Semana de 14 a 20 de outubro de 2013
Rosângela Palhano Ramalho[i]
As discussões sobre a conjuntura econômica brasileira esquentaram após o Copom decidir por um novo aumento da taxa de juros, de 9 para 9,5%. O leitor, infelizmente, não teve acesso a nossa última análise (produzida, mas não publicada neste espaço, por motivos que fogem a nossa vontade), que novamente fez duras críticas à decisão da autoridade monetária (A referida análise, que tem como título “Pânico no planeta, economia patina, mas juros sobem” encontra-se disponível em nosso blog referenciado logo abaixo deste texto).
O fato é que após a decisão, outra discussão ganhou corpo. O governo passou a ser acusado de abandonar o tripé econômico, doutrina que deveria embasar a nossa política econômica. O leitor sabe que esta contenda não é nova. Em 2010, a nossa coluna demonstrou que o tripé baseado em três objetivos, obtenção de altos superávits primários, câmbio flutuante e regime de metas para inflação, tem apenas um pé, uma vez que prioriza de forma absoluta apenas a manipulação das taxas de juros para combater a inflação. Por essa razão nós o apelidamos de saci macro econômico.
A confusão atual foi iniciada por quem nada entende do assunto. Marina Silva, frustrada pela não criação de seu partido e agora aliada de Eduardo Campos, candidato do PSB a presidência da Republica em 2014, discursou fervorosamente contra a política econômica do governo e defendeu, de forma veemente, o retorno ao tripé. A plateia, formada principalmente por investidores do banco Credit Suisse, ficou satisfeita ao ouvir de Marina que o governo deve dar “claros sinais ao mercado” do seu comprometimento com estas políticas. Quem te viu e quem te vê!
O alvoroço foi geral. Dilma e a equipe econômica saíram na defensiva. Segundo a presidente, o governo jamais abandonou o tripé, ou seja, as contas públicas estão em ordem, as reservas internacionais estão elevadas e a inflação está controlada. Mas, esquece Dilma, que de acordo com esta “solução absoluta”, não basta apenas declarar que as contas estão em ordem. Dever-se-ia ter cumprido a meta de superávit primário que, para este ano, era de 3,1%, o equivalente a economia de R$ 155,9 bilhões direcionados ao pagamento dos juros da dívida. O governo já assumiu que esta meta não será alcançada e o número fechará o ano em 2,3% do PIB, ou seja, ao invés de R$ 155,9 bilhões, pagaremos aos nossos pobres credores apenas R$ 111,2 bilhões!
Esquece Dilma também, que para a doutrina do “tripé”, não basta apenas ter reservas internacionais disponíveis, mas é necessário o câmbio a flutuar. Já fizemos referência aqui, que o nosso câmbio é regido pelo regime flutuante sujo, aquele em que a mão do governo é acionada quando as taxas cambiais fogem ao controle. Este ano, com o afrouxamento monetário promovido pelos Estados Unidos, as intervenções no mercado de câmbio foram intensas, no sentido de barrar a valorização do real. O Banco Central do Brasil anunciou, em agosto, um programa de intervenções para ofertar diariamente contratos de compra de dólares a futuro no valor de US$ 55 bilhões, até o final do ano. Portanto, o tripé foi abandonado há muito tempo sim. A saída mais honrosa para o governo seria assumir que ele não é mais um tripé e sim um saci, conforme tínhamos provado em 2010. O saci, maquiavélico, nos devolveu o topo do ranking dos maiores juros reais do mundo!
Os “analistas de mercado”, diante da decisão do Copom, como era previsível, passaram a elogiar a “responsabilidade” do governo e afirmar que foi resgatado um pontinho da “credibilidade” do Banco Central. Em novembro, tem-se como certo o aumento de 0,5 ponto percentual. Desesperadamente, analisam-se as entrelinhas da ata do Copom, a espera de um sinal que mostre que o aperto se estenderá por 2014. Trata-se agora de uma análise para entender o que está por trás do português da bendita ata. No termo “ainda”, concluem os “analistas”, está o segredo. Segundo o texto, a inflação “ainda” está resistente. Conclusão: a instituição não está satisfeita com o pequeno recuo do índice de preços ocorrido nos meses passados. Novos apertos virão. Mas não basta isto. O Banco Central, para recuperar sua credibilidade, diz o mercado, deveria garantir o retorno da inflação para o centro da meta (4,5%). Para isto a taxa deveria subir a 13%!
Ao que parece, o saci macroeconômico continuará a fazer suas peripécias, contribuindo para abortar a débil recuperação da economia, travar o desenvolvimento, aumentar o desemprego, reprimir o consumo e tornar ainda mais difícil a vida do setor industrial do país.
Viva a independência do BC!
[i] Professora do Departamento de Economia da UFPB e pesquisadora do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com)
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