segunda-feira, 31 de dezembro de 2018

2019: O ano do mit... mico


Semana de 24 a 30 de dezembro de 2018

Rosângela Palhano Ramalho [i]

Nesta última semana do ano disponibilizamos a derradeira análise de conjuntura de 2018 agradecendo àqueles que nos acompanharam semanalmente. Nos despedimos do ano que finda desejando o melhor para o ano vindouro. Mas como temos consciência de que os nossos desejos nem sempre se tornam realidade, vamos aos fatos.
Embora a maioria dos prognósticos econômicos para 2019 sejam positivos, com média de crescimento para o PIB de 3%, os últimos dados da conjuntura não permitem afirmar que este número será real. A Associação Brasileira de Lojistas de Shopping (Alshop) apurou que as vendas dos lojistas em shopping centers cresceram nominalmente 5,5% neste Natal em relação ao mesmo período do ano passado. A alta foi menor 0,5 ponto percentual que a apresentada em 2017. Se a inflação do período for considerada, a queda é mais clara: o crescimento real nas vendas das lojas de shoppings fechou em 1,8% quando a elevação de 2017 foi de 3%.
Quanto ao emprego, os últimos números da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua do IBGE (Pnad contínua) mostram que a taxa de desocupação fechou em 11,6% no trimestre móvel encerrado em novembro de 2018. Houve queda de 0,5 ponto percentual em relação ao trimestre de junho a agosto de 2018 e, em relação ao mesmo trimestre móvel de 2017, a queda foi de 0,4 ponto percentual. O número de trabalhadores desalentados, que ainda é muito alto (4,7 milhões), ficou estável em relação ao trimestre junho a agosto de 2018 e subiu 9,9% em relação ao mesmo trimestre de 2017. O número de empregados no setor privado com carteira assinada foi de 33 milhões mantendo-se estável. 11,7 milhões é o total de empregados sem carteira assinada e 23,8 milhões representa o total de trabalhadores por conta própria, ambos apresentando o maior contingente da série histórica. É uma tragédia. A resiliência do mercado de trabalho brasileiro mostra que o problema não reside apenas nas questões políticas. A saída de Dilma e dos “petistas” do poder, o desmonte de algumas políticas econômicas e a aprovação da reforma trabalhista não salvaram o Brasil do desemprego, nem produziram grandes prodígios econômicos.
Portanto, o que esperar em 2019? Indicadores econômicos já apresentados em análises anteriores mostram que o milagre esperado, com a ascensão de um novo presidente da República ao Planalto, não irá acontecer. A análise pragmática da realidade nos apresenta uma economia com alta capacidade ociosa, níveis baixíssimos de investimento público, baixa taxa de juros, baixa inflação e alto desemprego. São enormes os desafios da próxima gestão mesmo sem considerar as ameaças externas.
Os prognósticos ficam ainda piores se olharmos para os diferentes interesses dos grupos que formatam o governo Bolsonaro: além da prole do presidente temos os liberais, militares, evangélicos e ruralistas. Desengessar, desmontar, reduzir o tamanho do Estado, desregulamentar, são as palavras de ordem dos integrantes do novo governo.
O discurso soa fácil. E daí, se o Estado perder a sua função social? E daí, se o mercado de trabalho estiver cada vez mais próximo da informalidade? E daí, se o sistema S for liquidado? Quem liga para o Mercosul? E daí, se os trabalhadores sem-terra forem tratados como terroristas? E daí, se fecharmos o supremo apenas com um soldado e um cabo? E daí, se a posse de arma de fogo for liberada ao cidadão comum? E daí, se as relações com Israel forem estreitadas e desagradarem alguns “árabes”? E daí, se eliminarmos os “vermelhos”?
O que mais assusta é o desinteresse em relação às consequências destes atos, caso se concretizem. Parece que se ignora que elas recairão sobre uma sociedade formada por pessoas, seres humanos.
Neste cenário tudo leva a crer que o tal mito, figura alegórica criada por alguns e encampada por seguidores em redes sociais (que representam apenas 3,92% da população brasileira), terá que descer do seu pedestal artificial e reduzir-se a sua verdadeira pequenez sabendo que governará para 209,2 milhões de brasileiros.
Será 2019 o ano do mito ou do mico?

[i] Professora do Departamento de Economia da UFPB e pesquisadora do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com.br) Contato: rospalhano@yahoo.com.br

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terça-feira, 25 de dezembro de 2018

As contradições na formação do governo Bolsonaro


Semana de 17 a 23 de dezembro de 2018

Lucas Milanez de Lima Almeida [i]

Prezado leitor, apesar da presente coluna tratar de análise de conjuntura econômica, não podemos deixar de lado o entendimento das alianças realizadas em torno daqueles que irão exercer o poder político nos próximos quatro anos. Dentre outras coisas, o resultado dos acordos realizados entre as classes sociais (e suas frações) será o grande fio condutor das ações governamentais daqui por diante.
A primeira coisa a destacar, e mais flagrante, é que os grupos de maior poder econômico são aqueles com maior potencial de impor suas pautas e interesses. Por isso, existem frações da sociedade que tendem a ser mais beneficiadas nas políticas públicas. No Brasil, desde a década de 1990, a elite financeira tem seus interesses atendidos pelos sucessivos governos. Atualmente, uma forma prática de vermos isto é através dos resultados dos balanços anuais dos bancos, que, ano após ano, apresentam lucros cada vez maiores. No governo que se forma, para o período 2019-2022, o superministro Paulo Guedes e sua equipe devem garantir a manutenção e, sem dúvida, reforçar esta situação de dominação.
Uma das grandes bandeiras levantadas pelo setor financeiro é a liberalização e desregulamentação dos mercados: quanto mais “livre” for a mobilidade de dinheiro (entrando e saindo nas diferentes áreas), mais fácil se pode ampliar a rentabilidade das aplicações. A forma de abertura, contudo, pode não ser do interesse de toda classe empresarial. Já citamos, em colunas anteriores, algumas pérolas do futuro superministro. Dentre tantas, lembramos aquela sobre o Mercosul, quando Guedes, além de reduzir a importância do bloco, resolveu criticar e ameaçar os acordos vigentes. Caso cumpra as promessas, suas ações atingirão em cheio grande parte da elite industrial que tem como principal destino das exportações dos seus produtos os mercados da região latino-americana.
Engrossando a fileira dos prováveis insatisfeitos com as medidas favoráveis ao setor financeiro estão os integrantes de alta patente das forças armadas brasileira. Apesar de um general de quatro estrelas ser o vice-presidente, ele está na reserva, goza de menor influência sobre os ativos e, tal como o próprio Bolsonaro, não é unanimidade dentre os oficiais superiores e generais ativos. O motivo maior para a insatisfação dos milicos é a perda de soberania nacional resultante do processo de privatização generalizada defendido pelo super ministro, Paulo Guedes. Já prontos, deixados de presente por Temer, existem projetos de leilões para 12 aeroportos, 4 terminais portuários e 1.537 km de ferrovias. Além dessas, existem 80 projetos que podem ser realizados nos próximos anos.
Mas, isto não significa que interesses de outras frações da elite econômica não sejam atendidos. Por exemplo: a quem interessa a mudança no processo de demarcação de terras e a estúpida lógica de “integração do índio ao Brasil”? Isto é uma bandeira de setores da agroindústria, que é pop mas não é besta. A parcela mais atrasada da elite rural, que se baseia na agropecuária extensiva, e os empresários do setor extrativo, que buscam explorar seus recursos naturais, são os que mais se beneficiariam com as mudanças nas leis que tratam do meio ambiente e dos povos tradicionais.
A ideia de jerico de unir os Ministérios do Meio Ambiente e da Agricultura logo foi descartada. Não por um lampejo de consciência, mas porque os grandes exportadores da agroindústria foram internacionalmente ameaçados de suspensão das compras, caso o Brasil não apresentasse o mínimo de respeito à natureza e aos povos locais. Coisa parecida está acontecendo com o Acordo de Paris, que foi novamente criticado por Bolsonaro e já gerou reação dos chefes de governo da Alemanha e da França, que ameaçaram não realizar negócios com “países poluidores”.
E olhe que não reservamos espaço para falar da loucura desvairada dos ministros pitorescos. A partir do que vimos na campanha, por não dizer muita coisa para além do “mudar isso daí”, o caro leitor acha que Bolsonaro vai conseguir harmonizar as contradições durante todo seu governo?
Se não há resposta, perguntemos no Posto Ipiranga. Quem sabe eles nos digam onde está o Queiroz...

