quarta-feira, 2 de maio de 2018

Tem que manter isso, viu?


Semana de 23 a 29 de abril de 2018

Rosângela Palhano Ramalho [i]

Corre a notícia que o governo fará um último esforço para resgatar a popularidade de Temer lançando, no início de maio, publicidade que fará alusão aos “dois anos que salvaram o Brasil”. Os marqueteiros “abusando” das suas competências usarão o bordão “Tem que manter isso, viu?”, que quase derrubou Temer, associado a uma versão positiva. Frases como: “A inflação está em 2,8%, tem que manter isso, viu?”, “Os juros caíram para 6,5%, tem que manter isso, viu?”, “Os empregos estão voltando, tem que manter isso, viu?”, serão repetidas como um mantra.
Inacreditável!
O presidente, que acha que salvou o Brasil, até agora foi incapaz de salvar a si mesmo. Se a sua popularidade e sua candidatura à presidência dependerem dos números acima citados, Temer está em péssimos lençóis, pois segundo pesquisa do próprio Planalto, os brasileiros não lhe atribuem os feitos questionáveis que ele propaga.
            No que diz respeito à inflação, a crise continua a jogá-la para baixo e a façanha que o governo diz ser dele, foi provocada pela conjuntura econômica de crise e pela safra agrícola recorde que barateou os preços dos alimentos.
Na tentativa de alavancar a economia, o Copom promoveu a queda dos juros, mas tal medida não se converteu em estímulos aos consumidores e empresas, pois o crédito continua caro. O estoque de crédito bancário, segundo o Banco Central, cresceu apenas 0,6% em março deste ano, quando comparado a fevereiro. E só agora os especialistas do Banco Central perceberam que a queda dos juros “não está surtindo efeitos em estimular a economia”, pois os juros bancários não estão acompanhando a queda da Selic. Um estudo da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) questiona o porquê dos altos níveis de spreads bancários no Brasil. O presidente da Febraban, Murilo Portugal, em audiência na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, disse que os spreads elevados decorrem dos altos custos da intermediação financeira, ou seja, 77% do spread bancário são formados por custos. Os custos com inadimplência representam 55,7% desta fatia, enquanto que os  impostos são responsáveis por 15,6%. A Fiesp desmontou este argumento ao demonstrar que em outros mercados que apresentam taxas de calotes mais baixas, os spreads são menores que os nossos como é o caso de Itália, Irlanda, Portugal, Rússia e Espanha.
A razão para nós parece óbvia, mas grandes “esforços mentais” têm sido direcionados para entender o fenômeno. Ricardo de Menezes Barboza, economista da UFRJ, afirma com surpresa: “Tem alguma coisa no mercado de crédito que não está fluindo como o esperado (...) Tem algo acontecendo que não está derrubando o spread”.
Este blá, blá, blá todo encobre apenas uma verdade: os juros e spreads elevados decorrem da concentração bancária. Ponto. Os bancos não baixam os spreads porque não querem, pois os quatro maiores bancos do país respondem por quase 80% do crédito concedido. Baixa concorrência, juros altos, lucros altos. O Bradesco, por exemplo, registrou lucro líquido de R$ 5,1 bilhões no primeiro trimestre, alta de 4,9% em relação ao trimestre anterior e de 9,8% em relação ao mesmo período do ano passado. O resultado ficou acima do projetado pelos analistas, que também esperam aumento dos lucros do Banco do Brasil, Itaú Unibanco e Santander.
            Mas o governo Temer prenuncia: “Os empregos estão voltando, tem que manter isso viu?”. Dois dias depois do anúncio deste slogan, o IBGE divulgou os resultados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua). A taxa de desemprego subiu de 11,8% no último trimestre de 2017, para 13,1% no primeiro trimestre deste ano. O número de pessoas desocupadas cresceu de 12,3 milhões para 13,7 milhões. A indústria reduziu seus postos de trabalho em 2,7% (327 mil pessoas), a construção civil em 5,6% (ou 389 mil pessoas) e o comércio em 2,2% (396 mil pessoas).
Sem ter o que mostrar, o governo continua encurralado. De um lado, novas denúncias de corrupção ameaçam passar-lhe outra rasteira, e de outro, os “feitos” do grande herói da nação continuam a soar como uma grande ficção.


[i] Professora do Departamento de Economia da UFPB e pesquisadora do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com.br) Contato: rospalhano@yahoo.com.br

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