sexta-feira, 21 de fevereiro de 2025

TRUMP, EUA E O COMÉRCIO MUNDIAL: ALGUNS DADOS PARA ILUSTRAR O PROBLEMA

 Semana de 18 a 24 de novembro de 2024

 

           Lucas Milanez de Lima Almeida [i]

  

Os nossos leitores mais assíduos têm acompanhado algumas discussões sobre os experimentos do líder louco, Donald Trump. Vimos que, neste capitalismo em mudança, a retórica e a realidade têm colidido e divergido bastante. Mas, não podemos negar que ele tem colocado o mundo à prova, seja blefando, seja executando suas promessas de campanha. Nesse contexto, a presente análise traz alguns elementos que nos dão uma dimensão do poder que os EUA têm de interferir no comércio mundial, o que, ao mesmo tempo, é sua fraqueza (no final do texto tem uma tabela com os dados).

Antes de mais nada, é importante lembrar que, no capitalismo atual, a atividade produtiva se organiza com base nas chamadas cadeias produtivas globais. Ou seja, o processo de produção de bens e serviços foi fragmentado, descentralizado e espalhado por diversas partes do planeta. Com o objetivo de aumentar a lucratividade, quem liderou este processo foram as próprias empresas multinacionais, a partir dos anos 1980. Elas passaram a operar, direta ou indiretamente, os diversos elos da cadeia produtiva em vários países simultaneamente, transformando-se em empresas transnacionais.

Naturalmente, as grandes empresas que lideram e coordenam as cadeias produtivas globais são originárias dos países mais avançados, como EUA, Alemanha e Japão. Assim, mesmo que uma parte da produção tenha deixado de ocorrer nesses territórios, as empresas lá sediadas continuaram a conduzir a produção de mercadorias, agora, em escala global. A grosso modo, esses são os elementos que conformaram a globalização produtiva.

Pois bem, um dos resultados diretos disso é que muitos países, centrais e periféricos, aumentaram significativamente o comércio com outros países (centrais e periféricos). O leitor mais desatento pode achar que isto ocorreu porque as nações simplesmente resolveram estimular o comércio com as demais. É como se o espírito liberal de Adam Smith tivesse baixado em todos os governantes ao mesmo tempo... Contudo, o intenso aumento do comércio entre países desde os anos 1980 está essencialmente ligado ao aumento de compras diretas realizadas entre empresas sob o mesmo controle. É uma montadora de automóveis do Japão que passa a importar peças da Malásia, ao invés de produzi-las em terras nipônicas.

Pois bem, de novo. Como maior economia capitalista até aqui, os EUA também ampliaram intensamente seu comércio internacional por esta via. Isto se deu por meio da negociação entre empresas localizadas no país (principalmente americanas, mas também estrangeiras) e suas controladas espalhadas pelo mundo (uma empresa controlada é qualquer empresa sobre a qual outra empresa exerce controle significativo).

Entre 2021 e 2023, dos 8 setores classificados pelo Sistema de Classificação Industrial da América do Norte (NAICS, na sigla em inglês), em 4 deles mais de 20% das vendas externas se deu entre empresas com algum grau de controle entre si. Em outras palavras, as vendas das empresas destes 4 setores para o resto do mundo foram, na verdade, vendas para outras empresas ligadas àquela que exportou. O destaque foi a “Manufatura, Parte 2” (setor de matérias-primas de médio valor agregado), tendo em vista que 40,1% das suas exportações corresponderam a comércio entre empresas controladas e controladoras. No caso da “Manufatura, Parte 3” (atividades de maior valor agregado), 35,9% das vendas externas foi para empresas relacionadas com a empresa exportadora.

No caso das compras externas a situação é ainda mais interessante. Entre 2021 e 2023, dos 8 setores da NAICS, 7 tiveram mais de 20% das suas importações correspondendo a comércio entre empresas controladas e controladoras. Ou seja, foram empresas localizadas nos EUA que compraram produtos estrangeiros produzidos por outras empresas espalhadas pelo mundo, sendo que estas tinham alguma relação de controle com aquelas que importaram. Em 3 setores, mais de 50% das compras externas se deram entre empresas controladas/controladoras: “Manufatura, Parte 2” (56,1%); “Petróleo, Gás, Minerais e Minérios” (55,0%); “Manufatura, Parte 3” (50,1%).

