quarta-feira, 21 de novembro de 2012

Déjà vu europeu?


Semana de 12 a 18 de novembro de 2012


Lucas Milanez de Lima Almeida[i]




            Cientificamente, o déjà vu, a sensação de “já vimos isso antes”, ocorre quando levamos uma nova informação diretamente ao local do cérebro responsável pela memória de médio ou longo prazo.
            A impressão que temos com a Europa hoje, porém, não é esta. Há exatamente um ano, publicamos aqui uma análise de conjuntura intitulada “Para quem vai o novo presente de grego?”. Nesse texto nos perguntávamos o que aconteceria com a versão moderna do Cavalo de Tróia, a saber, a dívida grega. Na ocasião dissemos que não seriam os especuladores os ganhadores de tal presente, mas sim o povo, que, em meio às manifestações, o receberia a pau e pedra. Dito e feito. A conta grega está sendo paga pelas famílias gregas. Mas, as manifestações contra o governo não param de acontecer. O problema é que, não apenas a Grécia agraciou seu povo, os maiores países do sul da Europa também.
            Elevação dos impostos, redução dos salários, demissões de trabalhadores e redução dos gastos são alguns dos resultados dos planos de austeridade impostos pelos novos credores de Portugal, Itália, Espanha e Grécia (PIGS). Veja, leitor, que são novos credores, ou seja, os gastos e a dívida atuais, que não podem ser pagos, serão parcialmente quitados por meio de uma nova dívida, contraída, principalmente, por meio do Banco Central Europeu e do FMI. Como diz o provérbio português, é “abrir um buraco para tapar outro”.
            Diante disto, a Confederação dos Sindicatos Europeus (CSE) chamou a todos para, no dia 14 de novembro de 2012, participarem do “Dia Europeu de Ação e Solidariedade”, que levou trabalhadores de 23 países do continente a cruzarem os braços. É a primeira vez na história da União Europeia que uma greve tem a adesão de tantas nações. Segundo a secretária-geral da CSE, Bernadette Ségol, desse jeito “o que vai acontecer, entretanto, é o desmantelamento do modelo social, a capacidade negocial dos sindicados e o enfraquecimento da proteção social e dos serviços públicos. É isso que está em jogo hoje em dia”.
            O abandono da tese de que a riqueza é produzida no chão de fábrica, pelo trabalho, e a ascensão da tese de que o “mercado” (leia-se mercado financeiro especulativo) é o principal elemento da dinâmica capitalista trouxeram e trarão perniciosas mazelas para os países que, como os PIGS, levam esta teoria tão a sério. A imposição de medidas restritivas para, principalmente, satisfazer a sede de apropriação do capital fictício retira da população parte de uma renda que se torna insuficiente para a reprodução das condições normais de vida.
            Que sociedade é esta que retrocede nas conquistas obtidas pelo povo ao longo de décadas? Será que alguém merece, por decisão externa, ter seus direitos cerceados? E isto em detrimento da inquestionável “sagrada remuneração” dos “investidores” (especuladores)?
            Se ao menos houvesse algum alento nos números que mostram o resultado da política econômica, mas nem isso. No 3° trimestre de 2012, a Zona do Euro apresentou uma redução de 0,1% na sua atividade econômica. Isto quer dizer que ela está em recessão técnica, pois apresentou crescimento negativo também no segundo trimestre. Todos os PIGS apresentaram redução do PIB no trimestre passado, mantendo-se em recessão técnica. Já a França e a Alemanha, as duas maiores economias da união monetária, apresentaram resultados positivos, ambas crescendo 0,2%. Se por um lado os franceses frearam a tendência negativa do trimestre anterior, por outro, os alemães frearam a tendência positiva que apresentavam desde o começo do ano.
            Frente a este cenário internacional desolador, qualquer crescimento, mesmo que pequeno, se torna grande coisa. É o que está trombeteando o “Trombini”, digo, o Tombini, presidente do Banco Central do Brasil. De acordo com o IBC-Br, índice que faz uma prévia mensal do PIB, a atividade econômica do Brasil cresceu 1,15%, no terceiro trimestre. Mas, de agosto para setembro houve um decrescimento de 0,52%. A indústria contribuiu para esta queda. Na mesma comparação mensal, houve uma retração de 0,98% no total da produção física industrial. O comércio varejista ampliado (incluindo materiais de construção e veículos) também apresentou sinais ruins ao registrar uma retração de 9,2% nas vendas entre setembro e agosto. Mas, com as festas de fim de ano, espera-se uma melhora. Este é o motivo do trombone antecipado, que já clama pela elevação dos juros.
            De qualquer forma, olhando para além-mar e para cá, há alguma coisa que nos faz ter uma sensação dedéjà vu.
            E não é só impressão: nós realmente já vimos tudo isso antes.


[i] Professor do Departamento de Economia da UFPB e pesquisador do Progeb. (www.progeb.blogspot.com.)
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