quinta-feira, 1 de agosto de 2013

O assunto agora é a China



Semana de 22 a 28 de julho de 2013


Lucas Milanez de Lima Almeida[i]




            Esta semana que passou foi marcada pela visita do Papa Francisco ao Brasil, durante a Jornada Mundial da Juventude, fato que dominou todo o noticiário dos principais jornais do país. Teólogos, padres e ex-padres já veem o novo líder da igreja católica como sinal da mudança. O professor Leonardo Boff, que já foi da Ordem Franciscana, afirmou que “Francisco mudará muita coisa. Ele não está reformando somente a Cúria, está reformando o papado”. Já para o padre José Oscar Beozzo, “O papa tem dito que a igreja tem que sair da sacristia e ir para a periferia, para onde o povo está precisando. Não quer uma igreja burguesa, acomodada”. Mas, por mais que o sumo pontífice tenha abordado temas muito relevantes, nesta coluna somos obrigados a voltar para a economia e dedicaremos nossa atenção ao estouro da economia da China, país que já se auto denominou de socialista. Como esta afirmação pode parecer exagero, vamos aos fatos.
            Em toda a história da humanidade o homem precisou produzir e, consequentemente, distribuir boa parte dos elementos que servem a sua sobrevivência. Para isto, foi necessário criar e manusear os instrumentos e meios que são usados durante o processo produtivo (máquinas, equipamentos, matérias-primas, etc.). Ou seja, os meios de produção que servem para a criação de outros meios de produção e, principalmente, dos meios de consumo (alimento, vestuário, etc.).
            Pois bem, estamos vendo há décadas a República Popular da China transformar-se rapidamente numa economia capitalista. O principal agente que trouxe esta mudança foi o partido “comunista” chinês. Não se sabe ao certo o porquê, mas o Estado chinês mais parece com os antigos estados despóticos orientais característicos do modo de produção asiático. O processo de realização dos investimentos no país, em muito se assemelha à organização das grandes obras dos sistemas de irrigação, nas chamadas sociedades hidráulicas e das pirâmides, na civilização egípcia.
            Segundo um artigo publicado no The Wall Street Journal, “o governo faz planos de investimento e as empresas devem segui-los, quaisquer que sejam as condições de mercado”. Ao desagregarmos a riqueza produzida, a cada ano, na China podemos mensurar o que isto significa. Desde a década de 1990, para cada US$ 100 contabilizados no Produto Interno Bruto (PIB), pelo menos US$ 35 correspondiam a novos investimentos. Em 2012 este valor chegou a US$ 48,1. No mesmo período, o máximo que o Brasil conseguiu foi uma proporção de US$ 21 de investimento para cada US$ 100 de PIB. Porém, os números do país asiático escondem um grande problema. Segundo os autores do texto, Dinny McMahon e Bob Davis, “Ao comprimir em poucos anos o que normalmente seria uma década de investimentos, a China apressou o fim da sua fase de crescimento rápido. Muitos projetos [fábricas] foram duplicados, acabando por criar excesso de oferta em todos os setores, da habitação ao aço, do cimento aos equipamentos de energia solar”.
            Para o economista americano Michael Pettis, professor da Universidade de Pequim desde 2002, o governo precisa reequilibrar a economia. O que ocorre atualmente é que “Com tanto investimento liderado pelo governo central e pelos governos locais, e com a garantia desses governos de pagamento, isso criou um déficit fiscal muito maior do que se vê nas estatísticas oficiais”. Segundo ele, o déficit fiscal “real” da China está entre 10% e 25% do PIB. Os suspeitos dados oficiais relatam um valor em torno de 2%.
            A grande crítica feita pelos economistas ao modelo chinês é a de que os investimentos por si só não garantem longos anos de bonança. Para que o PIB siga uma trajetória de crescimento sustentável, sem haver um excesso de capacidade produtiva, seria necessário reduzir os estímulos ao investimento e fomentar o consumo das famílias.
            Sem querer entrar na questão da desigualdade de renda, que também contribui para a fraca demanda, digo que não há saída para o país. Aquilo que é inevitável no capitalismo, e que, em algum momento, iria chegar à China, a crise de superprodução de capitais, teve sua primeira manifestação paradoxalmente antecipada pelo partido “comunista”.
            O que aparenta ser apenas um desequilíbrio entre oferta e demanda é muito mais do que um mau uso das políticas econômicas. Até porque, no capitalismo, por se buscar apenas a expansão da riqueza com o objetivo de produzir mais lucros, pouca importância se dá às necessidades sociais. Neste sistema, a satisfação dos interesses individuais, quer seja dos empresários, quer seja dos seus representantes, é o que dá a dinâmica à economia.
            A China que o diga...


[i] Professor do Departamento de Economia da UFPB e pesquisador do Progeb. (www.progeb.blogspot.com; lucasmilanez@hotmail.com)
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