quinta-feira, 25 de maio de 2023

Remando contra a maré

Semana 15 a 21 de maio de 2023

 

Nelson Rosas Ribeiro[i]

           

A situação internacional continua a agravar-se. Nos Estados Unidos já foi criada uma nova expressão, “Polycrisis”, para designar o atual quadro. Não temos só uma crise, temos um conjunto delas que se expandem em vários terrenos. São referidas as crises na saúde (a pandemia), a desestruturação das cadeias produtivas globais, as tensões geopolíticas que levaram à guerra, as disrupções tecnológicas, a crise financeira etc. Já temos falado sobre isto, e como este conjunto de fenômenos dificulta a análise da evolução do ciclo mundial. Torna-se cada vez mais uma opinião consensual a aproximação de uma grande crise internacional e os economistas avaliam em 65% a probabilidade de ela ocorrer. A inflação resiste em ceder apesar de todos os Bancos Centrais (BCs) continuarem a subir os juros de referência, mesmo nos EUA onde a situação, para espanto geral, é ainda mais grave, diante da possibilidade de ser decretado um calote na dívida pública. Em 19 de janeiro o governo atingiu o teto do endividamento permitido, que é de US$32,4 trilhões. O escândalo ainda não estourou porque o Federal Reserve (Fed), BC americano, vem realizando uma série de manobras contábeis para esconder o fato. Os republicanos, que têm maioria no Congresso, não querem aprovar um aumento do teto e propõem uma redução das despesas com exceção das militares. O impasse está criado e tende a agravar-se.

A ação dos bancos centrais perdeu a sua eficácia. Todos sobem os juros, mas a inflação não cede, para surpresa e decepção geral. Afinal, a teoria não afirma que esta é a solução? A ideologia econômica professada por eles é tão fanática que não podem admitir que o problema está exatamente aí: a teoria está errada. Tenta-se desenvolver novas explicações. A mais usada no momento é a de que se passou ao estado de “dominância fiscal”. Isto ocorre quando a situação é tal que a política monetária, instrumento principal dos BCs, perde a eficácia diante da política fiscal. Vários seminários têm sido realizados para discutir o assunto como o promovido na sexta-feira passada (9) em São Paulo, com a participação de ilustres personalidades como Pedro Malan, Pérsio Arida, Roberto Campos Neto (presidente do BC), Roberto Setúbal (Itaú), Octavio Lazari Jr (Bradesco), Gabriel Galípolo etc., além de figuras internacionais como Agustin Carsters, dirigente do Banco de Compensações Internacionais BIS, Tiff Macklem, presidente do Bank of Canada etc. Após muitos debates, apenas concluíram que a política monetária está perdendo sua eficácia. Pressionado por alguns participantes Campos Neto, depois de reconhecer que a economia e o mercado de trabalho não desaceleram e que a inflação demora a cair desculpou-se afirmando que a política de juros altos não é sabotagem ou capricho do BC.

Em outra conferência promovida pelo Federal Reserve de Atlanta nos EUA, o presidente regional Raphael Bostic reconheceu que os EUA atravessam um período de incerteza justificando com os mesmos argumentos que caracterizam a “Polycrisis”. Apesar disto afirmou que o Fed não pretende reduzir os juros. Janet Yellen, secretária do tesouro dos EUA, afirmou que “o tempo está se esgotando para evitar a catástrofe”. A difícil situação dos EUA já está provocando o abandono do dólar nas relações comerciais internacionais e a substituição da moeda americana, como lastro, pelos BCs de todo o mundo. O dólar representava 71% das reservas mundiais de todos os BCs, em 1999. Hoje ele representa apenas 58%, sendo substituído pelo Renmimbi (chinês) 25% e o Euro 20,5%. Esta situação tende a se agravar diante das ações dos BRICS e do Banco dos BRICS. Justas são as propostas do governo Lula sobre o tema.

Mas a situação internacional degrada-se em outras regiões do mundo. O tão esperado crescimento da China vem perdendo força e a locomotiva da União Europeia, a indústria da Alemanha, também desacelerou.

Nesta atmosfera pesada, difícil é a missão do governo de promover o desenvolvimento do país, além de defender a democracia, tendo ainda de enfrentar sabotagens de todo tipo vindas de um congresso reacionário, uma burguesia atrasada, uma imprensa vendida e um bando de loucos terroristas.


[i] Economista, Professor Emérito da UFPB e Vice Coordenador do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira; nelsonrr39@hotmail.com; (www.progeb.blogspot.com). Colaboraram os pesquisadores: Guilherme de Paula, Valentine de Moura e Lucas Tiago de Santos.

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