Semana de 20 a 26 de Julho de 2009
Uma das medidas mais tradicionais para conter a crise, a redução do preço do dinheiro, vem sendo exaustivamente usada e já se aproxima do esgotamento.
Com efeito, em trinta países, este preço caiu para níveis preocupantes, e em 15 deles é negativo. Neste momento, vive-se a “síndrome do pânico” de um regresso da inflação. A Valor Data elaborou uma tabela, envolvendo 45 países, com dados da Bloomberg e com as estimativas de preços do relatório World Economic Outlook do FMI. 15 deles, entre os quais se encontram a Rússia, o Reino Unido e Israel, apresentam taxa de juro real negativa; outros 15, entre os quais estão a Índia, o Japão e o México, apresentam taxas que variam entre zero e 1%; e apenas oito deles, incluindo o Brasil e a China, têm taxa de juro real acima de 4%.
Este quadro é apenas uma pequena parte do cenário em que se move a economia planetária nos tempos atuais.
Mas, como em um refrão, a imprensa repete reiteradas vezes que estamos a sair da crise!
Em que pese a visão otimista do Presidente do Banco Central americano (Fed), Bem Bernanke, para quem a economia americana “parece estar melhorando”, a conseqüência mais grave da crise, o desemprego, continua mantendo-se a uma taxa de 9,5%. De 2007 até hoje, 6,5 milhões de trabalhadores ficaram desempregados. Eles representam 4,7% da força de trabalho ativa da América do Norte, o que vem colocando em sérias dificuldades a rede de proteção social. Segundo a estatística, um em cada nove americanos depende de vales-alimentação do governo, e o número total dessas pessoas cresceu 6,2 milhões desde o início da recessão.
A taxa de desemprego para os adolescentes é também, no momento, muito grande. Em Julho ela foi de 22%, estando aqui incluídos os empregos temporários de verão.
Será isso um sinal de que a economia está virando a página?
Noutros cantos do planeta, ao que tudo indica, o quadro é semelhante. Entre abril e junho deste ano, o PIB do Reino Unido sofreu retração de 0,8%, acumulando uma queda de 5,8%, se comparado com igual período de 2008. Na Espanha, o desemprego cresceu e atingiu 17,92% no segundo trimestre.
Neste contexto, a China aproveita como pode a sua situação particular de ser possuidora de grandes reservas. Utiliza os seus dólares para adquirir empresas em vários países do mundo seguindo o que parece ser assumidamente o lema do governo chinês: “ir para fora”! Nessa linha de ação, vem realizando investimentos em campos de petróleo no Iraque, nos negócios da Opel e General Motors (GM), na Alemanha, numa fábrica de equipamentos na Nova Zelândia, numa loja de departamentos no Japão e numa companhia de petróleo na Suíça.
Aqui, no patropí, cresce o déficit comercial da indústria, que passou a importar uma maior quantidade de componentes. Apesar do discurso oficial, o realismo nos leva a admitir que a saída da crise ainda está longe. O cenário não é positivo. As exportações no setor automobilístico caíram 48% entre janeiro e junho deste ano. No geral, os embarques de produtos industriais cairam 27%, os de Máquinas e Equipamentos, 32%; os do setor de vestuário e calçados, 29,6%, enquanto aumentaram as importações do vestuário em 32%.
Dois setores parecem fugir deste quadro geral: o setor de armas e o setor de automóveis. No caso dos automóveis, podemos responsabilizar a redução do IPI pelo aquecimento do mercado. O caso das armas merece uma análise mais detalhada que não nos propomos fazer agora.
Já a situação do setor sucroalcooleiro parece mais preocupante. Apesar de todo o berreiro sobre os bio-combustíveis, as usinas do Nordeste apresentam-se com uma dívida de cerca de R$ 7,5 bilhões e possuem receita estimada em R$ 5 bilhões na atual safra. Essa não é uma crise específica na região Nordeste. Ela manifesta-se também na parte do setor que se encontra localizada no Centro-Sul. Em que pesem as vantagens competitivas desta região face a primeira, a dívida das usinas oscila entre 0,7 e 1,5 do faturamento.
Em situação difícil encontram-se também as siderúrgicas, que, no Brasil, seguem a norma do mundo. Projetos encaminhados ao BNDES que orçavam em torno de R$ 53 bilhões foram cancelados. Entre as empresas que recuaram de sua demanda estão a Usiminas e a Açominas, de Ouro Branco (MG).
Algumas modificações estão a ser introduzidas nos contratos de encomendas com as mineradoras. Os preços, que antes eram fixados anualmente, vão passar a ser acertados trimestralmente, com grande tensão entre os fornecedores e a China, que, apesar de ser também um grande produtor líquido de aço, é o principal cliente mundial.
No setor financeiro os lucros continuam em expansão. O BMG, por exemplo, o 26º em ativos totais, fechou o primeiro semestre com um lucro líquido de R$ 176 milhões, 16,3% superior aos obtidos em igual período de 2008. Enquanto a rentabilidade dos bancos é comemorada, a FIESP, manifesta-se descontente com o corte na taxa de juro que foi considerado muito tímido, por não beneficiar o setor industrial.
No geral, a situação da indústria, o Patinho Feio da história desde o início do governo PT até o começo da crise, parece muito delicada. O caixa do setor inspira preocupações e para encontrar soluções e acomodações para preservação de alguma liquidez, esperam-se algumas medidas nada ortodoxas. Numa pesquisa que atingiu 147 empresas, realizada pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, FIESP, entre março e abril deste ano, constatou-se que 38% delas admitiam a hipótese de ter que deixar de honrar os seus compromissos. Pela ordem, a primeira vítima seria a receita federal, com o não pagamento dos impostos (53% das empresas entrevistadas). Em seguida viriam os fornecedores (27%) e bancos (21%). De acordo com a pesquisa, 61% das empresas pediram alargamento de prazo, de 32, para 47 dias, para os pagamentos aos seus fornecedores. Na outra ponta, os clientes também pediram ampliação de prazos, de 37, para 57 dias, segundo revelaram 78% das empresas pesquisadas. Por outro lado, a inadimplência continua a uma taxa de dois dígitos. De outubro de 2008 a março de 2009, as pessoas jurídicas inadimplentes aumentaram em 28% e, entre abril e maio deste ano, o crescimento foi de 17%.
Como se vê, ainda não chegamos ao fundo do poço.
Enquanto tudo isso acontece, a previsão do Ministério da Fazenda para o crescimento do PIB em 2009 é de 0,5%, com destaque para a participação dos setores de extração mineral, construção civil e serviços.
E, para terminar, ainda bem que o Ministro Carlos Mink deu um “chega pra lá”, mandando de volta os contêineres de lixo que nos foram presenteados pela Inglaterra. Como se não bastasse a crise, sorrateiramente (ou à socapa, como diria o português), tentou-se transformar o país na lixeira do planeta, agravando a situação do meio ambiente.
Haja externalidades!!!
E para não cair no desespero e acalmar os espíritos, o melhor que temos a fazer é entregar a alma a Deus e cantar com Marcelo D2:
“O rei mandou a gente se ajudar
O rei mandou o povo agilizar
O rei mandou a gente olhar pra frente...”
Texto escrito por: Elivan Rosas Ribeiro:
Professora do Departamento de Economia da UFPB e Pesquisadora do PROGEB – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira.
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