quarta-feira, 11 de julho de 2012

O último peru de Natal


Semana de 02 a 08 de julho de 2012


Nelson Rosas Ribeiro[i]




            As notícias são abundantes e todas confirmam a tendência que vimos apontando em nossas análises de agravamento da crise mundial. A desaceleração da produção industrial se generaliza nos EUA, na União Européia (UE), na China, e até em países como a Alemanha, a Coréia do Sul, Taiwan, etc. A situação é tal que provocou a ação simultânea de quatro dos maiores bancos centrais do mundo, reduzindo suas taxas de juros: o Banco Central Europeu (BCE), o Banco da Inglaterra (BoE), o Banco do Povo da China (BPoC) e o Banco da Dinamarca.
            Nos EUA, mesmo com as medidas tomadas pelo governo Obama, desesperado para ganhar as eleições, a situação não melhora. O FMI reviu para baixo as suas previsões para o crescimento da economia. Espera-se que as taxas de crescimento do PIB não ultrapassem os 2%. Lembramos que as taxas de juros do Banco Central Americano, o Federal Reserve (Fed), já estão próximas a zero, entre 0% e 0,25%.
            Na China, diante do agravamento da situação, o Banco Central tomou medidas cortando os juros e injetando, em um só dia, 143 bilhões de yuans (US$ 22,6 bilhões) na economia, depois de já ter lançado outros 143 bilhões na semana passada.  
            A União Européia e particularmente a zona do euro, continuaram sendo o epicentro da crise. O BCE, além de reduzir sua taxa básica de juros de 1% para 0,75% (queda de 0,25%), reduziu também outras taxas como a de depósitos, de 0,5% para 0%, e a de longo prazo, de 1,75% para 1,5%. Justificando a medida, o presidente do BCE, Mario Draghi afirmou que a crise da dívida levou a uma desaceleração generalizada atingindo mesmo os países mais fortes. Com efeito, ao ritmo em que a indústria se contrai, o desemprego nos 17 países da zona do euro atingiu o nível recorde com a taxa de 11,1% e 17,561 milhões de desempregados. Seguindo o exemplo, o Banco da Dinamarca reduziu sua taxa para 0,2%.
            Na Itália, o déficit fiscal, no primeiro trimestre, foi de 8% do PIB, superior aos 7% do mesmo período do ano passado. Com as mesmas referências o gasto público cresceu 1,3% e a arrecadação caiu 1%. O primeiro ministro Mário Monti, comprometido a reduzir o rombo até 2013, já prometeu demitir 10% dos funcionários públicos e, logicamente, os sindicatos ameaçam com greves gerais. Por seu lado, a França, para cumprir suas metas de equilíbrio orçamentário terá de fazer cortes violentos o que se contrapõe às promessas eleitorais do seu novo presidente Hollande.  
Mas, o que isto tudo tem a ver como o peru de Natal?
            A questão é que estamos integrados em um mundo globalizado e, como temos dito, estamos metidos igualmente nesta crise globalizada, para o bem e para o mal. A economia brasileira é uma parceira ativa neste processo e, por mais que o desejem, nem o ministro Mantega, nem o governo, nem administradores e economistas juntos podem evitá-la. O máximo que se consegue é amenizar e minorar os efeitos. No entanto, em vez de se procurar defender os interesses dos trabalhadores, se tem protegido os interesses de uma parcela ínfima dos capitalistas que dominam o setor financeiro.
            Os dados mostram que a economia do país está se degradando. A indústria desacelera (a utilização da capacidade instalada caiu para 80,7%, o menor nível desde 2009) as exportações diminuem, a balança comercial reduz os seus saldos, os estrangeiros retiram os capitais do país e os saldos da balança de pagamentos estão comprometidos. O tsunami financeiro acabou e o país deixou de ser o paraíso desejado pelos especuladores travestidos de “investidores”. As ratazanas abandonam o navio quando o “peru de Natal” é retirado da mesa. Segundo o ex-ministro Delfim Netto, o peru era o Brasil com as taxas de juros mais altas do mundo e as facilidades oferecidas ao capital estrangeiro. Com a redução delas e a política de repressão à especulação a farra acabou.
            Em declaração feita durante a semana, o ministro Mantega reconheceu a gravidade da crise e, lembrando a expressão de Delfim, concluiu enfático: “Aqui era ganhar dinheiro sem risco. Aí, de repente tiramos o peru.”
            Só não explicou por que permitiu que o país servisse de repasto para o capital financeiro durante tanto tempo e só agora lhe ocorreu interromper o festim roubando-lhes o peru.


[i] Professor do departamento de Economia, Coordenador do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira progeb@ccsa.ufpb.br); (www.progeb.blogspot.com).
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