Buscando sintetizar, mas deixando mais reflexões do que conclusões, os dados mostram uma complexa rede de conexões comerciais entre empresas localizadas nos EUA e no resto do mundo. Por um lado, vê-se o poder que o capital estadunidense tem, ao emaranhar-se em meio às cadeias fornecedoras e consumidoras de empresas das mais diversas nacionalidades. Por outro, isto também é a fraqueza das propostas de Donald Trump, pois são muitos os flancos através dos quais os países podem retaliar os EUA.

Resta esperar para ver quem vai ganhar e quem vai perder, pois, apesar dessas medidas atenderem aos interesses de alguma fração da burguesia ianque, está claro que elas vão afetar fortemente todo o mundo. É pegar a pipoca e assistir ao desfecho.

Tabela 1 - Percentual do comércio externo que se deu entre empresas controladas/controladoras nos EUA: 2021-2023










Fonte: https://data.census.gov/
  • Manufatura, Parte 1: Alimentos e Produtos Similares; Bebidas e Produtos de Tabaco; Têxteis e Tecidos; Produtos de Fiação e Tecelagem; Vestuário e Acessórios; Couro e Produtos Correlatos.
  • Manufatura, Parte 2: Produtos de Madeira; Papel; Matérias Impressas e Produtos Relacionados; Produtos de Petróleo e Carvão; Produtos Químicos; Produtos de Plástico e Borracha; e Produtos Minerais Não Metálicos.
  • Manufatura, Parte 3: Fabricação de Metais Primários; Produtos de Metal Fabricados, NESOI; Maquinário, Exceto Elétrico; Produtos de Computador e Eletrônicos; Equipamentos Elétricos, Eletrodomésticos e Componentes; Equipamentos de Transporte; Mobiliário e Acessórios; Produtos Manufaturados Diversos.


[i] Professor (DRI/UFPB; PPGCPRI/UFPB; PPGRI/UEPB) e Coordenador do PROGEB. (@progebufpb, www.progeb.blogspot.com; @almeidalmilanez; lucasmilanez@hotmail.com). Colaboraram: Brenda Tiburtino, Gustavo Figueiredo, Camylla Costa, Jéssica Brito, Maria Júlia Gomes e Paola Arruda.

 

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sábado, 15 de fevereiro de 2025

EUA VS. MUNDO: QUANDO A RETÓRICA COLIDE COM A REALIDADE

Semana de 03 a 09 de fevereiro de 2025

   

Paola Teotônio Cavalcante de Arruda[i]

  

Historicamente, os Estados Unidos vêm defendendo e difundindo os “princípios do livre mercado”, com apoio à especialização produtiva e à eliminação de barreiras tarifárias. Durante muito tempo, o pensamento econômico que predominou na economia global foi o de que seria necessário liberalizar, para desenvolver. As ideias hegemônicas eram as que fortaleciam concepções de economias abertas e do livre fluxo de pessoas e mercadorias.

O retorno de Donald Trump à cena política norte-americana, no entanto, expõe, mais uma vez, a hipocrisia desse discurso. Ao anunciar a imposição de tarifas sobre produtos vindos do Canadá, do México e, principalmente, da China, Trump contraria a lógica que sustentou a supremacia econômica americana por décadas. Mas, mais que isso, a conduta americana revela como os princípios do livre mercado e da não intervenção são frequentemente abandonados, quando determinados interesses nacionais estão em jogo.

Isso quer dizer, caro leitor, que, no fim das contas, a adesão ao liberalismo econômico por parte das grandes potências é mais uma questão de conveniência política do que de real compromisso econômico. O mesmo país que difundiu a democracia liberal pelo mundo, em oposição à regimes ditatoriais e em “defesa” da “soberania” e da “autodeterminação dos povos”, hoje, fala em acabar com a independência do Canadá e em anexar outros territórios soberanos, como a Groenlândia e o Canal do Panamá.

Veja, não é a “ditadura” chinesa que está falando em intervir em outros territórios, mas a “livre democracia” norte-americana. As ideias e ações de Donald Trump, em tão pouco tempo de governo, indicam a possibilidade de instauração de uma guerra comercial. As consequências de tais decisões é que não estão ainda claras e não há garantia de que saiam como esperadas para os EUA.

