quarta-feira, 26 de maio de 2021

Não há mais governo

Semana de 17 a 23 de maio de 2021

 

Nelson Rosas Ribeiro[i]

           

É mesmo de causar desânimo. Quando retomamos o assunto, na análise seguinte, quase dá para copiar a anterior carregando nas tintas. A demência do governo é crescente. Bolsonaro continua em plena campanha eleitoral, promovendo passeios, desfiles e concentrações, com o dinheiro da nação provocando aglomerações de pessoas sem máscara e desmoralizando as determinações de seu próprio Ministério da Saúde. Leva sempre nas suas aventuras alguns ministros, principalmente os da segurança ou militares. Sente a necessidade de mostrar que tem apoio armado para suas pretensões golpistas. O passado fim de semana foi um deprimente espetáculo. Cercado por uma matilha de seguidores motoqueiros ele desfilou pelas praias do Rio de Janeiro terminando com um comício. Excitado pelos seguidores ele vomitou mais uma de suas bravatas golpistas e ataques às instituições e à democracia. Ele não governa. Passeia em campanha, cercado por um batalhão de seguranças sempre provocando aglomerações. No palanque, desta vez estava o general Pazuello, ex-ministro da Saúde, que, com isto, afrontou e desafiou as normas do Exército. Até parece uma provocação proposital.

Durante a semana continuaram a decorrer as seções da CPI da covid criando situações cada vez mais constrangedoras para o governo. Ninguém quer assumir a culpa pela falta de vacinas, pela recomendação do tratamento precoce com cloroquina e pelo colapso de Manaus. O esforço é muito grande para blindar o presidente.

Enquanto a CPI trabalha a destruição do país continua. Desta vez mais uma pequena surpresa: a ação da Polícia Federal contra o ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles. Por decisão do ministro do STF, Alexandre de Moraes, a PF bateu à porta do Salles e seu bando afastando 9 funcionários do comando do Ibama incluindo seu presidente Eduardo Bim, sob a acusação de envolvimento no contrabando de madeira para os EUA. Mais um caso de corrupção. O escândalo disputou os holofotes com a CPI.

Com toda esta agitação sobrou pouco espaço para a economia

Embora lentamente, a União Europeia se recupera. Flexibiliza-se o isolamento social e a reabertura para o turismo começou. A Unctad prevê o crescimento do comércio mundial em 16%. A nova ameaça vem da Ásia com a propagação do coronavirus que se espalha por vários países como Indonésia, Filipinas, Malásia, Coreia do Sul, Tailândia e Vietnã. A situação do Japão também é delicada. No primeiro trimestre a economia caiu 1,3%, uma taxa anualizada de -5,1%. A vacinação tem sido muto lenta e o número de infetados elevou-se provocando medidas emergenciais de isolamento social. Temeroso, o Federal Reserve (Fed.), Banco Central dos EUA, mantem as taxas de juros e os estímulos à economia. O mesmo ocorre com o Banco Central Europeu (BCE) e com o Banco da Inglaterra. Há recuperação, mas lenta e os países estão cautelosos.

Por cá, as coisas estão ainda mais duvidosas. Vivemos na ameaça iminente de uma terceira onda com o número de mortes ultrapassando os 450 mil. Há estimativas de 1 milhão até o final do ano se a vacinação continuar no ritmo atual. O desemprego persiste. O emprego formal decresceu -0,45%, o rendimento dos trabalhadores caiu -2,4% e o trabalho informal se arrasta pelo medo das pessoas e pelas restrições impostas à circulação e as atividades, principalmente no setor de serviços. Quem relaxa paga um alto preço em mortes, fato provado pelas estatísticas nos municípios que tiveram alta votação em Bolsonaro e que seguem suas orientações.

Os bancos continuam a obter altos lucros e os militares se locupletam desmoralizando as forças armadas. Só na Saúde o número de militares cresceu 94,55% entre 2016 e 2020. Segundo o TCU há 6.157 fardados em cargos civis, 108% a mais que em 2016. A demonstração da competência da farda na gestão da coisa pública não tem sido das melhores. Pazuello na saúde = 450.000 mortos; general Heleno no GSI = cocaína no avião da comitiva presidencial; aumento das queimadas na Amazônia = general Hamilton Mourão no comando. Isso para não falar no próprio presidente, um desastre.

Para concluir, enquanto aguardamos o golpe do Bolsonaro, a estagflação continua firme, tratada com cloroquina pelo BC, e as estimativas para o PIB continuam a girar entre 3% e 4,5%.


