Rosângela Palhano Ramalho
[i]
Embora o jornalismo econômico continue a alardear
que a recuperação econômica está em curso, nossas últimas colunas têm
apresentado estatísticas decepcionantes da atividade econômica. Após a queda de
0,8% da produção industrial, em agosto, registre-se também, neste mês, a queda
0,5% das vendas no varejo restrito comparada a julho. Quando considerado o
varejo ampliado, que envolve veículos e autopeças, as vendas subiram apenas
0,1%. Uma decepção. Apesar dos soluços da recuperação, os analistas continuam
reforçando que a “recuperação é gradual”, mesmo sendo “não linear” e “não
exuberante”.
Os novos investimentos vêm do setor automobilístico.
A Mercedes-Benz anunciou que investirá R$ 2,4 bilhões entre 2018 e 2022 e a
Volkswagen, R$ 7 bilhões até 2020. Mas, a indústria de bens de capital,
termômetro da recuperação, ainda não decolou. Apesar de ter crescido 6,6% em
agosto, no acumulado do ano, o setor sofre uma queda de 18,6%, segundo o IBGE.
Na visão de Aloísio Campelo Jr e Pedro Costa, ambos da Fundação Getúlio Vargas
(FGV), se os investimentos não decolarem, “[...] a recuperação estará fadada a
ser um voo de galinha”. E lembre, caro leitor, que não será a primeira vez.
No mundo desenvolvido, a deflação preocupa. Mesmo em
recuperação, as economias padecem com a inflação baixa. Os Bancos Centrais da
Europa, Estados Unidos e Japão, injetaram de US$ 15 trilhões em suas economias
e nada da inflação reagir. O desemprego das economias avançadas caiu para menos
de 6% e, nada... Segundo Adam Posen, diretor do Peterson Institute e
ex-presidente do Banco Central da Inglaterra: “Se não conseguirmos fazer a
inflação voltar a subir, não conseguiremos ter estabilidade política sem
aumento de salários”. Será, caro leitor, esta a grande tragédia?
Não há consenso então, para as causas do fenômeno,
pois os formuladores de política econômica não acham resposta em seus modelos
prontos (aqueles que relacionam inversamente o desemprego e a inflação). Janet
Yellen, presidente do Fed, Banco Central dos Estados Unidos, declarou que o
entendimento “[...] pode estar essencialmente mal especificado”. Já Mario
Draghi, presidente do Banco Central Europeu (BCE) acha que a recuperação não
foi suficiente para gerar pressões inflacionárias. E Claudio Borio,
economista-chefe do Banco de Compensações Internacionais (BIS), questiona:
“Quanto realmente sabemos sobre o processo inflacionário?”
Outra cizânia foi posta à vista de todos, na
premiação do Nobel de Economia de 2017. Richard Thaler, professor da escola de
negócios da Universidade de Chicago, americano, 72 anos, foi laureado porque,
segundo a Real Academia de Ciências da Suécia, “incorporou premissas
psicologicamente realistas à análise da tomada de decisões econômicas. Ao
explorar as consequências da racionalidade limitada, de preferências sociais e
da falta de autocontrole, ele mostrou como essas características humanas sistematicamente
afetam as decisões individuais, assim como resultados de mercado”. A chamada da
Real Academia pode soar estranha ao leitor, mas é isto mesmo: a Teoria
Econômica predominante tem como premissa para a análise da realidade econômica,
um ser que não existe: o chamado Homo Economicus. Segundo a teoria, este ser é
perfeitamente racional, e por isso, dotado de capacidade decisória que lhe
permite, através da análise do imenso leque de informações disponíveis e
conhecidas, fazer sempre as melhores escolhas.
Em declarações anteriores à premiação, Richard
Thaler, precisou revelar o óbvio, até mesmo para aqueles que conhecem muito
pouco de Economia: “Para fazer boa economia, você precisa ter em mente que as
pessoas são humanas”. E alfinetou: “Eu acredito que, nos últimos 50 a 60 anos,
os economistas se dedicaram ao estudo de criaturas fictícias. Eles podiam muito
bem ter estudado unicórnios”. E, para amparar a sua tese, ao ser perguntado
como iria gastar o prêmio de US$ 1,1 milhão, o laureado não hesitou: “Vou
tentar gastá-lo do modo mais irracional possível”.
Até quando vamos basear a análise da realidade
econômica em modelos ultrapassados e seres fictícios?
[i] Professora
do Departamento de Economia da UFPB e pesquisadora do Progeb – Projeto Globalização
e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com.br)
Contato: rospalhano@yahoo.com.br
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