Semana de 26 de janeiro a 01 de fevereiro de 2009
“A pior crise econômica desde a Grande Depressão não é um fenômeno natural, e sim um desastre fabricado pelo homem no qual todos tiveram a sua participação”. É assim que o importante jornal britânico The Guardian, começa o artigo em que aponta os culpados. Ele apresenta uma lista de 25 nomes entre os quais se encontram os ex-presidentes dos EUA, Bill Clinton e George Bush, o primeiro ministro inglês, Gordon Brown, os presidentes dos bancos centrais dos EUA, Alan Greenspan e da Inglaterra, Mervyn King, 15 banqueiros e os dois grandes especuladores Warren Buffet e George Soros. Depois de identificar os criminosos, surpreendentemente, não é apontada nenhuma punição para tão hediondo crime.
Grande contribuição do The Guardian! Antes sabíamos apenas que os culpados eram algunstrambiqueiros do mercado imobiliário americano que emprestaram dinheiro a quem não podia pagar. Agora temos réus.
Se não são apresentadas punições para os criminosos, surgem brilhantes soluções para contornar a desgraça. O próprio Soros, no fórum de Davos, na Suíça, dá seus conselhos. Ele propõe uma “injeção direta de capitais nos bancos falidos”. Em um seminário, o nosso liberal economista Delfim Neto, cortejado por muitos, e em particular pelo presidente Lula, que o nomeou seu consultor, também apresentou sua sugestão: uma estatização temporária dos bancos. Em seguida, com receio de ser mal interpretado, apressou-se em explicar que “estatização não significa a morte do capitalismo”. Era só uma estatização para sanear os ativos podres, em mãos dos bancos, para uma posterior devolução aos seus legítimos donos.
Enquanto estas brilhantes sugestões são apresentadas, para salvar os bancos, o resto do mundocontinua a desabar. A Shell anunciou um prejuízo de US$ 2,81 bilhões, em 2008. A Ford, de US$ 14,6 bilhões, a maior da sua história. A Panasonic estima perder US$ 1,1 bilhão e a Samsung US$ 682 milhões. A General Eletric teve uma queda de 44% nos seus lucros, no último trimestre, o que foi considerado um dos períodos mais difíceis nos seus 117 anos de história. A Wells Fargo, a segunda maior instituição de crédito imobiliário dos EUA, também anunciou um prejuízo de US$ 2,55 bilhões, no quarto trimestre de 2008. O terceiro maior banco do Japão, o Sumitomo Mitsui Financial, informou que, já no terceiro trimestre, teve uma redução de 99% nos seus lucros. Ainda no Japão, a Nomura Holdig Inc, a maior corretora de valores do país, anunciou um prejuízo de US$ 3,8 bilhões, no mesmo período. A Toyotta Motor, em 2009, pretende reduzir a sua produção em 3 milhões de veículos o que significa uma queda de 20% na sua produção. A Boeing, após declarar um prejuízo de US$ 56 milhões, em 2008, anunciou um corte de 10.000 empregados. O Fundo Monetário Internacional, FMI, no documento Perspectivas para oCrescimento Global, previu que, em 2009, a economia mundial crescerá apenas 0,5%.
O desemprego também continua a se expandir. A Toshiba após anunciar um prejuízo de US$ 1,77 bilhão, no trimestre de outubro a dezembro, pretende demitir 4,5 mil trabalhadores. A GM já demitiu 2.000, e a Pfizer, 19 mil. A Starbucks, uma grande rede de cafés, demitirá 6,7 mil empregados e fechará 300 lojas. Na Itália, estima-se em 60.000 o número de postos de trabalho fechados. O Financial Times anunciou que, em apenas um dia, 70.000 trabalhadores foram demitidos no mundo. Nos EUA, na semana que terminou em 17 de janeiro, foram feitos 4,776 milhões de pedidos de seguro desemprego, o número mais elevado desde 1967. A Organização Internacional do Trabalho (OIT) prevê que, em 2009, 2,4 milhões de trabalhadores perderão os empregos na América Latina.
O agravamento da situação começa a provocar o surgimento de grandes manifestações nas ruas das principais cidades da Europa. Na França, estimou-se em 2,5 milhões o número de participantes no maior protesto dos últimos 20 anos e 69% da população apoiou a greve geral convocada. Manifestações também ocorreram no Reino Unido, Islândia, Bulgária, Grécia, Estônia, Hungria, Letônia, Lituânia, Eslováquia, Eslovênia, Espanha, Rússia, etc. Na Islândia o governo, diante das pressões, foi obrigado a demitir-se. A Grã-Bretanha declarou-se oficialmente em recessão e nos EUA os juros básicos foram mantidos entre 0% e 0,25%. O estado da Califórnia está à beira da falência. O relógio contador de déficit, instalado pelo seu governador Schwarzenegger, contabiliza US$ 500 por segundo e em breve atingirá os US$ 40 bilhões.
