quinta-feira, 28 de julho de 2022

Eleições 2022 e a atual janela de oportunidade

Semana de 18 a 24 de julho de 2022

 

Lucas Milanez de Lima Almeida [i]

 

De uma forma geral, chamamos de janela de oportunidades o período em que há uma real possibilidade de ocorrer transformações em cenários já estabelecidos. Isto significa que é possível (e mais provável do que o normal) haver mudanças no “estado das coisas”. No âmbito econômico, a economia mundial está a abrir uma dessas janelas.

Não é novidade que a pandemia de Covid-19 e, mais recentemente, a Guerra da Ucrânia têm mostrado as limitações das cadeias produtivas globais (CGV). Nesta atual forma de organização da divisão internacional do trabalho, o processo produtivo da maioria dos produtos industrializados está fragmentado e distribuído em diversas partes do planeta. E este é o cerne do problema: as perturbações em determinadas regiões atingem intensamente quase todo o mundo.

O contexto por trás disto é o fato de que, ao longo do século XX, os países de industrialização avançada passaram a exportar não só produtos (como sempre fizeram), mas também suas empresas (filiais ou subsidiárias). Com isto, intensificaram sua produção em territórios estrangeiros. Nas economias centrais, isto resultou em um adensamento da estrutura produtiva já existente (com forte presença de capitais nacionais). Nas economias periféricas, surgiram locais de densa industrialização (liderada pelo capital estrangeiro, mas aproveitada pelo capital nacional). Como característica comum aos dois casos, as regiões industriais reuniam tanto as empresas principais, quanto seus fornecedores. Ou seja, o resultado era o aglomerado de empresas líderes e seguidoras em um mesmo espaço geográfico, construído pelas necessidades da produção industrial.

Isto mudou entre o fim do século passado e início do atual. Ao invés de se formarem grandes estruturas industriais, que reuniam vários fornecedores na mesma localidade, as multinacionais passaram a fragmentar seu processo produtivo e instalar as partes deste processo onde lhes fosse mais vantajoso. Assim, surgiram as chamadas cadeias produtivas globais ou, para os íntimos, as CGV.

É nesse contexto que surgem, nas últimas décadas do século XX, os Tigres Asiáticos (os velhos e os novos). Junto com a China e a Índia, eles passaram a participar de maneira mais efetiva da exportação mundial de produtos manufaturados. E não se engane, dentre esses manufaturados estão aqueles de média e alta intensidade tecnológica: de bens de consumo (como televisores, geladeiras e smartphones), a insumos (como condutores e semicondutores) e bens de capital (máquinas e equipamentos). Então, a pergunta que fica é: como os países asiáticos conseguiram dar este salto e nós, brasileiros, ficamos para trás nas cadeias globais de valor?

Como a realidade é complexa, há um conjunto de respostas para esta pergunta: o interesse geopolítico dos EUA na região (que era próxima da Rússia e da China comunistas – afinal, estamos falando da época da Guerra Fria); a precariedade do mercado de trabalho (que tornava a mão de obra mais barata); e o papel que os Estados exerceram sobre a economia (criando políticas industriais orientadas para a inserção nas CGV dos setores industriais de ponta).

Como já foi levantado anteriormente na presente coluna, economistas, políticos e, principalmente, empresários já estão falando de um processo de “desglobalização”, no qual as frações e partes importantes das cadeias produtivas serão realocadas. Três seriam as possibilidades: o retorno da produção aos países de origem (termo em inglês, reshoring); a produção onde o produto será consumido (onshoring); ou a produção em outros países mais próximos (nearshoring).

É nesta última opção que surge a janela de oportunidade: o Brasil poderia atrair uma parte da produção agora executada na longínqua Ásia! Mas, o que seria possível fazer, a partir do exemplo deles? Dentre os três fatores apontados anteriormente, o que o Brasil poderia melhorar, hoje, seria a atuação estatal. O problema é que nosso dirigente máximo está dedicado a imprimir os votos de outubro, se houver eleições.


[i] Professor do DRI/UFPB e do PPGRI/UEPB e Coordenador do PROGEB. (@progebufpb, www.progeb.blogspot.com; lucasmilanez@hotmail.com). Colaboraram os pesquisadores: Guilherme de Paula, Mariana Tavares e Nertan Gonçalves.

