Semana de 13 a 19 de janeiro de 2025
Lucas Milanez de Lima Almeida [i]
“O mundo está mudado”. Essa é uma frase que
temos repetido inúmeras vezes nos últimos tempos. Mas, diferentemente dos seus
avós, que certamente já disseram isso ao caro leitor, nossas análises trazem as
causas reais dessa mudança (que não tem nada a ver com os jovens e a forma como
eles levam a vida). O que mudou e está em constante transformação é a maneira
como o capitalismo se impõe no nosso dia a dia.
Se hoje existem os “tios do zap”, é graças
ao avanço tecnológico alcançado pelo capitalismo. Se hoje os jovens se vestem
igual a um personagem de desenho animado, é graças à globalização capitalista.
Se a estranheza às diferenças está sendo transformada em ódio, também é graças
ao capitalismo. A grande dificuldade da imensa maioria da população é entender
isto.
De fato, encontrar as conexões entre o
nosso cotidiano e as estruturas da sociedade é difícil e requer raciocínios
complexos, que só são alcançados com um grau considerável de reflexão. Ou seja,
infelizmente, pensar o mundo em suas várias dimensões não é uma coisa acessível
para a maior parte da população. Nesse pacote de “limitações” estão elementos
que vão desde as nossas crenças e valores, até chegar à educação formal, dada
pelas escolas e faculdades. Por isso mesmo, frequentemente, parte considerável
da população acredita em soluções simples para problemas complexos (uma máxima
dos economistas).
O discurso de posse de Donald Trump segue
essa linha de raciocínio. Primeiro, mas jamais o faria, ele não ataca o cerne
do problema: o próprio capitalismo. Com a ascensão das tecnologias da
informação e comunicação, bem como com a conformação das cadeias globais de
valor, as potências ocidentais, em especial os EUA, perderam parte do controle
sobre o desenvolvimento capitalista mundial. Dentre as consequências, esses
países vivenciaram a desindustrialização, o empobrecimento da classe
trabalhadora, o aumento das desigualdades e a concentração exacerbada de
riqueza. O descontentamento social gerado por isso, por sua vez, mirou naquilo
que é mais aparente nesse processo: a globalização.
Como temos tratado há algum tempo, a reação
contrária tem sido chamada de desglobalização. Este é um fenômeno que tem um
caráter essencialmente econômico, mas com fortes elementos geopolíticos. O
CHIPS Act e o movimento “Make America Great Again”, por exemplo, são duas faces
dessa mesma moeda. De um lado, o grande capital norte-americano (leia-se: as
big-techs) busca tirar o atraso em relação ao desenvolvimento tecnológico dos
países asiáticos. Do outro, a burguesia interna e a classe trabalhadora sentem
na pele as mudanças atribuídas a deus e o mundo (vide o discurso de Trump). No
meio, a busca por um líder forte, que salve a tudo e a todos...
O problema é que, quando o assunto é a
defesa estatal de interesses econômicos nacionais, ou seja, quando o assunto é
usar o poder público para fins de interesses privados em escala internacional,
a história mostra que o capitalismo não mede qualquer esforço. No século
passado, viu-se a complacência do mundo capitalista com o nazismo, enquanto
este tinha apenas a União Soviética como alvo. Na época, o contexto também era
de um país buscando recuperar as glórias do passado, com inimigos externos e
“traidores” internos. Sob a justificativa do desenvolvimento, a burguesia alemã
patrocinou Hitler sem mais demora.
Como Elon Musk deixou absolutamente
escancarado, o próximo mandato de Donald Trump vai tirar, cada vez mais, o
fascismo do esgoto. Não apenas porque ele precisa manter sua base eleitoral,
mas porque o capitalismo e a hegemonia dos EUA dependem disso. Não podemos
achar que um país beligerante de nascença mude seu modus operandi. O que ainda
não está claro é como a China, a única potência capaz de fazer frente ao
poderio estadunidense, vai atuar no tabuleiro internacional.
Aqui, no Brasil, infelizmente, não temos
muito a fazer, além de continuar seguindo nossa tradição diplomática.
Internamente, a extrema-direita brasileira, que se diz patriota, tende a ter os
EUA como um grande aliado político. Isso preocupa muito no contexto da guerra
de informações em que vivemos, sobretudo porque ano que vem tem eleições
presidenciais. Espero que a mudança na comunicação do governo Lula seja
efetiva, pois, os bons números que a economia tem apresentado não são garantia
de nada. Pelo contrário, é preciso entrar nessa guerra de cabeça. À luta.
[i] Professor (DRI/UFPB; PPGCPRI/UFPB; PPGRI/UEPB) e
Coordenador do PROGEB. (@progebufpb,
www.progeb.blogspot.com; @almeidalmilanez; lucasmilanez@hotmail.com).
Colaboraram: Brenda Tiburtino, Rosângela Palhano, Guilherme de Paula, Gustavo
Figueiredo, Lara Souza e Paola Arruda.
0 comentários:
Postar um comentário