 China, Canadá e México são os três maiores parceiros comerciais do país, e a imposição de tarifas não apenas poderá gerar retaliações, como, provavelmente, impulsionará as nações a buscar novos mercados. Nesse contexto, a América Latina pode se tornar ainda mais estratégica para a China, especialmente diante da crescente tensão provocada pelas ameaças dos EUA ao Canal do Panamá e ao México, ampliando o espaço para a influência chinesa na região.

No que tange às relações com o Brasil, a postura cada vez mais agressiva dos Estados Unidos em relação a imigrantes reforça as tensões na política externa. A recente deportação de 88 brasileiros, que chegaram algemados ao país, em 24 de janeiro, evidenciou o tratamento desumano imposto pelo governo norte-americano. No campo comercial, ainda não está claro se o Brasil será alvo das tarifas protecionistas impostas pelos EUA. Apesar da gravidade do episódio e do aumento das tensões, o governo brasileiro tem adotado uma abordagem pragmática e cautelosa, com ênfase na reciprocidade.

Portanto, caro leitor, o cenário global se desenha cada vez mais instável, com os Estado Unidos assumindo uma postura protecionista, que contradiz seu próprio discurso. Espera-se, então, a remodelação das relações globais, já que as ações agressivas e os discursos retrógrados daquele país gerarão reações em cadeia. O Brasil, assim como outras nações emergentes, deve se preparar para um contexto de maior disputa geopolítica e realinhamentos estratégicos. A ascensão da China como alternativa comercial e a crescente pressão americana tornam imprescindível uma política externa equilibrada, capaz de defender interesses nacionais sem abrir mão da autonomia, da estabilidade e do crescimento econômico.


[i] Pesquisadora do PROGEB e Graduada em Relações Internacionais (UFPB). (paolatc.arruda@gmail.com). Colaboraram: Lara Souza, Rubens Gabriel, Antônio Queiroz, Ícaro Moisés, Miguel Oliveira, e Raquel Lima.

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sábado, 8 de fevereiro de 2025

TRUMP: O EXPERIMENTO DE UM LÍDER LOUCO

Semana de 20 a 26 de janeiro de 2025

       

Nelson Rosas Ribeiro[i]

   

Nos dias de hoje, torna-se quase impossível falarmos de conjuntura sem fazer considerações sobre o atual presidente dos EUA, Donald Trump. É claro que ele foi eleito pelo povo americano e, por isso, tem todo o direito de tomar decisões sobre seu país. No entanto, ele não foi eleito presidente ou rei do mundo. Não podemos negar que os EUA são a maior potência econômica e militar do planeta e merece todo o respeito. No entanto, é preciso lembrar que existe o resto do mundo que, por sinal, representa a maioria da população, do território, da economia etc. A maneira como se comporta o Sr. Trump nos faz crer que ele não sabe disso. A arrogância com que ele trata o resto do mundo nos faz crer que ele considera que seu país tudo pode e não depende de qualquer relação com os outros. Durante os poucos dias de seu governo, ele não assinou nenhum ato que não fosse de agressão, nem proferiu nenhum discurso, que provocasse simpatia, nem mesmo de seus mais fiéis aliados que, ao contrário, têm sofrido agressões.

Bancar o lunático tem sido uma ferramenta recorrente na carreira de Donald Trump. Afinal, agir assim assusta seus inimigos e os força a ceder. E é assim que ele tem agido. O detalhe é que seu poder de chantagem se ampliou infinitamente. As ameaças feitas por ele estarrecem o mundo. Logo de início declarou que pretendia apropriar-se do Canal do Panamá, alegando algumas mentiras sobre os chineses. Em seguida, propôs a anexação do Canadá, tornando-o o 51º estado americano. Taxou as importações do México e do Canadá em 25%, rasgando o tratado de comércio existente entre estes países, o USMCA. É bom referir que os EUA importam 40% do petróleo que consomem, e, destes, 60% vêm do Canadá e 11% do México. Além disso estes dois países têm 75% de suas exportações destinadas aos americanos. Declarou ainda a intenção de apropriar-se da Groelândia tomando-a da Dinamarca, o que provocou protestos deste país e de toda a União Europeia, com pronunciamentos dos governos da França, Alemanha e Inglaterra. Determinou ainda a mudança do nome do Golfo do México para Golfo da América.

