Semana de 31 de outubro a 06 de novembro de 2011
Lucas Milanez de Lima Almeida [i]
Quem não conhece a história do Presente de Grego? O famoso Cavalo de Tróia simbolizou a capacidade que este povo tem de resolver problemas impossíveis. Pois bem, nas últimas semanas, mais do que nunca, os gregos estão tendo que mostrar novamente esta habilidade. Diante do elevado endividamento do Estado grego, do quebra pau com a população, da falta de apoio do Parlamento e das pressões externas, o primeiro ministro da Grécia, George Papandreou, resolveu dar à Zona do Euro um Presente de Grego, ao perguntar à população se ela concordava em pagar pela dívida do governo. Talvez o povo soubesse o que fazer diante de mais uma missão impossível. Seria feito um plebiscito, para saber se o país deveria ou não acatar a atarraxada do Fundo Monetário Internacional. O temor de todos os “agentes do mercado” era de que o eleitorado não aprovasse as propostas, já que o bônus não caiu, mas o ônus cairia sobre eles.
Quem não ficou nada contente foi o casalzinho Merkozy, formado por Angela Merkel, primeira ministra da Alemanha, e Nicolas Sarkozy, presidente da França. O problema chegou a tal ponto que paira sobre a Zona do Euro a possibilidade de a Grécia sair da união monetária, caso não cumpra suas “obrigações”.
O problema é que, apesar do perdão forçado de cerca de 50% da dívida grega e da surpresa do BCE, que reduziu os juros básicos para 1,25% (queda de 0,25%), o mercado especulativo ainda está muito exposto aos problemas europeus. Estima-se que só as instituições financeiras estadunidenses tenham US$ 1,8 trilhão em negócios com a Europa. Em 2009, este número era de US$ 1,2 trilhão. Quando comparamos estas cifras com as promessas de ajuda do FMI, vemos que elas não são suficientes para salvar os parasitas do mercado financeiro. A esperança era de que o Fundo tivesse, na melhor das hipóteses, US$ 1 tri para ajudar os bancos. Isto dependia da reunião do G20, que ocorreu em Cannes. Porém nada foi definido. Ao fim da reunião, Barack Obama ainda soltou que “aprendeu muito nos dois dias que passou dentro do complexo processo de tomada de decisões da União Européia”. A presidente Dilma Rousseff avaliou o encontro como um “relativo sucesso”, visto que outros assuntos, que não a crise européia, foram deixados em segundo plano.
Mas a esperança é a última que morre. Desta vez o trunfo para a Europa é Made in China. Com uma reserva cambial de US$ 3,2 trilhões, os novos-ricos chineses parecem ser os salvadores dos velhos-ricos. Mas, como todo produto Made in China, o socorro tem uma qualidade duvidosa. Quando se descontam todos os compromissos de curto prazo do governo chinês, sobram apenas US$ 1,5 trilhões, dos quais US$ 500 bilhões foram canalizados para o Fundo Soberano Chinês e outros US$ 500 bi podem ser destinados aos governos municipais chineses. Daquele total, sobram US$ 500 bi de reservas livres para a ajuda.
Muito se fala em ajudar ao próximo. Mas esta ajuda também terá um preço caro, pois, além de devolver o dinheiro emprestado, o país precisa pagar os respectivos juros. A principal condição para a efetuação dos empréstimos, que é uma espécie de garantia do pagamento, é a redução do déficit orçamentário, o que significa dizer que haverá um aumento nas receitas do Estado e uma redução nos seus gastos. Tais medidas, por sua vez, têm um caráter econômico restritivo, pois reduz tanto o consumo do setor público como o do setor privado. O resultado é que a produção não será estimulada e, consequentemente, o emprego também não. Com isso, a renda não circula nas mãos dos capitalistas nem nas dos trabalhadores, o que agrava ainda mais a arrecadação de tributos. O dinheiro retirado das mãos das pessoas, por ser destinado ao pagamento dos empréstimos, termina piorando a situação da economia. Se o Estado direcionasse os recursos para setores que efetivamente são necessários à população, a situação melhoraria, mas aí não seria o capitalismo.
No capitalismo o que ocorre é precisamente o contrário. O povo que sofra com as consequências da voracidade do capital. Nada de plebiscito na Grécia. O Papandreou, representante do povo e, como tal, queria ouvir a voz das massas, não aguentou a pressão e terminou por renunciar ao cargo. Em seu lugar cogita-se colocar ninguém menos de que o ex-vice-presidente do BCE, Lucas Papademos, ou o representante da Grécia no FMI, Panagiotis Rumeliotis.
Ao contrário do que conta a história, seja quem for o novo representante, além de não dar o Presente de Grego aos especuladores, vai dá-lo ao seu próprio povo, que pagará muito caro por isso.
Resta saber como eles reagirão contra sua criatura.
[i] Mestre em Economia, professor do Departamento de Economia da UFPB e pesquisador do Progeb. (www.progeb.blogspot.com.).
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