[i] Professor do Departamento de Economia da UFPB e coordenador do PROGEB – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com; lucasmilanez@hotmail.com)
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quarta-feira, 19 de dezembro de 2018

Expectativas para o novo ano e governo


Semana de 10 a 16 de dezembro de 2018

Nelson Rosas Ribeiro[i]
           
O panorama externo continua sombrio. Nos EUA, empresas como a Pimco, que administra US$1,72 trilhão em recursos, avisou seus clientes que a probabilidade de recessão no país subiu para 30%, nos próximos 12 meses. Na União Europeia (UE), o Banco Central Europeu (BCE) vê a desaceleração na zona do euro e estima em 1,9% a taxa de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) em 2018, preocupado com a situação da Itália, Alemanha e França. Decidiu manter suas taxas de juros incluindo as taxas negativas de 0,4% para os depósitos bancários. Demonstrou preocupação com a situação de 19 países. Mario Draghi, seu presidente, lastima que precisará de mais tempo para reduzir os estímulos que o banco vinha praticando, afirmando que os riscos aumentaram por causa da onda protecionista, das turbulências geopolíticas e da vulnerabilidade dos mercados emergentes. No terceiro trimestre a taxa de crescimento caiu para 0,2%.
A relação EUA x China subiu de tenção com a prisão, no Canadá, a pedido dos americanos, de Meng Wanzhou, diretora da Huawei, gigante chinesa da informática.
Depois das declarações do presidente da França Emmanuel Macron de que não negociará com países que não respeitam o acordo do clima de Paris, foi a vez de Ângela Merkel, premier da Alemanha, fazer declaração no mesmo sentido. São mais dificuldades para o acordo de livre comércio Mercosul e União Europeia.
Estas são novidades que apontam para o agravamento do ambiente externo.
Internamente continua a “tragédia lenta e errática da recuperação da atividade econômica” segundo as palavras da MCM Consultores Associados.
De fato, o IBC-Br, indicador antecedente do PIB calculado pelo Banco Central (BC), apontou para um crescimento de apenas 0,02% da economia, em outubro. Outro indicador negativo veio da Pesquisa Mensal do Comércio (PMC) feita pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Em outubro, as vendas do varejo restrito caíram 0,4% e as do varejo ampliado (que inclui veículos e materiais de construção) caíram 0,2%. As quedas foram generalizadas: tecidos, vestuários e calçados (-2%), móveis e eletrodomésticos (-2,5%), equipamentos e materiais de escritório (-0,8%). A principal causa apontada foi o desemprego.
Tudo indica que os resultados para o quarto trimestre serão mornos.
O IBGE divulgou ainda uma série de indicadores que mostram a gravidade dos problemas sociais que afetam a desigualdade de renda, a educação, a habitação e o mercado de trabalho. Em 2017 o número de pobres aumentou 1,97 milhão, ou seja, 3,7%, passando a 52,8 milhões de pessoas, 26,5% da população. A extrema pobreza também cresceu 12,5%, passando a 15,2 milhões e representando 7,4% da população do país. A taxa de desemprego subiu de 6,9%, em 2014, para 12,5%, em 2017 e o trabalho informal neste ano alcançou 37,3 milhões de pessoas, ou seja, 40,8% da população ocupada.
A fragilidade da situação econômica levou o Comitê de Política Monetária (Copom), órgão do BC, a manter a Selic em 6,5%, considerando também que os núcleos da inflação estão sob controle e em nível “confortável”, substituindo a palavra “apropriado”. No entanto também alertou para o cenário externo, com as incertezas do comércio global e o aumento da aversão ao risco.
Neste ambiente, uma ampla maioria da população (64%) tem expectativas positivas sobre o novo governo, segundo pesquisa do IBOPE/CNI e 74% acham que ele está no caminho certo.
Parece que os escândalos envolvendo a família Bolsonaro e os processos pendentes sobre vários de seus ministros (além da quase debilidade mental demonstrada por alguns deles) e nem mesmo as falas do presidente eleito defendendo praticamente a extinção da legislação trabalhista, abalaram a fé das multidões.
Nem a fé do novo “time dos sonhos” agora formada pelos Chicago’s oldies (velhos de Chicago) como se auto intitula a equipe do ministro Guedes.

[i] Professor Emérito da UFPB e Vice-Coordenador do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira; nelsonrr39@hotmail.com; (www.progeb.blogspot.com).

