quinta-feira, 3 de outubro de 2024

AFINAL, OS CULPADOS SOMOS NÓS?

Semana de 23 a 29 de setembro de 2024

 

Paola Teotônio Cavalcanti de Arruda[i]

           

Se o leitor tem acompanhado as análises das últimas semanas, viu que a economia brasileira registrou uma série de indicadores positivos. O PIB teve um crescimento acima das expectativas no segundo trimestre, aumentando 1,4% em relação ao trimestre anterior, e 3,3%, se comparado ao mesmo período do ano passado. A arrecadação federal também teve um aumento real de 9,5% de janeiro a agosto e tanto o consumo quanto os investimentos apresentaram crescimento.

Apesar dos sinais positivos que temos ressaltado quase que semanalmente em nossas análises, persistem ressalvas e temores com relação ao famigerado “risco fiscal”, geralmente relacionadas ao crescimento acima do potencial e à inflação. Esse grande “temor” é utilizado para embasar a política monetária do Banco Central, de aumento da taxa de juros, ao passo que as boas notícias econômicas são frequentemente transformadas em problemas.

Independentemente dos bons resultados alcançados neste ano de 2024, comprovados, inclusive, pelos números, a resposta parece sempre a mesma: elevar os juros. Está claro que a teoria econômica dominante não tem explicado adequadamente a realidade brasileira, principalmente quando trata o aumento da Selic como um remédio milagroso, capaz de resolver todos os problemas do país. Além de não explicar a realidade, os economistas ortodoxos escondem da população a real intenção de tais medidas: assegurar a rentabilidade do capital financeiro, especialmente o ligado à dívida pública, que lucra sem sequer contribuir para a geração de empregos e renda. Fica nítido o poder que os donos de “ativos” exercem sobre os rumos da economia, a fim de garantir a manutenção de seus ganhos como rentistas. 

Enquanto isso, sofre o povo brasileiro. Já se fala em uma nova reforma da previdência, com menos direitos e garantias para a população. A culpa de todos os males da sociedade é, claramente, de Dona Maria, que, com 90 anos e depois de criar 12 filhos, vive às custas de uma aposentadoria que não lhe permite nem o suficiente para bancar seus remédios. Tenho certeza, caro leitor, que esse discurso já chegou, em algum momento, a seus ouvidos. O que quase nunca se menciona, no entanto, é que cada aumento de um ponto percentual na taxa Selic custa R$ 30 bilhões por ano aos cofres públicos. O país não cresce, as despesas sociais são comprimidas, os lucros dos rentistas são garantidos, mas a narrativa insiste em colocar a culpa nos mais vulneráveis, como os idosos que, supostamente, "vivem demais" e comprometem o sistema previdenciário. Parece piada, mas é a realidade do que se divulga na grande mídia.

É nessa conjuntura de ataque aos direitos sociais que se estabelecerão as eleições municipais no próximo domingo. No Brasil, o embate fica muito claro, se analisada a corrida eleitoral paulista. Em meio a cadeiradas e outras agressões, quem mais sofre é a população. E a situação não fica muito para trás, quando outras cidades vêm à tona. Os problemas parecem ser crônicos: superlotação e más condições no transporte público, sucateamento da saúde e da educação públicas, parcerias e aliciamento com o crime. Mas a culpa? É do povo. Não há outra explicação para a elite nacional.

O que vemos é um ciclo repetitivo de culpabilização da população, enquanto os verdadeiros beneficiários dessas políticas permanecem ocultos. O meio político tem perdido credibilidade e, cada vez mais, tem posto em xeque a democracia brasileira. Medidas, mais políticas que econômicas, têm garantido lucros aos detentores de ativos, comprimido investimentos sociais e sacrificado os mais vulneráveis. Por isso, mais do que nunca, é essencial manter firme nosso papel cidadão e ir às urnas. Esse é o primeiro passo para fazer valer nosso direito a uma representação política digna. Certamente, os embates socioeconômicos brasileiros não acabarão no domingo, mas é a partir do voto que podemos vigiar e exigir constantemente a concretização dos nossos direitos. Por isso, votar é o primeiro passo para mudança.


[i] Pesquisadora do PROGEB e Graduanda em Relações Internacionais (UFPB). (paolatc.arruda@gmail.com). Colaboraram: Lara Souza, Ryan Félix, Gustavo e Maria Vitória Freitas.

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