domingo, 14 de setembro de 2025

ENFIM CONDENADOS... E O QUE ISTO SIGNIFICA?

Semana de 01 a 07 de setembro de 2025

   

Lucas Milanez de Lima Almeida [i]

 

Em condições normais de temperatura e pressão, esta análise seria focada nos dados do PIB brasileiro no segundo trimestre de 2025. As informações dão conta de uma já esperada desaceleração da atividade econômica, com destaque negativo para a queda de 2,2% nos investimentos. Atribui-se esta redução à política monetária fortemente contracionista, que mantém a taxa real de juros no Brasil em torno de 10%. No total, o PIB brasileiro cresceu 0,4% em relação ao primeiro trimestre de 2025 e 2,2% em relação ao segundo trimestre do ano passado.

Contudo, a semana que passou ficou merecidamente marcada pelo início do “julgamento do século”. Pela primeira vez na nossa história, o país colocou no banco dos réus um ex-presidente da República, responsável por tentar realizar um golpe de Estado. E o condenou. Diante da nossa história, isto não é nada trivial.

Ainda no Brasil Colônia, toda a estrutura econômico-social do território recém invadido tinha como alicerce a repressão máxima das liberdades da população. Partindo do genocídio dos povos originários, passando pela vinda de portugueses proprietários, até chegar à escravização de africanos, o sistema colonial impediu qualquer tipo de organização espontânea dos que viviam no Brasil à época. Sequer aqueles que atuavam como classe dominante tinham liberdade para desenvolver-se plenamente no país. Por exemplo, a Coroa Portuguesa impôs leis que proibiam a criação de atividades manufatureiras que concorressem com os negócios da metrópole.

Por conta desta imposição, o Brasil passou mais de 300 anos sem constituir, de fato, uma estrutura social diversa e ampla. As pessoas que não fossem ligadas ao funcionamento da capitania ou ao comércio externo, eram meras figurantes. Por isso, mal foram constituídas classes sociais baseadas em interesses próprios e verdadeiramente “nacionais”, sobretudo nos anseios que emanavam da parte subalterna da sociedade. Sempre que surgiram, as revoltas populares foram sanguinariamente massacradas pelas forças militares vigentes.

O sintoma mais evidente desta aberração foi nossa Independência. Em tese, as grandes transformações sociais acontecem quando classes ascendentes se fortalecem a ponto de derrubar a velha estrutura de poder e construir outra em seu lugar. Porém, no caso do Brasil, o “grito de independência” limitou-se a quebrar as amarras que nos ligavam à Portugal, mantendo quase toda a base colonial. O país continuava sob uma realeza de origem portuguesa, com economia monocultora, latifundiária, escravista e exportadora. Esta foi a sustentação da economia cafeeira durante o Brasil Império.

Neste período, o país, de fato, iniciou um processo de transformação mais profundo, porém, de forma lenta, gradual e conciliatória. Em essência, nunca houve uma efetiva derrubada das velhas ações coloniais, mas sua adaptação aos novos costumes e práticas que surgiam. Por sua vez, assim como na colônia, as revoltas populares foram, uma a uma, exemplarmente esmagadas pelo exército imperial. Inclusive, foi neste período que Luís Alves de Lima e Silva se tornou o Duque de Caxias, que lutou em contra estrangeiros, mas também contra provincianos brasileiros revoltados com o Império.

As duas maiores transformações na política do Brasil aconteceram com a Proclamação da República e com a Revolução de 1930, quando novas frações da classe dominante surgiram e reivindicaram seu espaço no comando do Estado (mas sem retirar a tradicional aristocracia agrária dele). Nos dois casos, os militares foram essenciais para essa transformação, pois, seguindo a tradição, foram “o braço forte” e “a mão amiga” dos ocupantes do poder. Desde então, em muitos anos, a vontade da maioria foi absolutamente desrespeitada. Explicitamente, para além dos 15 anos de regime de exceção entre 1930 e 1945, tivemos mais 21 anos de ditadura após o Golpe de 1964.

Enfim, o julgamento que deve se encerrar no dia 12 de setembro de 2025 é um importante marco. Os militares, que sempre se reconheceram como moderadores do poder no Brasil, estão sendo julgados por civis, por atentarem contra a vontade das urnas pela primeira vez. Os mais otimistas acreditam que isto pode representar uma transformação na institucionalidade brasileira.

Contudo, na opinião do humilde redator desta análise, não podemos esperar muito da classe dominante brasileira. Afinal, sua essência violenta (e subalterna) ainda não foi eliminada por nenhuma outra classe que surgiu desde a colonização. Apenas mudou a forma, mas o conteúdo se mantém. Quando for preciso, tenha certeza, caro leitor, que a força militar será usada contra aqueles que se revoltarem contra as verdadeiras injustiças do país. Enquanto este momento não chega, apreciemos com satisfação e prazer este solene momento que antecede a condenação de Bolsonaro e sua gangue.


