Semana de 27 de fevereiro a 04 de março de 2012
Lucas Milanez de Lima Almeida [i]
“Nos preocupamos, sim, com esse tsunami monetário [dos] países desenvolvidos que não usam políticas fiscais de ampliação da capacidade de investimento para retomar e sair da crise que estão metidos e que usam, despejam, literalmente, US$ 4,7 trilhões no mundo”. Este é um trecho do discurso, em tom de protesto, da presidente Dilma Rousseff numa cerimônia oficial no Palácio do Planalto.
Para entender o motivo desta declaração, vamos aos fatos. Não foi ontem que a economia mundial entrou numa crise que só tem comparação com a Grande Depressão da década de 1930. Desde que os empresários começaram a sentir o impacto da chamada Crise do Sub-Prime em 2007, os governos da maioria dos países interviram na economia para salvar suas empresas, a exemplo da GM, Bank of America, AIG, dentre muitos outros.
Diante da então crise financeira, que, grosso modo, está ligada à disponibilidade e à oferta de crédito, os Estados despejaram trilhões de dólares nos bancos. Isto foi feito porque, se os bancos ficassem descapitalizados, as pessoas e os empresários não teriam como obter dinheiro para comprar ou investir. Entre os “economistas oficiais”, este é o motivo mais aceito como explicação do contágio do chamado lado real da economia.
Com o “despejo”, por meio da política monetária expansionista, esperava-se que boa parte do dinheiro escorresse para as mãos da população, o que não aconteceu. O principal uso deste capital foi para uma operação chamada de “carry trade”, onde os bancos tomam empréstimos em países que cobram taxas de juros baixas e emprestam, principalmente por meio da compra de títulos do governo, a outros países onde a taxa de juros é elevada. Em 2008, por exemplo, o Banco Central estadunidense estabeleceu como taxa básica de juros para a economia um valor que variou entre 0% e 4%. Já o Banco Central brasileiro decretou uma taxa que variou entre 11,25% e 13,75% ao longo do mesmo ano. A operação “carry trade” ganha em cima deste diferencial entre os juros dos países. Diante da tentadora diferença, parte dos US$ 4,7 trilhões mencionados por Dilma se destinou aos países em desenvolvimento, inclusive (e se tratando de “carry trade”, talvez principalmente) ao Brasil. Com isso, em 2008, o dólar chegou a ser cotado a R$ 1,59. Atualmente, para comprar um dólar, o brasileiro deve desembolsar em torno de R$ 1,75.
O problema é que, a esta taxa de câmbio, a indústria brasileira sofre por todos os lados: fica mais caro vender para o setor externo e não consegue competir com os importados no mercado interno. O resultado disto é a redução na produção e, consequentemente, no emprego. A Associação Brasileira de Máquinas e Equipamentos (Abimaq) publicou que um total de 2,32 mil funcionários foram demitidos, só nos últimos dois meses de 2011. Além disso, em janeiro de 2012, a utilização da capacidade instalada ficou em 75,8% e a perspectiva é de que, no resto do ano, haja uma redução de 20% na produção, o que leva a crer que haverá mais demissões este ano. Para piorar, a expectativa é de que, em 2012, o déficit da balança comercial do setor supere os US$ 17,88 bilhões do ano passado, atingindo a cifra de US$ 20 bilhões. Segundo o Dieese, o desemprego, em sete regiões metropolitanas do Brasil, subiu dos 9,1%, atingidos em dezembro de 2011, para o patamar de 9,5% em janeiro de 2012. Já o Índice de Nível de Atividade da indústria de transformação de São Paulo mostrou um recuo de 0,8% entre janeiro e dezembro passado. Segundo o estudo, os setores que mais sofreram foram os de máquinas e o automobilístico.
Sem esta situação cambial, a indústria poderia ter sofrido menos com os efeitos da crise, já que o governo brasileiro tomou medidas de política fiscal expansionistas, tais como a desoneração de alguns produtos e, principalmente, o aumento do salário mínimo. E todos sabem disto, pois, agora, estão tentando desesperadamente conter a apreciação do real, por meio da intervenção direta no mercado de câmbio e por meio da taxação sobre os falsos investimentos estrangeiros diretos (dinheiro que, por exemplo, é enviado pela matriz para investimento, mas a filial utiliza para especular, dentre outras opções, com os títulos do Tesouro). A situação é tão grave que, novamente, capitalistas e proletários se uniram contra a desindustrialização no país.
O pior é que Banco Central Europeu aprovou nova enxurrada de € 530 billhões para 800 bancos do continente, a uma taxa de 1% ao ano. O problema é que, com uma taxa de juros de dois dígitos, quem não vai querer colocar seu Tsunami monetário para cima do Brasil?
[i] Mestre em Economia, professor do Departamento de Economia da UFPB e pesquisador do Progeb. (www.progeb.blogspot.com.).
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