[i] Professor Emérito da UFPB e Vice-Coordenador do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira; nelsonrr39@hotmail.com; (www.progeb.blogspot.com). Colaboraram os pesquisadores: Ingrid Trindade, Guilherme de Paula e Daniella Alves.

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sexta-feira, 21 de maio de 2021

Bolsonaro, quem poderia imaginar?

Semana de 10 a 16 de maio de 2021

 

Lucas Milanez de Lima Almeida [i]

 

A semana que passou foi bem movimentada. O primeiro registro foi uma porrada na cara dos terraplanistas brasileiros: segundo levantamento do Financial Times, mais da metade das doses de vacinas contra o Covid-19 aplicadas na América Latina vieram da China. No Brasil, não fosse a “ComunaVac” chinesa, estaríamos lascados. Para além de fornecer a tecnologia e o Ingrediente Farmacêutico Ativo (IFA) da vacina produzida pelo Instituto Butantan, a China fornece o IFA também à Fiocruz. Não fosse nossos queridos representantes no Executivo, atrapalhando as importações, o número seria ainda maior.

Surpreendentemente (só que não), a constatação acima tem um dedinho da gestão Bolsonaro. Segundo contou à CPI da Covid o gerente-geral da Pfizer para a AL, Carlos Murillo, foram feitas seis ofertas de vacinas ao Brasil entre agosto de 2020 e fevereiro de 2021. No total, seriam cerca de 70 milhões de doses disponíveis à população brasileira. Caso as propostas feitas em 2020 fossem aceitas, já teríamos 1,5 milhão de doses no ano passado. Além disso, teríamos mais 17 milhões de doses entregues até o mês que vem (junho de 2021). Qual foi a resposta do governo brasileiro às ofertas? Nenhuma, apenas ignoraram. Como dizem os românticos, nada é pior que a indiferença.

Isso veio à tona em um contexto de mais de 425 mil mortes causadas pelo novo Coronavírus. Para aqueles que, aparentemente, estavam contentes com o alívio que isto traria para a Seguridade Social, pois os mais velhos morreram mais, saibam que o resultado econômico já é desastroso.

Segundo estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), até abril morreram no Brasil 301 mil pessoas com 60 anos ou mais. Na esmagadora maioria, são senhoras e senhores que deixaram de receber sua aposentadoria ou outros benefícios sociais. Esse era o motivo da alegria dos que acham que o brasileiro está vivendo demais. Porém, existe o outro lado da moeda. Dentre os 72,6 milhões de domicílios brasileiros, 25,4 milhões tem pelo menos um idoso como habitante. Contudo, em 15,4 milhões o benefício recebido pelo idoso corresponde a mais de 50% da renda domiciliar. A estimativa do IPEA é de que, entre março de 2020 e abril de 2021, as mortes de pessoas da terceira idade retiraram um total de R$ 3,8 bilhões de circulação. Isto, para além do problema que é em si, traz graves consequências para a própria retomada da atividade econômica. É dinheiro que deixa de circular agora. É dinheiro que deixará de circular no futuro. É redução de demanda por bens de consumo. É elevação das desigualdades sociais. É pressão sobre próprio sistema de assistência social. É muita coisa.

Falando em desigualdade social, este é outro problema agravado pela pandemia e pela péssima gestão federal da crise sanitária. O IPEA, novamente, realizou outro estudo que mostra que a inatividade da força de trabalho (desemprego e desalento) atingiu mais as mulheres, os negros e os jovens em 2020. Claro, o machismo, o racismo estrutural e a falta de políticas públicas de formação da força de trabalho são os grandes vilões por trás desses números.

E por falar nas mulheres, a Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe) fez um estudo que mostra como elas estão perdendo espaço entre os brasileiros que se aposentam por tempo de contribuição. No ano passado foi interrompida uma tendência de crescimento das brasileiras no total de pessoas que davam entrada na aposentadoria por tempo de serviço. Essa tendência resulta da maior inserção das mulheres nos empregos formais. Contudo, como constatado em outras pesquisas (e na citada anteriormente), elas foram as mais atingidas pelo desemprego na pandemia. Com isso, 35,4% das pessoas que pediram aposentadoria por tempo de contribuição em 2020 foram mulheres, ante 40,5% em 2019.

Por esses e por muitos outros motivos, em três das quatro pesquisas divulgadas semana passada, Bolsonaro perderia para Lula no segundo turno. É! Quem poderia imaginar que o único mandato presidencial de Bolsonaro seria esse desastre e que o vilão (na cabeça dele) ou anti-herói (na minha) poderá ser seu algoz...


[i] Professor do Departamento de Economia da UFPB e Coordenador do PROGEB – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com; lucasmilanez@hotmail.com). Colaboraram os pesquisadores: Ingrid Trindade, Guilherme de Paula e Daniella Alves.

