segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

O regresso a Keynes

Semana de 05 a 11 de janeiro de 2009

A crise, que vem fustigando a economia mundial, com manifestações específicas em cada região do globo, conforme o ritmo e graus de desenvolvimento de cada economia local, ou até mesmo nacional, parece ainda longe do fim.
Nos Estados Unidos, todos aguardam um pacote de estímulos, não inferior a US$ 1 trilhão, que virá com a administração Obama. Ali, a situação caracteriza-se pelas dificuldades de negócio e principalmente pelo crescimento assustador da taxa de desemprego. Somente em dezembro último, detetou-se um corte de 524 mil postos de trabalho, o que elevou a taxa oficial de desemprego para 7,6%, o pior índice em 16 anos. Durante todo o ano de 2008, 2,6 milhões de empregos desapareceram, sendo que 73% deles aconteceu nos quatro últimos meses. O crescimento do desemprego é mais acentuado para trabalhadores latinos. Esse foi o pior resultado anual de desemprego desde 1945.
Todos os setores têm sido atingidos e esse fenômeno não é uma exclusividade americana, mas tem sido comum a todas as economias nacionais, tais como China, India, e as economias europeias, onde as preocupações dos empresários e dos consumidores parecem convergir, pois cresce a taxa de desemprego, que, em novembro último, atingiu os 7,8%.
Ainda nos EUA, o New York Times divulgou que as siderúrgicas aguardam o pacote salvador de Obama. Esse segmento, que entrou em crise no melhor de sua saúde, passou a ser o melhor indicador da evolução da recessão. A produção do aço despencou 50%, desde Setembro. Ou seja, de 2,1 milhões de toneladas por semana, em 30 de Agosto, para 1,02 toneladas por semana, no fim de Dezembro.
Na Áustria, a notícia em destaque foi o controle do Bank Medici, em Viena, pelo órgão regulador da economia das instituições financeiras do país.
Na China, o grupo Lenovo, quarto maior produtor mundial de computadores pessoais, planeja demitir funcionários no centro de operações, em Pequim. A perspectiva da Dell e Lenovo são semelhantes. A Dell, segunda maior produtora mundial de computadores, planeja cortar entre 1,9 e 3 mil postos de trabalho.
Os indianos falam em 10 milhões de demissões e no Chile é anunciado um plano de ajuda financeira de US$ 4 bilhões.
Na Europa, o industrial alemão, Adolf Merckle, endividado, suicida-se.
Economistas, em geral, mesmo aqueles que custaram a admitir a possibilidade de uma crise do sistema mundial capitalista, dividem-se apenas quanto a longevidade do fenômeno. Uns, como Nouriel Roubini, da Universidade de Nova York, que foi dos primeiros americanos a anunciar o desastre da economia de mercado, em 2008, em recente comentário na Bloomberg News, prevê “uma retração profunda e prolongada que vai durar pelo menos até o final de 2009” com uma fraca recuperação, em 2010. Alguns otimistas, no entanto, julgam e difundem a idéia de que se os dominós caírem corretamente, o fundo do poço aproxima-se com mais velocidade e a economia entrará em recuperação, até julho deste ano. Num caso, ou no outro, todos esperam a intervenção do Estado para que a economia encontre um novo ponto de equilíbrio, que, espontaneamente, nunca seria alcançado ou somente o seria, através de um processo lento e doloroso para as populações.
Um pouco por todos os quadrantes do globo apresenta-se o mesmo enredo, muito embora com cenários diferentes, como não podia deixar de ser.
Assistimos o desenrolar de uma crise de superprodução, nada que teoricamente não se conheça e que na adulta vida do capitalismo já não se tenha manifestado anteriormente. No Brasil, no setor exportador, enfrentam-se dificuldades, que prometem ser agravadas em 2009, em consequência da queda da demanda mundial. Lembrem-se que o saldo da Balança Comercial sofreu um duro recuo de 38,2% apresentando um saldo de US$24,735 bilhões. Para 2009, segundo a visão da Associação dos Exportadores do Brasil, pela voz do seu Vice-Presidente, José Augusto de Castro, os embarques brasileiros vão conhecer uma queda no volume de exportações de US$ 29 bilhões com relação a 2008. A CONAB, por sua vez, prevê uma safra 