quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

Revolução Cubana: 50 anos de socialismo desafiando o capitalismo global

Semana de 19 a 25 de janeiro de 2009

Desde a 2ª Guerra Mundial, principalmente, criou-se uma série de indicadores econômicos com o objetivo de medir o desempenho das economias existentes no globo. Ao lado desses indicadores surgiram os indicadores sociais, tendo em vista que a preocupação, após a 2ª Guerra, era buscar o desenvolvimento econômico e não somente o crescimento. A diferença conceitual entre crescimento e desenvolvimento está no fato de que este último consiste não apenas no aumento quantitativo do produto de um país (ou seja, crescimento), mas na distribuição desta maior riqueza, de forma eqüitativa, entre os seus habitantes. Ora, uma olhada nas estatísticas mundiais mostra que crescer com equidade é incompatível com o modo capitalista de produção.
Dentre os indicadores econômicos podem-se destacar: a produção industrial, o volume de vendas do comércio e da indústria, o volume de crédito, o consumo de energia, a produção de papelão, a variação do PIB, etc. Quanto aos indicadores sociais, os mais importantes dizem respeito a dados sobre educação, saúde, saneamento básico, com destaque para o IDH (Índice de Desenvolvimento Humano). Pode-se afirmar que a taxa de crescimento do PIB figura como o indicador econômico de maior relevância e, observando o desempenho de um país do ponto de vista social, é o IDH que tem o maior destaque.
Ao estudar a dinâmica de desenvolvimento econômico, no capitalismo, o imortal Celso Furtado, respeitado economista brasileiro, chegou a duas importantes conclusões. Em primeiro lugar, que o subdesenvolvimento é um subproduto do capitalismo, e não uma mera etapa que todas as economias capitalistas terão de percorrer, rumo ao desenvolvimento. Em segundo lugar, com base na análise dos dados de uma série histórica de várias economias, Furtado concluiu que o crescimento econômico, no capitalismo, é sempre acompanhado de uma elevação no grau de concentração da riqueza.
Em 1º de janeiro de 2009, Cuba comemorou os 50 anos de sua revolução socialista, em meio a uma grande crise do capitalismo mundial. Os cubanos, há meio século, resistem às dificuldades impostas pelo bloqueio econômico norte-americano e desafiam o capitalismo mostrando indicadores sociais e econômicos muito melhores do que os de muitas economias capitalistas do mundo. Infelizmente, a grande mídia capitalista filtra as informações, divulgando o que Cuba tem de negativo e escondendo os resultados positivos que, se comparados às nações capitalistas, principalmente às subdesenvolvidas (90% do total de economias capitalistas), as envergonhariam. Para se ter uma idéia, a ilha caribenha possui o segundo menor índice de mortalidade infantil das Américas, com 5,3 mortes por mil nascidos vivos, inferior apenas ao Canadá. O dado mostra que o país mais rico do mundo, isto é, os Estados Unidos, com um PIB, que representa 25% da economia mundial, não foram capazes de cuidar tão bem da saúde de suas mulheres e crianças.
Deixando de lado as questões sociais e enfatizando as econômicas, já que no capitalismo são as únicas que interessam, Cuba também não passa vergonha, pelo contrário, constrange seus colegas capitalistas subdesenvolvidos e mesmo os desenvolvidos. De acordo com dados da Comissão Econômica para a América Latina, CEPAL, Cuba crescerá 4,3% em 2008, enquanto que o México, usado como exemplo das vantagens de se engajar ao bloco comercial comandado pelos Estados Unidos, Nafta, crescerá apenas 1,8%. A economia norte-americana terá um resultado inferior ao da mexicana. É válido ressaltar que, em 2008, Cuba teve perdas superiores a US$ 10 bilhões em conseqüência dos furacões Gustav e Ike, o que lhe impediu de repetir o crescimento de 12,1% (o maior crescimento entre os latinos), em 2007, e de 7,3%, em 2006. Em três anos Cuba expandiu seu PIB em 26%. Neste mesmo período, o Brasil cresceu... quanto mesmo?
Na Zona do Euro a previsão para 2009 é de uma retração de 1,9%, de acordo com a Comissão Européia. No último trimestre de 2008, a economia da zona do Euro encolheu 1,5%, depois de cair 0,2% nos dois trimestres anteriores.
As projeções da CEPAL para a economia cubana, em 2009, são de um crescimento de 4%, bastante superior aos de várias economias capitalistas latino-americanas, e aos das economias dos países desenvolvidos, todos em recessão. Além do mais, sem bolsa de valores, Cuba está isenta das preocupações e do desespero que o mundo capitalista tem vivenciado desde que a crise eclodiu. Até a China, antiga economia socialista, agora amarga os males da nova escolha, depois de ter experimentado as suas benesses. Trinta anos depois de ter dado início à nova estratégia de desenvolvimento, a China agora saberá o que é, de verdade, ser capitalista.