No Brasil a situação não está melhor. Segundo a Confederação Nacional da Indústria, CNI, noquarto trimestre a queda da produção industrial, em relação ao terceiro, foi de 17%. O uso da capacidade instalada caiu para 74%. Dos 28 setores pesquisados apenas três tiveram crescimento: bebidas, limpeza e perfumaria e vestuário. Apesar da queda da produção, os estoques cresceram 53,5%. Este trimestre foi o pior dos últimos 10 anos. A indústria de transformação paulista, em dezembro, apresentou uma retração de 5,2%. Esta desaceleração já vinha sendo notada em outubro (-1,7%) e novembro (-3,3%). A CNI espera que nos próximos seis meses continuem a cair, a demanda, as compras e as exportações. As indústrias continuarão a demitir empregados. Só no mês de dezembro, a Fiesp estima que foram demitidos 130.000trabalhadores. Apavorados com a crise os empresários cancelam os investimentos. Segundo os dados do BNDEs cerca de RS$ 155 bilhões já foram suspensos. Com efeito, o paradeiro continua. A Volkswgen Caminhões anunciou uma paralisação de 13 dias, entre fevereiro e 5 de março. A Scania também pretende parar 9 dias neste período. A Volvo do Brasil, que já demitiu 430 trabalhadores, pretende manter a redução da produção e vai estender as férias coletivas por um período de 50 dias.
Diante deste quadro assiste-se a um fato inusitado. Unem-se burgueses e proletários para reduzir o volume de desempregados. A Central Única dos Trabalhadores (Cut) conclama a formação de um pacto de “trabalhadores, empresários e governo”, cada um fazendo a sua parte, para evitar as demissões. As centrais sindicais propuseram “redução de juros, redução de lucro e redução de taxas bancárias”. Todas as soluções estão sendo tentadas. Redução da jornada de trabalho com redução de salários, férias coletivas, suspensão de contrato de trabalho, suspensão dos salários com manutenção do emprego, criação do banco de horas, etc. A Cia Vale do Rio Doce, por exemplo, fechou acordo com 7 sindicatos que representam 17 mil trabalhadores, prevendo a concessão de férias, com a redução de 50% dos salários, mas com garantia de emprego, até 31 de maio. Manifestos conjuntos estão sendo assinados pelas organizações de trabalhadores e de capitalistas pedindo a mudança da política econômica do governo e a redução dos juros.
Por seu lado, o governo, que se cansou de afirmar que a crise não chegaria ao Brasil, que era umproblema do “companheiro Bush”, que era uma marolinha, agora se desespera com medidas de todo tipo para conter a derrocada. Depois de reduzir os impostos sobre os carros novos deparou-se com o entupimento do mercado de carros usados. O Banco do Brasil já está se preparando para disponibilizar R$ 2,5 bilhões para financiamentos das compras deste tipo de veículo, com os recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). Mais perdido do que sego em tiroteio, o Ministro do Desenvolvimento Indústria e Comercio, assinou uma resolução que estabelecia a exigência de uma licença prévia para importações de cerca de 3 mil itens, o que corresponde a cerca de 60% dos produtos importados. A celeuma causada foi de tal ordem que, por ordem expressa do presidente Lula, a exigência foi revogada. Preocupadas, as empresas de publicidade, lideradas pela ABAP – Associação Brasileira de Agências de Publicidade, convencidas que a crise é resultado do pessimismo dos agentes econômicos, reagiram conjuntamente e preparam uma grande campanha para afastar este pessimismo com o lema: “A gente anda, o Brasil anda”. Agindo no mesmo sentido, o BNDEs abriu uma concorrência para contratar agências de publicidade no sentido de promover a divulgação de suas linhas de financiamento, por quatro anos, com uma modesta verba de R$ 200 milhões.
Para complicar ainda mais a situação, nas quatro primeiras semanas de janeiro, a balançacomercial, finalmente, acumulou um déficit de US$ 645 milhões o que contribuiu para também agravar a situação das transações correntes (conta que registra todas as entradas e saídas de dólares do país). O ano de 2008 fechou com um déficit de US$ 28,3 bilhões, o pior em 10 anos.
Diante deste quadro, enquanto as empresas fecham as portas e os trabalhadores perdem seusempregos e suas conquistas, apenas os bancos e o setor financeiro continuam com seus lucros fabulosos, graças à política seguida pelo Banco Central, sob a batuta do seu maestro, o todo poderoso Henrique Meirelles. Crescem as manifestações para que haja uma forte redução dos juros básicos do país, o maior do mundo, atualmente em 12,75, e, com este objetivo, uma nova e paradoxal consigna passa a ser proclamada: burgueses e proletários, uni-vos.
