Semana de 28 de abril a 04 de maio de 2025
Paola Teotônio Cavalcante de Arruda[i]
Já faz um tempo que falamos que a elevação
dos juros no Brasil tem imposto um custo elevado ao setor produtivo. Esse
impacto, todavia, não é isolado – ele se insere em um quadro mais amplo de
fragilidade política e institucional. A alta da Selic, que atingiu 14,75%, vem
sendo justificada como uma resposta “ao avanço inflacionário e à deterioração
das expectativas”. Seus efeitos colaterais, no entanto, estão se acumulando e
seu preço está cada vez mais alto: de um lado, as empresas enfrentam
dificuldades crescentes para honrar dívidas e investir; de outro, o setor
público vê suas despesas com juros se aproximarem da casa de R$ 1 trilhão
anuais.
Do ponto de vista empresarial, os números
são alarmantes. Estudo da Alvarez & Marsal, veiculado pelo Valor Econômico
na última semana, mostra que as companhias brasileiras terão que desembolsar
cerca de R$ 126 bilhões a mais em juros até 2030. Isso significa que uma parte
importante do caixa, que poderia ser aplicada em expansão, modernização ou
inovação, está sendo “desviada” para sustentar uma estrutura de endividamento
cada vez mais pesada. Já em 2025, os gastos adicionais estimados com juros somam
R$ 26 bilhões, comprometendo o fôlego de empresas de diversos setores,
especialmente aquelas que atuam em indústrias intensivas em capital, como
siderurgia, petroquímica e infraestrutura.
Do outro lado da mesma moeda está o setor
público: o Brasil gastou, em 12 meses até fevereiro, mais de R$ 923 bilhões
apenas com o serviço da dívida — valor que representa quase 8% do PIB e
responde por praticamente todo o déficit nominal do país. A conta dos juros,
portanto, asfixia tanto o Estado quanto o setor privado, formando uma armadilha
econômica que limita o crescimento e agrava a desigualdade.
Há aqui um efeito circular perverso. A
Selic alta eleva o custo da dívida pública, que, por sua vez, aumenta o déficit
nominal. Esse déficit alimenta as “incertezas do mercado” quanto à
“sustentabilidade fiscal do país”, pressionando novamente as taxas de juros
longas e “exigindo” uma política monetária ainda mais restritiva para conter as
expectativas inflacionárias. Assim, mesmo com sinais de arrefecimento na
inflação e com um câmbio relativamente estável, o discurso econômico hegemônico
insiste em manter o país preso a um ciclo de juros elevados, crescimento baixo
e endividamento crescente, que só beneficia grandes rentistas.
O resultado nós já sabemos e sentimos, caro
leitor. Uma economia paralisada entre dois mundos: o privado, endividado e
sufocado por custos financeiros crescentes, e o público, comprometido com
despesas fixas, as quais o impedem de direcionar recursos para outras áreas
econômico-sociais. Nesse cenário, tanto as empresas quanto o governo gastam
mais para simplesmente manter-se operando — sem espaço para investir, inovar ou
expandir. A política monetária, que deveria ser uma âncora de estabilidade,
transforma-se em um obstáculo para o crescimento. A industrialização se mostra
cada vez mais distante.
Diante de tudo isso, é preciso reconhecer
que a política monetária brasileira não opera num vácuo técnico neutro, mas
dentro de um arranjo em que expectativas — muitas vezes moldadas por interesses
financeiros — se impõem como verdades incontestáveis, condicionando decisões
que impactam diretamente o setor produtivo e a vida das pessoas. A manutenção
de juros altos, mesmo em contextos em que a inflação real não justifica tal
rigidez, revela uma captura ideológica da política econômica por uma racionalidade
de mercado que favorece os detentores de capital financeiro em detrimento do
investimento produtivo e do crescimento sustentável.
Romper esse ciclo exige mais do que ajustes
técnicos: exige coragem política para questionar a teoria econômica dominante,
enfrentar os interesses cristalizados no sistema financeiro e construir uma
nova lógica econômica que privilegie o desenvolvimento, a produção e o
bem-estar social.
[i]
Pesquisadora do PROGEB e Graduada em Relações
Internacionais (UFPB).(paolatc.arruda@gmail.com). Colaboraram: Bruno
Lins, Ícaro Formiga, Lara Souza, Miguel Oliveira e Ryann Felix
0 comentários:
Postar um comentário