Semana de 17 a 23 de janeiro de 2022
Lucas Milanez de Lima
Almeida [i]
Há
algum tempo que está ocorrendo um debate entre economistas das mais diversas
linhas sobre a eficácia da taxa de juros (principal instrumento da política
monetária) no combate à inflação. Vejamos do que se trata.
Para
começar, é preciso ter em mente que a inflação é o principal elemento que faz
os Bancos Centrais mexerem nos juros. A excessiva variação nos preços é (quase)
sempre respondida com variação nos juros. Se aumenta um, o BC aumenta o outro.
A prova disto é que, no ano passado, a inflação oficial foi de 10,06% (o máximo
deveria ter sido de 5,25%). Como resposta, a Selic saiu de 2% e foi para 9,25%
em dezembro de 2021. É isto que está sendo motivo de debate entre os
economistas.
A
controvérsia está no fato de que a taxa de juros teria pouca (quase nenhuma,
para ser mais preciso) influência sobre as causas da inflação. Isto é
confirmado pela carta enviada pelo presidente do BC ao presidente do Conselho
Monetário Nacional, justificando o estouro da meta oficial estabelecida por
este órgão. Nela, são apontadas como causas principais do aumento dos preços: a
elevação do preço das commodities, o encarecimento da energia elétrica devido à
escassez hídrica e as perturbações nas cadeias produtivas globais causadas pela
pandemia.
Na
carta, alguns pontos são detalhados. Como fator externo, foi estimado que 69%
do excesso de inflação registrado em 2021 foi “importado”. 1) Através do
aumento dos preços internacionais do petróleo e seu repasse para os brasileiros
por meio do programa de preços executado desde Michel Temer até hoje praticado
na Petrobrás. Isto contribuiu com 2,95 pontos percentuais para os preços
superarem a meta do IPCA. De longe, foi o que mais contribuiu. 2) Por meio do
aumento do preço das demais commodities, que, ficando mais caras lá fora, ficam
mais caras aqui dentro (afinal, para se equiparar às exportações, as vendas
internas precisam render mais e por isso os preços aqui precisam subir). Isto
contribuiu com 0,71pp no desvio da meta. 3) Através da taxa de câmbio, que
contribuiu com apenas 0,44pp no desvio da meta.
Como
fatores internos, contribuíram para o estouro da meta: a bandeira tarifária de
energia elétrica (0,67pp), as expectativas do mercado (0,25pp) e os demais
fatores (1,02pp). Além desses, dois componentes foram estimados: a herança do
aumento dos preços de 2020 sobre os preços de 2021, chamada de inércia
inflacionária (1,21pp) e a débil atividade econômica de 2021, que contribuiu
para o estouro ser menor (-1,21pp). Estes dois últimos elementos, portanto, se
anularam.
Esse é
o contexto do debate em torno da seguinte questão: como os juros poderiam ter
ajudado a combater a inflação de 2021? Diretamente, quase nada. Não tem como
reduzir o preço internacional do petróleo com aumento dos juros no Brasil. A
única coisa que poderia baratear o combustível aqui era o abandono da política
de preços antinacionalista imposta à Petrobrás. E as demais commodities?
Políticas de abastecimento, que existiram antes do Governo Bolsonaro,
amenizariam e muito o problema. Já os juros do Brasil, poderiam reorganizar as
cadeias produtiva globais? Não. E fazer chover, os juros podem?
Mas,
afinal, a quem interessa a taxa básica de juros ser tão elevada? De uma forma
simplificada, a explicação é a seguinte: para quem tem dinheiro aplicado e vê
seu poder de compra cair 10% com a inflação, aumentar os juros de 2% para 9,25%
é reduzir suas perdas de 8% para 0,75%. Agora, imagine uma situação em que
todas as aplicações rendem menos do que a inflação? Isto foi o que ocorreu em
2021. Apenas o Bitcoin apresentou rentabilidade maior ao IPCA. Bolsa, renda
fixa, dólar, ouro etc., a especulação com todos eles rendeu menos.
Com isto vemos que Banco Central independente está cumprindo muito bem seu papel essencial: utilizar os instrumentos disponíveis para garantir a rentabilidade dos seus.
[i] Professor
do Departamento de Relações Internacionais da UFPB e Coordenador do PROGEB –
Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com; lucasmilanez@hotmail.com).
Colaboraram os pesquisadores: Alan Gomes, Guilherme de Paula e Roberto Lucas.