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quinta-feira, 13 de maio de 2021

“Trata-se de uma grave doença mental”

Semana de 03 a 09 de maio de 2021

 

Nelson Rosas Ribeiro[i]

           

A situação do país continua grave. Não tanto pela economia, que continua a arrastar-se. Temos agora bons ventos soprando do Norte. A recuperação da economia mundial é puxada pelos países desenvolvidos (EUA, China, União Europeia etc.). Nestes países, com a vacinação, começou o controle da pandemia e, como era de se esperar, a atividade econômica foi sendo retomada. Claro que esta retomada se dá aos solavancos pois as cadeias globais de valor estão desarticuladas, o comércio internacional desorganizado e os países mais atrasados sofrem com novos focos da covid-19. Chegou a vez da Índia e outros países do oriente e da África que não conseguem comprar a vacina em quantidade suficiente para imunizar suas populações. Estamos assistindo, e vamos assistir, a um número crescente de mortes. O Brasil continua ainda a disputar um dos primeiros lugares no assassinato. Contamos com a forte colaboração do presidente Bolsonaro que permanece fazendo seus discursos genocidas e combatendo as medidas de contenção do vírus recomendadas internacionalmente e pelo seu próprio ministro da Saúde. E não é por acaso. Na CPI da covid surge cada vez mais evidente que esta é uma política de governo. O presidente parece pretender mesmo matar um grande número de pessoas enfrentando o vírus de frente. Afinal não somos um “bando de maricas” com medo “de uma gripezinha” qualquer. Depois do sinistro da Economia Paulo Guedes acusar a China de produzir o vírus, o presidente reforçou a ideia fazendo novamente a mesma acusação. Só dizendo como o deputado Fausto Pinato: “... deve tratar-se de uma grave doença mental”.

Efetivamente, as declarações de Bolsonaro surpreendem a cada dia. Nunca se pode imaginar o que ele é capaz de dizer diante da claque contratada que o aplaude histérica em frente ao Planalto. Sua demência é de tal ordem que, ele contrata o gado, paga e depois parece acreditar que está diante do povo, sendo aclamado. Entra em êxtase e sobe o tom: as ameaças de golpe. Esta é a parte mais perniciosa pois tenta envolver, na sua insanidade, as forças armadas que, na melhor das hipóteses, calam-se por omissão. De vez em quando algum general de pijama (daqueles formados na ditadura), mais histérico, faz coro. Desta vez foi o general Walter Braga Neto, ministro da Defesa que, em uma grande demonstração de ignorância e reacionarismo, reafirmou que não houve ditadura em 64, mandou os deputados estudarem história e defendeu a política genocida do governo na gestão do combate à pandemia, comprometendo-se pessoalmente com ela.

Enquanto isso, a CPI da covid-19 avança tomando novos depoimentos e obrigando outro general, o Pazuello, ex-ministro da Saúde, a tentar fugir da convocação para depor alegando contaminação com o vírus. Temendo ter que prestar contas de sua desastrosa gestão no ministério o general acovardou-se. Tem apelado até para o comando do exército para livrá-lo da incômoda situação. Como explicar sua afirmação de que “um manda e o outro obedece”? Quem mandou?

O governo está em desespero e Bolsonaro, quando encurralado, é capaz de jogar pedra na lua.

Já dissemos em outras análises que a economia se movimenta em ciclos de crescimento e desaceleração. O problema é que, quando o bonde passa subindo a ladeira, você pode pegá-lo ou não (papel da política econômica) mas quando passa ladeira abaixo arrasta todos querendo ou não.

Como já afirmamos anteriormente, a economia mundial, com o controle da covid, está entrando em recuperação. O Brasil pode ser arrastado ou não. O lamentável é que com este governo de incompetentes e fanáticos as perspectivas não são muito favoráveis.

A vacinação para e vai aos solavancos, enquanto surge o perigo de uma terceira onda. O desemprego cresce, a inflação aumenta, sobe a taxa de juros Selic para 3,5% ao ano. Estamos novamente diante da estagflação, inexplicável para a quadrilha do Guedes. Só os bancos nadam em grandes lucros, como era previsto. Se as coisas continuarem nesta direção, perderemos mais uma década e o Bolsonaro, ou dá o seu golpe, ou será julgado por um tribunal internacional por crime contra a humanidade, deposto ou não.


[i] Professor Emérito da UFPB e Vice-Coordenador do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira; nelsonrr39@hotmail.com; (www.progeb.blogspot.com). Colaboraram os pesquisadores: Ingrid Trindade, Guilherme de Paula e Daniella Alves.

