sábado, 15 de fevereiro de 2025

EUA VS. MUNDO: QUANDO A RETÓRICA COLIDE COM A REALIDADE

Semana de 03 a 09 de fevereiro de 2025

   

Paola Teotônio Cavalcante de Arruda[i]

  

Historicamente, os Estados Unidos vêm defendendo e difundindo os “princípios do livre mercado”, com apoio à especialização produtiva e à eliminação de barreiras tarifárias. Durante muito tempo, o pensamento econômico que predominou na economia global foi o de que seria necessário liberalizar, para desenvolver. As ideias hegemônicas eram as que fortaleciam concepções de economias abertas e do livre fluxo de pessoas e mercadorias.

O retorno de Donald Trump à cena política norte-americana, no entanto, expõe, mais uma vez, a hipocrisia desse discurso. Ao anunciar a imposição de tarifas sobre produtos vindos do Canadá, do México e, principalmente, da China, Trump contraria a lógica que sustentou a supremacia econômica americana por décadas. Mas, mais que isso, a conduta americana revela como os princípios do livre mercado e da não intervenção são frequentemente abandonados, quando determinados interesses nacionais estão em jogo.

Isso quer dizer, caro leitor, que, no fim das contas, a adesão ao liberalismo econômico por parte das grandes potências é mais uma questão de conveniência política do que de real compromisso econômico. O mesmo país que difundiu a democracia liberal pelo mundo, em oposição à regimes ditatoriais e em “defesa” da “soberania” e da “autodeterminação dos povos”, hoje, fala em acabar com a independência do Canadá e em anexar outros territórios soberanos, como a Groenlândia e o Canal do Panamá.

Veja, não é a “ditadura” chinesa que está falando em intervir em outros territórios, mas a “livre democracia” norte-americana. As ideias e ações de Donald Trump, em tão pouco tempo de governo, indicam a possibilidade de instauração de uma guerra comercial. As consequências de tais decisões é que não estão ainda claras e não há garantia de que saiam como esperadas para os EUA.

 China, Canadá e México são os três maiores parceiros comerciais do país, e a imposição de tarifas não apenas poderá gerar retaliações, como, provavelmente, impulsionará as nações a buscar novos mercados. Nesse contexto, a América Latina pode se tornar ainda mais estratégica para a China, especialmente diante da crescente tensão provocada pelas ameaças dos EUA ao Canal do Panamá e ao México, ampliando o espaço para a influência chinesa na região.

No que tange às relações com o Brasil, a postura cada vez mais agressiva dos Estados Unidos em relação a imigrantes reforça as tensões na política externa. A recente deportação de 88 brasileiros, que chegaram algemados ao país, em 24 de janeiro, evidenciou o tratamento desumano imposto pelo governo norte-americano. No campo comercial, ainda não está claro se o Brasil será alvo das tarifas protecionistas impostas pelos EUA. Apesar da gravidade do episódio e do aumento das tensões, o governo brasileiro tem adotado uma abordagem pragmática e cautelosa, com ênfase na reciprocidade.

Portanto, caro leitor, o cenário global se desenha cada vez mais instável, com os Estado Unidos assumindo uma postura protecionista, que contradiz seu próprio discurso. Espera-se, então, a remodelação das relações globais, já que as ações agressivas e os discursos retrógrados daquele país gerarão reações em cadeia. O Brasil, assim como outras nações emergentes, deve se preparar para um contexto de maior disputa geopolítica e realinhamentos estratégicos. A ascensão da China como alternativa comercial e a crescente pressão americana tornam imprescindível uma política externa equilibrada, capaz de defender interesses nacionais sem abrir mão da autonomia, da estabilidade e do crescimento econômico.


[i] Pesquisadora do PROGEB e Graduada em Relações Internacionais (UFPB). (paolatc.arruda@gmail.com). Colaboraram: Lara Souza, Rubens Gabriel, Antônio Queiroz, Ícaro Moisés, Miguel Oliveira, e Raquel Lima.

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