quinta-feira, 24 de julho de 2014

Fase de baixa no ciclo econômico

Semana de 14 a 20 de julho de 2014

Nelson Rosas Ribeiro[i]

“Estamos numa fase de baixa do ciclo econômico, mas vamos entrar em outra fase e temos de nos preparar”. Estas são as declarações da presidente Dilma em uma entrevista concedida à TV Al Jazeera, na semana passada. Pelo menos desta vez a presidente demonstrou algum conhecimento de teoria econômica que, infelizmente, se esgotou na frase seguinte: “Se não surgir pro resto do mundo, eu te asseguro que vai surgir para o Brasil”.
Parece que o otimismo do ministro Mantega está contaminando a presidente. Já temos repetido nesta coluna que, desde que o ciclo tornou-se sincronizado a nível mundial, o que se consolidou com a globalização, os destinos de todos os países estão ligados principalmente quando o trem desce a ladeira. Seria mais importante se a presidente e sua equipe explicassem por que, quando os outros já estão estabilizando suas economias (lentamente e a duras penas), nós continuamos a caminho do fundo do poço, embora a ritmos mais moderados.
As notícias da semana confirmam o quadro pessimista. O Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-BR), de maio, mostrou que a economia ficou estagnada nos dois primeiros meses do segundo trimestre, o que aponta para dois trimestres seguidos de queda no crescimento da economia. Em maio, em relação a abril, a queda foi de 0,18%.
O Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre-FGV), no seu Boletim Macro, de julho, calcula que o valor adicionado da indústria de transformação terá uma queda de 1% no ano, o que obriga a uma revisão para o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de 1,6% para 1%. O Boletim Focus do BC também revisou suas projeções, reduzindo para 1,05% o crescimento do PIB, em 2014, enquanto elevou as estimativas do IPCA (que mede a inflação), de 6,48% para 6,51%.
Não é por acaso que esta desaceleração já começa a agravar os dados do emprego. Segundo o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), a indústria demitiu 28,5 mil trabalhadores, no mês de junho, situação semelhante à de maio. Isto era esperado, pois a produção já acumulava, de janeiro a maio, uma queda de 1,6%. Empresas de consultoria como a LCA Consultores estimam que foram fechadas 74,5 mil vagas na indústria em todo o ano. No segundo trimestre foram eliminadas 59,6 mil vagas.
Estes dados ainda não mostram toda a gravidade da situação. Entre janeiro e maio o número de operários em “layoff” já ultrapassava o total acumulado de 2013, atingindo 7.514. Por esse sistema os trabalhadores ficam sem trabalho de 2 a 5 meses e recebem uma “bolsa-qualificação” que chega a R$1.304,65, tendo o resto do salário complementado pela empresa. Só no setor automotivo do ABC paulista há 1.300 metalúrgicos neste sistema. Mas há inúmeros outros exemplos. A Volkswagen em São José dos Pinhais (PR) afastou 400 operários e em São Carlos mais 70. A Eletrolux afastou 120 trabalhadores e a Smalte, outros 40. Todos em sistema de layoff. E o fenômeno se espalha para outras regiões do país.
A queda da produção e as desonerações dadas pelo governo estão comprometendo a arrecadação que continua baixa, o que está obrigando a criação de “receitas extraordinárias” para atingir a meta de R$80,8 bilhões de superávit primário ou recorrer a outras manobras contábeis, na tentativa de enganar o “mercado”. Este quadro esteve por trás da decisão do Copom que resolveu manter a taxa Selic em 11% em sua última reunião, com a desculpa de que, apesar de tudo, a inflação vem apresentando uma “trajetória de convergência para a meta”.
O pior é que o horizonte internacional continua nublado com a indústria da União Europeia caindo 1,1%, entre abril e maio, com a ameaça de estouro do Banco Espírito Santo SA de Portugal, com o anúncio de demissão de 18.000 empregados da Microsoft, com o Banco Central Europeu (BCE) preocupado com os ativos podres dos bancos europeus, etc.
Será que estamos diante de mais uma marolinha?



[i] Professor Emérito da UFPB e Coordenador do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira progeb@ccsa.ufpb.br); (www.progeb.blogspot.com).
Share:

0 comentários:

Postar um comentário

Novidades

Recent Posts Widget

Postagens mais visitadas

Arquivo do blog