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quinta-feira, 6 de maio de 2021

A conta precisa ser cobrada...

Semana de 26 de abril a 02 de maio de 2021

 

Lucas Milanez de Lima Almeida [i]

 

Começou a CPI da Covid-19. As primeiras notícias mostram que o Presidente Jair Bolsonaro, de fato, foi apresentado a um relatório que dimensionava o tamanho da pandemia. O cenário previsto, contudo, era bem menos trágico do que o vivido hoje no Brasil. Talvez porque o então Ministro da Saúde, Henrique Mandetta, botasse fé na adoção de alguma medida decente pelo governo. Agora vemos que isso não aconteceu.

Semana passada atingimos a inacreditável marca de 400 mil mortos (número inestimável mesmo para os mais pessimistas no início da pandemia). Enquanto isso, patinamos na vacinação. Segundo reportagem do Valor Econômico, estão comprometidas 200 milhões de doses de vacina pelos mais diversos motivos: desde a desconfiança na qualidade do imunizante (caso da Sputnik V) à incapacidade do alto escalão do Governo de manter a língua dentro da boca e de parar de implicar com a China (caso da Coronavac). Mesmo os números de vacinados por dia parecendo altos, ele está aquém do que o nosso SUS é capaz de fazer. Isto, obviamente, é resultado da péssima gestão da crise. Para além de não aproveitar as ofertas de vacinas no ano passado, o governo brasileiro se opôs à quebra de patentes das vacinas contra Covid-19. A disputa está na OMC e se dá entre países avançados e países atrasados. Mas, essa posição do governo Bolsonaro se repete internamente.

O Senado aprovou um projeto que permitirá a quebra momentânea das patentes de alguns medicamentos, vacinas e exames ligados à Covid-19. No texto está previsto o estabelecimento de acordos com as empresas proprietárias da patente, de forma que elas sejam remuneradas de alguma forma. Mesmo no caso onde não haja acordo e a quebra seja compulsória (unilateral pelo Brasil), mesmo assim a empresa seria ressarcida. Pois bem, a liderança do governo no Senado foi contra. O projeto foi aprovado com 55 votos a favor e 19 contrários. Agora ele segue para a Câmara dos Deputados.

Essa atitude do Governo Federal perante o novo coronavírus, claro, piora uma situação que já é crítica. Segundo uma pesquisa da consultoria IDados, a pandemia elevou para cerca de 30% o total de jovens entre 15 e 29 anos que nem estudam e nem trabalham os chamados “nem-nem”, em 2020. No fim do ano, pelos dados da PNAD Contínua, o percentual fechou em 25,5%. Em 2014 esse número era de 20,8%. Para piorar, apesar das mortes continuarem sendo maiores na faixa etária acima de 60 anos, cresceu 224% o número de mortes de jovens entre 20 e 39 anos, no período entre fevereiro e março.

Outra coisa que não colabora é a pífia ajuda emergencial que entrou em vigor em 2021. No ano passado foram dados R$ 600 por alguns meses para 67 milhões de pessoas. Agora, em 2021, será pago um auxílio entre R$ 150 e R$ 375 para 45,6 milhões de brasileiros. Por isso mesmo, o valor está longe de contribuir de forma contundente para o combate à desigualdade de renda no país. Segundo estudo realizado na USP, o total de brasileiros na pobreza deve subir 42%, em 2021. São mais 18 milhões de pessoas que se juntam aos 43 milhões do ano passado. Dessa soma que totaliza 61 milhões, a estimativa é de que 19,3 milhões estejam na extrema pobreza.

Enquanto isso, as perspectivas para os Bancos são as mil maravilhas. Os que já divulgaram seus resultados confirmam: os grandes bancos tiveram um forte aumento em seus lucros no primeiro trimestre de 2021. Há quem diga que, somados, os lucros dos bancos chegarão ao patamar pré-crise, de R$ 120 bilhões. Isso apesar de 16,3 milhões de brasileiros não terem conta bancária e outros 17,7 milhões terem conta, mas movimentá-las pouco.

Temos insistido nas nossas análises que os fatos têm revelado a incompetente gestão da pandemia. Contudo, o discurso também mostra que isso não é apenas incompetência, mas um tipo de política. Do tipo que a morte da população é bem-vinda. Afinal, as pessoas querem viver demais, né Paulo Guedes!? Com certeza o filho de qualquer porteiro teria mais dignidade do que você, imbecil!


[i] Professor do Departamento de Economia da UFPB e Coordenador do PROGEB – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com; lucasmilanez@hotmail.com). Colaboraram os pesquisadores: Ingrid Trindade, Guilherme de Paula e Daniella Alves.

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