terça-feira, 6 de outubro de 2009

A economia de muletas

Semana de 14 a 20 de setembro de 2009

Acaba de completar um ano o estouro do banco americano Lehman Brothers, que serviu como marco para a admissão da gravidade da crise, deflagrada nos EUA. Juntamente com ele, entraram, em ruptura, várias outras grandes instituições financeiras que antecederam a generalização do fenômeno a toda a economia. Passado o susto, agora aumenta o número de especialistas e representantes de governos que afirmam que a recuperação mundial será lenta. Também aumentam os partidários da idéia de que a atual crise terá uma trajetória similar a letra “W”, como temos afirmado em nossas últimas análises. Isto quer dizer que se generalizam os temores de que a lenta recuperação possa descambar em uma nova crise complementar.
O chamado “clube do W”, “W” de worry (preocupação, em inglês), é formado por economistas renomados como Ben Bernanke, presidente do Fed, William White, ex-chefe do Banco de Compensações Internacionais (BIS), e Nouriel Roubini, famoso por ter sido o primeiro a prever o advento da crise.
Para Roubini, por exemplo, existe um alerta para a possibilidade de uma nova queda na atividade econômica depois de uma recuperação. Mais enfático foi William White, o qual afirmou, em uma conferência em Hong Kong, que “o mundo ainda não resolveu os problemas subjacentes à crise”, e que os atuais sinais de recuperação não são sustentáveis. Já o presidente do banco central norte-americano, Ben Bernanke, espera uma recuperação moderada em 2010, com crescimento não muito rápido. A cautela estava presente em seu discurso apesar das animadas notícias sobre o aumento de 2,7%, em agosto, do consumo nos Estados Unidos, o maior em três anos, e da redução do número de desempregados. Contudo, o crescimento das vendas no varejo é resultado da ação dos programas do governo que subsidiaram a troca de veículos, das isenções fiscais para a compra de imóveis residenciais (que vão até novembro próximo) e da sazonalidade, já que agosto é o mês de volta às aulas.
Como se pode verificar, as ações governamentais, via pacotes de estímulo ao consumo e ajuda financeira, têm sido uma espécie de muleta, para ajudar as economias a se locomoverem.
Dados da Financial Economics Crisis mostraram que o tamanho do pacote fiscal, em relação ao PIB, chegou a 13% na China, 5,6% nos Estados Unidos e 4,7% no México. A conseqüência direta tem sido o aumento do endividamento dos governos. O governo federal estadunidense, por exemplo, vem aumentando suas dívidas a um ritmo anual de 28%. Já no Reino Unido, o déficit orçamentário deve dobrar neste ano, devendo atingir 12% do PIB.
Quem anda a desafinar o coro dos preocupados é o ministro da Fazenda, Guido Mantega, que, além de negar o formato em “W” da crise no Brasil e defender o formato em “V”, comemora o crescimento de 1,9% do PIB do país no segundo trimestre do ano. Não refere, ele, que este crescimento foi fortemente favorecido pelo aumento do consumo das famílias e do governo, graças às medidas de política econômica adotadas, como, por exemplo, a desoneração de tributos, (IPI sobre carros e outros utensílios domésticos) o aumento do crédito, a redução das taxas de juros, etc.



PIB e setores (com ajuste sazonal) - Taxa (%) do trimestre em relação ao trimestre imediatamente anterior (*)
* Para melhor visualização do gráfico clique sobre a imagem.


 
Componentes da demanda (com ajuste sazonal) - Taxa (%) do trimestre em relação ao trimestre imediatamente anterior (*)
* Para melhor visualização do gráfico clique sobre a imagem.
 

Na mesma linha de pensamento está o presidente Lula, que, animado com o fim da recessão técnica no Brasil (resultado positivo do PIB após dois trimestres consecutivos de crescimento negativo), conclamou os empresários a retomarem os planos de investimentos que estavam engavetados. O presidente também não perdeu a chance de acrescentar mais uma expressão ao seu famoso repertório de frases de efeito ao dizer: “Agora não é mais o momento de dar antibióticos (para o país), é hora de dar vitaminas”.
Análises positivas a parte, a grande preocupação é quanto ao surgimento ou aumento de novos investimentos. Os resultados do PIB, do segundo trimestre, livre de influencias sazonais, mostram que a indústria cresceu 2,1%, mas os investimentos ficaram estagnados. Em comparação com os resultados obtidos no mesmo período em 2008, a indústria caiu 7,9%, e o investimento, 17%. Um dos indicadores que mostram a retração da oferta é a elevada capacidade ociosa da indústria, que se encontra atualmente abaixo da média histórica.



Nível de Utilização da Capacidade Instalada (NUCI)(*)
* Para melhor visualização do gráfico clique sobre a imagem.
 

Outra preocupação no ar é quanto à trajetória decrescente da arrecadação tributária federal, a qual registrou queda pelo décimo mês consecutivo. Nos oito primeiros meses de 2009, o total arrecadado sofreu uma redução de 7,9%. Os principais motivos para a diminuição nas receitas foram as desonerações fiscais, responsáveis pelo impacto negativo de R$ 17,3 bilhões nos cofres públicos, a queda do valor das importações e a retração da produção industrial. No que tange às importações e à produção industrial, tais indicadores diminuíram 31% e 12%, respectivamente, de janeiro a agosto deste ano.
Além disso, a redução no lucro das empresas abertas colaborou diretamente para a menor arrecadação do Imposto de Renda e da Contribuição sobre o Lucro Líquido (CSLL). Só no primeiro trimestre, houve recuo de 29,5% nos lucros das 149 empresas de capital aberto que divulgaram balanço.
A respeito da trajetória da arrecadação, no próximo semestre, o coordenador de Estudos, Previsão eAnálise da Receita, Raimundo Eloi de Carvalho, avalia que não se sabe qual será a situação no final do ano.
Já com relação à formação de empregos, de acordo com o Cadastro Geral de Empregados eDesempregados (Caged), dos 437,9 mil postos criados no país no primeiro semestre, dois terços foramoriginados na área de serviços, que costuma ter empregos com remuneração mais baixa. No entanto, a indústria mostrou uma queda de 122,5 mil vagas de janeiro a julho de 2009.
Como se pode ver, a situação continua a não ser confortável.


Texto escrito por:
 Maria Carolina Costa Madeira: Jornalista, mestre em Economia da UFPB e pesquisadora do PROGEB – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira.
Email: progeb@ccsa.ufpb.br

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Um comentário:

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