terça-feira, 26 de julho de 2016

A alegria que durou pouco

Semana de 18 a 24 de julho de 2016

Rosângela Palhano Ramalho[i]

A frase “Não pense em crise, trabalhe” foi proferida pelo presidente interino em seu discurso de posse e espalhada em outdoors pelos quatro cantos do país. De acordo com esta visão simplista, a crise econômica é fruto do pensamento pessimista que se espalhou devido aos “desmandos” do governo de Dilma Rousseff. Então basta cantarolar feliz, esquecer os problemas, sinalizar mudanças e arrumar as contas públicas, recuperando a “credibilidade” que logo esta fase passa.
Mas a realidade objetiva teima em se impor e os números da atividade econômica mostram que a recuperação da “confiança” dificilmente afetará a economia real. A Confederação Nacional da Indústria (CNI) lançou a Sondagem Industrial e detectou que todos os indicadores de expectativas variaram positivamente em junho. Os índices de expectativa de demanda, de exportação, de compras de matérias-primas e de emprego vêm crescendo. Mas, ressalta a CNI, embora em ritmo mais leve, “no lado real, a contração continua”. Como os estoques caíram em 1,1% e a utilização da capacidade instalada permanece em 64%, desde março de 2016, a grande dúvida é se os anseios das sondagens virarão produção efetiva. O índice de intenção de investimento subiu apenas 0,2%, em junho, e o pequeno crescimento da indústria de bens de capital parece não ser suficiente para alavancar a Formação Bruta de Capital Fixo que fechará o ano com queda entre 7% e 10%, segundo as mais recentes estimativas.
A venda de fogões, lavadoras de roupa e refrigeradores, no primeiro semestre do ano, caiu 9,8%, em volume, em relação ao primeiro semestre de 2015, segundo a Eletros. Na linha marrom, setor que inclui os televisores, a queda foi de 18,7% e entre os portáteis, o tombo das vendas foi de 19%. Em tempos de crise, as empresas continuam a tomar medidas visando reduzir custos. A Brasil Kirin, que já havia vendido uma fábrica de cerveja no Rio de Janeiro para a Ambev, está negociando a venda de duas outras unidades para a Heineken, situadas no Ceará e em Goiás. E a General Mills, fabricante americana de alimentos, fechará as fábricas de Marília e São Bernardo do Campo, em São Paulo. Serão 420 trabalhadores desempregados.
O setor de construção civil registrou, no primeiro semestre de 2016, uma queda de 11,1% na construção por metros quadrados, segundo a Tendências Consultoria. Em agosto, uma comitiva do setor chegará, com o prato na mão, ao Palácio do Planalto.
O cenário desolador que se impõe, transmite urgência às tomadas de decisão do governo Temer. O presidente interino chegou entusiasmado ao seu gabinete esta semana, comemorando o resultado da pesquisa Datafolha noticiado no sábado (16). A pesquisa, divulgada pelo jornal Folha de São Paulo, indicou que 50% dos entrevistados preferem que Michel Temer siga na presidência até 2018. Logo, o mandatário queria lançar as medidas econômicas para suavizar a divulgação do contingenciamento do Orçamento. O ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, ao comentar a pesquisa do Datafolha destacou que o “rumo, o esforço, a determinação e o foco do governo, especialmente na área econômica e nas relações com o Congresso Nacional, estão propiciando que a esperança criada com a posse de Temer se converta, progressivamente, em confiança”.
Mas... Em 24 de julho, em um artigo de título “A Folha errou e persistiu no erro”, a ombudsman da Folha de São Paulo, Paula Cesarino Costa, assumiu que o jornal publicou dados incompletos sobre a pesquisa Datafolha. Na pergunta “O que é melhor para o país?” 62% dos entrevistados disseram preferir novas eleições, 19% Temer continuar, 12% o retorno de Dilma e 7% deram outras respostas. A Folha isolou os 62%, que preferiram novas eleições, e pesquisou os 38% restantes. Daí, surgiu 50% dos entrevistados que preferem Temer.
Na verdade, para 81% dos entrevistados quaisquer outras saídas à crise política são melhores que o governo Temer.
E agora? Cadê a confiança?
Alegria de interino dura pouco.

