quarta-feira, 17 de setembro de 2014

O “mercado” manda e nós obedecemos

Semana de 08 a 14 de setembro de 2014

Rosângela Palhano Ramalho[i]

            Faltando poucos dias para a eleição, os candidatos à presidência travam embates em relação à área econômica. O que surpreende é que não há nada de novo nas propostas apresentadas pelos três primeiros colocados. Todos são assessorados por economistas que partilham da mesma visão: a de que o tripé macroeconômico (regime de metas de inflação, câmbio flexível e metas de superávit primário) é o melhor remédio para a saúde da nossa economia. Até mesmo a candidata à reeleição, que não adota o mecanismo em sua plenitude, sequer cogita assumir que o abandonou ou que não o considera a melhor alternativa.
            O que não podemos esquecer é que continuamos numa conjuntura de crise. O resgate do tripé exigirá sacrifícios que acentuarão ainda mais a recessão no país. Ainda mais com uma situação econômica que só piora. O novo Boletim Focus projeta, para 2014, um crescimento do PIB de apenas 0,5%. A inadimplência continua a subir. Segundo levantamento do Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil), o número de consumidores com contas atrasadas subiu 5,09%, em agosto, comparado a agosto do ano passado. E em relação a junho, este indicador cresceu 0,28%. O setor automobilístico continua a registrar queda das vendas e seus representantes passaram a admitir um declínio de dois dígitos, no fim do segundo semestre.
Para os candidatos de oposição não há nada a fazer a não ser os ajustes, as reformas necessárias ou, melhor dizendo, o arrocho. O arrocho permitirá, segundo eles, combater o baixo crescimento econômico, a alta inflação e o alto déficit em conta corrente. Além do cumprimento total do tripé, o “mercado” e a maioria dos economistas, consideram que se houver liberdade econômica e clareza no comunicado das instituições governamentais, liberar-se-á, no futuro, uma maior capacidade produtiva, que permitirá um crescimento “sustentado”, pois os “investidores” ficarão mais confiantes e dispostos a investir.
Conclui-se então, a partir desta argumentação, que a crise que amargamos foi causada por erros dos gestores da política econômica e não das condições objetivas que fazem parte da evolução do processo econômico e, que, não por acaso, se repetirão continuamente.
Os economistas e os analistas do “mercado”, maliciosamente, continuam a pressionar e a responsabilizar o governo pela crise e pela piora dos “fundamentos macroeconômicos”. Esta marcação cerrada já rendeu a demissão antecipada do ministro da Fazenda, Guido Mantega. Acusado de ser irresponsável em suas decisões e de partilhar de uma visão “desenvolvimentista”, o ministro deverá sair do cargo, como bode expiatório, abandonado por Dilma e por Lula.
Enquanto isso, o “mercado”, que já havia “marinado”, mantém a pressão costumeira e continua a especular sobre o candidato que melhor atenderá, quando eleito, os seus interesses.
            Esta semana, cerca de 500 clientes do Bank of America Merrill Lynch (BofA) reuniram-se em um hotel em São Paulo, para que os coordenadores da campanha do PSB apresentassem o programa de governo da candidata Marina Silva. As propostas, segundo os participantes, agradaram. Mas não bastou. O mesmo público ainda quer ouvir a candidata à reeleição Dilma Rousseff (PT) e o senador mineiro Aécio Neves (PSDB).
Depois desta, pareceu despropositado o embate que acontece entre Dilma e Marina sobre os vínculos com os bancos e o crescimento dos lucros bancários. As duas candidatas se autoacusam: Marina acusa a presidente e seu antecessor de ter propiciado o aumento significativo dos lucros dos bancos e Dilma acusa a adversária, por receber o apoio de Neca Setúbal, herdeira do banco Itaú.
Para se ter ideia da influência do setor financeiro, a agência de rating Moody’s revisou de “estável” para “negativa” a perspectiva da nota de crédito do Brasil. Segundo a instituição o crescimento baixo, a piora nos indicadores da dívida e a piora das expectativas dos investidores, motivou a mudança. Um detalhe é que esta revisão só se concretizará daqui a 12 ou 18 meses. Mesmo assim houve uma pressão imensa para que a presidente se pronunciasse. Ao lamentar a possível decisão, a presidente declarou que sempre desejou o melhor para o Brasil, mas que diante da conjuntura, os esforços não foram suficientes.
Só nos resta a lamentar que o Brasil continue de joelhos frente ao mercado financeiro.
Quando é que os interesses do povo serão discutidos?



[i] Professora do Departamento de Economia da UFPB e pesquisadora do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com)
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