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quinta-feira, 13 de dezembro de 2018

Os “ses” que assombram 2019


Semana de 03 a 09 de dezembro de 2018

Rosângela Palhano Ramalho [i]

Sempre que se aproxima o final do ano, uma enxurrada de projeções para o ano seguinte é lançada. Na maioria das vezes, os prognósticos estão norteados pelas expectativas (daquilo que poderá acontecer) e por vezes, ignoram a realidade objetiva.
A realidade nos mostra que a atividade econômica mensurada trimestralmente, em 2018, não ultrapassou a barreira do 1%. O crescimento brando vem se impondo ao longo do tempo, apesar dos discursos “positivos” do governo. Salvar a economia da crise e das “políticas equivocadas” dos governos anteriores tornou-se a tônica, tanto do atual presidente (vice decorativo), quanto do futuro presidente (a “lisura em pessoa”).
Vai-se além... Não basta livrar-nos de “todos os pecados” cometidos anteriormente. Somos também convidados a disseminar o otimismo! Quem sabe assim, a coisa funciona! Torcer para que o novo governo dê certo virou discurso determinante para a realidade objetiva, embora a escolha dos nomes para os novos ministérios, por exemplo, aumente imensamente a probabilidade de dar errado. Age-se como se os fatos concretos dependessem diretamente dos nossos pensamentos e desejos.
Para o pífio crescimento deste ano, as mais variadas desculpas são dadas, como a “tensão” eleitoral de 2018, a greve dos caminhoneiros, o atraso do ajuste fiscal... Em contrapartida, para 2019, as previsões são de recuperação, semelhantes às realizadas nos anos anteriores e que, por sinal, vieram a se concretizar abaixo do esperado.
O UBS, por exemplo, está muito “confiante”. Avalia que estamos diante de um novo ciclo de expansão, começado em 2016 e que pode durar até 10 anos. O Credit Suisse estima que em 2019, o crescimento da economia brasileira mais do que dobrará: passará de 1,4%, neste ano, para 3%, ano que vem. A melhora do crédito e do mercado de trabalho aliados à possibilidade de realização das reformas pelo novo governo e a ociosidade elevada na economia, são fatores que, segundo a instituição, condicionarão este crescimento.
Já a pesquisa Focus realizada pelo Banco Central, mostrou que o mercado financeiro espera em 2019 um crescimento de 2,53% e, segundo a pesquisa, se a Reforma da Previdência acontecer, esta taxa pode superar os 3%. A projeção do economista Armando Castelar, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV), é de crescimento de 2,5% ou de 3% se houver a aprovação das reformas. Fechando o rol das projeções para 2019, o futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, já adiantou “acreditar” em um crescimento de 3,5%.
Mas, voltemos à realidade. Após o crescimento de apenas 0,8%, no terceiro trimestre, a produção industrial de outubro lançou um balde de água fria sobre a recuperação. Neste mês, segundo dados divulgados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a produção cresceu apenas 0,2%, sobre setembro. Os analistas esperavam alta de 1,2%. Esta leve alta vem seguida de quedas sucessivas registradas em julho (-0,2%), agosto (-0,7%) e setembro (-1,8%).
Como cientistas, devemos sempre nos amparar na análise da realidade. Torcer ou repetir um mantra não mudará os fatos. Portanto, é pouco provável que a nossa recuperação aconteça vigorosamente como preveem os analistas, pois o nível de utilização da capacidade instalada de novembro, segundo a Fundação Getúlio Vargas, foi de 75,2%. Em outubro, era de 76,4%.
Vários “ses” põem em dúvida a tal recuperação econômica. Se o ajuste fiscal for realizado iremos de novo, ao fundo do poço, pois, em nenhum país do mundo, reformas fiscais levaram ao automático crescimento. Nunca é demais lembrar que os mais ansiosos pelas “reformas” são os vampiros do mercado financeiro. Portanto, o paraíso dos especuladores passa pela aprovação de reformas que garantirão o equilíbrio das contas e consequentemente manterão o país com o selo de bom pagador de juros.
Será que se não fizermos a Reforma da Previdência, o mundo acaba? Há controvérsias...
Cadê os prometidos empregos gerados pela Reforma Trabalhista?

[i] Professora do Departamento de Economia da UFPB e pesquisadora do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com.br) Contato: rospalhano@yahoo.com.br

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quarta-feira, 5 de dezembro de 2018

O PIB brasileiro no 3º trimestre de 2018


Semana de 26 de novembro a 02 de dezembro de 2018

Lucas Milanez de Lima Almeida [i]

Na última sexta-feira, dia 30 de novembro, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou o resultado do PIB brasileiro no terceiro trimestre de 2018: crescimento de 0,8% em relação ao 2º trimestre de 2018; 1,3% comparando-se com o 3º trimestre de 2017; e 1,4% no acumulado dos últimos 4 trimestres (entre outubro de 2017 e setembro de 2018).
Apesar de não surpreender os analistas, nem o próprio governo, que já esperavam uma expansão desta magnitude, seria surpreendente o papel exercido pelos investimentos: cresceram 6,6%, na comparação com o trimestre anterior, e 7,8% em relação ao mesmo trimestre de 2017. Este valor foi o resultado mais expressivo desde o 4º trimestre de 2009. Será, então, que a economia brasileira voltou aos tempos áureos?
A justificativa para a forte elevação na chamada Formação Bruta de Capital Fixo se deu por mera formalidade: só agora foram contabilizados, nas estatísticas oficiais, alguns investimentos em plataformas de petróleo realizados em anos anteriores. Diante disto, os dados foram “inflados” por essa questão contábil. O mesmo pode-se dizer acerca da balança comercial brasileira: os dados foram inflados por causa da contabilização das plataformas no fluxo comercial. De acordo com o IBGE, sem esta simples questão formal de registro de transações passadas, o crescimento do investimento, entre os 3º trimestres de 2018 e 2017, seria de 2,7%. Isto significa que não foram produzidas tantas máquinas e equipamentos a mais. Assim, podemos responder à questão final do parágrafo anterior: não, a economia brasileira não está “quente”, no máximo febril (e olhe lá) ...
Olhando a despesa nacional, vemos que o principal motor da economia em 2018 está sendo o consumo das famílias, No acumulado de 4 trimestres, encerrados em setembro, 64,1% do PIB brasileiro destinou-se ao consumo das famílias; seguido do consumo do governo, que absorveu 19,1% do PIB; e investimentos, que corresponderam a um total de 16,4% do PIB. O saldo comercial líquido (exportações menos as importações) representaram 0,3%. Isto demonstra que a economia nacional ainda está longe de apresentar um crescimento forte, tendo em vista que o consumo das famílias, apesar de importante, não é o elemento mais dinâmico e fomentador do crescimento. Este papel deve ser dos investimentos. Só para termos uma base de comparação, ao longo de 2013, quando a atividade econômica brasileira se expandiu em “apenas” 3,0%, a Formação Bruta de Capital Fixo consumiu um total de 20,9% do PIB.
Do lado da produção, quase todos os setores apresentaram expansão na comparação entre o 2º e o 3º trimestre de 2018. A agropecuária cresceu 0,7%, a indústria 0,4% e os serviços 0,5%. Vimos que, nos últimos 4 trimestres (entre outubro de 2017 e setembro de 2018), o PIB brasileiro cresceu 1,4%. As atividades que mais contribuíram para isto foram comércio (0,4%), indústria de transformação (0,3%) e atividades imobiliárias (0,2%). A única que se contraiu foi a construção civil (-0,1%). Já a indústria extrativa, os serviços industriais de utilidade pública (água, esgoto, energia, etc.), os serviços de informação e os serviços de intermediação financeira em nada contribuíram para aquele crescimento.
Estes dados mostram que a atual situação do país, apesar da melhora, não é de expansão generalizada do consumo e da produção. Significa, na verdade, que estamos caminhando em passos curtos na recuperação da crise vivida entre 2014 e 2016. Segundo o próprio IBGE, só agora a economia nacional atingiu um patamar de produção igual àquele vivido em 2011, mas ainda longe do pico registrado no começo de 2014. Para piorar, cresce cada vez mais o número de analistas internacionais e nacionais que preveem uma nova crise em escala mundial para os próximos anos. Isto seria desastroso para nossa recuperação, que, como mostram os dados, ainda não engatou nem a segunda marcha.
A situação do próximo governo será desafiadora. A economia nacional andando devagar, a promessa de medidas liberalizantes e de austeridade, e um contexto internacional de crise.
 Preparemo-nos, pois tempo difíceis virão.