[i] Professor (DRI/UFPB; PPGCPRI/UFPB; PPGRI/UEPB) e Coordenador do PROGEB. (@progebufpb, www.progeb.blogspot.com; @almeidalmilanez; lucasmilanez@hotmail.com). Colaboraram: Camylla Martins, Julia Bomfim, Lara Souza, Maria Julia Alencar, Nelson Rosas, Rubens Cunha e Victoria Rodrigues.

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sábado, 6 de setembro de 2025

O MERCADO DO CRIME

Semana de 25 a 31 de agosto de 2025

   

Paola Teotônio Cavalcante de Arruda[i]

 

As últimas notícias brasileiras têm exposto algo maior que um caso policial: um “choque de real” sobre como fluxos ilícitos vêm atravessando setores-chave da economia formal. O esquema, revelado na semana passada, em uma das maiores operações já realizadas contra o crime organizado no Brasil, mobilizou 1,4 mil agentes da Polícia Federal, do Ministério Público de São Paulo e da Receita Federal, em oito estados, refletindo a dimensão da rede criminosa. Segundo as investigações, a estrutura de lavagem de dinheiro do PCC envolvia 1,2 mil postos de combustível, 42 fundos de investimento, fintechs e usinas de etanol. Assim, a nova “indústria do crime” movimentou cerca de 140 bilhões de reais em cinco anos, conferindo aparência de legalidade aos recursos obtidos com o tráfico e outras atividades ilícitas.

Esse movimento revela, em verdade, um fio condutor baseado na financeirização e na busca por escala, cuja lógica empresarial é apropriada para dar aparência de legalidade ao capital do crime, afetando a concorrência, elevando riscos institucionais e contaminando mecanismos de intermediação financeira e produtiva. O esquema demonstra método, sofisticação e normalização do dinheiro do crime dentro de engrenagens reguladas, operando com eficiência mercadológica e aproveitando brechas de governança e fiscalização. O efeito macroeconômico? Aumento do risco institucional, elevação dos prêmios de risco setoriais, contaminação de preços e erosão da confiança nos mecanismos de intermediação financeira e produtiva.

A grosso modo, caro leitor, é a “mão invisível” do livre mercado auxiliando a institucionalização e a complexificação de facções como o PCC no Brasil. Há quem diga, em momentos de loucura, ignorância ou desonestidade, que é a esquerda a maior apoiadora da criminalidade no país. Pois bem, não foi o que revelou a investigação da Polícia Federal. Muito pelo contrário, toda essa situação demonstrou como a própria estrutura do crime se ampara nos mecanismos de mercado para florescer.

Foi assim que o crime organizado conseguiu se infiltrar no coração do sistema financeiro brasileiro. Dos 350 alvos, 42 mantinham escritórios na Avenida Faria Lima, epicentro do mercado de capitais do país, sinalizando a sofisticação e o alcance da rede criminosa. De acordo com a PF, o esquema era liderado por Roberto Augusto Leme da Silva, o Beto Louco, e Mohamad Hussein Mourad, o Primo, empresários do setor de combustíveis em São Paulo, tendo como peça central a BK Instituição de Pagamento, conhecida como BK Bank, que servia como principal canal de bancarização e circulação dos recursos ilícitos. As investigações também apontam que a facção adquiriu usinas de etanol e teria envolvimento em incêndios criminosos em canaviais, que causaram prejuízos milionários a concorrentes, ampliando ainda mais seu controle sobre a cadeia sucroenergética.

Para o terror da extrema direita, a atuação do governo federal, sob a liderança de Lula, mostra que o crime organizado deve ser combatido de forma coletiva e coordenada. Sem slogans megalomaníacos, sem discurso violento, sem instrumentalização do ódio, o governo combate o cérebro do crime como ele deve ser combatido: com estratégia. Ao conduzir uma operação de grande escala, o Planalto demonstrou compromisso sério e estruturado no combate ao PCC e a outros ilícitos, reforçando a presença do Estado em setores estratégicos da economia.

Além disso, a ação envia um recado claro ao cenário internacional, sinalizando ao governo americano que o Brasil não é omisso diante das organizações criminosas e que está preparado para enfrentar os desafios da segurança nacional. A combinação de medidas firmes e visibilidade estratégica fortalece a credibilidade do país no combate ao crime e reafirma a centralidade do governo federal na proteção das instituições e da ordem econômica, sem abertura de margem para ingerências externas. Com determinação e ação coordenada, o Brasil mostra que é possível vencer o crime organizado e construir um futuro mais seguro e justo para todos.


[i] Pesquisadora do PROGEB e Graduada em Relações Internacionais (UFPB). (paolatc.arruda@gmail.com). Colaboraram:  Antonio Queirós, Bruno Lins, Julia Dayane, Lara Souza, Nelson Rosas e Ryann Félix .

  

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