Semana de 29 de julho a 04 de agosto de 2011
Rosângela Palhano Ramalho(*)
Surpreendente, audaciosa, precipitada, sagaz, inteligente, estes são os adjetivos que foram utilizados para caracterizar a decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC), de cortar a taxa de juros Selic em 0,5 ponto percentual. Só 30% dos analistas apostavam na redução da taxa e, por isso, a decisão pegou o “mercado” de surpresa.
70% dos que apostavam na manutenção dos juros em 12,5% ignoraram os recados dados pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, no início da semana e duvidaram que a instituição tivesse coragem suficiente para tomar a decisão que tomou. Os recados, reforçados pela presidente Dilma, começaram a ser enviados a partir do anúncio do aumento da meta de superávit primário em R$ 10 bilhões, para este ano. Mantega argumentou que a recessão mundial durará de dois a três anos e que é preciso fortalecer a economia doméstica. A medida fiscal adotada, segundo o ministro, “abriu espaço” para a queda da taxa de juros, ou forneceu “musculatura” para que a política monetária fosse aliviada.
Recado dado, decisão tomada.
O corte dos juros enfureceu o “mercado” e aqueles que defendem ferrenhamente o uso dos juros no combate à inflação. Nem mesmo a nota utilizada para justificar a queda da taxa convenceu os mais céticos. O Copom argumentou que, “...o ambiente internacional contribuirá para intensificar e acelerar o processo em curso de moderação da atividade econômica.” e a “...substancial deterioração, consubstanciada, por exemplo, em reduções generalizadas e de grande magnitude nas projeções de crescimento para os principais blocos econômicos”, justificam a queda dos juros.
De fato, a taxa de crescimento interno foi revisada mais uma vez pelo Boletim Focus, para 3,9%, e o cenário externo continua nebuloso. Os EUA rebaixaram a previsão de crescimento da economia em 2011 de 2,7% para 1,7% e a zona do euro registrou crescimento pífio de 0,2% entre o primeiro e o segundo trimestre.
Embora as estatísticas reforcem o cuidado do Banco Central, os que são contra o corte dos juros utilizaram diferentes argumentações: (1) que o cenário doméstico mudou pouco entre as reuniões de julho e agosto, ou seja, a inflação ainda ameaça; (2) que não há a certeza de que a economia mundial entrará em crise; e (3) que o esforço fiscal do governo em R$ 10 bilhões não vem com contenção de despesas, mas será conquistado com o excesso de arrecadação.
Ou seja, em nenhum momento se comemorou o montante a ser economizado pelo governo com o pagamento dos juros da dívida, nem o impacto da queda da taxa sobre o investimento produtivo, nem muito menos o efeito de desestímulo à entrada de capitais especulativos que afetam o câmbio, valorizando ainda mais o real frente ao dólar. O foco dos protestos é direcionado, mais uma vez, em defesa dos agentes do mercado financeiro. Estes, como Delfim Netto afirma, é que devem sair do mercado alegres, com seus gordos bônus sem serem incomodados, como na crise de 2008.
Eis os grandes questionamentos do “mercado”: Como pode uma instituição como o Banco Central, que necessita de credibilidade, tomar uma decisão tão insensata? E a autonomia do Banco Central? As decisões monetárias agora são de âmbito político?
Imune às críticas, a presidente argumenta que “o Copom fala pelo Copom e Dilma fala pelo governo federal” e continua mantendo conversas com o ex-ministro Delfim Netto, os professores Luiz Gonzaga Belluzzo e João Manuel Cardoso de Mello, o presidente do BNDES, Luciano Coutinho e o empresário Jorge Gerdau, nomes que engrossam a heterodoxia econômica. Além disso, crescem os rumores de que Dilma gostaria de ser lembrada como a presidente que cortou os juros para um dígito e esta possibilidade está deixando o “mercado” de cabelo em pé.
Mas, onde está determinado que o Banco Central deve prestar contas ao “mercado”? Afinal, o que é ter credibilidade? É assegurar juros altos e menos emprego? É garantir os elevados rendimentos ao mercado financeiro, enquanto grande parte da população enfrenta o desemprego e a miséria?
Alguns até já afirmam que o Banco Central perdeu sua autonomia e se transformou num derivativo do Ministério da Fazenda ou do Palácio do Planalto.
Nestes termos, é melhor não ter autonomia e ser derivativo da Fazenda ou do Planalto, do que ter autonomia e ser derivativo do Bank of Boston.
(*)Professora do Departamento de Economia da UFPB e pesquisadora do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com)
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