quinta-feira, 21 de agosto de 2008

A queda das commodities

Semana de 04 a 10 de agosto de 2008


Os produtos agrícolas, que até então estavam servindo de refúgio para os capitais especulativos, enlouquecidos com a atual crise econômica, despencaram de vez na cotação das principais bolsas do mundo. A tendência, que já vínhamos acompanhando há algumas semanas se agravou com a conseqüente desvalorização dos ativos financeiros atrelados as commodities como os grãos. A novidade é que os analistas admitem publicamente que este agravamento foi impulsionado pelo temor generalizado de uma desaceleração da economia global, fato que continua assombrando todos os investidores e especuladores nos mercados internacionais.
Segundo pesquisa da Economática, considerando-se o período que vai de 20 de maio até o fim de julho, a Bovespa registrou uma desvalorização de 19,06%, provocada, na maior parte, pela queda das commodities. A soja foi um dos produtos que teve a maior baixa em sua cotação. A desvalorização sofrida é tamanha que pode até mesmo comprometer o plantio. Na semana passada a soja sofreu mais um tombo na bolsa de Chicago, nos Estados Unidos, chegando a ser cotada a US$ 12,13 o buschel, o que torna a sua produção economicamente inviável, já que o preço mínimo que viabiliza o plantio situa-se entre os 13 e os 14 dólares o buschel.
Com esse novo estouro, mais uma vez, os capitais procuram desesperadamente encontrar outros ativos que os remunerem e, enquanto isso, a crise continua se arrastando lentamente. “Estamos experimentando um verdadeiro desastre em câmera lenta”, disse Paul Krugman em artigo publicado no The New York Times, sendo obrigado a reconhecer que a “crise financeira, decorrente desse ciclo econômico, está amplamente alastrada” e que “a situação ainda vai se agravar consideravelmente antes de melhorar”.
Como se vê, as previsões que temos feito, nem são alarmistas, nem pessimistas. Elas são confirmadas pelas opiniões de um economista respeitado como o Paul Krugman e, portanto, teremos de assistir pacientemente a caminhada da economia global em direção ao fundo do poço, para só depois retomar o crescimento.
De fato, parece que a crise ainda não cumpriu a sua função. Ao mesmo tempo em que crescem as perdas registradas pelas grandes empresas, aumenta também o nível do desemprego, características clássicas desta fase do ciclo econômico. A General Motors, por exemplo, contabilizou um prejuízo de US$ 15,5 bilhões no segundo trimestre, devido a queda acentuada de suas vendas nos Estados Unidos. Na Espanha, o desemprego atingiu o seu nível mais alto, nos últimos dez anos,para o mês de julho. O númerode desempregados aumentou em mais de 36 mil pessoas. Além disso, o governo japonês, por sua vez,desconfia que a tímida expansão do país tenha chegado ao fim, e admitiu que há uma alta probabilidade de que a economia tenha entrado na recessão.
Agora, com mais este estouro, desencadeado pela especulação em torno dos produtos agrícolas, que, diga-se de passagem, foi a grande responsável pela subida nos preços dos alimentos, afetando diretamente os consumidores, deveremos continuar assistindo ao desenrolar da crise com o seu efeito saneador sobre a economia. Este efeito, até agora, tem sido reprimido pelas políticas econômicas conjuntas realizadas pelos Bancos Centrais dos principais países afetados, cujo objetivo é tentar salvar empresas da falência, impedindo, entretanto, a eliminação daquelas que são menos eficientes. Com isto, não se verifica a necessária destruição de capitais, o que retarda o movimento econômico mundial.
Na verdade, a situação é extremamente incômoda para os responsáveis pela política econômica dos mais importantes países. Se não intervém para salvar as empresas à beira da falência, a destruição poderá ter conseqüências imprevisíveis do ponto de vista político e social. Se intervém, injetando dinheiro na economia, prolongam o sofrimento, exaurindo lentamente o enfermo e retardando a recuperação. A explosão das contradições do sistema arrasta a humanidade, mais uma vez, para o velho dilema: “Se correr o bicho pega, se ficar o bicho come.”
Segundo previsão do Dresdner Kleinwort, divisão do Dresdner Bank, terceiro maior banco da Alemanha, cerca de 6% ou 7% das empresas européias tomadoras de empréstimos deverão deixar de pagar suas dívidas dentro do prazo, no ano que vem, o que representa um percentual dez vezes maior que o de junho deste ano. “As empresas que tinham capacidade para refinanciar suas dívidas, um ano atrás, estão descobrindo que não poderão fazer isso agora”, disse Andy Stoneman, sócio da MCR Corporate Restructuring.
O Brasil, com a sua política monetária, continua mais uma vez remando contra a maré. Enquanto os principais bancos centrais reduzem suas taxas de juros referenciais, no Brasil, a Selic continua aumentando, e a previsão é que ela termine o ano em 14,75%, conforme aponta a Pesquisa de Projeções e Expectativas do Mercado, realizada pela Federação Brasileira de Bancos (Febraban). O objetivo de tal política, que é tentar combater a inflação, está cada vez mais em xeque. Não bastasse o fato do Banco Central não produzir petróleo, como já dissera Ben Bernanke, e por isso não ser capaz de reduzir os preços dos produtos, no caso do Brasil, tal política ainda cria efeitos contraditórios. Quando a Selic sobe, provoca
um aumento da rentabilidade dos bancos que possuem títulos indexados a esta taxa referencial, o que aumenta os recursos disponíveis nos cofres destes bancos. Conseqüentemente, cresce a sua capacidade de emprestar, contrariando o objetivo inicial de reduzir o crédito e conter a demanda. Isto tem sido o responsável pelo aumento do crédito as camadas de baixas rendas que é feito pelas pequenas instituições de credito, possuidoras de títulos públicos.
Indiferentes ao esforço do governo e estimulados pelas elevadas taxas de juros, os grandes bancos também têm ampliado a oferta de dinheiro. O Bradesco, por exemplo, apresentou uma alta de 38,8% na sua carteira de crédito em 12 meses. Já o Itaú registrou um avanço de 41,3% no saldo de empréstimos.
Além disso, o banco teve um lucro líquido de R$ 4,08 bilhões no primeiro semestre, 1,7% a mais em comparação com igual período do ano passado. Como vemos, enquanto os bancos do mundo inteiro amargam os prejuízos do subprime, a lucratividade dos bancos brasileiros continua indo de vento em popa, resultado da “robusta política monetária do governo”, que é, ao mesmo tempo, restritiva para o crescimento econômico do país, mas expansionista para o crescimento econômico das grandes instituições financeiras.

Texto escrito por:
Diego Mendes Lyra: Mestrando em economia, Professor Substituto do Departamento de Economia da UFPB e pesquisador do Progeb – Projeto globalização e crise na economia brasileira. (progeb@ccsa.ufpb.br)

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