O ano velho chega ao fim e o nascimento da criança 2011 se aproxima. Vivemos o repetitivo e alegre ritual e, aderindo a ele, não podemos deixar de desejar aos nossos leitores as maiores felicidades.
No entanto, a frieza do rigor científico com que fazemos nossas Análises de Conjuntura Econômica nos obriga a, desde já, avisar que esta criança que nasce não será tão pródiga quanto o velho que se finda. Mas, a passagem dos anos é um movimento cíclico, o que nos faz relembrar a questão alfabética que envolve os debates sobre o ciclo econômico. Agora podemos garantir que a saída da crise no Brasil já se configura como a conhecida saída em W, como vinhamos prevendo.
Tomando como indicador das diferentes fases do ciclo econômico o gráfico traçado com as taxas de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), a primeira perna descendente do W ocorreu durante o ano de 2009, quando esta taxa foi de -0,5%, ou seja, foi uma taxa de decrescimento que o cinismo dos economistas esconde sob o nome de “crescimento negativo”. Para o bom ano de 2010, o BC e o mercado estimam uma taxa em torno de 7,3%, ou seja, estamos na primeira perna ascendente do W. Neste momento, o próprio governo, com todo o seu otimismo, estima, para 2011, uma taxa de 4,5%. Desse modo vivemos um processo de desaceleração na economia, ou seja, estamos escorregando para baixo no escorrega da segunda perna descendente do W (mesmo tomando como base as otimistas estimativas do Ministro Mantega).
Identificado o fenômeno, a tarefa é entender as razões para esta configuração de ciclo econômico. Consideramos que a responsabilidade pela recuperação rápida da economia brasileira é da política anticíclica do governo. No entanto, o caráter eleitoreiro das medidas adotadas cobrará agora o seu preço e pagaremos o presente de Natal de 2010 com a desaceleração de 2011. O pior é que o fantasma meirelliano continua a rondar o BC brasileiro e, como se não bastasse o “porrete” macro prudencial do BC, nada fantasmagórico, no lombo do tão sofrido povo brasileiro, prepara-se, no mesmo BC, o aríete da elevação dos juros, programado para a próxima reunião do Copom em janeiro. Tudo com o pretexto de que a população está consumindo muito e a pressão da demanda, segundo a perversa lei da oferta e da procura, está provocando a inflação. Vejam bem o paradoxo que estamos vivendo. O governo Lula, para ganhar as eleições, distribuiu renda e elevou os salários e se vangloria de ter aumentado a capacidade de consumo dos pobres, reduzido a pobreza e aumentando os participantes das classes C e D. O forte do seu governo foi a política social. Agora, este ingrato povo, atacado por uma fúria compradora, vinga-se explodindo a demanda e provocando a inflação.
E tome BC neles! Declaradamente, todas as medidas adotadas, e por adotar, pretendem comprimir o consumo, em um ano em que já se esperava uma desaceleração da economia. O arrocho chegou como havíamos anunciado.
A perversa missão compete ao novo governo. Mas, como as eleições estão longe, de acordo com a teoria dos ciclos políticos, o povo tem memória curta e, começo de governo é hora de apertar. Quando as eleições se aproximarem, as medidas simpáticas retornarão. O problema é a permanência no poder. Os interesses da nação não são levados em conta. E para isto compram-se as pessoas e as consciências.
E cá estamos nós a bater no governo que ainda não tomou posse. Até parecemos anarquistas espanhóis. O problema é que não temos nenhum compromisso com qualquer partido político ou governo. Só temos compromisso com o país e com o povo.
Vejam, por exemplo, um derrotado ex-senador, agraciado com o prêmio de um ministério no novo governo. Na sua tese de doutorado defendida na Unicamp, mostrou que, durante os governos Lula, foi criado um “novo desenvolvimentismo”. Não conseguiu, porém, explicar o processo de desindustrialização em curso por não “acreditar” que ele exista. Mercadante, que subordina a sua pena de cientista aos interesses partidários, se escondeu atrás da ignorância como se as “questões da ciência” fossem questões de “crença”. Eis um caso explicável, mas... condenável.Texto escrito por:
Nelson Rosas Ribeiro: Professor do departamento de Economia, Coordenador do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira progeb@ccsa.ufpb.br); (www.progeb.blogspot.com).