Texto escrito por:
Nelson Rosas Ribeiro: Professor do Departamento de Economia da UFPB e coordenador do Progeb-Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira
(progeb@ccsa.ufpb.br)
Arquivo para download em formato pdf.
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Grande contribuição do The Guardian! Antes sabíamos apenas que os culpados eram algunstrambiqueiros do mercado imobiliário americano que emprestaram dinheiro a quem não podia pagar. Agora temos réus.
Se não são apresentadas punições para os criminosos, surgem brilhantes soluções para contornar a desgraça. O próprio Soros, no fórum de Davos, na Suíça, dá seus conselhos. Ele propõe uma “injeção direta de capitais nos bancos falidos”. Em um seminário, o nosso liberal economista Delfim Neto, cortejado por muitos, e em particular pelo presidente Lula, que o nomeou seu consultor, também apresentou sua sugestão: uma estatização temporária dos bancos. Em seguida, com receio de ser mal interpretado, apressou-se em explicar que “estatização não significa a morte do capitalismo”. Era só uma estatização para sanear os ativos podres, em mãos dos bancos, para uma posterior devolução aos seus legítimos donos.
Enquanto estas brilhantes sugestões são apresentadas, para salvar os bancos, o resto do mundocontinua a desabar. A Shell anunciou um prejuízo de US$ 2,81 bilhões, em 2008. A Ford, de US$ 14,6 bilhões, a maior da sua história. A Panasonic estima perder US$ 1,1 bilhão e a Samsung US$ 682 milhões. A General Eletric teve uma queda de 44% nos seus lucros, no último trimestre, o que foi considerado um dos períodos mais difíceis nos seus 117 anos de história. A Wells Fargo, a segunda maior instituição de crédito imobiliário dos EUA, também anunciou um prejuízo de US$ 2,55 bilhões, no quarto trimestre de 2008. O terceiro maior banco do Japão, o Sumitomo Mitsui Financial, informou que, já no terceiro trimestre, teve uma redução de 99% nos seus lucros. Ainda no Japão, a Nomura Holdig Inc, a maior corretora de valores do país, anunciou um prejuízo de US$ 3,8 bilhões, no mesmo período. A Toyotta Motor, em 2009, pretende reduzir a sua produção em 3 milhões de veículos o que significa uma queda de 20% na sua produção. A Boeing, após declarar um prejuízo de US$ 56 milhões, em 2008, anunciou um corte de 10.000 empregados. O Fundo Monetário Internacional, FMI, no documento Perspectivas para oCrescimento Global, previu que, em 2009, a economia mundial crescerá apenas 0,5%.
O desemprego também continua a se expandir. A Toshiba após anunciar um prejuízo de US$ 1,77 bilhão, no trimestre de outubro a dezembro, pretende demitir 4,5 mil trabalhadores. A GM já demitiu 2.000, e a Pfizer, 19 mil. A Starbucks, uma grande rede de cafés, demitirá 6,7 mil empregados e fechará 300 lojas. Na Itália, estima-se em 60.000 o número de postos de trabalho fechados. O Financial Times anunciou que, em apenas um dia, 70.000 trabalhadores foram demitidos no mundo. Nos EUA, na semana que terminou em 17 de janeiro, foram feitos 4,776 milhões de pedidos de seguro desemprego, o número mais elevado desde 1967. A Organização Internacional do Trabalho (OIT) prevê que, em 2009, 2,4 milhões de trabalhadores perderão os empregos na América Latina.
O agravamento da situação começa a provocar o surgimento de grandes manifestações nas ruas das principais cidades da Europa. Na França, estimou-se em 2,5 milhões o número de participantes no maior protesto dos últimos 20 anos e 69% da população apoiou a greve geral convocada. Manifestações também ocorreram no Reino Unido, Islândia, Bulgária, Grécia, Estônia, Hungria, Letônia, Lituânia, Eslováquia, Eslovênia, Espanha, Rússia, etc. Na Islândia o governo, diante das pressões, foi obrigado a demitir-se. A Grã-Bretanha declarou-se oficialmente em recessão e nos EUA os juros básicos foram mantidos entre 0% e 0,25%. O estado da Califórnia está à beira da falência. O relógio contador de déficit, instalado pelo seu governador Schwarzenegger, contabiliza US$ 500 por segundo e em breve atingirá os US$ 40 bilhões.
