sábado, 24 de dezembro de 2011

Homem primata! Capitalismo selvagem!

Semana de 12 a 18 de dezembro de 2011


Rosângela Palhano Ramalho¹




Desde 1825, um fenômeno econômico mundial se repete de forma periódica. Clement Juglar registrou a repetição, a partir de 1862. Segundo ele, as crises econômicas se repetem num período que varia entre 7 e 11 anos. Embora estudos comprovem a sua existência, no pós-segunda guerra mundial, os economistas acabaram com o problema chamando o capitalismo de “pós-cíclico”. As “flutuações econômicas”, termo que passou a designar as crises, eram então “acidentes” do capitalismo que facilmente poderiam ser resolvidos.
A partir de 2008, tivemos que conviver com mais este doloroso “acidente”, retomado em 2011. Uns relutam em admitir que a crise esteja aí, outros lançam probabilidades de ocorrência e alguns já admitem: estamos no fundo do poço. A OCDE detectou, em outubro, a oitava queda consecutiva da atividade econômica mundial. O Bank of America, projetou uma “desaceleração significativa” em 2012 com risco de 40% de recessão mundial. Já Paul Krugman bradou a frase que ninguém quer ouvir: “Estamos em uma depressão mundial”.
A Europa, de forma desesperada, tenta salvar a economia e o euro. Sob o comando do casal Merkozy, foi costurado um acordo de austeridade fiscal, sem a participação do Reino Unido. A idéia é fazer cumprir as metas de austeridade fiscal fixadas há mais de uma década e desrespeitada por todos, inclusive pela Alemanha e França. Países que permanecerem com déficit acima de 3% do PIB sofrerão sanções impostas pelo Tribunal Europeu de Justiça.
A saída está longe da “proposta modesta” lançada ainda em 2010, por estudiosos da Grécia e Portugal. Na ocasião, foram sugeridas as trocas de títulos da dívida pública por papeis do Banco Central Europeu, a conversão simultânea destes papéis pela autoridade monetária e a utilização dos fluxos de recursos obtidos no financiamento da recuperação
Embora tenha relutado bastante, a premier da Alemanha admitiu a ampliação do fundo de socorro aos bancos, de € 360 bilhões, para € 480 bilhões e a ajuda governamental caso os bancos não consigam captar no setor privado.
Portugal já tinha posto o plano de salvamento bancário em prática, vendendo ativos no valor de € 78 bilhões. Mas, o valor de mercado dos três maiores bancos portugueses caiu 68%, o que equivale a uma perda de €6,3 bilhões e o país já cogita nacionalizar parte do seu setor bancário. Em 2012, a economia portuguesa encolherá 3%, segundo a Comissão Européia, e o rendimento dos bônus de dez anos de Portugal quase duplicaram, nos últimos meses, chegando a 13%.
A situação também não melhorou na Itália. Mario Monti teme o risco de retorno do terrorismo político. Pichações do tipo “Abaixo os banqueiros ladrões!” surgem nas cidades e, organizados ou não, os protestos no país são cada vez mais comuns.
No Reino Unido, o número de desempregados, no terceiro trimestre, alcançou 2,64 milhões e a taxa de desemprego subiu a 8,3%.
Enquanto a produção industrial da zona do euro caiu 0,1%, o Programa Eurotast divulgava que 79 milhões de europeus vivem abaixo da linha da pobreza. Destes, 43 milhões encontram-se numa situação de risco alimentar e sem dinheiro para adquirir alimentos. Estima-se que a população pobre da Europa esteja em torno de 41,5% da população total.
Por outro lado, a Conferência do Clima, em Durban na África do Sul, promovida pela ONU, trouxe como resultados apenas mensagens políticas: a continuidade do Protocolo de Kyoto e compromisso de elaboração de outro documento que inclua todos os países. Tal documento só ficará pronto em 2015 com estimativa para entrar em vigor em 2020.
Mas, quem se importa?
Selvagemente, o “mercado” ainda espera ansioso uma “solução satisfatória” para a crise. E as agências de risco, assim como abutres que cercam a sua presa, ameaçam rebaixar a classificação de crédito dos europeus, o que trará mais um ingrediente negativo para o “mercado”.
Enquanto isso, dados sobre a desigualdade são divulgados. Cálculos realizados pelo Financial Times mostram que só 58% da renda americana equivale a salários. No pós-guerra esta participação era de 63%. Ou seja, a classe trabalhadora americana perdeu o equivalente a US$ 740 bilhões de dólares só este ano. Nunca a remuneração do capital foi tão alta
No Brasil, o departamento de gestão de grandes fortunas do Credit Suisse estima que, em 2016, os recursos dos milionários atingirão R$ 1 trilhão. Quase 500 mil novos milionários entrarão no mercado. O número passará de 319 mil para 815 mil, aumentando 155%.
Notícias boas só para os banqueiros. Segundo a Febraban, o lucro conjunto de 134 instituições bancárias, no terceiro trimestre, apresentou queda de 1,4% em relação ao trimestre anterior, mas lucro de 41% em relação ao mesmo período do ano passado! Este ano o setor bancário brasileiro é de longe o mais lucrativo. Em contrapartida a inadimplência das pessoas físicas subiu. Até novembro, este índice alcançou 22,4%.
É bom aprender. A vida é cruel... Homem primata! Capitalismo selvagem!

¹ Professora do Departamento de Economia da UFPB e pesquisadora do Progeb – Projeto Globalização e crise na economia brasileira. (www.progeb.blogspot.com)
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