Nas últimas análises, destacamos a fé da equipe econômica do governo Dilma em sua “santíssima trindade”: aumentos sucessivos da taxa básica de juros (Selic), uso das “medidas macroprudenciais” (aumento dos depósitos compulsórios dos bancos no Banco Central - BC e restrição do crédito) e redução dos gastos públicos.
A Selic continuará sua trajetória ascendente, em 2011. Espera-se que, até o final do primeiro semestre, ela suba para 12,25% ao ano. Em janeiro ultimo, a taxa foi elevada de 10,75% para 11,25% ao ano. O governo federal anunciou na semana passada um corte de R$ 50 bilhões nas despesas previstas no projeto da lei orçamentária de 2011. A presidente Dilma acredita que, com esse pacote de ações, se possa controlar a inflação e conseguir honrar os compromissos, como a economia de 3% do Produto Interno Bruto (PIB) para o pagamento dos juros da dívida – o superávit primário. Isto, sem reduzir os recursos do PAC e sem a realização de manobras na contabilidade.
Mas, um novo componente surgiu para desafinar o coro dos crentes: a escalada inflacionária dos alimentos. O aumento dos preços das commodities é generalizado, e vem preocupando dirigentes políticos da Europa, Ásia e Américas. Por um lado, o processo inflacionário se deve à queda de produção das safras de bens, como açúcar, milho e trigo, em várias partes do mundo. A Rússia, por exemplo, sofre a pior seca em meio século, e a China passa a considerar a ampliação de importações de açúcar e milho, em decorrência de reflexos climáticos adversos às produções desses grãos. Por outro lado, está diretamente relacionado com a especulação dos mercados financeiros, o que tem levado o primeiro-ministro Sarkozy, na França, a defender a ideia de intervir nos preços das commodities por meio da criação de estoques reguladores.
No Brasil, em pronunciamento numa reunião da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), o ministro da Agricultura, Wagner Rossi, atribuiu boa parte da alta dos preços à atividade especulativa realizada pelo capital financeiro. Analistas do mercado subscrevem o pensamento do ministro, já que há uma ampla procura pelos mercados futuros por parte dos investidores em busca de rentabilidade em meio a um ambiente de juro baixo na maioria dos países europeus e nos Estados Unidos. “Os preços das commodities são voláteis, mas sobem há vários anos. A percepção é que o mundo está vivendo um super ciclo de aumento de commodities. A inflação veio para ficar e é tema global”, avalia Marcelo Carvalho, analista-chefe do BNP Paribas para a América Latina.
Dados sobre os índices de inflação para o primeiro mês de 2011 indicaram aumento generalizado nos preços. No Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) a subida não decorre apenas de sazonalidades, como despesas com mensalidade e material escolar, mas também do aumento das tarifas de ônibus, das bebidas e da alimentação. Este último grupo foi responsável por 32% da alta do IPCA. O índice sofreu a maior variação para o mês (0,83%), desde janeiro de 2003. Em 12 meses subiu 5,99%, já se afastando da meta central de inflação do governo, que é de 4,5%.
Já pelo Índice geral de Preços – Disponibilidade Interna (IGP-DI) as maiores altas foram dos produtos agropecuários no atacado, como o algodão (18%), milho em grão (6,59%), café em grão (8,12%). As cotações agropecuárias acumulam variação de 28,4% em 12 meses. Para o coordenador de analises econômicas da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Salomão Quadros, estes movimentos refletem a disparada das commodities no mercado internacional. É bastante provável que a alta dos preços produza impactos no varejo nos próximos meses, acabando a alegria gerada pelo aumento do salário mínimo a ser concedido pelo governo Dilma.
Apesar da santíssima trindade, com as medidas de contenção do consumo, persiste a escalada dos preços ameaçando comprometer o nível de vida do trabalhador.
Além de queda, coice! E agora, BC?
Texto escrito por:
Maria Carolina Costa Madeira: Analista do Ministério da Pesca e Aquicultura, mestre em economia pela UFPB e pesquisadora do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira (progeb@ccsa.ufpb.br); (www.progeb.blogspot.com).