Semana de 27 de junho a 03 de julho
Lucas Milanez de Lima Almeida [i]
É, meus amigos, como prevíamos, o pau quebrou. Nos últimos dias de junho milhares de manifestantes foram às ruas da Grécia protestar, em vão, contra o plano de austeridade proposto pelo governo. Aprovado por 155, dos 296 parlamentares gregos, a expectativa é de que, nos próximos quatro anos, o país consiga economizar € 28,4 bilhões e obter outros € 50 bilhões com a venda de praias (da famosa costa grega), cassinos, campos de golfe, fábrica de sal, casas lotéricas, aeroportos, bancos, estradas, dentre outros "ativos" estatais. Tudo isso, é para garantir aos salvadores de emergência, leia-se FMI e Banco Central Europeu, o pagamento de uma ajuda futura, que virá por meio de empréstimo. Alguns analistas acreditam que uma possível moratória grega cause, para os bancos de todo o mundo, consequências piores do que as causadas pela quebra do Lehman Brothers.
Mas, não foram apenas os gregos que resolveram garantir o pagamento do dízimo à "instituição sagrada" chamada capital financeiro. O novo primeiro-ministro de Portugal também anunciou um agressivo plano de austeridade baseado em contenção de gastos e em privatizações. Para garantir seu compromisso com o FMI e com a União Européia, que concederam um montante de € 78 bilhões como empréstimo, a proposta é vender participações em diversas empresas estatais de vários setores, tais como o energético, o de aviação e o de telecomunicações. Além disso, um projeto será engavetado: a construção do trem bala que ligaria Portugal à Espanha. E, como não poderia deixar de ser, o povo também pagará sua parcela: serão reduzidos os benefícios de bem-estar social, aumentados os impostos sobre os salários e sobre a venda de algumas mercadorias e haverá, ainda, a "reestruturação" das políticas e leis de contratação de mão de obra.
Para não ter a necessidade de tomar empréstimos internacionais, como a Grécia, Portugal e Irlanda, a Espanha também propôs, como medida preventiva, novas regras de contenção dos gastos e redução do déficit orçamentário, tais como a redução dos salários do setor público e o aumento da idade mínima para a aposentadoria. Medidas semelhantes também estão sendo ou já foram tomadas na Inglaterra, que no dia 30 de junho colocou mais de 30 mil manifestantes nas ruas contra os tais planos de austeridade.
E, para piorar, as expectativas futuras também não são nada animadoras para o resto do mundo. O FMI prevê, que nos próximos cinco anos, a economia estadunidense continuará sofrendo com a crise do mercado imobiliário, com o desemprego elevado e com os déficits orçamentários (estima-se que só com gastos de guerra, incluindo indenizações e assistências, os EUA vão gastar um total entre US$ 3,7 e US$ 4,4 trilhões). Soma-se a isso o fato de que a confiança dos consumidores norte-americanos diminuiu mais do que esperavam os analistas. O resultado será o lento crescimento econômico. Já a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) registrou um aumento na concentração de renda em 17 das 22 economias dos países avançados. Enquanto isso, estudos mostram que, há mais de uma década. os salários reais dos trabalhadores de economias avançadas estagnaram. O que houve foi apenas um aparente aumento na capacidade de consumo causada pela grande oferta de crédito. Agora, que o crédito arrefeceu, é possível se ter uma idéia da real situação, que tende a piorar, pelos motivos acima apresentados.
Aterrissando aqui no Brasil, é de se destacar dois fatos: a expansão do setor de aviação de 21,74% de janeiro a maio de 2011 e o aumento da massa salarial, que, nos últimos 12 meses, cresceu mais do que o crescimento da taxa de ocupação em seis regiões metropolitanas. Segundo o Relatório de Inflação do Banco Central do Brasil, isto é motivo de preocupação, pois poderá causar pressões inflacionárias. Para o diretor Carlos Hamilton Araújo "o mercado de trabalho e o comércio ainda estão muito fortes", o que deve gerar pressão sobre os preços.
Destacam-se também as contas na área fiscal. Com a elevação na inflação, foi "necessário" ao Banco Central elevar a taxa de juros para "conter a demanda" (e também o excesso de gente empregada e os salários muito altos). Mas isto trouxe outros problemas para as expectativas fiscais de 2011: elevação da relação dívida líquida/PIB, que subiu de 38% para 39%; aumento na relação entre os juros nominais e o PIB, que passou de 4,8% para 5,4%; e, consequentemente, aumento no déficit nominal (receita menos todos os gastos do governo, inclusive com os juros da dívida), que, se espera, passará de 1,9% para 2,5% do PIB. Mas, parece que isto não será problema para o governo, pois este ano, já foram economizados 55% do necessário para o superávit primário (o dinheiro que poderia ser investido, mas é pago como juros), uma quantia total de R$ 64,8 bilhões.
Com esse aumento na remuneração, qual capitalista financeiro não tem interesse de "investir" aqui no Brasil? Em maio de 2011, o chamado Investimento Estrangeiro Direto (que hoje tem muito pouco de investimento) foi de US$ 64,1 bi, enquanto que, no mesmo mês de 2010, foi de US$ 26 bi. O problema é que a entrada de dinheiro estrangeiro supervaloriza a moeda local, que, por sua vez, cria uma concorrência desleal entre produtos importados e os nacionais, além de desestimular as exportações e o investimento industrial.
No que se refere às exportações, por incrível que pareça, elas vão de vento em popa (mas apenas as de commodities, é claro).
O superávit comercial em maio foi de US$ 3,527 bi, 2,3% maior que no mesmo mês de 2010. Decompondo a cifra de US$ 94,61 bi de produtos exportados, entre janeiro e maio de 2011, a Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB) identificou que US$ 67,36 bi são de commodities básicas, semimanufaturadas e manufaturadas (tais como álcool, gasolina, suco de laranja, barras de aço e ferro, açúcar refinado, etc.). Isto representa um total de 71% das exportações brasileiras, constituídas de produtos que tem seu preço determinado pelas bolsas do mundo inteiro, não tendo o país controle algum sobre eles.
É, mas garantir a remuneração do capital financeiro, acima de tudo, tem sido a opção, e não só do Brasil. Todos acreditam, com fé, que o salvador é este tipo de capital, e procuram satisfazer as suas necessidades a qualquer custo. Em todo o mundo é preferível pagar os juros da dívida e garantir a "sagrada remuneração", como se, com isso, fôssemos todos para o paraíso, doa no bolso de quem doer.
E sempre quem paga a conta são os trabalhadores.
Até quando?
[i] Mestre em Economia, professor Substituto do Departamento de Economia da UFPB e pesquisador do Progeb. (www.progeb.blogspot.com.).
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