Mas, Trump ainda não ficou satisfeito. Resolveu fazer nova arrumação no Oriente Médio. Decretou sua posse da Faixa de Gaza propondo-se a esvaziá-la, retirando de lá todos os palestinos, a fim de limpar os resíduos da guerra, reconstruir tudo e transformar a faixa em um grande resort, uma verdadeira Riviera, melhor mesmo que Mônaco. Para o resto da Palestina, ele propõe retirar os 2 milhões de palestinos que lá vivem, exportando-os para o Egito e Arábia Saudita. O mundo árabe pegou fogo, com protestos generalizados, não só dos países islâmicos, mas de muitos países da União Europeia e do resto do mundo. Só Netanyahu aplaudiu, chamando Trump de maior amigo que Israel já teve.

A América Latina também não ficou fora dos planos do tirano. Começou enviando um avião militar com colombianos deportados algemados e acorrentados para a Colômbia. O governo colombiano protestou e recusou-se a receber seus cidadãos deportados naquelas condições. Sob pressão e ameaças o governo recuou. Aconteceu o mesmo em relação aos brasileiros deportados, que chegaram igualmente acorrentados, sendo necessária a intervenção da Polícia Federal para tirar as algemas e não permitir novo embarque, no mesmo avião, para completar o trajeto até Minas, local de destino. Depois de protestos diplomáticos, chegou-se a um acordo para não desembarcar os prisioneiros algemados, nem utilizar aviões militares no transporte, além de usar o aeroporto de Fortaleza como destino, encarregando-se o Brasil pelo restante da viagem em aviões nacionais. Para completar, Trump ordenou seus militares a prepararem a base, que os EUA possuem em Guantánamo, Cuba, para abrigar até 30.000 prisioneiros deportados, a fim de tirá-los dos EUA.

Internamente, as autoridades fazem uma varredura em busca de imigrantes ilegais, prendendo em massa, na rua, nos empregos, nos restaurantes, nos bares, provocando um verdadeiro pânico. Sua promessa de campanha foi expulsar todos os ilegais, o que ele vem fazendo até agora.

As consequências esperadas para a economia dos EUA, vão desde a paralisação das atividades por falta de mão de obra, a inflação, até a falta de produtos. Este é o resultado da eleição do líder louco escolhido pelo povo americano. O pior é que o resto do mundo nada tem com isto, mas vai igualmente pagar o preço da insensatez. Esperamos que o preço seja pago na economia e não em sangue, o que seria terrível.


[i] Economista, Professor Emérito da UFPB e Vice Coordenador do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira; nelsonrr39@hotmail.com; (www.progeb.blogspot.com). Colaboraram os pesquisadores: Paola Arruda, Julia Bomfin, Mateus Eufrasio, Icaro Formiga, Ryann Felix e Guilherme de Paula.

        

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sexta-feira, 31 de janeiro de 2025

O ANO COMEÇA, E AS PREVISÕES SEGUEM AO ENCONTRO DO ERRO

 Semana de 20 a 26 de janeiro de 2025

    

Rosângela Palhano Ramalho [i]

        

Caro leitor, enquanto o mundo digere a retórica truculenta de Donald Trump e em torpor, aguarda pela possibilidade de suas ameaças se tornarem reais, o governo brasileiro segue tentando dirimir questões internas, que a oposição e os analistas fazem parecer maiores do que efetivamente são. Tornaram-se comuns as deturpações relativas às questões cotidianas e, principalmente dos dados econômicos, que vêm sempre acompanhados de “é um número bom”, mas, contudo, todavia...

Os resultados econômicos de 2024 estão sendo apurados. O PIB deve crescer em torno de 3%, o desemprego apresentará queda e nem a inflação, nem o dólar, como sugeriram, fecharão em descontrole. Nossa balança comercial apresentará superávit superior a US$ 77 bilhões, segundo os últimos números que foram verificados. Enfim, apesar do Banco Central, tivemos bons resultados econômicos.

O governo foi abertamente pressionado a adotar uma política monetária contracionista para promover uma desaceleração da economia. E o fez. Ainda não se sabe qual será o impacto do aumento da taxa de juros, mas, os mesmos analistas que “exigiram” medidas contundentes contra o inexistente monstro inflacionário, agora lamentam o efeito antes tão desejado. Representantes do setor financeiro (bancos, consultorias e gestoras de fundos) em suas cartas e relatórios tradicionais de início de ano, projetam uma recessão técnica, representada por dois trimestres seguidos de queda do PIB. O resultado fatídico viria nos últimos trimestres deste ano e, a economia cresceria em torno de 2,5%.