[i] Professora do Departamento de Economia da UFPB e pesquisadora do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com.br) Contato: rospalhano@yahoo.com.br
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quinta-feira, 21 de julho de 2016

quarta-feira, 20 de julho de 2016

Recuperação ou fundo do poço

Semana de 11 a 17 de julho de 2016

Nelson Rosas Ribeiro[i]

Nos últimos tempos tem aumentado o berreiro sobre a recuperação da economia. Os economistas do governo, as autoridades, os jornais, a TV Globo, os comentaristas, todos fazem questão de criar um ambiente otimista sobre o fim da crise. E isto é decisivo para o governo já que todos acreditam que os movimentos da economia são regidos por “expectativas” dos agentes. Quando a expectativa é negativa a economia afunda. Se for positiva, otimista, por milagre o crescimento é retomado. Tudo é uma questão de credibilidade. Assim, uma vez derrubado o PT, superada a corrupção, criada uma equipe econômica “confiável”, com um bom e sério governo, teria sido restaurada a credibilidade e a economia deveria entrar em recuperação. Infelizmente, apesar do berreiro, os únicos indicadores que são apresentados são indicadores subjetivos e duvidosos que reportam o humor dos empresários, consumidores e “investidores”. Os indicadores objetivos apontam, em outra direção. Vou apenas citar alguns exemplos.
Em maio, em relação à abril, o varejo caiu 1%, a venda de materiais de construção, 3,7% e os serviços 0,1%. A indústria se manteve estável e o desemprego ficou nos 11,2%. No entanto o número de pessoas que recebem menos que um salário mínimo aumentou de 19,4% para 23,5% e a previsão é que, até o final do ano, o número dos empregados com carteira assinada caia, de 57,2%, para 55%. A Volskwaguem de São Bernardo do Campo está promovendo a demissão de 3,6 mil operários, 30% do total do pessoal ocupado, além de cortar gratificações, pagamentos de horas extras, adicionais por serviço noturno e insalubridade. Admite-se que a queda na indústria automobilística já atinge os 20%.
Para agravar a situação o processo de valorização da moeda nacional ante o dólar continua apesar das intervenções do Banco Central (BC) que, contrariando as promessas de restauração do tripé macroeconômico (meta de inflação, superávit primário, câmbio flutuante), remove a perna do tripé do câmbio flutuante, voltando à política de “flutuação suja” usada pelo ex-ministro Mantega e tão criticada na época. A valorização do real dificulta as exportações tidas como um dos estímulos à recuperação.
Se a economia patina, o governo se enterra em contradições.
O resultado das privatizações já realizadas não está sendo o esperado. A receita vinda da entrega dos aeroportos não vem sendo recolhida, pois as concessionárias não pagam. Seis delas já devem ao governo R$2,6 bilhões, sem contar os juros (Viracopos R$173,7 milhões; Guarulhos R$1,1 bilhões; Galeão R$933,4 milhões; Confins BH R$74,4 milhões, etc.) Nas rodovias a situação é semelhante e os investimentos prometidos não estão sendo realizados. E o governo não cobra como também não vem cobrando os impostos devidos por grandes empresas que os utilizam como forma de capitalização, já que o crédito no sistema bancário continua escasso e sendo reduzido.
Com esses dados não nos parece que haja sinais de recuperação à vista. Tudo indica que nos aproximamos do fundo do poço, ou seja, a situação ainda está piorando, mas a um ritmo mais lento. 
No campo político o governo sofreu uma derrota na eleição para a presidência da Câmara com a vitória do candidato do DEM que contou até com os votos de parte do bloco aliado ao PT. Era preciso remover o defunto Eduardo Cunha do ambiente. O resultado criou uma grande alteração nas alianças dos partidos representando um rude golpe no “centrão”, o que obrigará Temer a rever a sua base de apoio. Mais complicação para o governo: gerir agora uma aliança PMDB – PSDB – DEM.
As esperanças de uma recuperação, no entanto, estão condicionadas por acontecimentos internos e externos. Internamente será difícil estimular a economia mantendo-se uma política de austeridade fiscal defendida fanaticamente pelas forças que estão no poder. Externamente, dependemos da recuperação da economia mundial, o que se torna cada vez mais difícil diante da ameaça de uma nova crise em gestação, agravada pelo Brexit, saída do Reino Unido da União Europeia, e das dificuldades da economia chinesa que continua a se arrastar.
Por enquanto ficamos no fundo do poço.

