Semana de 08 a 14 de julho de 2019
Lucas Milanez de Lima
Almeida [i]
A industrialização só chegou ao Brasil, de fato, no
século XX. Porém, neste momento da história, a economia mundial já havia
passado por profundas mudanças.
Nos séculos XVIII e XIX, aquilo que era uma profusão de
capitais de médio e pequeno porte atuando nos espaços econômico nacionais ainda
disponíveis, na virada do século XIX para o XX se transformou numa grande
disputa entre potências econômicas em busca do mercado mundial. A grande razão
está no fato de que, pelas próprias características inerentes ao capitalismo
(por exemplo, as crises econômicas e o desenvolvimento de tecnologias que
requerem grandes investimentos), o que antes era uma dispersão de empresas
manufatureiras agora se transformou em grandes conglomerados oligopolistas
dominando boa parte dos setores produtivos. Por sua vez, com o fim da
disponibilidade dos espaços livres nas nações mais avançadas, foi um movimento
quase natural a expansão dos negócios para além das fronteiras nacionais.
Este é o pano de fundo da “revolução industrial”
brasileira, que ficou conhecida como processo de industrialização por
substituição de importações. Como o nome sugere, aos poucos a economia nacional
foi deixando de importar alguns produtos manufaturados, pois passou a
produzi-los internamente. Em alguns setores, como o comércio, os demais
serviços e a indústria de bens de consumo não duráveis (alimentos, higiene,
vestuário, etc.), os recursos nacionais puderam financiar boa parte dos empreendimentos.
Contudo, para continuar a substituição de
importações, seria necessário trazer para dentro do país outros setores
importantes, como a indústria de bens de consumo duráveis (automóveis,
eletrodomésticos, etc.), de bens intermediários (insumos) e, principalmente, de
bens de capital (máquinas, equipamentos, etc.). Era necessário, pois, realizar
a industrialização pesada. Por suas próprias características, esses são os
setores de maior dinamização da atividade econômica, pois requerem grandes investimentos
em pesquisa e desenvolvimento, serviços e mão de obra especializados, acesso a
insumo de alta intensidade tecnológica, dentre outros fatores. E esse era o
grande problema: no Brasil não existiam recursos para esta empreitada.
A solução veio de fora, juntando a fome com a
vontade de comer: os capitais que formavam as economias mais desenvolvidas
buscavam mercados estrangeiros onde pudessem investir e o Brasil buscava
capitais externos para poder continuar seu processo de industrialização. Assim,
o grosso dos setores mais dinâmicos da economia brasileira foram sendo
dominados por empresas estrangeiras, seja em sua origem, em meados do século
XX, ou com as privatizações das décadas de 1990 e 2000.
É justamente aí que está o problema do desenvolvimento
capitalista em economias como a nossa (as economias dependentes, em geral). Se
são as multinacionais que tendem a gerar os maiores impulsos dinamizadores da
produção, considerando que elas têm estratégias de investimentos em escala
internacional, surgem as perguntas: 1) como convencê-las de que o Brasil é um
local que, de fato, lhes trará retorno, sobretudo com a atual fragmentação do
processo produtivo, a formação das cadeias globais de valor e a concorrência
com as economias asiáticas (em especial países como Vietnã, Bangladesh, Laos,
Camboja e Índia), que apresentam “custos” trabalhistas, sociais e ambientais
muito menores do que o Brasil? 2) Como convencer as multinacionais de que elas
deveriam redirecionar seus investimentos, que iriam para os centros
tradicionais de pesquisa e desenvolvimento, e passar a investir em ciência aqui
no Brasil?
A resposta está sendo dada nas reformas propostas
pelo governo Bolsonaro. De um lado, a saída é reduzir custos ligados aos
direitos e às condições de vida da classe trabalhadora (que vão além da
aposentadoria e de regras básicas de contratação e passam por um meio ambiente
minimamente habitável). De outro, através do projeto “Future-se”, que pretende
conceder a estrutura pública universitária já consolidada à iniciativa privada,
de preferência estrangeira (típica “privatização à brasileira”) e deixar ela
tomar os rumos do que será pesquisado no país de acordo seus próprios
interesses.
De qualquer forma, o resultado tende a ser o mesmo:
“desenvolvimento” que resultará em condições de vida precárias e maior
subordinação econômica.
[i] Professor
do Departamento de Economia da UFPB e coordenador do PROGEB – Projeto
Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com;
lucasmilanez@hotmail.com)
0 comentários:
Postar um comentário