 

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quinta-feira, 21 de julho de 2022

O jagunço é o gatilho dos covardes

Semana de 11 a 17 de julho de 2022

 

Nelson Rosas Ribeiro[i]

           

O país continua a viver sob o impacto da PEC das bondades ou Pec do fim do mundo, a que já nos referimos em outras análises. Desesperado com os resultados das pesquisas o presidente, orientado pelas raposas do Centrão, resolveu apelar para as ações eleitoreiras mais descaradas. Não bastou o orçamento secreto, as emendas do relator e todas as transferências irregulares feitas através das estatais entregues ao centrão. O governo comprou o congresso e as tais legendas de aluguel e partidos que formam o lixão que é sua base de apoio. Ainda foi pouco. Não conseguiu virar o jogo. Surgiu então a ideia genial da PEC das bondades para distribuir diretamente dinheiro aos eleitores pertencentes às camadas mais empobrecidas da população. Isto foi feito no desespero, às vésperas das eleições, violando leis e a própria constituição. Não há previsão orçamentária e o rombo no orçamento vai aumentar. Como já referimos, a jogada surpreendeu mesmo a oposição que foi obrigada a aprovar tudo. Quem poderia se opor a concessão de auxílio aos mais pobres e necessitados?

Agindo para virar o jogo e reverter as más avaliações apontadas nas pesquisas, Bolsonaro não abandonou sua antiga estratégia. Continuou a proferir ofensas contra as instituições e pregar o golpe. Desta vez foi mais longe. Convocou o corpo diplomático acreditado no país para uma reunião. Violando todos os protocolos a reunião foi realizada no palácio presidencial, com o comparecimento de alguns ministros como os generais Paulo Sérgio Nogueira (Defesa), Luiz Eduardo Ramos (Secretaria Geral), Augusto Heleno (GSI), além de Carlos França (Relações Exteriores) e Ciro Nogueira (Casa Civil). Na reunião o presidente desferiu vários ataques ao processo eleitoral e às urnas eletrônicas, repetindo mentiras que ele já proferiu em outras ocasiões e foram rebatidas. Fez também ataques diretos a alguns ministros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e do Supremo Tribunal Federal (STF) e aos próprios tribunais. O escândalo foi internacional e estamos vivendo agora o resultado e as repercussões das declarações a nível nacional e internacional que deverão continuar nos próximos dias.

Logo depois, em um ato religioso em que participou em Fortaleza, voltou a pregação direta do golpe e mesmo da suspensão das eleições. O tenente insubordinado, expulso do exército por tentar colocar bombas nos quarteis e cometer outros crimes, considerado insano, agora cobra o preço de ter sido guindado à presidente com o apoio dos militares, dos empresários, dos políticos e de amplas camadas reacionárias da população tocadas pelo sentimento antipetista. E sempre acenando com o apoio das forças armadas.

O resultado da histeria estimulada pelo Bolsonaro e sua família já começa a dar seus resultados. Além dos atentados às reuniões e passeatas do Lula, temos os dois assassinatos no Amazonas e agora o assassinato no Paraná. A lentidão da apuração e punição dos autores destes atentados pode agravar muito a situação e contaminar o processo eleitoral. E não custa relembrar que este foi o caminho para a instalação dos regimes fascistas no mundo. Eis a ameaça que paira sobre nós.

As reações que está se esboçando no país e no exterior estão encurralando cada vez mais o presidente o que o torna ainda mais perigoso. Seu destempero está aumentando e sua ação parece querer provocar um desfecho violento para obrigar as instituições e a população a um confronto para o qual ele se vem preparando com a criação de seu exército particular bem armado. Não tem sido por acaso todas as medidas que têm sido tomadas para promover a compra de armas pelos seus partidários, além da corte que vem fazendo às forças armadas, particularmente às forças policiais. Diante da corrupção nos partidos políticos que se reflete no parlamento e da passividade das organizações operárias e populares, caminhamos perigosamente para depender do comportamento dos militares para a manutenção da democracia no país. Esperamos que mais uma vez eles não se prestem ao papel de “capitães do mato”, de jagunços na execução do trabalho sujo de reprimir o povo em defesa dos interesses de uma burguesia reacionária e atrasada.


[i] Professor Emérito da UFPB e Vice Coordenador do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira; nelsonrr39@hotmail.com; (www.progeb.blogspot.com). Colaboraram os pesquisadores: Guilherme de Paula, Mariana Araújo e Nertan Alves.

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quinta-feira, 14 de julho de 2022

A fascistização do Brasil e o golpe em curso

Semana de 04 a 10 de julho de 2022

 

Lucas Milanez de Lima Almeida [i]

 

Caro leitor. Não poderia começar a presente coluna sem falar do ocorrido no último final de semana, quando um bolsonarista invadiu uma festa e assassinou um dirigente petista, o aniversariante que fizera 50 anos. Ao que tudo indica, eles nem se conheciam. As imagens até agora divulgadas mostram o nível de estupidez ao qual chegou uma parte não desprezível dos adeptos do presidente Jair Messias Bolsonaro.