[i] Professor do Departamento de Economia da UFPB e coordenador do PROGEB – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com; lucasmilanez@hotmail.com)

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quarta-feira, 28 de novembro de 2018

O novo governo e a economia II


Semana de 19 a 25 de novembro de 2018

Nelson Rosas Ribeiro[i]
           
Dois grandes temas destacam-se na semana: a desaceleração da economia mundial e a formação do novo governo.
Comecemos pela desaceleração da economia mundial, assunto já tratado nesta coluna há vários meses. É só conferir nos jornais anteriores ou no Blog do PROGEB (progeb.blogspot.com) onde elas estão disponíveis.
Os sintomas que apontam na direção da aproximação de uma nova crise são cada vez mais evidentes e há mesmo quem fale da aproximação de uma “tempestade perfeita”. Discute-se se ocorrerá em 2019 ou nos anos seguintes. Os principais fatores aprontados como causas são: a guerra comercial Trump x China, a elevação das taxas de juros do Fed (Banco Central americano), as incertezas políticas como o Brexit (saída da Inglaterra da União Europeia) e as eleições na Alemanha e Itália.
Há analistas que afirmam que a desaceleração já vem ocorrendo e estes fatores apenas agravam o fenômeno. O processo é comandado pelas grandes economias, que são as locomotivas EUA, China e União Europeia. As estimativas para o crescimento global para 2019 e 2020 já foram reduzidas de 3,7% para 3%, pela Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) e pelo Banco Mundial. Para a economia dos EUA, o Federal Open Market Commitee, órgão do Fed (equivalente ao nosso Copom do BC) prevê que o crescimento de 3,1% deste ano cairá para 2,5% em 2019, 2% em 2020 e 1,8% em 2021. Para a China, os 6,6% deste ano se reduzirão para 6,3% em 2019 e 6% em 2020, segundo a OCDE. A economia do Japão, a terceira maior do mundo, já teve, no terceiro trimestre deste ano, uma queda de 1,2%.
Algumas organizações privadas também divulgaram estimativas pessimistas. A Oxford Economics, por exemplo, prevê que o crescimento do PIB mundial cairá de 3,1%, este ano, para 2,8%, em 2019 e o Goldman Sachs estima que a economia americana desacelerará para 1,75%, em 2019.
Como vemos, e como vínhamos prevendo, o cenário mundial, para o novo governo, não será dos mais favoráveis. O agravante é que a tempestade desabará sobre um governo que não vem apresentando, em sua composição, um panorama muito animador. Os constantes desmentidos e desautorizações do presidente eleito são uma demonstração disso e olhe que ele conseguiu ficar calado durante quase toda a campanha. Imagine se ele tivesse falado!
Os poucos dados sobre a economia do país também não são animadores. A saída de recursos, por efeitos sazonais, segundo os analistas, está provocando uma alta do dólar superior a 2%, no mês, e a moeda já ultrapassa os R$3,80. Foram criadas 57,7 mil vagas de trabalho com carteira assinada, em outubro, mas o número ficou abaixo do esperado e vem caindo, o que reflete uma desaceleração da retomada da economia. O Índice de Atividade Econômica do BC (IBC-Br) cresceu 1,74%, no terceiro trimestre, depois de cair 0,8%, no trimestre anterior. Mas em setembro, o crescimento foi de apenas 0,5% e as expectativas para o quarto trimestre não são boas.
Enquanto isso, o novo governo vai se constituindo e os nomes dos escolhidos vão sendo anunciados a conta gotas. Nada é muito surpreendente. O número de militares de alta patente é elevado e talvez maior que nos tempos da ditadura. Eles formam um dos grupos de pressão. O outro grande grupo é constituído pelos amigos do ministro czar da economia, Paulo Guedes. Sua equipe vai substituir, com vantagem, a atual “equipe dos pesadelos”. Provavelmente vai ultrapassar as expectativas pela linha dura ortodoxa. São os Chicago boys já auto denominados “Chicago oldies”. É uma poderosa equipe de doutores em universidades americanas e adeptos da mesma cartilha liberal. O pior grupo é, porém, o escolhido pelos parlamentares com o Lorenzoni na cabeça e que inclui os indicados pelo pseudo filósofo e astrólogo Olavo de Carvalho. É nesse grupo que se inclui o louco que, segundo o jornalista Ricardo Boechat, beira a debilidade mental pelas suas declarações e que chefiará as relações exteriores.
É aguardar a tragicomédia resultante desta inusitada mistura.
Para rir ... e chorar.


[i] Professor Emérito da UFPB e Vice-Coordenador do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira; nelsonrr39@hotmail.com; (www.progeb.blogspot.com).

