terça-feira, 9 de abril de 2024

A economia decola, mas cuidado com o voo de galinha...

Semana de 01 a 07 de abril de 2024

 

Lucas Milanez de Lima Almeida [i]

 

Como sabem nossos leitores mais assíduos, as economias capitalistas se desenvolvem alternando entre momentos de maior e menor crescimento. A esse movimento periódico e regular chamamos de ciclo econômico, cujas fases são quatro: crise, depressão, reanimação e auge.

Os nomes já sugerem o que ocorre em cada fase. A crise é o momento em que      a economia como um todo desacelera, interrompendo-se um forte crescimento generalizado. Em seguida, na depressão, a economia fica quase estagnada e o crescimento atinge os níveis mais baixos (podendo até decrescer). Em seguida, a economia decola, o desemprego se reduz, as compras aumentam, o crédito retoma sua força, o consumo se eleva, etc. Essa é a fase de reanimação do ciclo. Por fim, vem a fase de auge, onde a euforia geral leva o crescimento ao seu nível máximo, preparando o terreno para outra crise.

Em sintonia com o texto da semana passada, a análise de hoje vai argumentar que a economia brasileira está em reanimação. Contudo, há um fator limitante a essa recuperação e que vai reduzir o auge que o país poderia alcançar: a desindustrialização.

A primeira boa notícia vem do mercado de força de trabalho. Semana passada já vimos que o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados registrou, em fevereiro de 2024, um saldo positivo de 306 mil admissões de trabalhadores. Este aumento nas contratações foi espalhado por todos os setores da economia: indústria, agricultura, serviços, comércio e construção civil. Além disso, a PNAD Contínua mostrou que, no trimestre encerrado em fevereiro de 2024, o rendimento médio habitual do brasileiro cresceu 4,3%, em relação ao mesmo período do ano passado. Por fim, os dados do IBGE mostram que o nível de subutilização da mão de obra caiu para 17,8% do total da força de trabalho brasileira (em 2021 era de 29,3%).

A segunda boa notícia vem dos empréstimos. Na semana passada, o Banco Central elevou a estimativa de crescimento no crédito livre às pessoas físicas, que deve subir 10% esse ano, em relação ao ano passado. O motivo é a aceleração da concessão de empréstimos às famílias. Em janeiro de 2024, segundo estudos da PicPay, a parte do crédito que está ligada ao consumo (financiamento de bens, cartão de crédito, etc.) subiu 14,4%, enquanto aqueles ligados às dívidas (cheque especial, rotativo, não consignado, etc.) subiu 7,1%. Além disso, o mesmo estudo mostra que, apesar de ainda elevada, a inadimplência das famílias brasileiras tem caído intensamente. Isto se associa, por um lado, ao aumento da renda e, por outro, à redução da Selic, que ajudou a baixar os juros.

Na indústria, um setor tem se destacado: o automobilístico. No total, foram anunciados investimentos de R$ 106,85 bilhões para os próximos anos no Brasil. Por isso, de acordo com o Sindicato Nacional da Indústria de Componentes, o setor de autopeças vai investir mais de R$ 6 bi já em 2024. Isso deve criar mais de 5 mil novos empregos diretos. Ainda na indústria, segundo a FGV, este foi o setor que mais contribuiu com o Indicador Antecedente do Emprego de março passado, que aumentou em relação a fevereiro. Por fim, em termos de produção, tanto a indústria de bens intermediários (1,5%), quanto as de bens de consumo duráveis (1,0%) e não duráveis (2,2%), apresentaram crescimento nos últimos 12 meses encerrados em fevereiro de 2024.

Porém, e aí está o grande problema, o índice médio da produção brasileira de bens de capital dos últimos 12 meses (março de 2023 a fevereiro de 2024) está 9,5% abaixo do observado nos 12 meses anteriores (março de 2022 a fevereiro de 2023). Por sua vez, nessa mesma comparação, o índice médio da quantidade importada de bens de consumo subiu 1,4%, o de bens de capital subiu 3,2% e o de bens intermediários subiu 11,4%.

Esses dados mostram que, caso a indústria brasileira não entre de vez e de forma generalizada na reanimação do crescimento econômico, essa decolagem tem tudo para ser um voo de galinha: sai do chão, mas não vai tão longe. Isto porque nossa indústria perdeu capacidade de fomentar o nosso próprio crescimento (interno). Com isso, cada vez mais os estímulos da nossa demanda local por bens industriais têm sido transferidos para fora do país, via importações.

Para mudar isso, é preciso iniciar imediatamente os investimentos/financiamentos públicos em infraestrutura pesada, como portos, rodovias e energia. Além disso, conduzir de forma bem articulada uma política industrial que renove o parque produtivo brasileiro. A missão é essa e o governo sabe disso. Mas, colocar em prática é que é o busílis.


[i] Professor do DRI/UFPB, do PPGCPRI/UFPB e do PPGRI/UEPB; Coordenador do PROGEB. (@progebufpb, www.progeb.blogspot.com; @almeidalmilanez; lucasmilanez@hotmail.com). Colaboraram: Maria Fernanda Vieira, Guilherme de Paula, Lara Souza, Valentine de Moura, Gustavo Figueiredo e Paola Arruda.

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Um comentário:

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