4,9% menor do que em 2007/08. Em um cenário otimista, a produção brasileira de grãos será de 140,2 milhões de toneladas e, em cenário pessimista, 137 milhões de toneladas. Na Bolsa de Valores, o valor de mercado de 45 empresas brasileiras recuou mais de 80%. Segundo dados divulgados, o mercado interno teve um crescimento muito aquém do esperado. O setor de alimentos, que tinha expectativas de crescimento de 4% inicialmente apresentou um crescimento das vendas da ordem dos 1,4% a 2%. Quanto ao mercado de trabalho, por maior que seja a consciência da nação, o desemprego persiste e cresce. O setor financeiro, respondendo aos estímulos e as imposições do soberano mercado, centraliza-se, concentra-se, ao mesmo tempo em que, através dos financiamentos da crise, arranca lucros inimagináveis. As fusões e aquisições seguem o seu rumo inevitável, Nessa semana que passou, o Banco do Brasil anunciou oficialmente (sexta feira, 09.01.09) a compra de 49,99% do capital, com direito a voto, do Banco Votorantim, por R$ 4,2 bilhões. O Banco não foi estatizado por diferença de 0,02% nas ações. Esse foi apenas mais um passo no caminho da concentração desse mercado, que no momento já se apresenta de tal forma, que os dez maiores bancos do país respondem por 94% das 18,9 mil agências bancárias existentes. Se considerarmos, apenas os cinco maiores bancos, a concentração chega a 90,1%, contra 57,4% das agências, em 1999.
Mesmo com um quarto trimestre muito fraco para os negócios, em geral, o Brasil apresentou um novo recorde do volume de fusões e aquisições, cujo volume somou os US$ 95,34 bilhões, 62,25% mais do que o volume apresentado em 2007. O desempenho foi oposto aos resultados somados no mundo, onde foi observada uma retração de 29,2% no ano.
Entretanto, o valor de mercado de 45 empresas brasileiras recuou mais de 80%. A superprodução atinge vários setores. Dados do desempenho da indústria brasileira, de acordo com a Pesquisa da Industrial Mensal do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), dão conta da quebra física da indústria nacional em Novembro com relação a Outubro, de 5,2% e uma retração de 7,9%, entre Setembro e Novembro. A previsão para 2009 é de que o setor de alimentos vai ser muito afetado.
O desemprego no Brasil é cada vez mais preocupante. Somente a Renault suspendeu, na semana em análise, o contrato de 1000 metalúrgicos, durante cinco meses, e a Philips anunciou medida semelhante, ambas empresas protegidas por uma base legal, garantida pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT artigo 476). Com a preocupação de evitar cortes a Força Sindical reuniu-se com a Fiesp, aceitando negociar redução de salários.
Espera-se algumas medidas de intervenção econômica, principalmente mudanças na política financeira. O mercado espera queda na taxa de juro como resultado da reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), que se deve realizar entre 22 e 23 desse mês. O Ministro Guido Mantega já afirmou, que o recuo da inflação abre espaço para um corte na taxa de juro e até o presidente da Febraban apelou para que a redução desta taxa seja efetivada mais rapidamente, sugerindo inclusive a antecipação da reunião do Copom.
Com esse quadro típico de uma crise cíclica de superprodução, as atenções voltam-se para a personagem principal: a crise. O grande centro emissor de idéias, os Estados Unidos da América, vai dando o mote e as economias em todos os cantões do mundo, vão introduzindo um outro modo de pensar e de agir. Com o Brasil não acontece diferente e, dessa forma, abrem-se as cortinas para a entrada triunfal do keynesianismo, na passarela. A intervenção keynesiana, aclamada de pé, é introduzida na cena, a política econômica avança e está expulsando dos governos, oficialmente, o Consenso de Washington, sem protestos e sem argumentos contrários.
A discussão passa a outro plano. Não se discute liberalismo versos intervencionismos, mas somente o “como intervir”.

Texto escrito por:
Elivan G. Rosas Ribeiro: Professora do Departamento de Economia da UFPB e pesquisadora do Progeb .
progeb@ccsa.ufpb.br.

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