quarta-feira, 21 de maio de 2014

Piketty e a desigualdade



Semana de 14 a 18 de maio de 2014

Rosângela Palhano Ramalho[i]

            Caro leitor. Se você ainda não ouviu falar em Thomas Piketty, saiba que, é o economista francês mais comentado do momento. Seu livro recentemente lançado “O Capital no século XXI”, deu a Piketty, nos Estados Unidos, o status de rock star. Mas, qual a novidade que está por traz das suas opiniões? Mesmo não tendo acesso ao livro, que logo será editado no Brasil, a leitura dos comentários nos permite fornecer uma ideia geral do seu conteúdo. Em 970 páginas em francês e 685 em inglês, o economista discute a questão da desigualdade e conclui, com o uso de estatísticas bastante abrangentes, que a tendência geral é de que as sociedades se tornem cada vez mais desequilibradas. A dinâmica da acumulação capitalista, segundo ele, gerará uma espiral de desigualdade fora de controle. Como uma nave sem piloto, o mundo caminha para a tragédia. Ao citar o exemplo dos Estados Unidos, Piketty mostra que os 10% da população de rendimento mais elevado que possuíam 30% a 35% da renda total, passaram a possuir mais de 50% hoje, e mesmo nos países mais igualitários, como a Suécia e a Suíça, esta proporção vem aumentando com o tempo. O acompanhamento das séries de longo prazo, conclui o economista, mostra que a tendência é a de que o rendimento do capital continuará superior às taxas de crescimento e com isto elevará a concentração da renda, a níveis tais que ameaçará o funcionamento das instituições democráticas.
            Desde o início da crise atual que são lançados estudos sobre este tema. A Suécia, por exemplo, país citado nas análises de Piketty, é a nação rica onde a desigualdade cresce mais rápido, segundo a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE). As estatísticas mostram que desde 1985, considerando um grupo de 34 países ricos, a Suécia se destaca por apresentar alto crescimento da desigualdade. Na década de 90, os 10% mais ricos da população sueca apresentaram uma renda quatro vezes maior que a renda dos 10% mais pobres. Em 2008, este número subiu para seis vezes. Em 2010, a taxa de pobreza registrada na Suécia foi de 9%, o que representa mais do que o dobro do número registrado em 1985.
            O leitor que acompanha esta coluna sabe que partilhamos da ideia de que a acumulação capitalista promove e acentua as desigualdades, através do aumento do fosso que divide os ricos dos pobres. Tal fato é inerente ao próprio processo de acumulação capitalista. Em nossas análises já trouxemos inúmeros exemplos dos artifícios utilizados pelo capital para se expandir e se apropriar de parcelas cada vez maiores da renda, fenômeno há muito tempo discutido pela teoria marxista. O que nos admira é justamente a surpresa de alguns economistas com estas questões que são tão antigas quanto o próprio capitalismo.
            Lembremos alguns exemplos recentes de como os grandes capitais, através da exploração da mão de obra barata, garantem a acumulação. No Vietnã, ocorreu uma onda de protestos causada pela decisão da China em explorar petróleo em águas profundas nas Ilhas Paracel, território de disputa entre chineses e vietnamitas. O curioso, é que, os protestos acabaram prejudicando grandes empresas como a varejista Walmart, a Nike e a Adidas, que tem parte de suas cadeias produtivas sediadas naquele país. As redes já fugiram da China, em virtude do aumento do custo da mão de obra. Estão indo embora de Bangladesh, por causa do acidente gravíssimo em uma fábrica têxtil que matou mais de mil trabalhadores, e também fogem da Tailândia, em razão dos riscos políticos. Resta então explorar o continente africano. A Rede de cartões Visa, já está na África, precisamente em Ruanda, tentando convencer aquela sociedade dos grandes benefícios em obter créditos e utilizar o pagamento eletrônico. A própria China está levando literalmente seu chão de fábrica para a África. Fabricantes de caminhões, calçados, peças para televisores, tubos de aço e têxteis, estão transferindo suas instalações para Uganda, Angola, Zimbabue, Etiópia e Zâmbia, por causa dos baixos custos da mão de obra comparados aos custos chineses.
            Os problemas fundamentais relativos à dinâmica da acumulação capitalista já haviam sido previstos por Marx. Thomas Piketty, agora apelidado de Marx I, propõe, para resolver a trágica acentuação da desigualdade, a adoção de um imposto progressivo mundial sobre o capital.
Com todo o respeito que a obra do autor possa merecer temos de concluir que a montanha pariu um rato.
            Esta é a grande diferença entre ele e Marx, pois para Marx, a superação destes problemas, gerados pela lei geral da acumulação capitalista, está na superação do próprio capitalismo.


[i] Professora do Departamento de Economia da UFPB e pesquisadora do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com)
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