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quarta-feira, 21 de novembro de 2018

A atividade econômica mantém desempenho pífio


Semana de 12 a 18 de novembro de 2018

Rosângela Palhano Ramalho [i]

Caro leitor, continuamos a assistir atônitos, mas não surpresos, o bate-cabeças da equipe de transição do novo governo que conduzirá o país a partir de 1º de janeiro. O grupo e seu mentor maior ainda não perceberam que a campanha eleitoral acabou. Todos os dias lançam ao vento uma fala, um posicionamento desastroso que gera consequências. Mudança de embaixada, eliminação de “viés ideológico” no comércio mundial e o não financiamento da ditadura cubana que acabou com o programa Mais Médicos, são alguns dos motivos que tornaram o Brasil alvo de chacota do momento.
Infelizmente nossa situação vai piorar. Não é necessário ter bola de cristal para prever isto. Basta interpretar a realidade, coisa que a equipe de transição não conhece, ou finge não existir. Limitemos-nos à atividade econômica.
Não é de hoje que esta coluna alerta para o crescimento pífio da nossa economia. Ao contrário do que o atual governo afirmou, não se pode culpar a greve dos caminhoneiros, pois quatro meses se passaram e a tendência de queda se mantém.
As vendas do varejo, segundo a Pesquisa Mensal do Comércio (PMC) do IBGE, caíram 1,3%, em setembro. Esperava-se um recuo de apenas 0,2%. Ao comentar o resultado, os analistas dizem, em coro, que “a recuperação tem sido mais lenta que o esperado...”, um sinal de que as sondagens de expectativas revelam que elas não passaram de expectativas.
Corroborando a tendência, o Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br) caiu 0,09% em setembro, comparado a agosto. Até setembro, o indicador acumula alta de 1,14% e a previsão é de que a atividade econômica avance apenas 1,4%, em 2018. A previsão anual em janeiro era de crescimento de 2,83%.
A inadimplência continua em alta. No mês de outubro, de acordo com dados apurados pela Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL) e pelo Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil), a quantidade de inadimplentes cresceu 4,22%, comparado a outubro do ano passado. E o Indicador Antecedente de Emprego (IAEmp), calculado pela Fundação Getulio Vargas (FGV), recuou 0,2 ponto, em outubro. É o oitavo mês consecutivo de queda deste indicador, sinal de que o emprego não está se recuperando. Na região metropolitana de São Paulo, dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad) Contínua, do IBGE, apresentam uma taxa de desemprego de 14,6%, no terceiro trimestre, maior que a apresentada no terceiro trimestre do ano passado. A renda média caiu R$ 101,00 comparada também a 2017.
A formação da equipe econômica, a começar pelo “rico” superministro, que sabe de menos, torna a situação preocupante. Sua agenda liberal vai promover o retorno do austericídio e nos levar de volta ao fundo do poço. A propósito, os Chicago Boys estão em alta e ocuparão, além do Ministério da Economia, a presidência da Petrobras (Roberto Castello Branco) e a presidência do BNDES (Joaquim Levy, o retorno).
Lembro ao leitor que durante 10 meses do ano de 2015, Joaquim Levy atuou como ministro da Fazenda do governo de Dilma Roussef e pôs em prática um doloroso ajuste fiscal, aumentando, por exemplo, os juros dos empréstimos do Programa de Sustentação do Investimento (PSI). (Confira em http://progeb.blogspot.com/2015/) As medidas, que tinham como objetivo promover o crescimento, promoveram sim uma queda de 3,8% do PIB em 2015.
Portanto, a experiência tem mostrado que a saída idealizada por Paulo Guedes e seus apadrinhados, provavelmente não entregará o prometido. E se a economia mundial entrar em nova crise, como se está prevendo, nossa economia será dizimada. Mesmo diante desta perspectiva, mais de 100 economistas lançaram, sob o guarda-chuva do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da FGV (Fundação Getúlio Vargas-RJ), um documento intitulado Carta Brasil com propostas em 22 áreas e que, em sua maioria, apoiam as ideias do guru econômico do próximo governo.
Assim sendo, bons ventos não sopram pro lado de cá. Aguardemos.


[i] Professora do Departamento de Economia da UFPB e pesquisadora do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com.br) Contato: rospalhano@yahoo.com.br

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quarta-feira, 14 de novembro de 2018

O superministro que sabia de menos


Semana de 05 a 11 de novembro de 2018

Lucas Milanez de Lima Almeida [i]

A Sétima Arte já retratou histórias e estórias de espiões que, por saberem demais, deveriam findar em uma “queima de arquivo”. Infiltrado do mercado financeiro no futuro governo do capitão “aposentado” eleito, Paulo Guedes demonstrou nos últimos dias pouco conhecimento relacionado a sua futura missão de Superministro da Economia.
A primeira demonstração foi sobre o Mercosul, ao colocar no mesmo pacote Argentina, Venezuela e Bolívia, sendo que os dois últimos países não fazem parte, efetivamente, do bloco (a Venezuela está suspensa e a Bolívia em fase de adesão). Em 1991 (ainda no liberal governo Collor), assinaram o Tratado de Assunção (que deu origem ao bloco) Argentina, Uruguai, Paraguai e Brasil. O Superministro afirmou que o comércio com estes países da região não seria prioridade, pois existiria um “viés ideológico” nas transações. A primeira pergunta que fica é: o que seria esse “viés ideológico” associado a uma transação de compra e venda?
Além disso, talvez ele não saiba que o Brasil é quem mais se beneficia neste comércio, pois, dentre outros, os três produtos que mais renderam divisas de exportações ao Brasil no comércio com o Mercosul em 2017 foram veículos rodoviários, máquinas e equipamentos para a indústria e petróleo e seus derivados. Todos eles de grande importância para a cadeia produtiva brasileira.
A segunda demonstração de desconhecimento da realidade, do Superministro, veio de algo que qualquer interessado em administração pública saberia: que a constituição obriga que o orçamento governamental de um determinado ano (a LOA – Lei Orçamentária Anual) seja definido no ano anterior através de um Projeto de Lei (PLOA) votado no parlamento. Pois bem, o atual presidente do Senado, Eunício Oliveira, convidou Paulo Guedes para participar das discussões, que estão ocorrendo agora, sobre o orçamento de 2019. A resposta, pasmem, foi: pode fazer o orçamento de vocês, que, quando assumirmos em janeiro de 2019, faremos o nosso...
O problema é que o Superministro não está acostumado com a gestão pública. Ele é um agente do sistema financeiro, sócio de uma empresa de investimentos, daquelas que concentram dinheiro de vários agentes econômicos e os aplicam no que considerar mais rentável. Foi assim que ele fez fortuna: apostando contra os Planos Cruzado de Collor e a favor do Real (neste, por exemplo, ele pegou emprestado recurso no exterior a uma taxa de juros de até 2% e comprou títulos do governo, que na época de FHC pagavam até 45% de juros).
A situação é tal que, para assumir a superpasta da Economia, ele terá de vender sua participação na Bozano Investimentos, empresa que pode (e deve) se beneficiar diretamente do que Paulo Guedes vem prometendo ao longo da campanha e, agora, na transição de governo: privatizações e (contra)reformas estruturais.
A cabeça do Superministro é tão enviesada que ele equipara a administração pública com a privada. Nas palavras dele, quando “vendeu algumas subsidiárias e pagou bancos, a Petrobrás passou a valer dez vezes mais. Com o país é a mesma coisa”. Isto é tão falacioso quanto comparar o orçamento governamental com o orçamento familiar. Para início de conversa, o Estado não é um “agente” econômico que visa o lucro ou a “gestão” de 3 ou 4 pessoas, portanto, sua lógica de funcionamento não é a do simples custo-benefício empresarial ou da manutenção de um grupo pequeno de pessoas. O Estado é a instituição que reúne e “administra” os diversos interesses (muitas vezes conflituosos) das distintas classes que compõem uma sociedade. Claro que as classes mais fortes economicamente são as de maior poder político. Mesmo assim, elas não podem transformar o Estado em um instrumento exclusivo de realização dos seus interesses. E isto já é manifestado pela Confederação Nacional da Indústria, que deve se prejudicar com as medidas ultraliberais, benéficas ao setor financeiro. A própria classe trabalhadora pode se organizar e impor barreiras às mudanças que vão retirar seus direitos.
Pelo que parece, não é por saber demais que o Superministro e sua equipe vão se queimar, mas por saberem de menos como funciona a gestão pública.