No Brasil a situação não está melhor. Segundo a Confederação Nacional da Indústria, CNI, noquarto trimestre a queda da produção industrial, em relação ao terceiro, foi de 17%. O uso da capacidade instalada caiu para 74%. Dos 28 setores pesquisados apenas três tiveram crescimento: bebidas, limpeza e perfumaria e vestuário. Apesar da queda da produção, os estoques cresceram 53,5%. Este trimestre foi o pior dos últimos 10 anos. A indústria de transformação paulista, em dezembro, apresentou uma retração de 5,2%. Esta desaceleração já vinha sendo notada em outubro (-1,7%) e novembro (-3,3%). A CNI espera que nos próximos seis meses continuem a cair, a demanda, as compras e as exportações. As indústrias continuarão a demitir empregados. Só no mês de dezembro, a Fiesp estima que foram demitidos 130.000trabalhadores. Apavorados com a crise os empresários cancelam os investimentos. Segundo os dados do BNDEs cerca de RS$ 155 bilhões já foram suspensos. Com efeito, o paradeiro continua. A Volkswgen Caminhões anunciou uma paralisação de 13 dias, entre fevereiro e 5 de março. A Scania também pretende parar 9 dias neste período. A Volvo do Brasil, que já demitiu 430 trabalhadores, pretende manter a redução da produção e vai estender as férias coletivas por um período de 50 dias.
Diante deste quadro assiste-se a um fato inusitado. Unem-se burgueses e proletários para reduzir o volume de desempregados. A Central Única dos Trabalhadores (Cut) conclama a formação de um pacto de “trabalhadores, empresários e governo”, cada um fazendo a sua parte, para evitar as demissões. As centrais sindicais propuseram “redução de juros, redução de lucro e redução de taxas bancárias”. Todas as soluções estão sendo tentadas. Redução da jornada de trabalho com redução de salários, férias coletivas, suspensão de contrato de trabalho, suspensão dos salários com manutenção do emprego, criação do banco de horas, etc. A Cia Vale do Rio Doce, por exemplo, fechou acordo com 7 sindicatos que representam 17 mil trabalhadores, prevendo a concessão de férias, com a redução de 50% dos salários, mas com garantia de emprego, até 31 de maio. Manifestos conjuntos estão sendo assinados pelas organizações de trabalhadores e de capitalistas pedindo a mudança da política econômica do governo e a redução dos juros.
Por seu lado, o governo, que se cansou de afirmar que a crise não chegaria ao Brasil, que era umproblema do “companheiro Bush”, que era uma marolinha, agora se desespera com medidas de todo tipo para conter a derrocada. Depois de reduzir os impostos sobre os carros novos deparou-se com o entupimento do mercado de carros usados. O Banco do Brasil já está se preparando para disponibilizar R$ 2,5 bilhões para financiamentos das compras deste tipo de veículo, com os recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). Mais perdido do que sego em tiroteio, o Ministro do Desenvolvimento Indústria e Comercio, assinou uma resolução que estabelecia a exigência de uma licença prévia para importações de cerca de 3 mil itens, o que corresponde a cerca de 60% dos produtos importados. A celeuma causada foi de tal ordem que, por ordem expressa do presidente Lula, a exigência foi revogada. Preocupadas, as empresas de publicidade, lideradas pela ABAP – Associação Brasileira de Agências de Publicidade, convencidas que a crise é resultado do pessimismo dos agentes econômicos, reagiram conjuntamente e preparam uma grande campanha para afastar este pessimismo com o lema: “A gente anda, o Brasil anda”. Agindo no mesmo sentido, o BNDEs abriu uma concorrência para contratar agências de publicidade no sentido de promover a divulgação de suas linhas de financiamento, por quatro anos, com uma modesta verba de R$ 200 milhões.
Para complicar ainda mais a situação, nas quatro primeiras semanas de janeiro, a balançacomercial, finalmente, acumulou um déficit de US$ 645 milhões o que contribuiu para também agravar a situação das transações correntes (conta que registra todas as entradas e saídas de dólares do país). O ano de 2008 fechou com um déficit de US$ 28,3 bilhões, o pior em 10 anos.
Diante deste quadro, enquanto as empresas fecham as portas e os trabalhadores perdem seusempregos e suas conquistas, apenas os bancos e o setor financeiro continuam com seus lucros fabulosos, graças à política seguida pelo Banco Central, sob a batuta do seu maestro, o todo poderoso Henrique Meirelles. Crescem as manifestações para que haja uma forte redução dos juros básicos do país, o maior do mundo, atualmente em 12,75, e, com este objetivo, uma nova e paradoxal consigna passa a ser proclamada: burgueses e proletários, uni-vos.
Texto escrito por:
Nelson Rosas Ribeiro: Professor do Departamento de Economia da UFPB e coordenador do Progeb-Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira
(progeb@ccsa.ufpb.br)
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