[i] Professor Emérito da UFPB e Coordenador do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira; nelsonrr39@hotmail.com; (www.progeb.blogspot.com).
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quarta-feira, 13 de julho de 2016

A culpa é sua, trabalhador!

Semana de 04 a 10 de julho de 2016

Rosângela Palhano Ramalho[i]

Caro leitor, em meio a uma crise política que parece longe de acabar, a economia brasileira continua a amargar maus resultados. A produção industrial ficou estável entre abril e maio, de acordo com a Pesquisa Industrial Mensal Regional do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), interrompendo a sequência positiva de 1,4%, em março, e 0,2%, em abril. Em oito dos 14 locais pesquisados houve queda da atividade. O resultado foi recebido com surpresa (exceto por nós que fazemos esta coluna) já que se esperava uma inflexão, uma saída do fundo do poço. Dados da Confederação Nacional da Indústria (CNI) mostram que o faturamento real do setor caiu 3,8% e as horas trabalhadas na produção recuaram 3,6%, em maio, comparado a abril. A utilização da capacidade instalada foi de 77% e o emprego industrial caiu 0,8%, em maio. Diante do quadro sombrio, a instituição alterou sua projeção de uma queda do Produto Interno Bruto (PIB) de 3,1% para 3,5%, em 2016, com queda da produção industrial de 5,4%. O recuo da atividade pode ainda ser verificado pelo sucessivo aumento do desemprego. Segundo a PNAD Contínua, em maio, o desemprego atingiu 11,2%. E não restou alternativa ao ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, a não ser reconhecer que a taxa pode chegar a 14%, até dezembro. Finalizando o retrato nebuloso, veja-se o expressivo aumento dos pedidos de falência e de recuperação judicial no país. De acordo com a Boa Vista SCPC, no primeiro semestre deste ano, os pedidos de falência aumentaram 26,5%, comparado ao mesmo período de 2015 e, segundo a Serasa Experian, os pedidos de recuperação judicial elevaram-se em 87,6%.
Esses resultados falam por si só e são derivados da conjuntura de crise. Com uma equipe econômica altamente conservadora deveremos esperar o pior. O presidente do Banco Central ao assumir seu posto, se adiantou em afirmar que “o velho e bom tripé macroeconômico: responsabilidade fiscal, controle da inflação e câmbio flutuante” está de volta. Mas, Ilan Goldfajn, em entrevista recente ao Jornal Valor Econômico, jogou o tripé no lixo: “Não sou advogado de um câmbio flutuante puro em economias emergentes”. Segundo a nova equipe a intervenção no mercado de câmbio continuará e será pontual. E como a responsabilidade fiscal em virtude do desarranjo geral não será alcançada tão cedo, duas das pernas do tripé foram amputadas. Restou-nos o velho e bom “saci” macroeconômico: o controle da inflação por meio dos juros altos. Esta será a “questão de primeira ordem”.
O presidente do Banco Central declarou também saber dos efeitos que o ajuste fiscal provocará e da dimensão da crise econômica. Segundo ele, “[...] o desemprego subiu muito, o ajuste fiscal vai ocorrer ao longo do tempo, vai exigir reformas, vai exigir medidas.” Portanto, devemos estar preparados.
O leitor assíduo desta coluna já sabe quem vai pagar o pato. Mas, a emblemática declaração do presidente da CNI (Confederação Nacional da Indústria) reforça perfeitamente a questão. Robson Andrade em encontro com o presidente interino Michel Temer com cerca de 100 empresários do Comitê de Líderes da Mobilização Empresarial pela Inovação (MEI), disse que o déficit fiscal será sanado com “mudanças duras” na Previdência Social e nas leis trabalhistas. Citando o exemplo da França (onde as propostas de mudanças das leis trabalhistas estão sendo ferozmente combatidas nas ruas), falou: “No Brasil, temos 44 horas de trabalho semanal. As centrais sindicais tentam passar esse número para 40. A França, que tem 36 passou, para a possibilidade de até 80 horas de trabalho semanal (sic) e até 12 horas diárias de trabalho.”.
E finalizou solenemente: “O mundo é assim. A gente tem que estar aberto para fazer essas mudanças. E nós ficamos aqui realmente ansiosos para que essas mudanças sejam apresentadas no menor tempo possível”.
Após o alarido geral causado pela declaração, a CNI em nota disse que não era bem assim, mas o que está dito, está dito: você trabalhador é o grande culpado porque está trabalhando pouco.