[i] Professor do Departamento de Economia da UFPB e coordenador do PROGEB – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com; lucasmilanez@hotmail.com)

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quarta-feira, 7 de novembro de 2018

O novo governo e a economia


Semana de 29 de outubro a 04 de novembro de 2018

Nelson Rosas Ribeiro[i]
           
Resistindo à tentação de falar de política passemos à análise da conjuntura. Internamente, as notícias econômicas não são boas. A lenta recuperação está ainda mais lenta apesar da euforia no setor financeiro provocada pelo resultado eleitoral, saudado com o foguetório das entidades empresariais como a CNI, CNC, ruralistas, Febraban, etc. Um dos indicadores dessa euforia é o Índice de Confiança Empresarial (ICE) calculado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) que subiu 0,9 pontos, entre setembro e outubro, além das notas de apoio publicadas nos jornais.
No entanto a situação da economia não é animadora. Os dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Economia e Estatísticas (IBGE) referentes a setembro, em relação a agosto, mostram uma queda de 1,8% da produção industrial. É a terceira queda seguida neste setor. O IBGE também revisou para pior as quedas de agosto frente a julho (-0,7) e de julho frente a junho (-0,2%). Houve queda em 16 dos 26 ramos industriais destacando-se o de veículos, reboques e carrocerias (-5,1%), máquinas e equipamentos (-10,3%), bebidas (-9,6%), bens de consumo duráveis (-5,5%), bens de capital (-1,3%) e bens intermediários (-1,0%).
O Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), a partir de dados da Pesquisa Industrial Mensal do IBGE, destaca que a recuperação da indústria perdeu forças. De 93 segmentos estudados, 49 pioraram o desempenho, de janeiro a agosto, em relação ao ano passado e 52% da indústria terá um desempenho decepcionante. Os 4,2% de crescimento industrial previstos pelo Boletim Focus do Banco Central (BC), no começo do ano, foram reduzidos para 2,6% agora. Um terço dos setores permanece em um quadro de crise com destaque para os fabricantes de bens de capital pesados como tanques, caldeiras e reservatórios pesados (-17,5%), geradores, transformadores, motores elétricos (-4,8%), máquinas e equipamentos de uso geral (-1,0%).
Pelo lado do emprego a situação também não é animadora. Apesar de haver uma pequena redução do número de desempregados, os novos empregos criados são de má qualidade, baixa remuneração e informais. A taxa de ocupação caiu para 11,9%, mas, dos 1,3 milhões de empregos criados, 900 mil são informais, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, feita pelo IBGE. Continuam desempregados 12,492 milhões de pessoas. Enquanto os empregos sem carteira assinada cresceram 4,7% os com carteira assinada apenas 0,4%. A precária situação da indústria fez com que a demanda interna fosse suprida pelas importações de produtos industriais. No terceiro trimestre o déficit da balança comercial de produtos da indústria de transformação foi 10 vezes maior atingindo US$46,4 bilhões.
A situação internacional vem se agravando ainda mais rapidamente. As bolsas nos EUA apresentaram fortes quedas. O mês de outubro está sendo considerado o pior outubro em uma década. O índice S&P 500, referência do mercado de ações, caiu 7,94%, a maior queda desde 2010. O Dow Jones perdeu 5,99%, o pior desempenho desde 2015. O Nasdaq Composto recuou 11,0%, o pior desde 2008. Os analistas atribuem este pânico ao aumento dos juros nos EUA, à guerra comercial com os chineses, aos problemas financeiros da Itália e a algumas preocupações com a economia americana. Na zona do euro, além dos problemas italianos, também há preocupações com a economia alemã e com redução dos programas de estímulos monetários do Banco Central Europeu. Na América Latina um relatório da Comissão Econômica para a América Latina (Cepal) alerta para a queda das exportações diante do esfriamento do comércio internacional.
O novo governo terá de enfrentar assim, condições internas e externas adversas. Apenas a inflação continua domada o que fez o BC manter a taxa Selic em 6,5%. Nestas condições é de se temer a condução da economia que o novo ministro Guedes pretende imprimir com sua visão liberal e de austeridade fiscal.
Preparemo-nos para as consequências sociais que elas provocarão.


[i] Professor Emérito da UFPB e Vice-Coordenador do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira; nelsonrr39@hotmail.com; (www.progeb.blogspot.com).