O curioso é que, mesmo com o governo atendendo ao clamor de uma rígida política monetária, os documentos levantam “preocupações”. Temem que a reação do governo à desaceleração econômica seja a de gastar mais. A afirmação flerta com a ideia de que os gastos governamentais provocam apenas uma consequência: mais inflação, que tem que ser combatida com mais juros! Pela visão míope que tem da economia, o setor financeiro não concebe que os gastos impulsionam as variáveis econômicas reais, por meio do efeito de arrastamento sobre a renda e investimentos nacionais. Por outro lado, dizem os levantamentos, a desaceleração econômica piorará a avaliação do governo e este reagirá gastando mais. Estaremos todos perdidos! Mais um caos para chamarem de seu!

Enfim, os fantasmas criados em 2024 foram tragados pela realidade, mas outros estão sendo concebidos para assombrar 2025. Para felicidade nossa, o mercado erra e erra muito. Uma verificação feita pela plataforma digital UOL (Universo On Line), mostrou que economistas, especialistas e analistas de mercado, erraram em 95% das previsões dos últimos quatro anos. Tomando como base o primeiro boletim Focus do Banco Central de cada ano e a primeira edição da pesquisa “LatAm Fund Manager Survey”, feita pelo Bank Of America, os erros incidem sobre as projeções do PIB, inflação, taxa de juros, Ibovespa e dólar. E, se levarmos em conta apenas as previsões e fechamentos anuais do PIB, inflação e juros, realizadas pelo Focus, os erros foram de 100%, conforme apresentado na tabela a seguir!

Do poderio econômico e financeiro não se cobra credibilidade. Do governo, sim.

O primeiro boletim Focus de 2025 projeta crescimento do PIB de 2,02%, juros de 15% e inflação de 4,99%. Esperamos veementemente que o mercado mantenha o padrão e erre! De novo!


[1] Professora do Departamento de Economia da UFPB e pesquisadora do PROGEB (@progebufpb, www.progeb.blogspot.com; rospalhano@yahoo.com.br, rosangelapalhano31@gmail.com). Colaboraram: Brenda Tiburtino, Maria Júlia Alencar, Guilherme de Paula, Nelson Rosas, Lara Souza e Gustavo Figueiredo.

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sexta-feira, 24 de janeiro de 2025

O DISCURSO DE TRUMP: ECOS DE UM CAPITALISMO EM MUDANÇA

Semana de 13 a 19 de janeiro de 2025

   

Lucas Milanez de Lima Almeida [i]

   

“O mundo está mudado”. Essa é uma frase que temos repetido inúmeras vezes nos últimos tempos. Mas, diferentemente dos seus avós, que certamente já disseram isso ao caro leitor, nossas análises trazem as causas reais dessa mudança (que não tem nada a ver com os jovens e a forma como eles levam a vida). O que mudou e está em constante transformação é a maneira como o capitalismo se impõe no nosso dia a dia.

Se hoje existem os “tios do zap”, é graças ao avanço tecnológico alcançado pelo capitalismo. Se hoje os jovens se vestem igual a um personagem de desenho animado, é graças à globalização capitalista. Se a estranheza às diferenças está sendo transformada em ódio, também é graças ao capitalismo. A grande dificuldade da imensa maioria da população é entender isto.

De fato, encontrar as conexões entre o nosso cotidiano e as estruturas da sociedade é difícil e requer raciocínios complexos, que só são alcançados com um grau considerável de reflexão. Ou seja, infelizmente, pensar o mundo em suas várias dimensões não é uma coisa acessível para a maior parte da população. Nesse pacote de “limitações” estão elementos que vão desde as nossas crenças e valores, até chegar à educação formal, dada pelas escolas e faculdades. Por isso mesmo, frequentemente, parte considerável da população acredita em soluções simples para problemas complexos (uma máxima dos economistas).

