quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

A velha crise e o ano novo



Semana de 23 a 29 de dezembro de 2013


Rosângela Palhano Ramalho[i]



            Caro leitor, em pleno segundo dia do ano, ainda estamos naquela atmosfera de feliz ano novo, mas as notícias são velhas. Para o ano que se inicia, já expusemos neste espaço alguns dos prováveis acontecimentos: o “tapering” do Banco Central americano e a concretização do “pibinho” brasileiro de 2013. Assim, perdura a velha crise, no novo ano.
            A retirada dos estímulos econômicos do Fed provocará uma redução gradual no montante de dinheiro injetado na economia americana. Ao contrário do Banco Central brasileiro, dizem os críticos, o Fed representa o modelo ideal de autoridade monetária, pois deixa claro para o “público” quais efetivamente serão suas ações. Ele avisa aos bancos: preparem-se, pois a partir de janeiro vocês terão uma redução do montante de compras dos títulos que têm em mãos. E avisa aos especuladores: podem voltar ao nosso mercado, pois a economia está dando sinais de recuperação. Com isto, o mercado fica calminho, calminho, e “adapta”, “ancora”, suas expectativas para um futuro garantido.
            No Brasil, a divulgação do Relatório de Inflação de dezembro causou “frenesi”. Assim como se tornou tradição analisar as entrelinhas da ata do Copom, os “analistas, leitores e peritos de documentos econômicos” tentam entender qual a mensagem subliminar do Relatório. A conclusão a que se chegou é que o Banco Central não ficou satisfeito com o superávit primário (criticando as suas próprias ações!) e provavelmente vai tentar aumentá-lo em 2014. Por quê?
            Ora, antes o governo dizia que os superávits primários deveriam se situar “em patamares próximos aos que têm sido gerados recentemente”, mas agora a frase foi substituída por esta: “em patamares próximos à média dos gerados em anos mais recentes”. A média dos anos recentes, considerando 2012 e 2013, está entre 2,1% e 2,2% do PIB. Esta meta é maior do que o resultado previsto para 2013, que fechará em 1,8% ou 1,9%.
            Se o Banco Central do Brasil fosse mais preciso em suas comunicações, questionam os críticos, seria desnecessário todo este malabarismo para entender a sua linguagem: o “bancocentralês”. Obviamente, todos já sabem que a meta de 4,5% de inflação jamais será alcançada este ano, mas, a autoridade monetária deveria deixar claro que perseguirá o centro da meta. No atual Relatório de Inflação, o abandono da meta fica claro, dizem os “analistas”. Mas isto não basta. Na década passada, o Banco Central sempre procurava trazer a inflação para o centro da meta, no “horizonte de transmissão da política monetária”, estimado em cerca de um ano. Naquela época sim, era possível que o “mercado” “ajustasse” suas expectativas, pois se tinha a certeza de que a única forma de combate à inflação (o aumento dos juros) perduraria neste período de tempo. E, pelo menos por um ano, os ganhos altos estariam garantidos.
            As metas, agora não formais, do Banco Central só tornam indefinidos os ganhos futuros dos especuladores que vivem de sugar as economias emergentes via juros altos. Capital de curto prazo que não gera riqueza e que vive de aproveitar os momentos mais propícios para aumentar seus ganhos. No entanto, as medidas anticíclicas adotadas pelo governo brasileiro foram defensivas e tentaram minimizar os efeitos da crise sobre a economia brasileira. Se isto desagrada os especuladores, paciência...
            A discussão sobre a falta de compromisso do Banco Central em cumprir as metas de inflação e a sua imprecisão na comunicação perdura e atende os interesses de uma classe específica. Claro que neste jogo vale tudo. Vale até dizer que o aumento de preços corrói a renda dos mais pobres e provoca a perda de competitividade das exportações. Mas, sabemos que o centro do discurso está na desconfiança dos investidores com os rumos da política monetária.
            O fato é que, num mundo dominado pelo mercado financeiro, o anúncio do tapering do Fed, deve ter deixado os “investidores” bastante satisfeitos. Com isto, as economias emergentes terão que se ajustar à nova realidade provocada pela fuga provável dos capitais de volta aos EUA. Certamente, os espaços para a especulação continuarão a existir através de mecanismos como a arbitragem com as taxas de câmbio, os juros e as inúmeras mercadorias financeiras já existentes e as novas que podem ser criadas.
            Adeus ano velho, feliz ano novo...


[i] Professora do Departamento de Economia da UFPB e pesquisadora do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com)
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