Antonio Carneiro de Almeida Júnior [i]
Ainda não se pode afirmar com certeza se o crescimento de 1% do Produto Interno Bruto, PIB, no primeiro trimestre de 2017, marca o início da recuperação da economia brasileira, que vem sendo dilacerada por grave crise nos últimos anos. Contudo, já começam a se delinear as características dessa recuperação: as bases da retomada não se encontram no mercado interno, mas sim no externo, ou seja, é o resto do mundo que nos vai “tirar do buraco”.
Quando se analisa a contribuição dos setores ao crescimento do PIB trimestral supracitado, é notável a que foi dada pelo setor agrícola, que cresceu 13,4% no mesmo período, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, IBGE. Tal expansão de oferta, contudo, não teve por objetivo atender à demanda interna. Ainda de acordo com o IBGE, o consumo das famílias continua caindo, embora a um ritmo bem mais lento: 0,1% nesse primeiro trimestre. Já não se pode dizer o mesmo com desempenho das exportações: elas aumentaram 4,8% no mesmo período. Neste cenário, a MCM Consultores estima um crescimento de 21,59% do saldo do balanço comercial, em 2017, o que fecharia o ano em US$58 bilhões. Já o saldo da conta corrente, que além da balança comercial, engloba o fluxo de rendas entre Brasil e resto do mundo, deve atingir no final do ano um déficit de US$23,5 bilhões. Estima-se que tal déficit, contudo, seja coberto pelo Investimento Estrangeiro Direto com folga.
Analisando inicialmente apenas a situação da conta corrente, embora a saída de renda do país mais que compense o saldo positivo no balanço comercial, teoricamente, o impacto positivo do setor exportador no PIB é superior ao impacto negativo da fuga de renda, uma vez que o primeiro estimula o investimento, alavancando outros setores da economia, algo que já vem ocorrendo.
O bom desempenho da agricultura se refletiu na indústria, com a venda de máquinas agrícolas alcançando 17.262 unidades nos cinco primeiros meses desse ano, um quantum 28,7% maior que o atingido em igual período de 2016. Não é à toa que o setor automobilístico e o setor de máquinas e equipamentos, a despeito do seu comportamento errático, cresceram, respectivamente, 3,4% e 4,9%, entre março e abril desse ano, constituindo dois dos quatro principais responsáveis pelo crescimento de 0,6% da indústria nesse mesmo período. É oportuno comentar ainda que, com o real bastante desvalorizado frente ao dólar, não apenas a exportação de commodities, mas também a de outros tipos de mercadorias vem experimentando um bom desempenho no presente ano. De janeiro a maio, o setor automobilístico, por exemplo, obteve uma receita de exportações de US$5 bilhões, um crescimento de 57,2% em relação ao mesmo período do ano passado. Caso o ritmo se mantenha, com mais três meses, o setor exportará a quantidade de veículos prevista para todo o ano.
Quando passamos a considerar o ingresso de investimento direito no país, a contribuição dada pelo setor externo torna-se ainda mais clara. Em primeiro lugar, é certo que pelo menos uma pequena parte desses recursos advindos do exterior constituirá um aumento do estoque de capital do país, seja porque de fato serão criados novos empreendimentos, seja porque as empresas destinarão parte dos recursos captados com a venda de ações para investimento. A outra parte, por sua vez, mesmo que se transforme apenas em renda, servirá de contrapeso para o saldo negativo do balanço de rendas. Ou seja, de uma maneira ou de outra, o setor externo estará agindo no sentido de empurrar a recuperação da economia.
Desta forma, frente às medidas restritivas que vem sendo tomadas pelo governo Temer e de outros fatores internos que impedem que mecanismos endógenos provoquem a retomada da economia brasileira, estando esta ligada indissoluvelmente ao movimento cíclico da economia mundial pelo fenômeno que conhecemos como globalização, tal retomada será certamente patrocinada pela poupança externa. Contudo, a entrada de recursos no país pela conta financeira do balanço de pagamentos, ao passo que pode contribuir para a elevação da atividade econômica, tem como contrapartida uma elevação da renda líquida enviada ao exterior em um futuro próximo, seja sob a forma de juros de dívida ou de remessa de lucros, o que perpetua e amplifica a situação de dependência da economia em relação aos países centrais.
[i] Professor Substituto do Departamento de Relações Internacionais da UFPB e pesquisador do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com).
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