Semana de 20 a 26 de maio de 2013
Lucas Milanez de Lima Almeida[i]
Nas últimas semanas temos apresentado números nada animadores sobre a economia. Não é de hoje que esta necessária mas combalida atividade humana, de produção e distribuição da riqueza, está doente. Tão enferma que os urubus já estão sobrevoando em círculos as nossas cabeças.
Já falamos aqui do capital fictício, que deriva da valorização do capital sem uma base material concreta. Falamos também que o “mercado”, tal como nós, os animais, tem apetite e que este apetite é satisfeito, principalmente, pela acumulação do capital, pela apropriação de rendimentos produzidos por pura especulação.
Se fossemos tratar o mercado como um animal, deveríamos chamá-lo de urubu. Isto porque, segundo os “analistas de mercado”, o atual apetite está voltado para os chamados títulos podres. Estes “ativos podres” consistem em papéis que representam dívidas de clientes, seja pessoa física ou jurídica, com os bancos. Porém não são quaisquer dívidas, mas as que estão em atraso, ou seja, aquelas que não foram quitadas no prazo.
Pois bem, bancos como o Santander, Citibank e Votorantim fazem este tipo de negociação. Outros três pequenos, Pine, Mercantil e Cetelem, negociaram, durante os últimos anos, carteiras inadimplentes com atraso superior a 6 meses. Além destes, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, o BNDES, pretende lançar no mercado um ativo com um saldo devedor de R$ 37,046 bilhões. Os “analistas de mercado” atribuíram a este ativo um preço de R$ 6,102 bi. Para termos uma ideia, em 2011, o total negociado em carteiras inadimplentes no Brasil, por bancos nacionais e estrangeiros, foi de R$ 16,658 bilhões. Em 2012, este número se reduziu, para R$ 9,815 bi. A expectativa para 2013 é de que sejam movimentados entre R$ 15 e R$ 20 bilhões em créditos podres. O pior é que, segundo a consultoria KPMG, a potencial oferta está aquém do apetite da demanda.
Tal problema não é exclusividade nossa. O presidente do banco central estadunidense, Ben Bernanke, assinalou sua preocupação com as “apostas em riscos excessivos” que estão tomando os aplicadores de todo o mundo. Isto, graças ao baixo nível de taxas de juros e aos afrouxamentos monetários (leia-se derramamento de dinheiro na economia), que estão sendo praticados pelos países desenvolvidos. A situação é tal que, até o ouro, a mercadoria mais aceita do planeta, está em baixa: entre os dias 01 de janeiro e 21 de maio de 2013 a desvalorização do metal no mercado mundial chegou a 17,25%, enquanto em 2012 a valorização havia sido de 8,56%.
Tudo isto não é à toa. A atividade produtiva no mundo ainda não decolou e está a dar sinais de afundamento. Durante os últimos dez anos as economias emergentes foram responsáveis por mais de 50% do crescimento do PIB mundial. Só nos anos, entre 2008 e 2012, as vendas no varejo destes países cresceram, em média, 8,8%. Isto é consideravelmente maior do que o pífio 0,9% dos EUA, zona do Euro e Japão. Porém, a expectativa de grande parte dos economistas é de que a atividade irá desaquecer no trimestre que vai de abril a junho de 2013. Esta percepção é fruto da redução para 6,5% no crescimento das vendas dos países em desenvolvimento, no mês de março. Somado a isso, a margem de endividamento das famílias em alguns países está esgotada: na Indonésia e na Malásia, a proporção entre o endividamento das famílias e o PIB cresceu 20% em quatro anos, enquanto na China o crescimento foi de 13%; já na Coréia do Sul, o total de dívidas acumuladas pelas famílias é equivalente a 136% da renda disponível em todo o país. Para agravar o cenário internacional, os estadunidenses colocaram em prática os cortes automáticos de US$ 85,3 bilhões. Segundo estimativas do HSBC, esta cifra irá retirar 0,3% de crescimento do PIB dos EUA, em 2013, e outros 0,3%, em 2014.
Diferentemente do que pensa Luiz Carlos Mendonça de Barros, ex-presidente do BNDES, os dados da economia não nos permitem afirmar que a crise global está em seus últimos capítulos. Ele fez esta afirmação com base nas novas medidas adotadas pelos governos de países desenvolvidos: o profundo ajuste fiscal dos EUA e a nova e agressiva política monetária do Japão, que irá jogar entre 60 e 70 bilhões de ienes na sua economia.
Longe de ser a solução, estas medidas não obrigam os livres empresários a investirem. Tal como a aspirina, apenas aliviam as dores dos urubus em uma situação de dificuldade.
[i] Professor do Departamento de Economia da UFPB e pesquisador do Progeb. (www.progeb.blogspot.com; lucasmilanez@hotmail.com)
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