quinta-feira, 14 de julho de 2022

A fascistização do Brasil e o golpe em curso

Semana de 04 a 10 de julho de 2022

 

Lucas Milanez de Lima Almeida [i]

 

Caro leitor. Não poderia começar a presente coluna sem falar do ocorrido no último final de semana, quando um bolsonarista invadiu uma festa e assassinou um dirigente petista, o aniversariante que fizera 50 anos. Ao que tudo indica, eles nem se conheciam. As imagens até agora divulgadas mostram o nível de estupidez ao qual chegou uma parte não desprezível dos adeptos do presidente Jair Messias Bolsonaro.

Na semana que se encerrou naquele fatídico sábado, correligionários do Partido dos Trabalhadores já haviam sido alvo de bolsominions ensandecidos (desculpe o pleonasmo). Um artefato caseiro, feito com garrafa pet, bomba junina e fezes, foi lançado contra um evento petista na Cinelândia, RJ. Lá, pouco tempo depois, discursou o pré-candidato à presidência pelo PT, Luiz Inácio Lula da Silva. Em junho, em evento em Minas Gerais, petistas já haviam sido alvo de drones, que despejaram “líquidos malcheirosos” sobre o público de outro evento que esperava a presença de Lula.

Por sua vez, nem é preciso dizer o quanto as falas públicas de Bolsonaro sugerem aos seus que coisas do tipo sejam feitas. A mais famosa foi em 2018 em Rio Branco (AC), quando, em cima de um trio elétrico e segurando um objeto em alusão a uma arma, gritou: “vamos fuzilar a petralhada aqui do Acre”. Não é raro ele soltar, em suas lives, algo do tipo: vocês sabem o que tem que fazer.

Desde o início do mandato, em 2019, Bolsonaro tem atacado as instituições que ele não pode controlar diretamente, mas que podem interferir em seu dinástico plano de poder. Foi assim com o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal. No caso do primeiro, após perceber que não tinha força suficiente para suplantá-lo, resolveu a ele se aliar. É nesse contexto que se explica a guinada política (tanto de Bolsonaro quanto dos militares que o apoiam) que resultou no Orçamento Secreto. Este nada mais é do que a forma (contraditória) que o ocupante da cadeira do Planalto encontrou para manter-se no poder: entregar parte do poder ao Congresso, via orçamento, e manter-se na cadeira acenando com as bandeiras que levanta. Quais sejam: por um lado, a bandeira da moral e dos (maus) costumes, satisfazendo a “ala pobre” do bolsonarismo; por outro, a bandeira das reformas neoliberais, satisfazendo a “ala rica”.

Com isso, criou-se a barreira necessária para impedir qualquer ação vinda do judiciário que buscasse derrubar o presidente, pois o impeachment precisa ser aprovado na Câmara e no Senado, como ocorreu recentemente com Dilma Rousseff.

No caso do STF, a coisa foi diferente. Sem um orçamento para comprá-lo, o presidente só conseguiu infiltrar dois dos seus lá dentro, devido a duas aposentadorias ocorridas desde 2019. Como o Congresso se tornou seu colete salva-vidas, então Bolsonaro foi à carga sobre o Supremo. Com isso, passou três anos desgastando tanto a instituição, quanto alguns de seus membros. Atualmente, não é equívoco afirmar que o STF está sem forças para recolocar o arcabouço institucional de volta nos trilhos. Para completar, agora em conjunto com os militares, Bolsonaro passou a atacar não só as urnas, mas o próprio Tribunal Superior Eleitoral e as eleições de 2014 e 2018. Assim, novamente, desgasta a instituição responsável por gerir sua provável derrota nas eleições de outubro e, tal qual fez com o Congresso e está fazendo com o STF, busca dar um xeque-mate na instituição para se manter no poder.

Por fim, ilustrando como as principais instituições são depredadas em meio à fascistização em que vivemos, Bolsonaro insinuou que o estuprador anestesista preso em flagrante no fim de semana tenha sido produto de uma “ideologia” imposta no ambiente universitário em que se formou.

É um crime em cima do outro. Porém, as instituições nada fazem. E quando elas nada fazem, quem faz é a população. O problema é que quem está se mobilizando está armado, seja civil ou militar, e tem um norte claro: a eliminação do outro, do diferente, do inimigo. Assim surgiu o fascismo na Europa. Será o caso do Brasil?


[i] Professor do Departamento de Relações Internacionais da UFPB e Coordenador do PROGEB – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com; lucasmilanez@hotmail.com). Colaboraram os pesquisadores: Guilherme de Paula, Mariana Tavares e Nertan Gonçalves.

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