sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

Entre o dragão e o ogro



Semana de 13 a 19 de janeiro de 2014


Nelson Rosas Ribeiro[i]

A situação da economia mundial continua a evoluir a passos de tartaruga, empurrada lentamente pela locomotiva dos EUA, que a todos irrita com sua lentidão.
Desta vez a palavra está com Cristine Lagarde, diretora-gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI), que classificou como “frágil” a recuperação global, admitindo que “esta crise ainda persiste”. Felizmente ela deu uma pequena injeção de ânimo afirmando que “o otimismo está no ar”... “e o horizonte mais claro”.
Nesse discurso, feito no National Press Club, em Washington, ela lamentou que o crescimento mundial continue abaixo do “potencial” que se situa em torno de 4%.
Continuando, Lagarde alertou para dois perigos: a inflação, que ela chamou de “gênio da garrafa”, e nós, mas apropriadamente chamamos de dragão, e a deflação, considerada por ela igualmente perigosa e apelidada de “ogro”. Deste modo o futuro da humanidade está ameaçado por duas figuras míticas: o gênio da garrafa (dragão) e o ogro (Shrek). Parece que os dois inimigos agem de forma combinada. Enquanto o Shrek ataca os países mais avançados, o dragão encarrega-se dos mais atrasados, entre os quais, os emergentes. Lamentavelmente ele tem uma predileção especial pelo Brasil e está se tornando uma terrível dor de cabeça para o governo petista.
Dirigindo-se aos países mais desenvolvidos Lagarde alertou os Bancos Centrais para não retirarem os estímulos monetários, a exemplo do Q.E. (Quantitative Easing) do Federal Reserve (Fed), banco central americano, até “um crescimento robusto estar firmemente enraizado”. Colocando o carro a frente dos bois, ou invertendo a relação causa-feito, ela copia o erro grosseiro da ideologia econômica dominante de achar que é a deflação que causa a crise e não o contrário.
Sendo mais realista que o rei, o Japão tem se mostrado muito criativo sob o comando do ministro Shinzo Abe e a aplicação da sua chamada “abenomics”. O afrouxamento monetário praticado por ele não é apenas um Q.E., mas um Q.Q.E. (Quantitative and Qualitative Easing). O temor é que a “abenomic” conduza o país a um “abegedon”, ou seja, um Armagedon em que as metas, de elevar a inflação para 2% e fazer crescer o PIB em 1,5%, não sejam atingidas e, além disso, a economia saia de qualquer controle e o caos se instale no país.
No caso do Brasil, a batalha continua contra o dragão da inflação. Parece que o Shrek não se sente bem abaixo da linha do equador. Segundo os dados, o ministro Mantega não conseguiu cumprir o seu único compromisso publicamente expresso: ter uma taxa de inflação inferior à do ano passado. Apesar de ficar abaixo do teto da meta (6,5%), a taxa do ano de 2014 atingiu 5,91%, ficando acima dos 5,84% do ano passado. Isto, apesar de todo o esforço do governo para conter a alta dos preços administrados (combustíveis, transportes, energia, etc.) Há economistas que afirmam que se esse esforço não fosse feito, a taxa teria ultrapassado os 7%.
Aterrorizado e continuando com sua crise de autoafirmação o Banco Central brasileiro, na reunião da quarta feira da semana passada, manteve a sua marcha irracional para abortar todos os esforços de recuperação da economia feitos pelo governo: subiu a taxa de referência Selic para 10,25%, com uma elevação de 0,5%. O Banco Central continua teimosamente na contramão de todos os BCs do mundo e mesmo da América Latina, sem que sua ação tenha produzido qualquer resultado na redução da taxa de inflação.
O dragão anda à solta!
A ideologia econômica que justifica esta decisão é sempre a mesma: a inflação é causada pelo excesso de demanda. As pessoas estão consumindo muito e isto provoca a subida dos preços. Ora, todos nós sabemos que o sonho de qualquer capitalista é ter demanda para sua produção. Por que será que os empresários brasileiros, tendo à sua disposição um mercado tão forte, não aumentam sua produção? Esta pergunta elementar nunca é feita ou respondida pelas inteligências do BC. Qual a justificação para tamanha estupidez? Quem sabe, o BC obedece às determinações do Capital Financeiro.
Desconfiamos que, para nossa infelicidade puseram a raposa para tomar conta do galinheiro!


[i] Professor Emérito da UFPB e Coordenador do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira progeb@ccsa.ufpb.br); (www.progeb.blogspot.com).
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