O discurso de posse de Donald Trump segue essa linha de raciocínio. Primeiro, mas jamais o faria, ele não ataca o cerne do problema: o próprio capitalismo. Com a ascensão das tecnologias da informação e comunicação, bem como com a conformação das cadeias globais de valor, as potências ocidentais, em especial os EUA, perderam parte do controle sobre o desenvolvimento capitalista mundial. Dentre as consequências, esses países vivenciaram a desindustrialização, o empobrecimento da classe trabalhadora, o aumento das desigualdades e a concentração exacerbada de riqueza. O descontentamento social gerado por isso, por sua vez, mirou naquilo que é mais aparente nesse processo: a globalização.

Como temos tratado há algum tempo, a reação contrária tem sido chamada de desglobalização. Este é um fenômeno que tem um caráter essencialmente econômico, mas com fortes elementos geopolíticos. O CHIPS Act e o movimento “Make America Great Again”, por exemplo, são duas faces dessa mesma moeda. De um lado, o grande capital norte-americano (leia-se: as big-techs) busca tirar o atraso em relação ao desenvolvimento tecnológico dos países asiáticos. Do outro, a burguesia interna e a classe trabalhadora sentem na pele as mudanças atribuídas a deus e o mundo (vide o discurso de Trump). No meio, a busca por um líder forte, que salve a tudo e a todos...

O problema é que, quando o assunto é a defesa estatal de interesses econômicos nacionais, ou seja, quando o assunto é usar o poder público para fins de interesses privados em escala internacional, a história mostra que o capitalismo não mede qualquer esforço. No século passado, viu-se a complacência do mundo capitalista com o nazismo, enquanto este tinha apenas a União Soviética como alvo. Na época, o contexto também era de um país buscando recuperar as glórias do passado, com inimigos externos e “traidores” internos. Sob a justificativa do desenvolvimento, a burguesia alemã patrocinou Hitler sem mais demora.

Como Elon Musk deixou absolutamente escancarado, o próximo mandato de Donald Trump vai tirar, cada vez mais, o fascismo do esgoto. Não apenas porque ele precisa manter sua base eleitoral, mas porque o capitalismo e a hegemonia dos EUA dependem disso. Não podemos achar que um país beligerante de nascença mude seu modus operandi. O que ainda não está claro é como a China, a única potência capaz de fazer frente ao poderio estadunidense, vai atuar no tabuleiro internacional.

Aqui, no Brasil, infelizmente, não temos muito a fazer, além de continuar seguindo nossa tradição diplomática. Internamente, a extrema-direita brasileira, que se diz patriota, tende a ter os EUA como um grande aliado político. Isso preocupa muito no contexto da guerra de informações em que vivemos, sobretudo porque ano que vem tem eleições presidenciais. Espero que a mudança na comunicação do governo Lula seja efetiva, pois, os bons números que a economia tem apresentado não são garantia de nada. Pelo contrário, é preciso entrar nessa guerra de cabeça. À luta.


[i] Professor (DRI/UFPB; PPGCPRI/UFPB; PPGRI/UEPB) e Coordenador do PROGEB. (@progebufpb, www.progeb.blogspot.com; @almeidalmilanez; lucasmilanez@hotmail.com). Colaboraram: Brenda Tiburtino, Rosângela Palhano, Guilherme de Paula, Gustavo Figueiredo, Lara Souza e Paola Arruda.

 

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quinta-feira, 16 de janeiro de 2025

ECONOMIA EM ALTA, CONFIANÇA EM BAIXA: O PAPEL DA ELITE NA DESINFORMAÇÃO

Semana de 06 a 12 de janeiro de 2025

     

Paola Teotônio Cavalcanti de Arruda [i]

   

Se você acompanhou as análises das últimas semanas, percebeu que os indicadores econômicos de 2024 desafiaram as previsões pessimistas, amplamente divulgadas no mercado ao longo do ano anterior. As projeções de colapso econômico, frequentemente comparando o Brasil a situações de crise em outros países, não se concretizaram. Pelo contrário, o país apresentou crescimento. Ainda assim, esse avanço não parece despertar entusiasmo em certos setores da elite econômica nacional.

Um exemplo revelador está numa notícia publicada neste início de janeiro, pelo jornal Valor Econômico, intitulada: “Mesmo com incertezas, desemprego deve ter alta apenas gradual em 2025.” O texto começa com uma frase emblemática, que parece traduzir o desconforto de parte da elite frente aos resultados positivos de 2024: “Será que a perda de fôlego do mercado de trabalho esperada há três anos por economistas vai enfim chegar em 2025?” A questão implícita parece ser: será que, finalmente, aqueles que dependem do trabalho assalariado enfrentarão dificuldades novamente? Será que as pressões nos preços, geradas por salários melhores e maior acesso a bens e serviços, deixarão de incomodar? Essa narrativa evidencia a resistência de alguns segmentos da sociedade em aceitar um maior dinamismo econômico no país, que traga mais qualidade de vida à população em geral.

