quarta-feira, 2 de outubro de 2013

O déficit e o superávit orçamentário



Semana de 23 a 29 de setembro de 2013


Lucas Milanez de Lima Almeida[i]




            O jargão economês se deleita com palavras difíceis. Não é raro o linguajar ser tão indigesto que é até melhor deixar o dito pelo não dito. Nesta linha mesma seguem as palavras de origem latina, déficit e superávit. Descomplicando, déficit é o mesmo que dizer saldo negativo e superávit é o mesmo que saldo positivo. Quando este saldo se refere à diferença entre o que o governo arrecada e o que ele gasta, temos o saldo orçamentário, que pode ser equilibrado (zero), superavitário (positivo) ou deficitário (negativo).
            Nesta semana, o assunto que está em evidência é o veto, pelo congresso estadunidense, da ampliação da dívida do governo ianque. Apesar do desespero de Barack Obama, esta não seria a primeira vez que isto ocorreria. Em 2011 já houve uma manobra do tipo “toma lá dá cá”, onde os parlamentares conseguiram concessões fiscais em troca do aumento do teto da dívida pública do país. O resultado foi o rebaixamento simbólico da classificação de risco de calote dos EUA, pela Standard & Poor.
            Os republicanos do congresso, que são a maioria e da oposição, também pretendiam realizar alguns desejos em troca de uma nova flexibilização do orçamento. O principal alvo foi o chamado Obamacare, um plano nacional de reforma do sistema de saúde dos EUA que, dentre outras coisas, dá subsídios aos mais pobres na contratação de um seguro de saúde. A oposição queria adiar o início das reformas para 2014. O problema é que os democratas não abriram mão de tais ganhos sociais.
            O resultado é que, segundo o secretário do Tesouro dos EUA, Jacob Lew, no dia 17 de outubro de 2013 será atingido o teto do endividamento do país, dívida esta que chegou a US$ 16,7 trilhões. Naquela mesma data, o país terá apenas US$ 30 bilhões para honrar seus compromissos, que já atingem, porém, os US$ 60 bi. Ou seja, se isto se concretizar, a maior economia do planeta dará um belo de um calote em seus credores, pois o orçamento do governo estadunidense é deficitário e não poderá mais ser financiado.
            Além dos serviços públicos, como a manutenção de museus e parques, a emissão de passaporte e o funcionamento de escritórios federais, os setores de energia e agronegócios serão afetados, por falta de pessoal para liberar pesquisas e investimentos. Ao todo, 800 mil trabalhadores serão obrigados a ficar em casa sem trabalhar e, o mais importante para o orçamento, sem receber seus salários. Como exemplo, a famosa estátua da liberdade já foi fechada. Por outro lado, se tratando dos EUA, era de se esperar que os gastos militares não fossem prejudicados pelo impasse. Como garantido pelo presidente e pelo congresso, nenhum dos 1,4 milhão de militares ativos e tantos outros trabalhadores responsáveis pela segurança nacional terá problemas de imediato.
            Esse é o cenário no maior país da América do Norte: o governo gasta mais do que pode e por isso enfrenta sérios problemas. O porém é o seguinte: mesmo que um país tenha um saldo orçamentário positivo, ou seja, apresente superávit, nada garante que ele esteja no melhor dos mundos.
            O Brasil, entre janeiro e agosto de 2013, acumulou um saldo orçamentário de R$ 54 bilhões, mas, mesmo assim, o “mercado” não está satisfeito com tamanho superávit. Este dinheiro é economizado para pagar o chamado serviço da dívida, outro jargão do economês para se referir aos juros, tal como o que pagamos ao banco e operadoras de cartão, que são os nossos credores ou financiadores.
            Segundo o Ministro da Fazenda, Guido Mantega, já está garantido para este ano um montante de R$ 73 bi, o que representa 1,53% de tudo o que o Brasil é capaz de produzir em um ano. Porém, apesar de muito aquém do que o “mercado” quer (vale lembrar que o “mercado” é o credor ou financiador do governo!), Mantega afirma que o superávit primário será de 2,3% do PIB. Isto é pouco provável. Até o agente máximo de submissão ao “mercado”, o Banco Central, admite que “hoje não se faz necessária a geração de superávits primários de ampla magnitude”. O que se espera é um percentual de 2% do PIB, em 2013, para pagar os juros das dívidas do governo.
Para finalizar esta análise, sugiro ao leitor procurar a revista britânica “The Economist”, publicada em 26/09/13, para ter uma ideia do que pensa o “mercado” sobre o que o periódico chamou de “voo de galinha” do Brasil.
            Ali podemos ver ainda que, dos amigos americanos, importamos, não só os jargões, mas também às teses sobre o comportamento da economia brasileira.


[i] Professor do Departamento de Economia da UFPB e pesquisador do Progeb. (www.progeb.blogspot.com; lucasmilanez@hotmail.com)
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