sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

Os vulneráveis



Semana de 10 a 16 de fevereiro de 2014


Rosângela Palhano Ramalho[i]

            Em agosto de 2013, esta coluna anunciou que as revisões para baixo nas previsões de crescimento do PIB dos emergentes determinaram o fim do prestígio deste grupo de países frente à sua participação na elevação do crescimento mundial. E 2014 chegou para selar o destino dos emergentes. O “tapering” do Federal Reserve (Fed), banco central dos EUA, está, conforme o esperado, gerando problemas financeiros em diversos países do mundo, estimulados principalmente pelas especulações realizadas no mercado cambial.
            Brasil, Índia, Indonésia, África do Sul e Turquia, agora reunidos em um grupo batizado de BIITS sendo os mais afetados pela decisão norte-americana de reduzir os estímulos monetários, são agora enquadrados como frágeis, vulneráveis. Suas vulnerabilidades estão resumidas num indicador construído pelo Fed e calculado para uma amostra de 15 economias emergentes. O índice de vulnerabilidade apurado se correlaciona com as persistentes desvalorizações cambiais dos países estudados. A conclusão faz parte de um relatório divulgado pela equipe gestora do Fed, na pessoa de sua nova presidente, Janet Yellen. Neste relatório o Brasil aparece como o segundo mais vulnerável do BIITS, perdendo apenas para a Turquia.
            As conclusões do tal relatório causou um mal-estar tão grande na equipe econômica brasileira, que a direção do Banco Central entrou em contato com o Fed para esclarecer que esta posição sobre o Brasil está defasada. Os próprios “investidores”, segundo o governo, admitem as diferenças entre os emergentes, e em especial, entre o Brasil e a Turquia. A equipe econômica, que no Fórum Econômico Mundial em Davos, já havia rejeitado a “crise da meia-idade” dos emergentes, rejeita também esta comparação. Afirma que o Brasil está muito à frente da Turquia quanto se consideram os aumentos sucessivos nas taxas de juros e o montante de reservas cambiais (US$ 370 bilhões) que são, segundo o governo, mais que suficientes para atravessar as turbulências financeiras.
            Além da contestação oficial, destacaram-se as declarações de economistas renomados que passaram também a rejeitar a ideia da crise generalizada nos emergentes e de comparação entre eles. Murilo Portugal, por exemplo, classificou de “totalmente absurda a comparação do Brasil com a Turquia” e Delfim Netto chamou de “paranoia absurda” as conclusões do relatório do Fed.
            Não precisamos ser economistas renomados para perceber que a contaminação pela desvalorização cambial seria uma das consequências da decisão do banco central americano e que os emergentes deveriam ajustar suas políticas internas à nova situação, sendo obrigados a elevarem a taxa de juros para defender as suas moedas. Mesmo assim, o futuro dos emergentes parece muito mais agradável. Segundo o FMI, os países emergentes cresceram 4,7% em 2013 e crescerão 5,1% em 2014, enquanto que o mundo desenvolvido cresceu 1,3% em 2013 e crescerá 2,2% em 2014.
            À espera de melhores dias para todos, o presidente do Banco Central indiano, Raghuram Rajan, ainda em Davos, clamou de forma ingênua: “Os países industrializados têm de desempenhar um papel na restauração (da cooperação mundial) e a essa altura não podem simplesmente lavar as mãos e dizer que farão o que precisam fazer e os outros que se ajustem.”
            Em contrapartida, esta semana, na primeira sabatina frente ao Congresso americano, a presidente do Fed, limitou-se a dizer que o banco central persegue a estabilidade de preços e o máximo emprego e garantiu que a política americana seguirá o curso prometido a não ser por uma piora dos indicadores americanos, é claro. Ainda segundo Yellen, as vulnerabilidades dos BIITS, não são reflexos apenas das reduções das compras de ativos do Fed, mas sim de uma série de outros fatores intrínsecos a estas economias.
            De forma clara a resposta ao clamor de Rajan foi dada: cada um que trate de domar a sua crise. O curioso é que quando os Estados Unidos tomam decisões que afetam os outros, é só uma questão de defesa interna. Mas quando os “vulneráveis” se defendem são acusados de intervencionistas extremos que comprometem os ajustes necessários e que impedem o melhor funcionamento da economia.
            Será apenas uma questão de ponto de vista?


[i] Professora do Departamento de Economia da UFPB e pesquisadora do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com)
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