Semana de 12 a 18 de outubro de 2009
Dados econômicos divulgados na primeira quinzena deste mês mostraram uma realidade complexa acerca da recuperação e do crescimento da economia brasileira. Tais informações criam uma situação similar à da visão de um copo cheio até a metade, que uns podem considerar meio cheio e outros, meio vazio.
A produção industrial continua a se recuperar, mas ainda se encontra em um nível 10% abaixo do que se encontrava em agosto de 2008. Alguns setores conseguem avançar mais rápido do que outros: é o caso dos setores de material de construção, papel e celulose, além das indústrias automobilísticas e de eletrodomésticos. A recuperação destes segmentos foi fortemente apoiada pelos incentivos do governo, como o programa “Minha Casa, Minha Vida”, a ampliação do crédito imobiliário de bancos públicos e a isenção de IPI para carros e eletrodomésticos (linha branca).
Outros setores, como o da metalurgia e de bens de capital, que sofreram as maiores quedas no uso da capacidade instalada, 19,2% e 29,3%, respectivamente, caminham a passos mais lentos. E há ainda aqueles mais preocupantes, como os setores de calçados e vestuário, setores tradicionalmente exportadores que, além da restrição de crédito externo e interno, sofrem com a competitividade dos produtos importados, especialmente chineses, devido à valorização do real nos últimos meses.
Mesmo que o setor produtivo celebre o termino da fase “fundo do poço”, e que tenha conseguido criar 123.318 postos de trabalho em setembro, foi o setor de serviços quem mais contratou trabalhadores nos primeiros oito meses do ano, seguido pela construção civil, agricultura e comércio. Enquanto o setor de serviços gerou 411.426 postos de trabalho, o industrial criou 62.759, conforme dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged). Sabemos que estes dados falseiam a realidade, pois, por imprecisão e pouco rigor científico das Contas Nacionais, o chamado setor de serviços esconde muitas atividades industriais que, por falta de critérios científicos aí são classificadas.
O IBGE informa que a folha de pagamento na indústria, no acumulado dos oito primeiro meses do ano, caiu de 2,2% em comparação ao mesmo período de 2008.
Como comentamos em análises passadas, o que está surpreendendo o governo é a queda da arrecadação da Receita Federal. Para os especialistas, está ocorrendo o chamado “financiamento tributário”, ou seja, as empresas que ainda estão com insuficiência de caixa preferem atrasar o pagamento de impostos a pedir empréstimos para tapar os buracos nos seus balanços.
Analistas do governo avaliam que o Ministério da Fazenda esperava que o crescimento na economia tivesse reflexo positivo sobre a receita tributária já neste terceiro trimestre, o que, de fato, não ocorreu. Com isso, a equipe econômica tende a não conceder novas reduções de impostos ou prorrogar as existentes. Algumas empresas do setor de eletrodoméstico, por exemplo, já reivindicam a extensão do prazo de redução do IPI até o final do ano. Além disso, o governo reduziu, de R$ 522 milhões, para R$ 466 milhões, o seu orçamento anual.
O Banco Central (Bacen) prevê aceleração do déficit em conta corrente entre 2009 e 2010. A maior parte deste déficit decorre exatamente do resultado da balança comercial, com importações crescendo mais do que as exportações, como também da entrada de capital especulativo, o chamado “hot money”, voltado para os mercados de ações e de títulos da dívida.
Além disso, o Bacen, em apenas sete dias deste mês, realizou uma série de compras de dólares no mercado doméstico interbancário. Estas compras giraram em torno de US$ 5,3 bilhões. Embora não seja revelado, o objetivo principal de tal ação foi impedir uma valorização maior do real diante o dólar, com o conseqüente aumento do montante das famosas reservas nacionais. O que não se costuma revelar é o custo dessas transações para a dívida pública brasileira. O Banco Central, ao comprar grande quantidade de dólares, lança, no mercado, uma quantidade correspondente de reais. Para fugir à pressão que estas emissões possam causar sobre as taxas de inflação, ele é obrigado a “enxugar” este excesso, o que tem feito através do lançamento de títulos da dívida pública, em geral, atrelados à taxa Selic. O resultado é o aumento da dívida e do volume dos juros que já não se consegue pagar, abalando a credibilidade do governo.
Na economia dos Estados Unidos, por sua vez, o Federal Reserve, Banco Central do país, informou que o programa de compras de títulos atrelados a hipotecas e de títulos públicos de longo prazo, que seria encerrado em 31 de dezembro próximo, será estendido até março de 2010. Receosos quanto à fragilidadeda economia norte-americana, a equipe do Fed sinaliza que poderá expandir as compras de ativos, caso asperspectivas não melhorem. O Fed também resolveu manter a taxa básica de juros próxima a zero.
Além disso, ao longo dos últimos tempos, o dólar vem se desvalorizando em relação ao euro e às outras moedas, como o iene e o real. Tal tendência tem causado sérias dificuldades para a recuperação do comércio internacional. O que tem ocorrido é a redução ou o adiamento de pedidos dos varejistas das nações ricas aos países tradicionalmente exportadores, como Japão, Coréia do Sul e China. Conforme o Fundo Monetário Comercial, o volume de comércio mundial vai cair 11% este ano, e crescerá apenas 2,5% no ano que vem.
Na União Européia, a situação também causa preocupações. O Banco Central europeu (BCE) decidiu manter a taxa de juros em 1%, a mais baixa em sua história. Em pronunciamento, Jean-Claude Trichet anunciou que a zona do euro continua a se recuperar economicamente e que a fase de queda livre acabou. Contudo, ponderou sobre uma rápida recuperação ao afirmar: “Em geral, a recuperação deverá se manter bastante irregular”.
Como estamos vendo, tudo aponta para um processo de recuperação lento e cheio de tropeços.
Texto escrito por:
Maria Carolina Costa Madeira: Jornalista, mestre em Economia da UFPB e pesquisadora do PROGEB – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira.
Email: progeb@ccsa.ufpb.br
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