Na semana que se encerrou naquele fatídico sábado, correligionários do Partido dos Trabalhadores já haviam sido alvo de bolsominions ensandecidos (desculpe o pleonasmo). Um artefato caseiro, feito com garrafa pet, bomba junina e fezes, foi lançado contra um evento petista na Cinelândia, RJ. Lá, pouco tempo depois, discursou o pré-candidato à presidência pelo PT, Luiz Inácio Lula da Silva. Em junho, em evento em Minas Gerais, petistas já haviam sido alvo de drones, que despejaram “líquidos malcheirosos” sobre o público de outro evento que esperava a presença de Lula.

Por sua vez, nem é preciso dizer o quanto as falas públicas de Bolsonaro sugerem aos seus que coisas do tipo sejam feitas. A mais famosa foi em 2018 em Rio Branco (AC), quando, em cima de um trio elétrico e segurando um objeto em alusão a uma arma, gritou: “vamos fuzilar a petralhada aqui do Acre”. Não é raro ele soltar, em suas lives, algo do tipo: vocês sabem o que tem que fazer.

Desde o início do mandato, em 2019, Bolsonaro tem atacado as instituições que ele não pode controlar diretamente, mas que podem interferir em seu dinástico plano de poder. Foi assim com o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal. No caso do primeiro, após perceber que não tinha força suficiente para suplantá-lo, resolveu a ele se aliar. É nesse contexto que se explica a guinada política (tanto de Bolsonaro quanto dos militares que o apoiam) que resultou no Orçamento Secreto. Este nada mais é do que a forma (contraditória) que o ocupante da cadeira do Planalto encontrou para manter-se no poder: entregar parte do poder ao Congresso, via orçamento, e manter-se na cadeira acenando com as bandeiras que levanta. Quais sejam: por um lado, a bandeira da moral e dos (maus) costumes, satisfazendo a “ala pobre” do bolsonarismo; por outro, a bandeira das reformas neoliberais, satisfazendo a “ala rica”.

Com isso, criou-se a barreira necessária para impedir qualquer ação vinda do judiciário que buscasse derrubar o presidente, pois o impeachment precisa ser aprovado na Câmara e no Senado, como ocorreu recentemente com Dilma Rousseff.

No caso do STF, a coisa foi diferente. Sem um orçamento para comprá-lo, o presidente só conseguiu infiltrar dois dos seus lá dentro, devido a duas aposentadorias ocorridas desde 2019. Como o Congresso se tornou seu colete salva-vidas, então Bolsonaro foi à carga sobre o Supremo. Com isso, passou três anos desgastando tanto a instituição, quanto alguns de seus membros. Atualmente, não é equívoco afirmar que o STF está sem forças para recolocar o arcabouço institucional de volta nos trilhos. Para completar, agora em conjunto com os militares, Bolsonaro passou a atacar não só as urnas, mas o próprio Tribunal Superior Eleitoral e as eleições de 2014 e 2018. Assim, novamente, desgasta a instituição responsável por gerir sua provável derrota nas eleições de outubro e, tal qual fez com o Congresso e está fazendo com o STF, busca dar um xeque-mate na instituição para se manter no poder.

Por fim, ilustrando como as principais instituições são depredadas em meio à fascistização em que vivemos, Bolsonaro insinuou que o estuprador anestesista preso em flagrante no fim de semana tenha sido produto de uma “ideologia” imposta no ambiente universitário em que se formou.

É um crime em cima do outro. Porém, as instituições nada fazem. E quando elas nada fazem, quem faz é a população. O problema é que quem está se mobilizando está armado, seja civil ou militar, e tem um norte claro: a eliminação do outro, do diferente, do inimigo. Assim surgiu o fascismo na Europa. Será o caso do Brasil?


[i] Professor do Departamento de Relações Internacionais da UFPB e Coordenador do PROGEB – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com; lucasmilanez@hotmail.com). Colaboraram os pesquisadores: Guilherme de Paula, Mariana Tavares e Nertan Gonçalves.

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quinta-feira, 7 de julho de 2022

A farra eleitoreira acabou a austeridade fiscal?