O governo desse país informou que o desemprego cresceu pela primeira, vez desde 2003, atingindo 4,2% em 31 de dezembro. Três meses antes a taxa de desemprego urbano era de 4%. As perspectivas são de piora, dado o declínio das exportações. O crescimento econômico chinês caiu para 6,8%, no último trimestre do ano, e 9%, em todo o ano de 2008, contra um crescimento de 13%, em 2007.
De acordo com Nouriel Roubini, professor da Universidade de Nova York que previu a crise econômica atual, a China já está em recessão, apesar do governo ter divulgado dados que mostram um crescimento no quarto trimestre: “A China está em recessão, independente do que os números oficiais, muito manuseados, afirmam”.
O economista disse que os dados sobre o crescimento econômico anual da China são grandemente enganosos porque não refletem a acentuada desaceleração na produção ocorrida durante o quarto trimestre de 2008. Para ele, o declínio na produção de energia elétrica e a contração da indústria de transformação sugerem que o crescimento pode ser negativo.
A China não é a única economia asiática a amargar as conseqüências da crise. O Japão já registrou retração do PIB, e o banco central japonês prevê redução de 1,8%, para o ano orçamentário 2008-2009, e de 2%, para 2009-2010. A Coréia do Sul encolheu 5,4% só no último trimestre do ano, sendo esta a maior retração registrada nos últimos 11 anos.
Referindo-se aos EUA, Roubini afirmou que os prejuízos das instituições norte-americanas, com crédito, poderão chegar ao seu pico no nível de US$ 3,6 trilhões, metade dos quais seriam perdas dos bancos e das corretoras credenciadas como operadoras primárias. Se for assim, isso “significa que, na prática, o sistema bancário dos Estados Unidos está insolvente porque começa a funcionar com um capital de US$ 1,4 trilhão. Isso é uma crise bancária sistêmica”, disse Roubini.
Ainda conforme Roubini, o novo presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, terá de empregar até US$ 1 trilhão em recursos públicos para respaldar a capitalização do setor bancário, depois da injeção de US$ 350 bilhões, aplicada pelo governo Bush. E concluiu que “os problemas do Citi, do Bank of America e de outros, sugerem que o sistema (norte-americano) está falido. Na Europa é a mesma coisa”.
Os dados sobre o desastre econômico continuam a chegar de todos os setores da economia mundial.
  • O Citigroup sofreu perdas, em cinco trimestres consecutivos, totalizando US$ 25,2 bilhões e, as perdas no quarto trimestre de 2008 alcançaram a cifra de US$ 8,29 bilhões.
  • A Microsoft divulgou resultados trimestrais que ficaram aquém da expectativa de Wall Street e anunciou que poderá cortar até 5 mil postos de trabalho.
  • A Honda reduzirá sua produção de veículos em 1,17 milhão de unidades, até março, e demitirá 3.100 trabalhadores temporários no Japão, em abril. A produção será suspensa por 29 dias, em fevereiro e março, e 35 dias, em abril e maio, na fábrica de Swindon, Inglaterra.
  • A Toyota está executando cortes de produção que variam por fábricas e modelos, por meio da eliminação de 29 dias de produção, neste trimestre, em duas linhas de montagem que constrói os sedãs Camry. No tocante ao emprego, planeja demitir 5 mil trabalhadores temporários no Japão e nos Estados Unidos.
  • A Nissan, terceira maior montadora do Japão, vai reduzir os planos de produção doméstica em mais 64 mil veículos, em fevereiro e março.
  • A Yamaha, segunda maior fabricante de motocicletas do mundo, suspenderá temporariamente as operações nas 11 fábricas nacionais por alguns dias, em fevereiro e março.
  • A Circuit City, segunda maior cadeia norte-americana de lojas de produtos eletrônicos, decretou falência, deixando sem emprego 30 mil pessoas e fechando 567 lojas.
  • O conglomerado industrial MAN AG vai interromper a produção de suas fábricas de caminhões, na Alemanha, por 42 dias, durante a primeira metade do ano, o que afetará cerca de 9,4 mil trabalhadores.
  • A Stora Enso, maior fabricante européia de papel, planeja aumentar os cortes na produção depois de diminuir em 15% sua produção de papel, no quarto trimestre de 2008. A empresa fechou uma unidade de produção de papelão e uma linha de papel cuchê na Alemanha, no trimestre, e deixou de extrair madeira na Finlândia por várias semanas, como parte do plano de redução de custos anunciado em setembro.
  • A Metso Oyi, que fabrica maquinário para indústria de papel e celulose, irá eliminar 1,2 mil empregos.