O que se pode observar é um padrão recorrente, em que a responsabilidade pelos problemas recai sobre a população, enquanto o 1% mais rico do país se beneficia com políticas contracionistas e de austeridade. Paralelamente, a confiança no cenário político segue em declínio, ameaçando a estabilidade democrática. Apesar dos resultados positivos de 2024 — como o menor nível de desemprego da série histórica e o crescimento do PIB —, essas conquistas parecem não alcançar plenamente a consciência coletiva. Em meio a uma espécie de apatia informativa, grande parte da população continua consumindo desinformação e alimentando, inadvertidamente, ciclos de fake news que permeiam diversas camadas da sociedade.

Ainda nessas primeiras semanas de 2025, uma notícia falsa alegando que o governo brasileiro teria implementado uma taxação sobre transações realizadas via Pix, especialmente para valores mais elevados, espalhou-se rapidamente, gerando pânico entre os usuários, que receavam ter parte de seus ganhos “confiscados” pelo governo, em virtude de transações bancárias. Não havia, no entanto, qualquer nova cobrança sobre o Pix, e as medidas tinham, como objetivo exclusivo, aprimorar o monitoramento de transações financeiras, e combater a sonegação fiscal, sem prejudicar os usuários comuns

A disseminação da notícia falsa sobre a suposta taxação do Pix dividiu a sociedade. De um lado, havia grupos mal-intencionados divulgando deliberadamente a desinformação, para causar pânico e enfraquecer a confiança no governo. De outro, havia pessoas e organizações empenhadas em combater a fake news, tentando esclarecer a medida. Sabe-se, todavia, que o ciclo de fake news é muito difícil de ser quebrado, porque as informações falsas alcançam um número maior de pessoas, em muito menos tempo.

Em meio ao tumulto, o governo, em vez de buscar diálogo com a sociedade, optou por revogar a medida, cedendo às pressões geradas por informações falsas. Essa decisão traz, pelo menos, dois impactos negativos para a atual gestão do Brasil. Para aqueles que não entenderam a medida, ficou a impressão de que o governo realmente planejava taxar o Pix e recuou, devido à “pressão da oposição”. Por outro lado, para quem compreendeu a proposta e tentou desmentir a informação falsa, o recuo pode ser interpretado como um sinal de fraqueza e incapacidade de comunicar suas intenções e políticas de maneira clara e eficaz à população. Assim, a revogação não apenas falhou em reverter os danos causados pela fake news, como também reforçou a percepção de instabilidade e falta de liderança.

Como dito na última análise, este não será um ano fácil. Enquanto isso, 2026 está batendo à porta e, por isso, 2025 será crucial para o que está por vir. A gestão do país enfrentará o desafio de consolidar os avanços obtidos em 2023 e 2024, ao mesmo tempo em que precisará combater ciclos de fake news, que não só ameaçam a estabilidade social e política, como também tendem a se fortalecer com o fim das restrições da Meta. Portanto, não basta que sejam promissores os resultados, será também imprescindível fortalecer os canais de comunicação com a sociedade, combater a desinformação e reafirmar o compromisso com decisões transparentes e consistentes.


[i] Pesquisadora do PROGEB e Graduanda em Relações Internacionais (UFPB). (paolatc.arruda@gmail.com). Colaboraram os pesquisadores: Brenda Tiburtino, Rosângela Palhano, Guilherme de Paula, Lara Souza, Gustavo Figueiredo, Jéssica Brito, Antônio Fontes e Icaro Moisés..