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quarta-feira, 31 de outubro de 2018

Os discursos do presidente eleito


Semana de 22 a 28 de outubro de 2018

Rosângela Palhano Ramalho [i]

O processo eleitoral de 2018 foi concluído no domingo, 28 de outubro. Como as pesquisas apontavam, o candidato do PSL, Jair Bolsonaro, venceu o pleito para o cargo de presidente da República. Com 55,13% dos votos válidos, o eleito obteve 57.797.847 votos, contra 44,87% de Fernando Haddad do PT que obteve 47.040.906 votos. Os resultados também chamam a atenção para o alto nível de abstenção: 21,3% dos eleitores não compareceram às urnas, ou seja, 31.371.704 de eleitores.
Consolidado o resultado, o presidente eleito fez uma primeira interlocução, não como de praxe, em espaço público ou na sede do partido, mas em sua sala de estar, por meio do Facebook Live, o tipo comum de “comunicação” utilizada ao longo da sua campanha. A fala foi explicitamente direcionada aos seus eleitores. Sem modéstia, alimentou a posição de salvador de pátria dizendo não querer “...ocupar a cadeira presidencial por um motivo pessoal. Ocupá-la sim para que juntamente com uma boa equipe, boas pessoas ao meu lado, nós pudéssemos ter sim, mais que a esperança, mas a certeza de mudar o destino do Brasil.”
Usando no total, o nome de Deus 8 vezes, e invocando a passagem bíblica “Conhecereis a verdade e a verdade vos libertará” deu a entender que o povo brasileiro marchava ignorante para a morte. Mas como o despertar aconteceu a tempo, o povo entendeu “...que sabia para onde o Brasil estava marchando e clamava por mudanças.” E, novamente, sem surpresas, deixou claro quem é o inimigo a ser eliminado: “Não poderíamos mais continuar flertando com o Socialismo, com o Comunismo e com o Populismo e com o extremismo da esquerda.”
Mais uma vez, o agora presidente, desnuda sua intenção. Demonstrando desconhecer noções básicas de história, política, sociologia e de áreas afins e ignorando que as últimas gestões presidenciais não passaram nem perto daquilo que é conceituado como socialismo, comunismo, populismo e extremismo de esquerda, elegeu um inimigo que sequer existe. O tom de seu discurso foi o mesmo da sua campanha.
Pois bem, minutos depois, ao decidir falar para todo o povo brasileiro, o tom mudou. Visivelmente desconfortável ao ler um discurso amaciado, afirmou: “Faço de vocês minhas testemunhas de que esse governo será um defensor da Constituição, da democracia e da liberdade.” E completou: “Liberdade é um princípio fundamental: liberdade de ir e vir, de andar nas ruas, em todos os lugares deste país, liberdade de empreender, liberdade política e religiosa, liberdade de informar e ter opinião. Liberdade de fazer escolhas e ser respeitado por elas.”
Mesmo não fazendo referência aos “supostos inimigos” do Brasil como o fez na live, Bolsonaro destilou ranço nas entrelinhas: “Libertaremos o Brasil e o Itamaraty das relações internacionais com viés ideológico a que foram submetidos nos últimos anos. O Brasil deixará de estar apartado das nações mais desenvolvidas.” Esta foi uma indireta para a prioridade que supostamente se dá às relações para com o Mercosul. “Ressalto aqui que os principais parceiros comerciais da pauta exportadora do Brasil não estão apenas no Mercosul. São a China, os Estados Unidos, a Argentina, a Holanda e a Alemanha”. Portanto, não há o que contestar. Haveria, caso o resultado das urnas fosse o oposto, segundo o próprio Bolsonaro e seus apoiadores repetiram inúmeras vezes. O pleito representa a vontade da maioria.
Mas, o presidente e sua equipe, como já destacado nesta coluna, não enfrentarão problemas triviais. Não haverá soluções mágicas, assim como já foi provado com o impeachment de Dilma Rousseff. O milagre não se fez. Embora se tente demonstrar o contrário, os dados das nossas análises anteriores, mostram que o ciclo econômico segue seu curso e que os problemas sociais não desaparecerão da noite para o dia.
Como cientistas e apoiadores do sistema democrático, o Progeb e seus pesquisadores continuarão a estudar a realidade e a elaborar análises de conjuntura numa perspectiva crítica e resistirá às ameaças à livre manifestação do pensamento.


[i] Professora do Departamento de Economia da UFPB e pesquisadora do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com.br) Contato: rospalhano@yahoo.com.br

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quarta-feira, 24 de outubro de 2018

Um salto mortal ao passado


Semana de 15 a 21 de outubro de 2018

Lucas Milanez de Lima Almeida [i]

As pesquisas apontam para uma vitória expressiva do fascismo-antipetismo nesse 2º turno das eleições de 2018. Criado pelo ódio às diversas faces dos governos do PT (positivas e negativas), o atual movimento de rejeição ao partido somou-se ao contraditório discurso de repulsa ao diferente (de si e de suas crenças e tradições) e ao que está aí (na estrutura política). Além dos fatos concretos motivadores desse sentimento, a grande mídia brasileira cumpriu o papel de inflamar a opinião pública.
Desde as manifestações de junho de 2013, mas, sobretudo, a partir de 2014, vimos a responsabilidade por todos os problemas econômicos ser atirada contra o governo Dilma e sua política intitulada de “irresponsável”.
Como bem sabe qualquer economista que se preze, as economias capitalistas apresentam uma característica básica: a alternância periódica de momentos de aquecimento e desaquecimento da atividade produtiva. No final de 2008, o Brasil foi atingido pela “Crise do Subprime”, originada no mercado financeiro estadunidense. Como reação a isto, o então presidente Lula utilizou-se de políticas econômicas de combate aos efeitos da crise. Ao assumir a presidência, em 2011, Dilma Rousseff manteve e, em alguns pontos, ampliou tais medidas.
O problema fundamental é que, mesmo com o aparente superpoder que o Estado supostamente teria, ele só é capaz de combater os sintomas da crise. Sua causa fundamental, contudo, ele é incapaz de eliminar. Sua ação se assemelha a um analgésico, que inibe os efeitos de uma infecção, mas não combate o mal causador da patologia. Quando o analgésico é utilizado de forma contínua, a tendência é de que sua eficiência se reduza gradativamente, até chegar ao ponto de não mais surtir qualquer efeito. O mesmo pode-se dizer das medidas anticrise adotadas por um governo. O limite da intervenção é o orçamento governamental, que, em períodos de crise, por si só, tende a tornar-se deficitário.
As restrições na intervenção governamental começaram a se manifestar em 2014, ano em que a presidente foi reeleita, derrotando o candidato do PSDB, Aécio Neves. No ano seguinte, no início do seu segundo mandato, Dilma, de imediato, adotou uma política de forte cunho restritivo, e este foi um dos grandes erros no trato da crise econômica. Isto significou que, mesmo sem ter superado a fase crítica de desaquecimento, o Estado não só reduziu a dosagem do analgésico, como tomou medidas para piorar a situação da atividade produtiva. Isto se manteve nos primeiros meses de 2016, quando houve o Golpe.
A partir daí, o bombardeio de críticas à política econômica se intensificou e por todos os lados: além da grande mídia, também entrou no jogo a esmagadora maioria dos partidos políticos, inclusive os que outrora eram aliados. O objetivo primordial era aniquilar o PT e associar toda a desgraça do país a ele. As eleições de 2014 já haviam mostrado que faltava pouco para a direita (agora centro-direita, diante do atual cenário) voltar ao poder do Executivo nacional. Contudo, “esqueceram de combinar com os russos”, quer dizer, com Joesley Batista. No ano passado, o dono da JBS revelou a verdadeira face da menina dos olhos da burguesia, Aécio e o próprio PSDB: seu envolvimento com a corrupção a qualquer custo (inclusive custos com a vida alheia). Com isto, os grandes problemas da “velha política” e do PT também estavam enraizados nos tucanos, ou seja, eles estavam contaminados e seriam carta fora do baralho, como o 1º turno demonstrou.
É neste ponto chave que se dá a reviravolta e a ascensão de uma figura de intelecto duvidoso, que desde 1993 despeja excremento através de palavras ofensivas, mas que conseguiu incorporar parte do clamor social e tornar-se porta-voz dele. Surgiu, então, a figura do “mito” (sic) Jair Bolsonaro. Este, por sua vez, tratou de alinhar-se, também, com as frações da burguesia que detêm o poder no Brasil: os setores financeiro e agrário.
Assim, sem um candidato tradicional capaz de se aproveitar do antipetismo, a elite e seus “peixes-piloto” (a classe média) tiveram que apostar na carta fascista.
 A questão que fica é a seguinte: em que momento deve vir o arrependimento por essa infeliz escolha, tão semelhante àquela feita pela Alemanha ou pela Itália no início do século passado?