[i] Professora do Departamento de Economia da UFPB e pesquisadora do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com.br) Contato: rospalhano@yahoo.com.br
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terça-feira, 5 de julho de 2016

O Brexit e a crise

Semana de 27 de junho a 03 de julho de 2016

Nelson Rosas Ribeiro[i]

           
O plebiscito realizado dia 23 de junho no Reino Unido (RU) foi o assunto mais comentado da semana. A aprovação por uma pequena maioria do Brexit, sigla que identificou o processo de saída dos britânicos da União Europeia (UE), abalou os fundamentos da Europa unida e agora se teme a desagregação do bloco. A vitória do Brexit mostrou o grande descontentamento das populações com os partidos políticos que se revezam no poder, com as desigualdades e os problemas sociais que não encontram solução. O arrastamento da crise econômica, que não termina, a espera de uma recuperação, que se arrasta, os problemas do desemprego, da imigração e dos refugiados, são os temperos que possibilitaram a virada que enganou até os experientes George Soros e o Deutsche Bank, o mais poderoso banco europeu.
Agora se discutem as consequências e a forma como o desligamento será realizado. França e Alemanha pressionam o Reino Unido para que oficialize o pedido de desligamento para que as ações possam ser iniciadas. O destroçado governo inglês, após a renúncia do primeiro ministro, não consegue tomar nenhuma iniciativa a espera das decisões do parlamento. As bolsas despencam, as ações dos bancos e das empresas caem, o sistema financeiro entra em pânico. Segundo George Soros o Brexit pode precipitar a crise.
Se o ciclo mundial entrar em nova fase de crise já temos um culpado: os britânicos.
Em várias análises anteriores já vínhamos apontando sinais da aproximação de uma nova crise mundial, que daria início a um novo ciclo. A característica deste novo ciclo é que ele se precipitou, seguindo a mesma periodicidade do anterior, o de 2008. O Fundo Monetário Internacional (FMI) já havia observado que todo o socorro feito aos bancos pelos Bancos Centrais (BCs) e o afrouxamento monetário (quantitative essing) que despejou trilhões de dólares no mercado não foi suficiente para dar início a uma forte recuperação. O FMI já havia observado a fragilidade do Deutsche Bank AG, e alertado para a possibilidade de um estouro. Outros bancos como o HSBC Holding e o Credit Suisse Group também foram citados na lista dos vulneráveis. O FMI alertou ainda que as consequências seriam graves para as economias da Alemanha, França, Reino Unido e EUA. Com a decisão dos britânicos a situação deve agravar-se e já começou o salve-se quem puder. É o que assistiremos nas próximas semanas.
Esta situação terá duras repercussões no Brasil e será mais um entrave nos planos do governo Temer. A economia nacional continua péssima apesar de todo o esforço do governo em dourar a pílula e mobilizar um batalhão de empresários para, como claque organizada, realizar manifestações de aplausos e apoio e oferecer um público onde ele possa fazer seus canhestros discursos sem risco de ser vaiado. Uma das características do agravamento de uma crise é o crescimento do número de falências de empresas de grande porte. Isto é o que precisamente está ocorrendo agora. Para não falar na Petrobras e Sete Brasil, traiçoeiramente assaltadas pelas gangues partidárias, temos os casos de pedidos de recuperação judicial da telefônica Oi, das siderúrgicas Usiminas e CSN, da mineradora Samarco, de 15 grupos do setor sucro alcooleiro, da aérea Gol, etc. Por mais que o IPEA e o IBGE, agora devidamente aparelhados pelo PMDB, busquem divulgar dados manipulados nada conseguirá enganar os agentes econômicos.
A situação continua a agravar-se. Não chegamos ao fundo do poço, o crédito continua caro e escasso, as taxas de juros e o desemprego elevados e as vendas e a produção continuam em queda. E, com Meirelles, vem mais arrocho por aí.
O governo Temer não consegue sequer unificar sua base parlamentar de apoio, a mesma base fisiológica, corrompida, formada pelo “centrão” e pelo PMDB que considera ter chegado sua vez de atirar-se à mesa para o banquete.
E é preciso ainda satisfazer os interesses do PSDB e DEM que espreitam a oportunidade para cobrar dividendos.

[i] Professor Emérito da UFPB e Coordenador do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira; nelsonrr39@hotmail.com; (www.progeb.blogspot.com).
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