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sexta-feira, 10 de janeiro de 2025

2025: PREPAREMO-NOS PARA AS BATALHAS QUE VIRÃO

Semana de 30 de dezembro de 2024 a 05 de janeiro de 2025

   

Nelson Rosas Ribeiro[i]

   

Nas duas análises passadas, destacamos a “resiliência” da economia em 2024 e as ameaças que pairam sobre nossas cabeças agora em 2025.  O ano mal começou, e a inflação bateu à porta vindo do exterior e do clima. A desvalorização do real frente ao dólar, com a ajuda da especulação, tem repercussão sobre os preços dos importados, elevando os custos de produção. Por outro lado, as variações e as catástrofes climáticas influem nos preços dos alimentos. Em ambos os casos, as taxas de juros não têm nenhuma influência. Nada podemos contra o clima e não conseguimos influenciar a política do governo dos EUA. A situação torna-se ainda mais grave com o aumento das incertezas geradas pela eleição de Donald Trump.

Mas o Banco Central (BC) não sabe disso. Na cabeça de seus diretores, só existe a velha (teoria) ideologia econômica, ensinada nos manuais, segundo a que se combate a inflação elevando a taxa de juros. E aí aguardamos que se cumpra a profecia de novas elevações da Selic, já prometida. Os sábios diretores do BC ainda não descobriram que os desequilíbrios entre oferta e procura podem ser corrigidos também pelo aumento da oferta. Assim, as taxas de juros elevadas, não tendo qualquer influência na contenção da elevação dos preços atuais, apenas dificultam os investimentos travando a produção e, portanto, comprimindo a oferta. Coitados dos novos diretores a serem indicados pelo Lula, incluindo o novo presidente, Gabriel Galípolo, os quais assumirão a direção do BC, sofrendo grande pressão “d’Uzmercado” e de toda a mídia reacionária. A Selic, que hoje se situa em 12,25%, deverá subir para 15% até o final do ano, segundo as estimativas dos representantes do sistema financeiro, aqui chamados de “uzmercado”.

Os resultados econômicos de 2024 desmoralizaram as previsões pessimistas “d’ Uzmercado”. Não estamos emitindo uma opinião, mas apenas constatando os dados publicados. O emprego aumentou, aumentaram os salários, os investimentos, as vendas, a produção, os lucros etc. Desmoralizaram-se as previsões de caos, de nos tornarmos uma Venezuela ou Argentina. (Onde andará o profeta Paulo Guedes? Gostaria de ver a cara dele).

Mas nada parece adiantar. O problema é que os reacionários não conseguem engolir o governo Lula, mesmo com as derrotas das tentativas de golpe e com o avanço dos processos que levarão a muitas condenações de golpistas e conspiradores como já vem ocorrendo, as tramas continuam. Para agravar a situação, temos agora de enfrentar duas poderosas organizações criminosas, muito piores que o PCC e o CV. Estas duas perigosas organizações ameaçam as pessoas, mas, agindo contra a lei, assumem o risco de seus membros serem apanhados, processados e presos. As duas novas organizações que temos de enfrentar não correm este risco pois se encontram aquarteladas dentro do Congresso nacional e no Banco Central. São, porém, mais perigosas pois, acobertados pela legalidade de seus status, conspiram contra a nação e a sua ação atinge a todos.

No Congresso aprovam leis e decretos anticonstitucionais, aumentando seus privilégios e salários e provocando rombos no orçamento. Estes rombos serão lançados nas contas do governo que será responsabilizado por não cumprir a lei do arcabouço fiscal. Ao mesmo tempo, aumentando o desequilíbrio fiscal, aprovam leis que elevam as despesas, como a desoneração da folha de pagamento, ou a conceção de benefícios fiscais para algumas empresas, ou ainda criando novas emendas parlamentares, dinheiro destinado aos redutos eleitorais dos deputados e senadores, sem qualquer controle.

A organiza criminosa alojada no BC, por seu lado não vacila em derrubar a economia programando novas elevações da taxa de referência Selic. O insaciável mercado financeiro não para de berrar histérico, acusando o governo de não buscar o equilíbrio fiscal, de não cortar gastos, não procurar obter superávit primário e não conseguir dar garantias de que conseguirá conter o endividamento. Acusam o governo de não apresentar um plano convincente de corte de gastos capaz de satisfazer sua sanha por mais juros.

Certamente teremos um 2025 difícil.


[i] Economista, Professor Emérito da UFPB e Vice Coordenador do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira; nelsonrr39@hotmail.com; (www.progeb.blogspot.com). Colaboraram os pesquisadores: Brenda Tiburtino, Guilherme de Paula, Gustavo Figueiredo, Lara Souza, Maria Julia Alencar, Paola Arruda e Raquel Lima.

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