  • A Basf, maior companhia do setor químico mundial, reduziu a produção nas fábricas e disse que poderá efetuar mais demissões, além dos 200 postos já eliminados. Atualmente, mais de 1,8 mil empregados trabalham menos horas enquanto as fábricas operam com menos de 75% da capacidade em média.
  • A Dow Chemical, empresa norte-americana também do setor químico, já demitiu 5 mil pessoas, fechou algumas unidades e vendeu alguns setores.
  • As exportações das gigantes japonesas Sony e Toyota, despencaram 35%, em dezembro, frente ao mesmo mês, em 2007.
  • A Sony registrou prejuízo líquido, em 2008, de US$ 2,9 bilhões (260 bilhões de ienes) e a LG, no último trimestre do ano, contabilizou um prejuízo de US$ 489 milhões.
Paradoxalmente, o pesadelo de empresários, trabalhadores e governos se transforma em alívio para o meio ambiente que está deixando de receber uma quantidade considerável de gases e substâncias nocivas graças à “parada obrigatória” da produção e do consumo. É lamentável que as soluções para a superaçãoda crise, sugeridas até o momento, não contemplem à questão ambiental, bem mais séria e crônica que qualquer crise.
No Fórum Econômico Mundial as perspectivas para 2009 são as piores. De acordo com o relatório anual divulgado pelo encontro o cenário deste ano contemplará mercados voláteis, falta de liquidez, aumento de desemprego. Associado a isto, a saída dada ao problema, aumento substancial do gasto público, não é vista com otimismo, em função dos déficits governamentais já existentes. Conforme destaca
o relatório: “os gastos maciços destinados pelos governos para ajudar as instituições financeiras ameaçam a já precária saúde fiscal de países como Estados Unidos, Grã Bretanha, França, Itália, Espanha e Austrália”.
No Brasil, a situação não é diferente. A perda de postos de trabalho com carteira assinada atingiu 654.946 trabalhadores, só no mês de dezembro. Segundo informações do Cadastro de Empregados e Desempregados (Caged) este foi o pior resultado registrado para este mês, desde 1992. Conforme dados da CNI (Confederação Nacional das Indústrias) o faturamento da indústria caiu 9,9%, em novembro, em relação a outubro, e o número de horas trabalhadas apresentou retração de 1,5%, a maior queda desde janeiro de 2003, quando teve início a série preparada pela instituição. Pior que isso é que novembro é o segundo mês consecutivo de queda e dos 19 setores pesquisados, somente o de vestuário apresentou aumento de 7,6%. O índice de Utilização da Capacidade Instalada (UCI) também sofreu queda, em novembro, ficando em 81,6%, um ponto percentual a menos que em outubro. A produção brasileira de coque (combustível derivado do carvão usado no processo siderúrgico e também na produção de pastilhas de freio), caiu em torno de 70%. Como o setor opera com apenas 30% de sua capacidade instalada os trabalhadores estão, desde novembro, em férias coletivas e as fundições também estão paralisadas.
O documento divulgado pela CNI afirma ainda que “a intensa queda do faturamento sinaliza a acumulação de estoques indesejados, o que sugere recuos adicionais da produção industrial, nos próximos meses”.
A velocidade com a qual a crise se espalha na economia deixa o governo assustado e uma série de medidas já foram tomadas e outras estão para ser implementadas. O BNDES irá receber do Tesouro um reforço de R$ 100 bilhões para ampliar as linhas de financiamento a investimentos de empresas brasileiras e, o Comitê de Política Monetária (Copom) reduziu em 1 ponto percentual a taxa básica de juros Selic, que ficou em 12,75%.
Infelizmente, a medida do Banco Central não resolve o problema dos juros no Brasil, que continua a possui a maior taxa de juros real do mundo de 7,6%. Com exceção de Hungria e Argentina, as demais economias possuem um juro real inferior a 3%, quando não negativo.
A política monetária de Henrique Meirelles fez o Brasil perder o bonde do crescimento e agora, se não revertida rapidamente, incluirá o país no grupo das economias com os piores resultados dentre os atingidos pela crise.
E enquanto o mundo capitalista se dilacera, com falências, desemprego e, tudo mais de ruim, Cuba busca superar suas dificuldades e fortalecer seu socialismo solitário, que, apesar de todos os erros e dificuldades, tem apresentado resultados que deveriam servir de reflexão para o “moderno” capitalismo de mercado.

Texto escrito por:
Águida Cristina Santos Almeida: Professora do Departamento de Economia e Finanças da Universidade Federal de Campina Grande - UFCG e integrante do PROGEB – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira.
progeb@ccsa.ufpb.br

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