ccsa.ufpb.br); (www.progeb.blogspot.com).
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