Semana de 27 de junho a 03 de julho de 2022

 

Nelson Rosas Ribeiro[i]

           

O crime foi consumado. A equipe do governo emparedou a oposição. Só pode ter sido obra das velhas raposas do centrão Lira, Pacheco, Nogueira et alii. A PEC dos combustíveis, que virou a PEC do fim do mundo, foi aprovada quase por unanimidade, ou seja, a oposição foi obrigada a aprovar as medidas propostas apesar de violarem a legislação e a Constituição. Quem se atreveria a votar contra medidas que favorecem os pobres? Com isto estourou-se definitivamente o “teto dos gastos”, acabou a austeridade fiscal (plataforma do Guedes), o orçamento, e foram violadas várias leis e a própria Constituição. Novos gastos foram aprovados sem previsão orçamentária, foram criados benefícios em período eleitoral e tudo feito pelo Congresso, deixando o Presidente fora da autoria dos crimes, protegido inclusive pela Advocacia Geral da União (AGU).

Mas, por que todo este açodamento?

As eleições vêm aí, as pesquisas mostram a derrota do Bolsonaro, talvez mesmo no primeiro turno, e a situação econômica é desastrosa. Alguns dados ajudam a entender o problema.

No país há 97,516 milhões de pessoas ocupadas, das quais apenas 35,57 milhões em empregos formais. Os informais somam 39,129 milhões. A taxa de informalidade é de 40,1% dos ocupados. Os desempregados somam 10,631 milhões aos quais se devem acrescentar 4,3 milhões de desalentados (os desempregados que não mais procuram emprego). Além disso 25,401 milhões, ou seja, 21,8% da força de trabalho é subutilizada. Se os trabalhadores formais já recebem baixos salários a situação dos restantes é ainda pior. A Fundação Getúlio Vargas (FGV) Social calculou que a pobreza supera os 40% da população em 14 dos 27 estados da União. Em 2021 atingiu 62,9 milhões de pessoas representando 29,6% do total. O governo, no entanto, comemora a criação de 1,05 milhão de empregos, no acumulado do ano, até maio. Mesmo assim o quadro apresentado é a realidade e o rendimento médio dos trabalhadores não cresceu o que mostra que os empregos criados foram de baixa qualidade.

Temos de acrescentar a inflação fora do controle pois o próprio BC jogou a toalha: não tem mais meta a atingir até 2024.

O que pode fazer Bolsonaro para ganhar a eleição, além de tocar o terror proferindo as costumeiras ameaças de golpe?

Eis a razão das ações desesperadas que estão sendo implementadas.

Para conter a inflação visando frear o aumento dos combustíveis, tenta-se a redução dos impostos o que implica em renúncia fiscal. É o caso dos impostos federais e do ICMS que atingiu a receita dos Estados com consequências para o financiamento da educação e saúde criando um litígio com os governadores. A perda da receita é estimada por eles entre R$ 105 e 136 bilhões, cerca de 10% da arrecadação. A renúncia dos impostos federais aumenta o rombo do orçamento. Mas, além disso, a PEC do fim do mudo criou novas despesas. O Auxílio Brasil aumentou de R$400 para R$600 sendo estendido a mais 1,6 milhões de famílias (R$ 26 bilhões). O vale gás foi duplicado sendo pago a cada 2 meses (R$ 1,05 bilhões). Foi criado um voucher para os caminhoneiros com o pagamento de R$ 1.000 mensais (R$ 5,4 milhões). Para o transporte gratuito de idosos reservou-se R$ 2,5 bilhões. Calcula-se o somatório de todas estas bondades em R$38,75 bilhões. É preciso considerar que antes deste pacote o governo já se havia comprometido com a antecipação do 13º (R$ 34,6 bilhões), liberação do FGTS (R$ 30 bilhões), além das renúncias fiscais com os cortes de 35% do IPI (R$ 7,6 bilhões de renúncia), PIS/COFINS (R$ 17,6 bilhões) e o ICMS cuja uma renúncia é estimada em R$ 50 a R$ 65 bilhões.

Há um outro aspecto a considerar. Todas estas benesses, que visam comprar os votos dos mais pobres, representam uma injeção de cerca de R$300 bilhões na economia, ou seja, 3,3% do PIB, que certamente funcionarão como estímulo. Eis como o sinistro Paulo Gudes, fanático liberal, por interesses eleitoreiros, a serviço do seu senhor, trai sua proporia ideologia. Quanto cobrará por isso?


[i] Professor Emérito da UFPB e Vice Coordenador do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira; nelsonrr39@hotmail.com; (www.progeb.blogspot.com). Colaboraram os pesquisadores: Guilherme de Paula, Mariana Araújo, Nertan Alves e Ana Isadora Meneguetti.

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