[i] Professor do Departamento de Economia da UFPB e coordenador do PROGEB – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com; lucasmilanez@hotmail.com)

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quarta-feira, 17 de outubro de 2018

Ela vem aí



Semana de 08 a 14 de outubro de 2018

Nelson Rosas Ribeiro[i]

           
Apesar de toda a agitação eleitoral começo pela economia. Já falamos várias vezes da formação de nuvens carregadas no horizonte. A ameaça de nova crise mundial aumenta. Os avisos surgem de todos os lados com diferentes formulações. Segundo William White, ex-vice-presidente do Banco do Canadá e presidente da comissão de análise econômica e de desenvolvimento da OCDE, uma “Perigosa maré financeira em alta”. White alerta ainda para a desaceleração do crescimento provocada pela política protecionista de Trump e para o perigo que corre o sistema monetário mundial baseado no dólar, resultado da utilização da moeda como arma geopolítica. Finalmente alerta ele que “não está tudo bem abaixo da superfície. Se uma nova crise financeira ocorrer, a recessão subsequente poderá ser ainda mais onerosa do que a última”.
O relatório de Estabilidade Financeira Global do FMI afirma que “os riscos de uma crise para os mercados emergentes tem aumentado” e que a fuga de capitais, que retornam aos EUA, deve ocorrer em um período de quatro a oito trimestres, diante da elevação das taxas de juros pelo Banco Central (BC) americano. Cita ainda que as tensões comerciais e a elevação das incertezas políticas podem levar a um repentino aperto nas condições financeiras globais.
Para o FMI o ritmo da economia global é menos vigoroso que há seis meses e os riscos aumentaram. O jornal Valor Econômico em editorial, referindo-se ao relatório do FMI, afirma que “o crescimento global começou a fraquejar no ano corrente e deverá declinar um pouco mais nos próximos dois anos”. Em relação ao Brasil o Valor prevê que “terá crescimento abaixo de previsto este ano (1,4% ante 1,8%) ... e continuará sua tendência de voar mais baixo que os emergentes...”.
O nervosismo crescente já é sentido e refletido nas bolsas de valores do mundo e na de Wall Street, como a recente onda de “sell-off” que levou o Índice Dow Jones, um dos principais do mercado financeiro dos EUA, a cair 832 pontos em um dia (quarta feira, 10), a terceira maior queda da história.
No Brasil os números também não são animadores. O Indicador Antecedente de Emprego (IAEmp) da Fundação Getúlio Vargas (FGV) caiu 3,3 pontos, em setembro, pelo sétimo mês consecutivo, situando-se em 91,0 pontos, o menor nível desde dezembro de 2016. O Indicador Coincidente de Desemprego (ICD) aumentou 1,3 pontos, também em setembro, o que mostra a incerteza quanto ao crescimento da economia e à geração de emprego.
Em São Paulo, a produção industrial recuou 0,9%, em agosto, em relação a julho, de acordo com a Pesquisa Industrial Mensal – Regional (PIM-Regional), divulgada pelo IBGE. Outros estados também tiveram queda: Amazonas (-5,3%) Pará (-1,1%), Espírito Santo (-0,9%), Santa Catarina (-0,7%) e Rio de Janeiro (-0,3%). Segundo o Iedi, isto mostra uma “razoável disseminação do mau desempenho do mês”.
A euforia histérica dos empresários e dos especuladores do “mercado” com a vitória eleitoral do Bolsonaro, no primeiro turno, repercutiu na bolsa de valores elevando o Ibovespa aos 86 mil pontos. O chamado “kit eleições” valorizou-se 19,9%, subindo de R$931 bilhões para R$1,12 trilhão. O kit é um pacote com os papéis da Petrobrás, Eletrobrás, Banco do Brasil, Itaú, Unibanco, Bradesco, Magazine Luiza, Lojas Rener, Cemig, Copel e Embraer. Supõem os especuladores que elas são afetadas pelos resultados das eleições.
A euforia com as boas chances de vitória do militar excita também os especuladores internacionais que, considerando que “o ambiente por aqui é hoje construtivo” se atiram às ações de empresas brasileiras. O ingresso de capitais estrangeiros já chegou a R$2,21 bilhões, em outubro, até o dia 8.
Nesse ambiente de crise iminente caminhamos para o segundo turno sob o risco de afundarmos no fascismo e no obscurantismo de um tosco capitão, reformado pelo próprio exército como incapaz e promovido a líder pelas forças mais reacionárias do país e simbolizando o que há de mais grotesco, primário, clerical e preconceituoso da sociedade.


[i] Professor Emérito da UFPB e Vice-Coordenador do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira; nelsonrr39@hotmail.com; (www.progeb.blogspot.com).

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